Messer (arma)

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Grosse Messer, alfange alemão de duas mãos

A messer ("faca" em alemão) é uma arma branca corto-perfurante, de um só gume, que se insere na categoria dos alfanges[1], isto é, pelas suas características, encontra-se a meio termo entre a espada europeia e os sabres do Próximo Oriente.[2] Pertence ao período compreendido entre o século XIV e o século XVI.[1]

Era de tal ordem comum que chegou a fazer parte obrigatória dos manuais de esgrima da altura, dos quais se destaca o manual do final do séc. XV escrito por Johannes Lecküchner, clérigo de Nuremberga.[3] [4] O "Fechtbuch", que foi um manual de esgrima suíço do século XVI, da autoria de Heinrich Wittenwiler[5], por seu turno, tomava a messer como a arma-paradigma, cujas técnicas e manobras serviam de base para a aprendizagem no manejo de outras armas, como a espada suíça.[6]

Feitios[editar | editar código-fonte]

Concretamente, a messer tem uma empunhadura de estilo de faca, tradicionalmente guarnecida de um guarda-mão em cruz.[1] Enquanto alfange, as messeres até se aproximavam mais dos sabres do que das espadas, ostentando uma lâmina mais afilada e com alguma curvatura.[1] A messer clássica podia chegar a medir cerca de 75 centímetros, dos quais a lâmina perfazia cerca de 60, pesando sensivelmente um quilo.[1]

Com o passar dos tempos, as messeres foram-se particularizando e cindiram-se em dois tipos distintos: as Kriegsmessers (que significa “faca de guerra” em alemão) e as as Lange Messers (lit. "facas longas" em alemão).[7]

Kriegsmessers[editar | editar código-fonte]

Eram alfanges de guerra, de uma ou duas mãos, tipicamente asidos por militares. Destacam-se pela lâmina curva, que podia medir até um metro e meio de comprimento. Foram especialmente populares às mãos dos lansquenetes, mercenários alistados pelas legiões alemãs do Sacro Império Romano-Germânico, entre os séculos XIV e XVII. [1] Ao contrário das lange messers que podiam ter uma lâmina recta, as kriegmessers tinham uma curvatura mais pronunciada e terão sido influenciadas pelos alfanges curvados da europa de leste, os quais, por seu turno, há séculos que sofreriam influências mais pronunciadas dos sabres turcos. [8]

Duelo com Messer e "escudo húngaro" (da "Gladiatoria Fechtbuch" pág. 55, meados do século XV)

Lange Messers[editar | editar código-fonte]

Também chamadas Großes Messer ("Facão"), eram alfanges de duas mãos, que mediam entre 1,07 a 1,2 metros de comprido, dos quais as lâminas compunham entre 80 a 90 centímetros de comprimento e 40 mm de largura, chegando a pesar entre 1,3 a 1,8 quilos. Eram tradicionalmente empunhadas por burgueses ou cavaleiros-vilões para efeitos de autodefesa. [8]

A origem desta variante das messeres é desconhecida. Há algumas teorias, porém, que tentam dar-lhe etiologia.

Uma dessas teoria aventa que possam ter evoluido das Bauernwehr ("arma vilã" em alemão), um facão de cerca de 80 centímetros, usado entre o século XIV e XV pelos plebeus alemães, o qual, por seu turno, será uma evolução da scramasax, um tipo de sax de pequenas dimensões, portado pelos povos germânicos desde o século VIII até ao século XIII. [9]

No sobrado desta teoria está o arrazoado de que a lange messer seria uma tentativa plebeia de tornear as leis da época que interditavam os plebeus de portarem armas de guerra, reservadas por apanágio à nobreza. [10]

A manigância à lei passava por fazer uma arma ensiforme, cujo cabo, lâmina e empunhadura não fossem todos a mesma peça contínua, como acontece nas espadas, em que a empunhadura liga com a lâmina e remata no pomo, numa peça inteiriça. Assim, a lange messer tinha um cabo normalmente constituído por duas peças de madeira, que eram tachadas ou rebicadas à extensão da lâmina, para fazer a empunhadura.[11][12]

Desta maneira, a nobreza mantinha o apanágio do porte de espadas e a plebe podia valer-se de uma arma que fazia as vezes de espada, para o que fosse necessário. No entanto, esta teoria, embora largamente divulgada, é duvidosa. Isto porque, embora houvesse cidades que efectivamente proibissem explicitamente o porte de espadas a plebeus, havia também muitas outras cidades cujas redacções da lei iam mais além da mera proibição do porte de espadas, alargando-o ao porte de todo e qualquer implemento bélico (armas de guerra).[3]

Outra tese mais moderna aventa que a origem possa radicar de uma questão do foro jurídico-comercial entre os mesteirais (ou guildas) de artífices da época. Em rigor, os artesãos de facas pertenciam a guildas diferentes dos ferreiros e alfagemes[13], que tinham o apanágio de poder fabricar e vender espadas. Existiriam portanto, à época, códices ou regras de fabrico que delimitariam as diferenças entre uma espada e um facão, tal como hoje-em-dia existem regras símiles no direito de patentes e nas regras de fabrico. A lange messer teria, então, sido uma manobra de artesãos de facas, para ludibriar essas regras e poderem introduzir-se no mercado, por sinal mais lucrativo, da venda de armamento.[14]

Referências

  1. a b c d e f M. C. Costa, António Luiz (2015). Armas Brancas- Lanças, Espadas, Maças e Flechas: Como Lutar Sem Pólvora Da Pré-História ao século XXI. São Paulo: Draco. p. 53. 176 páginas 
  2. Veiga Coimbra, Álvaro (1960). Questões pedagógicas. São Paulo: Departamento de História, Universidade de São Paulo. p. 488. 500 páginas. doi:10.11606/issn.2316-9141.rh.1960.120156 
  3. a b Johannes Lecküchner Transkription (PDF; 797 kB)
  4. Anglo, Sydney; B. Norman (2000). The martial arts of Renaissance Europe. Yale, New Haven, United States: Yale University Press. pp. 102–103 
  5. «Hugo Wittenwiler | Kunst des Fechtens» (em inglês). Consultado em 7 de novembro de 2020 
  6. «Handschriftenkataloge ONLINE». bilder.manuscripta-mediaevalia.de. Consultado em 7 de novembro de 2020 
  7. {{citar livro|título="Das Schwert. Gestalt und Gedanke: The Sword. Form and Thought"|ultimo= Grotkamp-Schepers|primeiro= Barbara|autor2= Isabell Immel|autor3= Peter Johnsson|editora=Sixt Wetzler|ano= 2015|local= Solingen|página=44
  8. a b Clements, John (1998). Medieval Swordsmanship: Illustrated Methods and Techniques. Boulder, Colorado, United States: Paladin Press. p. 78 
  9. Barbara Grotkamp-Schepers, Isabell Immel, Peter Johnsson, Sixt Wetzler: "Das Schwert. Gestalt und Gedanke: The Sword. Form and Thought" Deutsches Klingenmuseum. Solingen, 2015, ISBN 3930315408
  10. *Nuremberg : man hat verboten [...] daz dhein burger weder in der stat noch auzwendig niht sol tragen dhein silberin gürteln [...] dhein welhisch messer noch dheinen basler (Satzungsbücher und Satzungen der Reichsstadt Nürnberg aus dem 14. Jahrhundert ed. Werner Schultheiß, 1965, p. 217)
    • Mainzer Friedgebot (1300), 101: wel man zu Meinze inne woninde ist, der rutinge dregit odir swert odir beseler, der sal uz Meinze varin ein vierteil iaris (ed. Rudolf Steffens), in: Mainzer Zeitschrift 98 (2003), 1-10; beseler glossed as "two-edged knives" in F. J. Mone, Der Friedensbruch der Stadt Mainz, um 1430 (1856).
    • A 1427 law code of Tegernsee lists paslär as one of a number of illegal weapons (verpotne wer), setting a fine for carrying them in the street: Gustav Winter, Osterreichische Weistümer, vol. 8 (1896), p. 970.
    see also mhdwb-online.de
  11. Haage, Berlin, Germany; Wolfgang Wegner; Gundolf Keil; Helga Haage-Naber (2007). Deutsche Fachliteratur der Artes in Mittelalter und Früher Neuzeit". [S.l.]: Schmidt Erich Verlag. p. 260 
  12. «Das lange Messer, eine fast vergessene Waffe» (htm) 
  13. S.A, Priberam Informática. «Consulte o significado / definição de alfageme no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, o dicionário online de português contemporâneo.». dicionario.priberam.org. Consultado em 25 de dezembro de 2020 
  14. Datenblatt Langes Messer (PDF; 429 kB) Gesellschaft zur Erforschung und Erprobung historischer Waffen e.V.