Auto da Barca do Inferno: diferenças entre revisões
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A presença ou ausência do Parvo no Purgatório aquando do fim da peça acaba por ser pouco explícita, uma vez que esta acaba com a entrada dos Cavaleiros na barca do Anjo sem que existissem quaisquer outros comentários do Anjo ou do Parvo sobre o seu destino final. |
A presença ou ausência do Parvo no Purgatório aquando do fim da peça acaba por ser pouco explícita, uma vez que esta acaba com a entrada dos Cavaleiros na barca do Anjo sem que existissem quaisquer outros comentários do Anjo ou do Parvo sobre o seu destino final. |
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== Análise == |
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=== Sátira social === |
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Esta obra tem dado margem a leituras muito redutoras, que grosseiramente só nela vêem uma [[farsa]]. Mas se [[Gil Vicente]] fez a impiedosa das [[moléstia]]s que [[Corrosão|corroíam]] a sociedade em que viveu, não foi para se ficar aí, como nas farsas, mas para propor um caminho decidido de transformação em relação ao presente.{{carece de fontes|data=Dezembro de 2008}} |
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Normalmente classificada como uma moralidade, muitas vezes ela aproxima-se da farsa; o que indubitavelmente fornece ao leitor é uma visão, ainda que parcelar, do que era a sociedade portuguesa do [[século XVI]]. Apesar de se intitular ''Auto da Barca do Inferno'', ela é mais o auto do julgamento das almas.{{carece de fontes|data=Dezembro de 2008}} |
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=== Personagens === |
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As personagens desta obra são divididas em dois grupos: as personagens alegóricas e as personagens – tipo. No primeiro grupo inserem-se o Anjo e o Diabo, representando respectivamente o Bem e o Mal, o [[Céu]] e o [[Inferno]]. Ao longo de toda a obra estas personagens são como que os «juízes» do julgamento das almas, tendo em conta os seus pecados e vida terrena. No segundo grupo inserem-se todas as restantes personagens do Auto, nomeadamente o Fidalgo, o Onzeneiro, o Sapateiro, o Parvo (Joane), o Frade, a Alcoviteira, o Judeu, o Corregedor e o Procurador, o Enforcado e os Quatro Cavaleiros. Todos mantêm as suas características terrestres, o que as individualiza visual e linguisticamente, sendo quase sempre estas características sinal de corrupção. |
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Fazendo uma análise das personagens, cada uma representa uma classe social, ou uma determinada profissão ou mesmo um credo. À medida que estas personagens vão surgindo vemos que todas trazem elementos simbólicos, que representam a sua vida terrena e demonstram que não têm qualquer arrependimento dos seus pecados. Os elementos cénicos de cada personagem são: |
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* '''Fidalgo''': manto e pajem que transporta uma cadeira de espaldas. Estes elementos simbolizam a opressão dos mais fracos, a tirania e a presunção. |
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* '''Onzeneiro''': bolsão. Este elemento simboliza o apego ao dinheiro, a ambição , a ganância e a usura). |
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* '''Sapateiro''': avental e moldes. Estes elementos simbolizam a exploração interesseira, da classe burguesa comercial. |
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* '''Parvo''': representa simbolicamente, os menos afortunados de inteligencia. |
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*'''Frade''': Moça, espada, escudo e capacete. Estes elementos representam a vida mundana do [[Clero]], e a dissolução dos seus costumes. |
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* '''Alcoviteira''': moças e os cofres. Estes elementos representam a exploração interesseira dos outros, para seu próprio lucro. |
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* '''Judeu''': bode. Este elemento simboliza a rejeição a fé cristã. |
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*'''Corregedor''' e '''Procurador''': processos, vara da Justiça e livros. Estes elementos simbolizam a magistratura. |
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*'''Enforcado''': Acredita ter o perdão garantido. Seu julgamento terreno e posterior condenação à morte o teriam redimido de seus pecados, mas é condenado igual aos outros. Ele carrega a mesma corda com que fora enforcado. |
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*'''Quatro Cavaleiros''': cruz de Cristo simboliza a fé dos cavaleiros pela religião católica. |
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(todos os elementos cénicos representam os pecados das personagens) |
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=== Humor === |
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Surgem ao longo do auto três tipos de cómico: o de carácter, o de situação e o de linguagem. O cômico de carácter é aquele que é demonstrado pela personalidade da personagem, de que é exemplo o Parvo, que devido à sua pobreza de espírito não mede as suas palavras, não podendo ser responsabilizado pelos seus erros. O cómico de situação é o criado à volta de certa situação, de que é bom exemplo a cena do Fidalgo, em que este é gozado pelo Diabo, e o seu orgulho é pisado. Por fim, o cómico de linguagem é aquele que é proferido por certa personagem, de que são bons exemplos as falas do Diabo. |
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== O ''Auto da Barca do Inferno'' e o ''Inferno'' anónimo (c. 1515) do Museu Nacional de Arte Antiga == |
== O ''Auto da Barca do Inferno'' e o ''Inferno'' anónimo (c. 1515) do Museu Nacional de Arte Antiga == |
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O Auto da Barca do Inferno é uma complexa alegoria dramática de Gil Vicente, representada pela primeira vez em 1517. É a primeira parte da chamada trilogia das Barcas (sendo que a segunda e a terceira são respectivamente o Auto da Barca do Purgatório e o Auto da Barca da Glória).
Os especialistas classificam-na como moralidade, mesmo que muitas vezes se aproxime da farsa. Ela proporciona uma amostra do que era a sociedade lisboeta das décadas iniciais do século XVI, embora alguns dos assuntos que cobre sejam pertinentes na atualidade.
Diz-se "Barca do Inferno", porque quase todos os candidatos às duas barcas em cena – a do Inferno, com o seu Diabo, e a da Glória, com o Anjo – seguem na primeira. De facto, contudo, ela é muito mais o auto do julgamento das almas.
Estrutura
O auto não tem uma estrutura definida, não estando dividido em actos ou cenas, por isso para facilitar a sua leitura divide-se o auto em cenas à maneira clássica, de cada vez que entra uma nova personagem.
Resumo
Predefinição:Revelações sobre o enredo Embora o Auto da Barca do Inferno não integre todos os componentes do processo dramatico, Gil Vicente consegue tornar o Auto numa peça teatral, dar unidade de acção através de um unico espaço e de duas personagens fixas " diabo e anjo".
A peça inicia-se num porto imaginário, onde se encontram as duas barcas, a Barca do Inferno, cuja tripulação é o Diabo e o seu Companheiro, e a Barca da Glória, tendo como tripulação um Anjo na proa.
Apresentam-se a julgamento as seguintes personagens:
- um Fidalgo, D. Anrique;
- um Onzeneiro (homem que vivia de emprestar dinheiro a juros muito elevados naquela época, um agiota);
- um Sapateiro de nome Joanantão, que parece ser abastado, talvez dono de oficina;
- Joane, um Parvo, tolo, vivia simples e inconscientemente;
- um Frade cortesão, Frei Babriel, com a sua "dama" Florença;
- Brízida Vaz, uma alcoviteira;
- um Judeu usurário chamado Semifará;
- um Corregedor e um Procurador, altos funcionários da Justiça;
- um Enforcado;
- quatro Cavaleiros que morreram a combater pela fé.
Cada personagem discute com o Diabo e com o Anjo para qual das barcas entrará. No final, só os Quatro Cavaleiros e o Parvo entram na Barca da Glória (embora este último permaneça toda a acção no cais, numa espécie de Purgatório), todos os outros rumam ao Inferno. O Parvo fica no cais, o que nos transmite a ideia de que era uma pessoa bastante simples e humilde, mas que havia pecado. O principal objectivo pelo qual fica no cais é para animar a cena e ajudar o Anjo a julgar as restantes personagens, é como que uma 2ª voz de Gil Vicente.
A presença ou ausência do Parvo no Purgatório aquando do fim da peça acaba por ser pouco explícita, uma vez que esta acaba com a entrada dos Cavaleiros na barca do Anjo sem que existissem quaisquer outros comentários do Anjo ou do Parvo sobre o seu destino final.
O Auto da Barca do Inferno e o Inferno anónimo (c. 1515) do Museu Nacional de Arte Antiga
Existe no Museu Nacional de Arte Antiga uma pintura anónima do Inferno que é quase contemporânea do Auto da Barca do Inferno. Poderá precedê-lo em dois anos. É uma pintura de qualidade e contém, como a obra de Gil Vicente, intenção de crítica social. Mas enquanto na Barca assistimos ao julgamento, donde se pode sair condenado ou salvo, a pintura mostra um recanto infernal com danados distribuídos por grupos, recordando talvez o que se passa na Divina Comédia; no auto, as personagens são individuais.
Esta pintura, que Gil Vicente pode bem ter conhecido, remete para o mesmo momento cultural e religioso, até para um semelhante empenho pré-reformista de intervir na sociedade.
O Auto da Barca do Inferno e os Diálogo dos Mortos, de Luciano
Como Miguel Ângelo há de fazer cerca de 20 anos mais tarde no Juízo Final[1] da Capela Sistina (ao fundo do fresco a barca de Caronte), também Gil Vicente construiu a sua alegoria com vários elementos vindos da mitologia, mais em concreto, dos Diálogos dos Mortos[2], de Luciano de Samósata.
A intertextualidade entre esta obra e a moralidade de Gil Vicente é clara, de modo particular se considerarmos o Diálogo X. Veja-se como Hermes, sempre satírico como o Diabo vicentino, se dirige ao Filósofo:
- Põe de parte a postura, em primeiro lugar, e depois tudo o mais! (…)
- Deita fora também a mentira, a presunção e o acreditar que és melhor que os outros, porque se embarcares com tudo isso, qual o navio de cinquenta remadores, capaz de te receber?
A recusa de tudo o que podia significar distinção social na vida terrena aparece também no auto, quando lá se fala das «cárregas» inúteis para garantir êxito no julgamento.
A afastar as duas obras, está tudo o que depende da teologia cristã, a começar pela presença do Anjo, com a possibilidade de dois destinos, o da condenação e o da glória, o final esperançoso (claramente visível quando se tem em conta o modo como o autor aproveita a maré ao longo da obra - que está vasa no final, impedindo a ida para o Inferno), e ainda o novo contexto histórico.
Notas e referências
Ligações externas
- Versão integral da obra, para leitura ou download
- Edição integral com notas e introdução (Googlebooks)
- [http://ardefilmes.no.sapo.pt/barca.html Peças de teatro de Gil Vicente para escolas no Mosteiro dos