Grande Diálogo Nacional
O Grande Diálogo Nacional (em francês: Grand dialogue national) é o nome oficial de um diálogo entre o governo camaronês e vários partidos da oposição, com o objetivo de resolver a crise separatista nos Camarões. O evento ocorreu entre 30 de setembro e 4 de outubro de 2019.[1]
Antecedentes
[editar | editar código-fonte]Durante décadas, os camaroneses anglófonos na área anteriormente conhecida como Camarões do Sul ressentiram-se do governo central por marginalizá-los.[2] Em outubro de 2016, grandes protestos eclodiram em cidades das regiões anglófonas. O governo camaronês respondeu enviando soldados para reprimir os protestos.[3] Seis semanas depois das manifestações, seis manifestantes foram mortos e mais de 100 foram presos.[4] Em setembro de 2017, os separatistas anglófonos começaram a pegar em armas contra o governo camaronês e, em 1 de outubro, a Frente Unida do Consórcio Ambazônia dos Camarões do Sul declarou a independência da República Federal da Ambazônia.[5] A situação evoluiu para um conflito militar, incluindo violações de direitos humanos.[6]
Negociações
[editar | editar código-fonte]Em 10 de setembro de 2019, o presidente de Camarões, Paul Biya, anunciou em um discurso televisionado que um "grande diálogo nacional" ocorreria antes do final do mês. O diálogo teria lugar "no contexto da constituição", excluindo assim a independência da Ambazônia, e incluiria a diáspora anglófona dos Camarões.[7] Posteriormente, foi lançado um site do governo, onde as pessoas poderiam apresentar propostas antes do diálogo.[1]
Curso do Diálogo
[editar | editar código-fonte]30 de setembro
[editar | editar código-fonte]O diálogo começou com uma cerimônia de abertura, onde ex-combatentes separatistas cantaram o hino nacional de Camarões.[8] Em seguida, o primeiro-ministro Joseph Ngute desafiou os participantes a "fazer história" e encontrar soluções para "os problemas que nos separaram física e intelectualmente nos últimos anos".[9]
1 de outubro
[editar | editar código-fonte]Os debates começaram plenamente no segundo dia de diálogo. Oito comissões haviam sido nomeadas, cada uma com foco em um assunto específico; uma para o multiculturalismo e bilinguismo, uma para o sistema educacional, uma para o sistema judicial, uma para a questão dos refugiados, um para a reconstrução, uma para o desarmamento, uma para a diáspora e uma para a descentralização.[10]
No final do segundo dia, o advogado Akere Muna do "Now Movement" disse que se retiraria do diálogo se a forma do Estado não fosse discutida.[11]
2 de outubro
[editar | editar código-fonte]O terceiro dia teve o mesmo foco do segundo dia. O advogado Felix Agbor Balla declarou que o diálogo seria inútil a menos que a forma do Estado fosse discutida, insistindo que a descentralização seria insuficiente.[12]
3 de outubro
[editar | editar código-fonte]No quarto dia, as comissões apresentaram suas recomendações ao primeiro-ministro.[13] À medida que o Grande Diálogo Nacional se aproximava de sua conclusão, o presidente Paul Biya emitiu um decreto que suspendeu os processos judiciais contra 333 ativistas anglófonos.[14]
Em resposta à presença de generais separatistas no diálogo, o Conselho de Autodefesa da Ambazônia emitiu uma declaração alegando que esses separatistas eram falsos.[15]
4 de outubro
[editar | editar código-fonte]No quinto dia, as resoluções finais foram lidas.[16] A comissão de descentralização propôs um status especial para as regiões anglófonas, bem como mais autonomia local.[17] Outras recomendações incluíram a construção de um aeroporto e um porto marítimo nas regiões anglófonas, a renomeação do país para "República Unida dos Camarões", medidas contra a corrupção e um esforço intensificado para reabilitar antigos combatentes separatistas.[18]
Reações
[editar | editar código-fonte]O partido governante acolheu as recomendações das comissões. Alguns participantes criticaram a estrutura do diálogo, bem como o fato de a secessão não ter sido debatida como alternativa. Outros caracterizaram o evento de cinco dias como uma farsa.[19] Os separatistas reafirmaram sua rejeição ao diálogo, prometendo intensificar a guerra.[18]
Em dezembro de 2020, as Nações Unidas instaram o governo de Camarões a abordar as questões levantadas no Grande Diálogo Nacional e a continuar o processo de diálogo com todas as partes envolvidas. François Loucemy Fall, chefe do Escritório Regional das Nações Unidas para a África Central, afirmou que "a implementação das recomendações do grande diálogo nacional, além do diálogo contínuo com todas as partes, continua sendo crucial para a construção de uma paz e desenvolvimento duradouros".[20]
Consequências
[editar | editar código-fonte]No dia seguinte à conclusão do diálogo, o presidente Biya ordenou a retirada dos processos judiciais de alguns apoiadores do Movimento pelo Renascimento dos Camarões, incluindo seu líder Maurice Kamto.[21] Esta medida estava diretamente ligada ao Grande Diálogo Nacional.[22] Em 16 de novembro, duas delegações governamentais iniciaram uma missão nas regiões anglófonas para conquistar o apoio popular para as conclusões do Grande Diálogo Nacional. Em particular, as delegações pretendiam convencer a população de que um "status especial" para as regiões anglófonas resolveria suas queixas.[23] Isso resultou no "Código Geral das Autoridades Regionais e Locais", que foi aprovado pelo parlamento camaronês em 18 de dezembro de 2019.[24]
A guerra nas regiões anglófonas se intensificou nas semanas seguintes ao diálogo. Mantendo sua abordagem militar para resolver a crise, o governo camaronês começou a se concentrar na criação de grupos locais de vigilantes para combater a guerrilha separatista. Os separatistas intensificaram sua guerra de guerrilha contra Camarões, principalmente ao assassinar um general separatista poucos dias depois de ter deposto as armas.[25]
Notas
[editar | editar código-fonte]- Este artigo foi inicialmente traduzido, total ou parcialmente, do artigo da Wikipédia em inglês cujo título é «Major National Dialogue».
Referências
- ↑ a b Cameroon: Gov't creates website for reception of contributions ahead of National dialogue, Journal du Cameroun, 19 de setembro de 2019.
- ↑ Anyangwe, Carlson. Betrayal of Too Trusting a People. The UN, the UK and the Trust Territory of the Southern Cameroons: The UN, the UK and the Trust Territory of the Southern Cameroons, pp. 108–111. African Books Collective, 2009.
- ↑ «(True or False?) Two Anglophone lawyers beaten up in Buea – StopBlaBlaCam». StopBlaBlaCam (em inglês). Consultado em 13 de setembro de 2017. Cópia arquivada em 3 de setembro de 2017
- ↑ «Arrests in Cameroon language protests». BBC News (em inglês). 23 de novembro de 2016. Consultado em 13 de setembro de 2017. Cópia arquivada em 11 de setembro de 2017
- ↑ «English speakers protest in Cameroon, demand equal rights amid calls for secession». DW.COM. 22 de setembro de 2017. Cópia arquivada em 25 de janeiro de 2018
- ↑ CHRDA publishes shocking list of military atrocities in Cameroon’s NW, SW regions Arquivado em 2018-08-22 no Wayback Machine, Journal du Cameroun, 22 de agosto de 2018.
- ↑ Cameroon: Paul Biya convenes national dialogue to solve Anglophone crisis, Journal du Cameroun, 10 de setembro de 2019.
- ↑ Cameroon: Ex Ambazonia fighters sing National Anthem at Major National Dialogue, Journal du Cameroun, 30 de setembro de 2019.
- ↑ PM Dion Ngute urges Cameroonians to make history with Major National Dialogue, Journal du Cameroun, 30 de setembro de 2019.
- ↑ Cameroon: Major National Dialogue enter day two, Journal du Cameroun, 1 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Akere Muna storms out of Major National Dialogue, Journal du Cameroun, 1 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Agbor Balla insists form of State should be discussed at Major National Dialogue, Journal du Cameroun, 2 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Committees of Major National Dialogue submit reports today, Journal du Cameroun, 3 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Paul Biya orders discontinuance of case against 333 detainees of Anglophone crisis, Journal du Cameroun, 3 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Ambazonia Forces say Generals Presented in Yaounde are fake, Journal du Cameroun, 3 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Final resolutions expected as Major National Dialogue wraps up today, Journal du Cameroun, 4 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Delegates propose special status Anglophone regions at Major National Dialogue, Journal du Cameroun, 4 de outubro de 2019.
- ↑ a b Cameroon's Anglophone conflict: Will the National Dialogue make any difference?, BBC, 5 de outubro de 2019.
- ↑ «A war of words / English-speaking villages are burning in Cameroon / A report from a forgotten conflict» (em inglês) (7 de novembro de 2019). Parágrafo 8, p. 41: The Economist impresso semanalmente e web (artigo completo com inscrição ou inscrição gratuita). 9 de novembro de 2019. pp. 41–42.
Signs of compromise are scant. Separatist groups do not even have a common position among themselves, despite efforts by the Centre for Humanitarian Dialogue, a Swiss NGO, to help them find one. For his part, President Riya in September raised hopes by announcing a “National Dialogue”. Yet it was a sham. The meeting was not just about the crisis; it gave Cameroonian leaders from all regions a chance to air complaints (and collect per-diems). Many important Anglophones were either not invited or left in prison. “It was not a sincere effort,” says Alice Nkom, a lawyer.
- ↑ Cameroon:UN wants govt to address core issues raised by Major National Dialogue, Journal du Cameroun, 11 de dezembro de 2020.
- ↑ Cameroon orders release of main opposition leader Maurice Kamto, France24, 5 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Paul Biya discontinues case against ‘some’ Pro Kamto supporters, Journal du Cameroun, 5 de outubro de 2019.
- ↑ Cameroon: Gov’t dispatches post dialogue missions to Anglophone regions, Journal du Cameroun, 18 de novembro de 2019.
- ↑ Cameroon: Parliament adpts bill according ‘special status’ to Anglophone regions, Journal du Cameroun, 20 de dezembro de 2019.
- ↑ Why has violence increased since Cameroon’s National Dialogue?, African Arguments, 29 de outubro de 2019.