Presídio de Ziguinchor

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O Presídio de Ziguinchor,[1] também conhecido como Forte ou Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição,[2] foi uma antiga fortificação portuguesa, defendendo a praça de Ziguinchor, em Ziguinchor, no atual Senegal.[2] Estava subordinada à praça do Cacheu,[3] juntamente com Farim.[1]

História[editar | editar código-fonte]

A povoação de Ziguinchor, principal mercado e entroncamento do rio Casamansa, teve origem numa comunidade de lançados, associada ao jesuíta frei João Delgado, que ali morreu em 1609. Em 1621 a povoação tinha quinze casas de comerciantes “portugueses”, uma igreja, um padre, e muitos cristãos locais. Nos anos seguintes, a povoação virá a tornar-se no principal local de trocas comerciais no rio entre luso-africanos e bainuncos.[4]

O território de Ziguinchor, propriedade de uma tribo local, os iziguinchos, somente entra oficialmente sob alçada da administração portuguesa com a fundação do presídio por Gonçalo Gamboa de Ayala, capitão-mor do Cacheu, em 1645,[4][5] no mesmo ano em que fundou Farim,[6][1] ambos dependentes da capitania de Cacheu.[4] Ziguinchor era um posto avançado pouco importante, dominado por mestiços e grumetes de origem portuguesa, que guarneciam o forte e controlavam o comércio local, sobretudo de escravos. A mais alta autoridade da Coroa Portuguesa era o capitão-cabo, geralmente mestiço, e muitas vezes da família Carvalho Alvarenga, comerciante e com fortes ligações à elite local.[1][7]

Em outubro de 1694, o capitão-mor de Cacheu, Santos Vidigal Castanho, alertou em carta ao Conselho Ultramarino para a falta de soldados na fortaleza, propondo-se o arrendamento da mesma a quem sustentasse o presídio.[8] Em outubro de 1698, carta do mesmo capitão informa que a guarnição desta praça fazia-se com delinquentes do Reino de Portugal enviados para degredo, referindo novamente a falta de soldados nesta fortaleza, necessários para a repressão do comércio dos estrangeiros.[9]

Em 1700, quando André Brue, diretor da Compagnie du Sénégal, com sede em Gorée, visitou o povoado, notou que o forte português estava equipado com algumas peças de artilharia. Brue observou igualmente que em Bayto, a curta distância para sul do presídio, se encontrava outro forte português aparentemente guarnecido com quinze peças de artilharia e igual número de soldados.[1]

Em abril de 1723, o capitão-mor de Cacheu, Pedro de Barros, alertava novamente para a falta de soldados nesta fortaleza.[10] Em maio de 1726, o mesmo capitão informou a falta de armas na fortaleza,[11] e que a praça se encontrava deserta em função da grande mortalidade.[12] Em junho de 1728, o novo capitão-mor do Cacheu, João Perestrelo, afirma que a praça necessita de moradores e artilharia.[3]

Nas primeiras décadas do século XVIII, serviu como capitão-cabo deste forte Aleixo Pinheiro, capitão de infantaria e capitão de cavalos reformados.[13]

No início da década de 1730, João Pereira de Carvalho, na qualidade de capitão-mor do Cacheu, proveu no posto de cabo da praça de Ziguinchor António dos Santos Pereira, com a condição de fazer um baluarte e duas carretas à sua custa, e reparar a artilharia.[14]

Em junho de 1736 e setembro de 1738, documenta-se como capitão-cabo de Ziguinchor Domingos Mendes Souto.[15][14]

Em abril de 1740, Damião de Bastos, capitão-mor do Cacheu, dava conta que a praça de Ziguinchor se encontrava em guerra com o gentio vizinho, informando que, apesar dos parcos meios de que dispunha, ia em socorro daquela praça, a qual recebera também socorro dos casangos, aliados de Portugal, comoa testavam as cartas do então cabo da praça de Ziguinchor, Manuel Batista Ferreira.[16]

Em 1766, era capitão-cabo deste forte Carlos de Carvalho Alvarenga.[2]

Em março de 1775, António Vaz de Araújo, sargento-mor e comandante da praça do Cacheu, escreve a Martinho de Melo e Castro, secretário de estado da Marinha e Ultramar, dando conta do estado da praça de Ziguinchor após um levantamento que ocorreu na sequência da tomada de uma embarcação francesa, assim como um segundo levantamento no mês de dezembro anterior, o qual vitimou um sargento e cinco soldados, e que devido a estes acontecimentos os negócios na praça estavam parados e a Fazenda Real não arrecadava nenhuns direitos; informando ainda da necessidade de homens para a guarnição das praças.[17] Em junho de 1777, o mesmo capitão informa que o tenente Manuel Gomes Vale governara Ziguinchor por mais de seis meses com o posto de capitão cabo, tendo fortificado e feito as prisões dos réus capturados após os levantamentos de 1775.[18]

A fortificação consta de uma carta militar datada de 1777.[19]

Declínio[editar | editar código-fonte]

Sujeito a uma gestão ineficiente a partir de Cacheu, Cabo Verde e Portugal, o presídio de Ziguinchor funcionava em autogestão, até cair sob a crescente esfera de influência francesa.[7] No século XIX, o único edifício público da praça de Ziguinchor consistia na igreja, feita de barro e coberta de palha.[20]

Em 1837 os sinais de declínio da povoação eram já evidentes, sendo o local descrito como em estado de caos e anarquia por um visitante francês em 1874.[21]

Por 1870, o presídio português, em território bainunco, separava os dois postos avançados franceses na região de Casamansa, Carabane e Sediou.[22]

Em 1884, era chefe do presídio o alferes Joaquim António Pereira.[23]

A 12 de maio de 1886, a povoação e presídio de Ziguinchor foi cedida à França,[21] por troca com o rio Cassini, mais a sul,[22] em consequência da Conferência de Berlim.[21]

Referências

  1. a b c d e Mendy, Peter Michael Karibe (1994). Colonialismo português em África: a tradição de resistência na Guiné-Bissau (1879-1959). [S.l.]: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa. pp. 128–129 
  2. a b c Brooks, George E., 1933- (2003). Eurafricans in western Africa: commerce, social status, gender, and religious observance from the sixteenth to the eighteenth century. Athens: Ohio University Press. p. 285. ISBN 0821414852. OCLC 51446039 
  3. a b «CARTA do capitão-mor da praça de Cacheu, João Perestrelo, ao rei [D. João V] dando conta do estado das praças de Farim e Ziguinchor, que estavam subordinadas à praça de Cacheu, afirmando que as ditas praças precisavam de moradores e artilharia. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  4. a b c Almeida, Carla.; Carvalheira, Raquel.; Cheikh, Abdel Wedoud Ould.; Frazão-Moreira, Amélia.; Freire, Francisco.; Leitão, Francisco.; Lucas, Joana.; Moreira, Ana Rita.; Oliveira, Sandra. (2017). Castelos a Bombordo : Etnografias de patrimónios africanos e memórias portuguesas. Lisboa: Etnográfica Press. p. 209. ISBN 9791036511219. OCLC 1089418911 
  5. Callixto, Vasco (1991). Viagem à África Ocidental: Guiné, Bissau, Senegal, Gâmbia. [S.l.]: Edição do Autor. p. 63 
  6. Lopes, Carlos (1993). Mansas, escravos, grumetes e gentio: Cacheu na encruzilhada de cicivilização : IV centenário da fundação da cidade de Cacheu, 1588-1988. [S.l.]: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa. p. 153 
  7. a b Mendy, Peter Michael Karibe,. Historical dictionary of the Republic of Guinea-Bissau Fourth edition ed. Lanham: [s.n.] 433 páginas. ISBN 9780810880276. OCLC 861559444 
  8. «CONSULTA do Conselho Ultramarino ao rei D. Pedro II sobre a carta do capitão-mor de Cacheu, Santos Vidigal Castanho, quanto à falta de soldados naquela praça e nas fortalezas de Bolor e de Ziguinchor, ao alto preço das obras necessárias à de Bolor para impor respeito aos estrangeiros, às vantagens em arrendar a fortaleza de Ziguinchor a quem sustentasse o presídio, do usufruto do Rio de Geba pelos capitães-mores de Cacheu e dos actos de Francisco Vaz de França contra escravos e forros. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  9. «CONSULTA do Conselho Ultramarino ao rei D. Pedro II sobre cartas do governador de Cabo Verde, D. António Salgado, com informações do capitão-mor de Cacheu, Santos Vidigal Castanho, acerca do estado da Guiné e da tentativa dos franceses de construírem uma fortaleza no ilhéu de Bissau; sobre o que indicava aquele capitão-mor, dos meios para frustrar o plano dos franceses e impedir os muitos negócios que os moradores faziam desde Bissau ao rio Geba com os estrangeiros; das referências que dava da devassa Manuel Mendes Ramos e sobre as imprudências cometidas pelo falecido capitão-mor de Cacheu, José Pinheiro; informando, com base nas certidões da Fazenda Real de Bissau, dos rendimentos da Alfândega e despesas que se tinham feito para o pagamento dos soldados, filhos da folha e dotes dos reis; e pedindo que se enviasse à Guiné os delinquentes que no Reino, eram condenados ao degredo para assim se poder guarnecer as praças de Cacheu, Bissau e Ziguichor; sobre cartas do capitão-mor de Cacheu, Santos Vidigal Castanho acerca das actividades dos franceses naquela costa, alertando da chegada de duas naus a Goré, ilha dos franceses, e da colocação em Gerege de um baqueano com casa de fazendas para comerciar cera, com o intuito de explorar aqueles rios por Gerege, Jame, Bissau e Geba, lesando a Fazenda Real e a Companhia [de Cacheu]; referindo a falta de um baluarte em Geba e de soldados na praça de Cacheu e na fortaleza de Ziguinchor para reprimir o comércio dos estrangeiros; expondo a devassa feita a Miguel Mendes Ramos, suspeito na morte do seu sócio francês. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  10. «CONSULTA do Conselho Ultramarino ao rei [D. João V] sobre carta do capitão-mor de Cacheu, Pedro de Barros, de 16 de Abril de 1723, dando conta da falta de soldados e moradores naquela praça, dada a grande mortalidade ocorrida no ano passado, tendo pedido socorro de soldados ao ouvidor-geral de Cabo Verde, mas sem sucesso; recebeu apenas oito soldados do Reino, mas precisava de mais de cinquenta pagos, mais vinte ou trinta para guarnecer Farim e Ziguinchor; solicitando que lhe fosse enviado alguns soldados brancos na primeira monção, e outros da ilha [de Santiago] por estarem familiarizados com o clima. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  11. «CARTA do capitão-mor da praça de Cacheu, Pedro de Barros, ao rei [D. João V] informando que dada a falta de armas para repartir entre os soldados daquela praça, bem como das praças de Farim e Ziguinchor, e para a defesa daquelas praças ordenou que o feitor da Fazenda Real, Manuel da Costa Coelho, comprasse armas de fogo na ilha de Bissau com o dinheiro do depósito Real pertencente ao [ex-capitão-mor da praça de Cacheu], Santos de Vidigal Castanhona. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  12. «CARTA do capitão-mor da praça de Cacheu, Pedro de Barros, ao rei [D. João V] informando em resposta à carta régia, de 18 de Maio de 1726, acerca do estado em que se achava as praças de Cacheu, Farim, Ziguinchor e Geba e da ilha de Bissau; fazendo relação do número de moradores, soldados e dos religiosos que assistiam naquelas praças e ainda do valor das suas côngruas, dos frutos do seu trabalho missionário entre os cristãos e gentios; dando conta da falta de moradores nas praças, enfatizando que aquelas praças se encontravam desertas devido à grande mortalidade. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  13. «CONSULTA do Conselho Ultramarino ao rei D. João V sobre nomeação de pessoas para o posto de capitão e sargento-mor da ilha do Fogo por terminar o provimento do capitão Silvestre Cirne da Veiga naquele cargo. É oponente, Aleixo Pinheiro que serviu na ilha de Santiago, Cabo Verde, em praça de soldado, de alferes na praça de Cacheu, capitão e cabo da Fortaleza de Bolol (sic) [Bolor], capitão de Infantaria de Ordenança, capitão e cabo da Fortaleza de Ziguinchor, capitão de Infantaria e capitão de cavalos da Companhia dos Reformados. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  14. a b «CARTA do capitão-mor da praça de Cacheu, João Pereira de Carvalho, ao rei [D. João V] informando que anos atrás tinha provido o capitão António dos Santos Pereira no posto de cabo da praça de Ziguinchor com a obrigação de levantar um baluarte e duas carretas à sua custa e reparar a artilharia, como constava da certidão inclusa; dando conta que o cabo de Farim Estêvão dos Santos procedeu à reforma da tabanca, e que nomeara Simão Álvares para tenente de um baluarte com a obrigação de fazer a sua cobertura. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  15. «CARTA do capitão-mor da praça de Cacheu, João Pereira de Carvalho, ao rei [D. João V] sobre a ordem régia de 9 de Setembro de 1735, acerca da providência que deu na praça de Ziguinchor, para impedir os moradores de ir comerciar no Gâmbia, em prejuízo da Fazenda Real; remetendo certidão da tomada de uma quantidade de cera feita pelo capitão cabo de Ziguinchor, [Domingos Mendes Couto]. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  16. «CARTA do capitão-mor da praça de Cacheu, Damião de Bastos, ao rei [D. João V] dando conta que a praça Ziguinchor se encontrava em guerra com o gentio vizinho, advertindo que apesar dos poucos meios que dispunha vinha socorrendo aquela praça, e que também a praça recebera socorro dos casangos aliados de Portugal, tal como atestavam as cartas do cabo que se achava governando Ziguinchor, [Manuel Baptista Ferreira] - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  17. «OFÍCIO do sargento-mor e comandante da praça de Cacheu, António Vaz de Araújo, ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro], dando conta do estado da praça de Ziguinchor após um levantamento que ocorreu na sequência da tomada de uma embarcação francesa, sendo que ainda ocorreu um segundo levantamento em Dezembro passado que vitimou um sargento e cinco soldados, e dada aos acontecimentos os negócios na praça estavam parados e a Fazenda Real não arrecadava nenhuns direitos; informando que acudiu Ziguinchor porque estava ocupado com a defesa de Farim; da necessidade de homens para a guarnição das praças. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  18. «CARTA do sargento-mor e comandante da praça de Cacheu, António Vaz de Araújo, à rainha [D. Maria I] remetendo para a cadeia do Limoeiro os presos capturados durante o castigo dado aos levantados de Ziguinchor, sendo acusados da morte de alguns soldados que guarneciam aquela praça; dando conta que intentaram contra sua vida e contra a do oficial que deixou governando Ziguinchor; acerca dos seus serviços na praça de Cacheu e a sua sucessão; informando que o tenente Manuel Gomes Vale governou Ziguinchor por mais de seis meses com o posto de capitão cabo, tendo fortificado e feito as prisões dos réus que presentemente estava a remeter para o Limoeiro e com tal deveria ser renumerado pelos seus serviços; mencionando que Filipe Gonçalves Braga, sua mulher Maria Joséfa e António Vermão de Sousa encabeçaram os levantamentos e ataques contra à ordem [estabelecida]; advertindo que para além dos presos, os moradores de Ziguinchor também deveriam ser castigados. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  19. «[Fortificações: Bissau, Cacheu, Zinguinchor, Bolor, Farim, Fá e Geba]. - Arquivo Histórico Ultramarino». digitarq.ahu.arquivos.pt. Consultado em 27 de outubro de 2019 
  20. Esteves, Maria Luísa (1988). A questão do Casamansa e a delimitação das fronteiras da Guiné. [S.l.]: Centro de Estudos de História e Cartografia Antiga. p. 22 
  21. a b c Connolly, Sean,. Senegal First edition ed. England: [s.n.] p. 286. ISBN 9781841629131. OCLC 899226637 
  22. a b Fage, J. D.; Oliver, Roland Anthony. (1975–1986). The Cambridge history of Africa. Cambridge: Cambridge University Press. p. 218. ISBN 0521209811. OCLC 3034730 
  23. Silva, Joaquim Duarte; Mota, Avelino Teixeira (1973). Honório Barreto, português da Guiné. [S.l.]: Agência Geral do Ultramar. p. 17