Os géneros da palavra sanduíche (reiteração aperfeiçoada da minha exposição anterior).
A palavra “sanduíche” é o aportuguesamento do termo inglês sandwich. Apesar da sua aparente igualdade conforme a formação lexicográfica e adaptação à língua portuguesa, a sua classificação morfossintáctica* ocorreu separadamente em cada uma das duas variantes da língua portuguesa. Assim, a palavra portuguesa sanduíche adaptada do inglês é foneticamente aos ouvidos de um falante do português europeu um lexema do género feminino, enquanto aos ouvidos de um falante do português brasileiro é foneticamente um vocábulo de género masculino.
No artigo “Sanduíche” publicado na wikipedia esta palavra é referenciada apenas como pertencente ao género masculino, o qual se utiliza só na variante do português brasileiro. Quando alguém de um terceiro país consulta o artigo sanduíche na wikipedia, é induzido em erro por causa disso e presume que o género masculino é de uso comum em ambas variantes do português. E assim, o dito uso comum no género masculino abrangeria também todos os territórios, onde se fala predominantemente o português europeu, entre quais estão, além do próprio país europeu designado Portugal e órgãos oficiais da União Europeia, como também Angola, Cabo Verde, Macau (China). Moçambique, São Tomé e Príncipe, Timor. Acontece que a patrulha dissuasiva da wikipedia contra os vandalismos e outros intentos semelhantes arbitrariamente não deixa ninguém aperfeiçoar a informação enciclopédica constante do artigo e acrescentar ao artigo sanduíche também o género feminino que é exclusivo da variante europeia. Evidentemente a falta dessa informação “de desambiguação lexical” confunde e prejudica os consulentes da wikipedia, em todo o mundo, exceptuando talvez uns poucos brasileiros que têm conhecimento prévio dessa diferença de género. Esta palavra de origem inglesa adaptada à língua portuguesa separadamente em cada variante da língua, obviamente não pode ser tratada do mesmo modo como uma palavra que tenha dualidade morfossintáctica de géneros, por exemplo, como a palavra “personagem” que possui simultaneamente dualidade de género em ambas variantes da língua. A adaptação escrita “sanduíche” tomada do nome inglês “sandwich” verificou-se logo após e por força da reforma ortográfica preconizada pelo Acordo Ortográfico celebrado entre a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras que entrou em vigor a partir do dia 27 de Maio de 1931 em Portugal), dado que até então a forma escrita usual era a própria forma escrita original inglesa “sandwich”.
Na senda dessa falta de exactidão também se encontram ainda os nomes compostos com o lexema “sanduíche”, o qual fica omisso no uso corrente. Por exemplo, o sanduíche misto quente que é um alimento ligeiro consumido entre refeições principais pelos brasileiros, mas todavia, por economia de verbalização, é designado simplesmente misto-quente. A preparação desse alimento ligeiro foi introduzida no Brasil por transplante e adaptação da receita francesa de um certo tipo de sanduíche que se designa em França, “croque-monsieur” e “croque-madame”. Este alimento ligeiro que é dado em França pelo nome “sandwich” croque-monsieur” foi assinalado pela primeira vez escrito na ementa de um café parisiense, no ano de 1910, mas a origem dessa denominação francesa é todavia desconhecida. O escritor francês Marcel Proust menciona-a na sua obra À l'ombre des jeunes filles en fleurs, cuja publicação se deu em 1919. A receita desse alimento ligeiro também foi trazida para Portugal bastante cedo em relação ao seu aparecimento em França, e numa adaptação portuguesa menos elaborada em relação à receita original francesa tomou a designação “sanduíche mista quente”. Na primeira metade dos anos 1950 um emigrante português regressado de França trouxe consigo a receita original de preparação do citado tipo de sandauíche croque-monsieur. Este ex-emigrante português acrescentou à receita do “croque-monsieur” um molho picante à base de piri-piri e passou a servi-la num prato, enquanto a sanduíche mista quente antes era servida num simples pratinho, cujo consumo era feito em estabelecimentos de café ou “snack-bar”. Para acentuar bem a origem francesa da receita o referido ex-emigrante cognominou a sua versão da sanduíche francesa croque-monsieur com o adjectivo diminutivo construído por sufixação com a desinência “-inha” e o radical do adjectivo “francês”. Desse modo surgiu o nome composto “sanduíche francesinha”, o qual significa uma “sanduíche” muito francesa ou sanduíche típica francesa, a qual nada tem a ver com uma suposta mulher francesa pequena. Aqui também se verificou o mesmo fenómeno por economia de verbalização que aconteceu com a “sanduíche mista quente” o nome sanduíche (f.) é omitido e sobrou somente o seu atributo “francesinha”.
Perante a factualidade aqui expendida o artigo “Francesinha” na wikipedia está eivado de “inexactidões”, visto que as fontes indicadas não são “de confiança”, porque são artigos jornalísticos que transmitem especulações fantasiosas sobre factos ocorridos 60 anos antes da sua data de publicação no jornal. Por exemplo, o jornal lisboeta “Diário de Notícias” dissertou nas suas páginas sobre a atribuição do nome da sanduíche “francesinha” repercutindo estranhamente “mitos urbanos” que se refere a mulheres francesas, quando na verdade o próprio vocábulo francesinha é prova cabal do seu significado e a melhor fonte da informação como atributo do nome sanduíche ao significar a origem francesa da versão empregada na cidade do Porto e para se preparar a referida sanduíche. Em suma, tudo tem que ser revisto e não é assunto de um simples dicionário, mas de um artigo enciclopédico, que até poderia ser uma secção dos artigos referenciados. Esta secção poderia designar-se “etimologia” indexada com “anotações e indicação de fontes” (eu pessoalmente já fiz algo semelhante na wikipedia de língua alemã, por não existir fontes fidedignas verificáveis em directo [on-line]).
Peço desculpas pela ortografia empregada no presente arrazoado, mas não vou aderir à reforma ortográfica estabelecida pelo AO de 1990, tal como certos autores e alguma imprensa portuguesa também não aderem. Espero não ter ofendido ninguém com os termos da minha exposição, se alguém se sentir ofendido, por favor, queira desculpar-me, pois não foi essa a minha intenção.
* (https://www.todamateria.com.br/morfossintaxe/)
@Teuto-brasileiro