Usuário(a):Felipe Asensi/Princípio da participação social em saúde

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O princípio da participação social em saúde é um dos princípios que rege o direito à saúde no Brasil, ao lado dos princípios da universalidade, integridade, descentralização e equidade em saúde. A participação social trata sobre a necessidade da interação entre a sociedade e o Estado a fim de se aprimorar a efetivação do direito à saúde.A ideia de participação social é mais abrangente do que o mero controle social pois pressupõe que a comunidade irá não somente fiscalizar a atuação na área da saúde, mas também se organizar, gerir e intervir nos processos de formação de políticas de saúde.[1] Assim, o Sistema Único de Saúde se revela como um espaço democrático para a luta a favor do direito à saúde, tendo a criação dos Conselhos e Conferências de Saúde profunda relevância quanto à formação de novas arenas de representação e deliberação. Também se revelam como importantes instâncias de participação social as Audiências Públicas e mesmo espaços informais não previstos em nenhuma legislação específica, mas que permitem a interação entre sociedade e Estado.

Legislação[editar | editar código-fonte]

O artigo 198, III da Constituição Federal Brasileira de 1988 [2] determina que a participação da comunidade é uma das diretrizes a ser seguida pelas ações e serviços públicos de saúde do SUS. Isto quer dizer que a participação social é um dos princípios a que se vincula o Estado ao elaborar suas políticas de saúde. A previsão na Carta Magna revela a importância da interação entre usuários, técnicos, Estado e todos aqueles que possam ter seus interesses relacionados à área a fim de se estabelecer novas metas e modos de atuação visando à efetivação do direito à saúde.

Os mecanismos de participação social estão previstos também nas legislações infraconstitucionais. Em se tratando de Conselhos e Conferências de Saúde, a lei nº 8.142 de 28 de dezembro de 1990 [3] dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde. O artigo primeiro deste dispositivo declara que em cada esfera de governo deverão existir instâncias colegiadas, sendo elas as Conferências e os Conselhos de Saúde. Quanto às primeiras, o parágrafo primeiro do artigo 1 determina que elas se reunirão a cada quatro anos e deverão contar com a representação dos diversos segmentos sociais para avaliação da saúde. O objetivo desses encontros é a propositura de diretrizes para a formulação de políticas de saúde, sendo as Conferências convocadas pelo Poder Executivo ou, de maneira excepecional, pela própria Conferência ou pelo Conselho de Saúde. No que diz respeito aos Conselhos de Saúde, eles tem caráter permanente, de maneira diversa às Conferências. São compostos por represetantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários. O objetivo dos Conselhos é a formulação de estratégias e o controle da execução de políticas de saúde. Vale ressaltar que conforme previsto no artigo 1º, parágrafo 3 da lei nº 8142, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems) deverão ter representação no Conselho Nacional de Saúde. Tanto o Conass quanto o Conasems não são formados por membros da sociedade civil. O primeiro é constituído por secretários de saúde do Estado e do Distrito Federal [4], ao passo que são associados do segundo todas as secretarias municipais de saúde ou órgãos equivalentes, que integram a administração pública municipal [5]. Por último, é importante dizer que a representação dos usuários deve ser paritária com relação aos outros segmentos, isto é, o número de usuários deve ser o mesmo do que o de representantes do governo, prestadores de serviço e profissionais de saúde presentes no Conselho.

Outro mecanismo que serve como forma de se fomentar a participação social são as Audiências Públicas. A lei nº 9868 de 10 de novembro de 1999 [6] estabeleceu a possibilidade de Audiências Públicas no Supremo Tribunal Federal para auxiliar os Ministros que estão julgando ações diretas de inconstitucionalidade ou ações declaratórias de constitucionalidade. No mesmo ano, uma nova lei, a lei nº 9882,[7] estendeu a posssibilidade de convocação de Audiências Públicas para os julgamentos de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. E, finalmente, a Emenda Regimental nº 29 ao Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal [8] estabeleceu que Audiências Públicas poderiam ser convocadas nos casos de repercussão geral e interesse público, aumentando os espaços de discricionariedade dos Ministros para se utilizarem desse mecanismo. No âmbito da saúde, no ano de 2009, foi realizada a terceira Audiência Pública no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a judicialização do direito à saúde. Esta audiência contou com a participação de 53 indivíduos escolhidos pelo STF, tendo a duração de 6 dias. Dentre as principais consequências da audiência pública de saúde, tem-se a edição da recomendação número 31 do Conselho Nacional de Justiça [9] que recomenda aos magistrados como proceder ao julgar ações que digam respeito à tutela desse direito; a resolução número 107 do Conselho Nacional de Justiça [10] a qual institui o Fórum Nacional de Saúde; e o voto do Ministro Gilmar Mendes no julgamento da Tutela Antecipada número 175.

Não se pode esquecer que outros mecanismos de participação não previstos na lei também são possíveis. É o caso de reuniões informais com gestores, palestras realizadas a fim de se esclarecer determinado tema da área da saúde ou ensinar novos profissionais a como pautar suas formas de atuação, dentre outros que dependem da discricionariedade do governante ou mesmo do próprio Conselho ou Conferência de Saúde.

Outra lei que vale ser mencionada é a lei nº 8080 de 1990 [11] a qual dispõe sobre as condições para a proteção, promoção e recuperação da saúde, bem como sua organização e funcionamento de seus serviços. O artigo 7º desse diploma legal determina como um dos princípios que devem guiar a atuação na área de saúde a participação da comunidade, repetindo os mesmos termos utilizados na Constituição Federal Brasileira de 1988.

Por fim, é importante destacar que a Norma Operacional Básica do SUS 01/96 (NOBSUS 01/96)[12] trata sobre a participação social como uma das estratégias e mecanismos para a articulação entre os diversos níveis de gestão e a própria sociedade.

Participação social nos Conselhos de Saúde[editar | editar código-fonte]

Os Conselhos de Saúde são considerados instâncias formais do exercício do princípio da participação social.

No Brasil, a formulação, a execução e a fiscalização de políticas públicas se dava de maneira centralizada, representando, na maior parte das vezes, uma imposição do governo sobre os seus cidadãos. A partir da criação dos Conselhos de Saúde, no entanto, as estratégias para a efetivação do direito à saúde bem como o planejamento de políticas públicas a ela relacionadas passaram a ser discutidos publicamente, dando a possibilidade de se chegar a decisões mais legítimas uma vez que foram construídas a partir do diálogo entre o Estado e a sociedade civil. Erro de citação: Parâmetro inválido na etiqueta <ref>

O Conselho Nacional de Saúde (CNS) Erro de citação: Parâmetro inválido na etiqueta <ref> é a instância máxima de deliberação do SUS. É um órgão vinculado ao Ministério da Saúde, sendo o Presidente do Conselho eleito entre os seus membros. O Conselho é formado por 48 membros, sendo eles representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários. Os membros do Conselho não são remunerados pelo serviço que prestam, embora o exercício de sua atividade perante o órgão seja considerado relevante serviço público. Esta é a disposição do Decreto nº 5.839 de 2006[13]. É importante ressaltar que este Decreto também prevê que as resoluções do CNS serão homologadas pelo Ministro de Estado da Saúde.

Após a Reforma Sanitária as discussões sobre integralidade, descentralização e universalização se acirraram e, consequentemente, as atribuições do Conselho se expandiram. O Decreto nº 5.839, de 11 de julho de 2006 elencou as competências do CNS no artigo 2º, dentre elas: atuar na formulação de estratégias e no controle da execução da Política Nacional de Saúde, na esfera do Governo Federal; estabelecer diretrizes a serem observadas na elaboração dos planos de saúde; acompanhar e controlar a atuação do setor privado da área de saúde; e propor critérios para a definição de padrões e parâmetros assistenciais. O mesmo Decreto também trata da competência do CNS para convocar entidades, autoridades, cientistas e técnicos nacionais ou estrangeiros para contribuirem com estudos e participarem de comissões criadas pelo CNS.

Da leitura do Decreto nº 5.839, vê-se que a participação social é um dos pilares fundamentais para a boa atuação do Conselho Nacional de Saúde. A previsão de abertura para o diálogo com outros indivíduos que não integram necessariamente o quadro de membros do Conselho bem como a possibilidade do órgão controlar atuações privadas na saúde e definir padrões assistenciais a serem observados, por exemplo, demonstram que o CNS deve trabalhar o mais perto possível da sociedade civil a fim de efetivar o direito à saúde da população. Esse caráter deliberativo é essencial para a democratização das políticas públicas e para a distribuição do poder de decisão. Erro de citação: Parâmetro inválido na etiqueta <ref>

Além do Conselho Nacional de Saúde, existem Conselhos de Saúde no âmbito estadual e municipal. A criação dos Conselhos de Saúde se dá com base na lei municipal, estadual ou federal, conforme os termos da Lei nº 8.142 de 1990. [14] Cabe ao ente que institui o Conselho de Saúde garantir a autonomia administrativa do órgão assim como estabelecer a dotação orçamentária para o seu funcionamento. Dessa forma, a criação de Conselhos de Saúde em esfera estadual e municipal permite uma análise mais aprofundada das questões que impedem a efetivação do direito à saúde em dada região. Enquanto o Conselho Estadual de Saúde do Pará convocou em 25 de junho de 2012 a Audiência Pública de Belém para discutir e avaliar a forma de gestão dos Hospitais Regionais Públicos [15], por exemplo, em outubro do mesmo ano, o Estado de São Paulo promoveu o seminário intitulado "os desafios para o desenvolvimento de uma política integral para o autismo". [16]Assim, vê-se que a partir da criação dos Conselhos de Saúde nas mais variadas esferas de governo, torna-se possível atentar para as especifidades locais a fim de se assegurar o direito à saúde dos cidadãos.

Participação social nas Conferências de Saúde[editar | editar código-fonte]

A literatura é unânime em destacar que as Conferências de Saúde têm um caráter democratizador [17], sendo elas também espaços formais que promovem a participação social em saúde. A Lei nº 8.142 estabeleceu que as Conferências de Saúde devem ocorrer de quatro em quatro anos, possibilitando a participação de movimentos sociais organizados, de entidades ligadas à saúde assim como de gestores e prestadores de serviços de saúde. Também é importante ressaltar que, no intuito de aproximar a sociedade civil dos centros de debate e de fazê-la interagir com o Estado, a mesma lei exigiu que a representação dos usuários fosse paritária em relação aos demais segmentos sociais ali presentes.

As Conferências de Saúde têm o dever de avaliar a situação da saúde e propor diretrizes para a formulação de políticas públicas na esfera do governo em que foram criadas. Normalmente elas são convocadas pelo próprio Poder Executivo, mas, em situações excepcionais, a lei autoriza que elas sejam instauradas pelo Conselho de Saúde. Dessa forma, a participação social nas Conferências de Saúde é dotada de grande relevância uma vez que suas deliberações devem servir como orientação aos gestores na elaboração de planos e ações que visam a efetivação do direito à saúde dos cidadãos. Segundo o sítio virtual do portal de Saúde do Governo, "a cada nova Conferência tem sido observado um aumento importante da participação da sociedade civil, fenômeno que garante a definição de políticas de saúde cada vez mais democráticas". [18]

As Conferências de Saúde também servem como espaços de controle social. A partir da gestão participativa no Sistema Único de Saúde, tem se tentado fortalecer a participação da sociedade na eloboração e fiscalização das questões relativas à saúde.

Quanto à Conferência Nacional de Saúde, a primeira se deu no ano de 1941, sendo convocada por Gustavo Capanema, o Ministro da Educação na época. Nesse período, as questões relativas à saúde eram discutidas no Ministério da Educação pois ainda não existia o Ministério da Saúde.

Embora a primeira Conferência Nacional de Saúde tenha se dado nos anos 40, a primeira vez em que se teve uma ampla participação popular foi na 8ª Conferência Nacional de Saúde. [19] Realizada na década de 80, devido à Reforma Sanitária e às crescentes lutas democráticas, um forte grupo se mobilizou com objetivo precípuo de positivar na Constituição Federal que estava sendo discutida na Assembleia Constituinte as conquistas já alcançadas pelos movimentos sociais. Foi nesta Conferência, por exemplo, que se aprovaram as diretrizes do Sistema Único de Saúde, traçando-se seus objetivos principais. Devido às pressões dos atores envolvidos na 8ª Conferência Nacional de Saúde, a Constituição de 1988 foi promulgada com uma seção destinada especificamente ao direito à saúde, além de ter sido estabelecido que a saúde é direito de todos e dever do Estado. A 8ª Conferência Nacional de Saúde também destacou que o direito à saúde não se materializava pela sua mera positivação no texto constitucional, sendo necessária a ação da sociedade no "controle do processo de formulação, gestão e avaliação das políticas sociais e econômicas" (parágrafo 4, tema 1- Saúde como direito). Por fim, declarou a saúde como um direito de conquista social (parágrafo 5, tema 1- Saúde como direito).

Até o presente momento foram realizadas 14 Conferências Nacionais de Saúde. A última, realizada entre 30 de novembro e 04 de dezembro de 2011, teve como tema "todos usam o SUS! SUS na Seguridade Social, Política Pública, patrimônio do Povo Brasileiro". Por meio das Conferências, o direito à saúde passou a ser compreendido como um direito de cidadania, tornando-se necessário uma resposta do governo às questões expostos pela população a fim de se garantir o acesso efetivo à saúde. [20]

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. Participação da comunidade em espaços públicos de saúde: uma análise das conferências nacionais de saúde
  2. Constituição Federal Brasileira
  3. Lei 8142
  4. Conass
  5. Conasems
  6. Lei 9868
  7. Lei 9882
  8. RISTF
  9. Recomendação n. 31, CNJ
  10. Resolução n. 107, CNJ
  11. Lei 8080
  12. NOBSUS
  13. Decreto nº 5.839/06 [1]
  14. Resolução nº 333 [2]
  15. Audiência Pública em Belém[3]
  16. Conselho Estadual de São Paulo[4]
  17. CÔRTES, Soraya Maria Vargas.Conselhos e conferências de saúde: papel institucional e mudança nas relações entre Estado e sociedade.[5]
  18. Portal de Saúde do Governo [6]
  19. Portal de Saúde do Governo [7]
  20. PINHEIRO, Roseni. Apresentação — democracia e saúde: sociedade civil, cidadania e cultura política. [8]