De Motu (ensaio de Berkeley)
De Motu: Sive, de Motus Principio & Natura, et de Causa Communicationis Motuum (On Motion: or The Principle and Nature of Motion and the Cause of the Communication of Motions), ou simplesmente De Motu,[1] é um ensaio escrito por George Berkeley e publicado como um folheto em Londres em 1721. O ensaio foi submetido sem sucesso a um prêmio que havia sido oferecido pela Royal Academy of Sciences em Paris.
Berkeley rejeitou o espaço, tempo e movimento absolutos de Sir Isaac Newton. Com este ensaio, Berkeley é considerado o "precursor de Mach e Einstein" (Karl Popper).[2][3][4]
Movimento concreto e abstrato[editar | editar código-fonte]
Devemos prestar atenção aos fatos sobre as coisas e sua natureza, não às palavras ou à autoridade de alguém. A mente deve se preocupar com as próprias coisas particulares e concretas, não com termos abstratos. Os efeitos que são sentidos em nossos sentidos devem ser notados. As causas desses efeitos são inferidas racionalmente e são qualidades ocultas.
Gravidade e força são exemplos de qualidades ocultas. Mas eles podem ser termos úteis. A gravidade pode designar corpos de concreto em movimento e a força pode designar o esforço concreto de resistir. No entanto, eles não devem ser usados abstratamente, separados de coisas concretas e individuais. Se nenhuma mudança ocorre e não há efeito, então não há força. Força, gravidade e atração são abstrações matemáticas, hipotéticas e não são encontradas na natureza como qualidades físicas. O paralelogramo de forças compostas não é uma qualidade física. É matemático. As tentativas de explicar a causa e a origem do movimento são abstratas e obscuras. Não são afirmações particulares e determinadas. Tais tentativas tentam explicar o desconhecido por algo ainda mais desconhecido.[4]
Princípios ou causas do movimento[editar | editar código-fonte]
Os corpos não são conhecidos por conter, dentro de si, forças que causam movimento. Mentes, no entanto, são conhecidas por causar movimento. Tais mentes são causas particulares e individuais que são partes da causa primária e universal do movimento.
Os corpos são passivos, não ativos. Eles simplesmente persistem indiferentemente em seus estados, seja de movimento impelido ou de repouso. Ação e reação são apenas hipóteses matemáticas, não qualidades físicas. É útil referir-se à ação e reação ao demonstrar a mecânica, mas elas não são causas de movimento.
Experimentamos pessoalmente dentro de nós uma causa de nosso movimento corporal. Chama-se alma, mente ou espírito. Mas, não experimentamos uma causa de movimentos dentro de outros corpos. A causa última do movimento de todos os corpos é a mente de Deus. Isto é conhecido através da metafísica e da teologia.
A ciência natural limita-se a experimentos e mecânica, mas assume que Deus foi a principal fonte de movimento. As leis do movimento, não a causa do movimento, são estabelecidas pela ciência natural. Os físicos explicam e compreendem os fenômenos mostrando como eles concordam com as leis do movimento. Termos fictícios, abstratos e gerais, como força, ação e reação, são usados em teorias, fórmulas e cálculos. Estes não podem ser encontrados em corpos.
Através de nossos sentidos, na verdade, experimentamos apenas os efeitos de corpos em movimento ou em repouso. O cientista natural está preocupado com experimentos, leis do movimento, princípios mecânicos e dedução racional desses princípios. O próprio princípio e causa do movimento é uma preocupação metafísica, teológica e moral.[4]
Natureza do movimento[editar | editar código-fonte]
O movimento não deve ser considerado uma abstração, separada do espaço e do tempo. Não deve ser analisado em ideias abstratas como movimento, velocidade e força. Considerações matemáticas de infinitesimais espaciais e temporais levam a paradoxos. O movimento não deve ser equiparado à causa do movimento. Dizer que a quantidade de movimento é sempre conservada é confundir o próprio movimento com a força que causa o movimento. A força da causa do movimento é conservada. O movimento não é uma força interna e viva nas coisas. É um efeito sem vida, indiferente.[4]
Movimento no espaço[editar | editar código-fonte]
O espaço absoluto não contém corpos. Mas, como tal, não seria observável. Nada é denotado pelas palavras "espaço absoluto". Movimento e espaço são relativos. Eles pressupõem uma relação com algum outro corpo através do qual são determinados. Para uma visão mais ampla, seria útil considerar o movimento relativo às estrelas fixas, que seriam consideradas em repouso, ao invés do espaço absoluto. Assim como não podemos conhecer o espaço absoluto, não podemos saber se todo o universo está em repouso ou se está se movendo uniformemente em uma direção.
Para determinar a verdadeira natureza do movimento, devemos seguir três regras: (1) distinguir as hipóteses matemáticas da natureza das coisas; (2) cuidado com abstrações; (3) considerar o movimento como sensível ou imaginável e contentar-se com medidas relativas.[4]
Comunicação de movimento[editar | editar código-fonte]
A ciência física está preocupada apenas com a mecânica. Portanto, pode-se dizer que, em uma colisão, ação e reação são sempre opostas e iguais. Tais ações e forças, porém, são apenas hipóteses matemáticas. Só sabemos realmente que o corpo atingido perde movimento e o corpo atingido ganha movimento. Não sabemos se o movimento é comunicado de um corpo para outro ou se o movimento é destruído no batedor e criado no golpeado. Na verdadeira natureza das coisas, todos os corpos são passivos. A causa verdadeiramente ativa do movimento é metafísica e não a preocupação da ciência física.[4]
Ver também[editar | editar código-fonte]
Referências
- ↑ Berkeley's Philosophical Writings, New York: Collier, 1974, Library of Congress Catalog Card Number: 64-22680
- ↑ Karl R. Popper Conjectures and Refutations. The Growth of Scientific Knowledge, Routledge and Kegan Paul 1969, Part I, 6. "Note on Berkeley as precursor of Mach and Einstein"
- ↑ The New Encyclopædia Britannica, Micropædia, Vol. 2, Chicago, 2007
- ↑ a b c d e f Myhill, John "Berkeley's "De Motu" - An Anticipation of Mach" In: "George Berkeley: Lectures delivered before the Philosophical Union of the University of California" Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 1957 (University of California Publications in Philosophy, Volume 29)
Ligações externas[editar | editar código-fonte]
- The Works of George Berkeleyin English on Project Gutenberg, incl. De Motu