Alexandre da Etiópia

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Eskender (15 de Julho de 14717 de Maio de 1494), nome grafado na escrita ge'ez እስክንድር iskindir, entronizado como imperador Kwestantinos II, mais conhecido na historiografia lusófona como Alexandre da Etiópia, foi nəgusä nägäst da Etiópia (1478 - 1494), membro da Dinastia Salomónica. Filho do imperador Baeda Maryam e da sua esposa Romna, foi este imperador que recebeu na sua corte Pêro da Covilhã, o primeiro português a estabelecer contacto com o império etíope na busca pelo Preste João.

Biografia

A morte de seu pai, o imperador Baeda Maryam, força Eskender a subir ao trono com apenas sete anos de idade. Devido à sua juventude, o poder foi entregue a um conselho de regência composto pela sua mãe, a rainha Romna, pelo abade Tasfa Giyorgis (abade de um mosteiro sito nas margens do Lago Hayq) e pelo bitwoded Amda Mikael. Contudo, pouco depois a rainha Romna abandonou o conselho, sendo obrigada a recolher-se a um convento nas imediações de Debre Libanos, onde viveria até falecer. Como o abade Tasfa Giyorgis não era capaz de fazer frente ao experiente Amda Mikael, este dirigiu o reino com mão livre[1].

O governo do betwoded Amda Mikael terminou por volta de 1486, quando um golpe palaciano liderado pela rainha-mãe Eleni, uma das viúvas do pai do jovem imperador, levou à deposição da junta e à execução de Amda Mikael. A partir daí coube à rainha Eleni a liderança do governo e a orientação dos assuntos do jovem imperador.

Pouco depois de assumir a governação, Eskender realizou uma acção de retaliação contra as razias realizadas pelo vizinho Sultanato de Adal e em 1478, naquele que seria o principal feito do seu reinado, saqueou Dakkar, a capital do Sultanato de Adal. Apesar desse feito, quando conduzia as suas forças de volta à Etiópia, uma força mais poderosa, comandada pelo emir Muhammad ibn Azhar ad-Din, atacou o exército etíope, matando muitos dos seu homens e aprisionando muitos mais. Diz a lenda que Eskender apenas escapou a captura com a assistência de anjos, razão pela qual mandou construir uma igreja a que deu o nome de Debere Meshwa'e, ou "Lugar de Sacrifício".[2].

Não é claro o contexto desta campanha: enquanto Zasillus, governador de Província de Amhara, tinha sido enviado para mobilizar as forças disponíveis no sul do império, Eskender assumiu igual operação em Angot e Tigray, decidindo então responder aos ataques de Mahfuz de Zeila[3]. Historiadores recentes[4] defendem que o saque de Dakkar conduzido por Eskender teria levado o emir Muhammad a procurar negociar uma paz com a Etiópia, no que foi ultrapassado por Mahfuz, que discordava da sua necessidade[2].

Não são conhecidos com exactidão as causas da morte do imperador Eskender, que ocorreu quando ele contava apenas 22 anos de idade. Algumas fontes afirma que ele foi morto em campanha contra o povo Maya, um grupo étnico entretanto desaparecido, conhecido por usar setas envenenadas, que habitava a região leste da Província de Enderta[5]. outras fontes, entre as quais o explorador Richard Burton, afirmam que Eskender foi assassinado em Tegulet, segundo alguns às ordens do governador Zasillus de Amhara[6], segundo outros às ordens de Mahfuz[7]. Foi enterrado na igreja de Atronsa Maryam, um templo cuja construção fora iniciada por seu pai[8].

A morte prematura do imperador conduziu de imediato a uma guerra civil: enquanto a corte resolveu manter o falecimento em segredo, o governador Zasillus de Ammhara marchou de imediato com as suas tropas até à prisão real de Amba Geshen, libertou Na'od, meio-irmão de Eskender que ali se encontrava encerrado às suas ordens, e promoveu a sua aclamação como novo imperador. Outro nobre, de nome Tekle Kristos, que tinha permanecido na corte imperial, defendeu que a sucessão no trono coubesse ao filho de Eskender, uma criança de nome Amda Seyon. Apesar das forças leais a Tekle Kristos terem derrotado os apoiantes de Zasillus, a guerra civil continuou em diversos pontos do império[9]. A vitória dos apoiantes de Amda Seyon, que reinou como Amda Seyon II, foi de pouca duração, pois Na'od seria imperador apenas seis meses depois, já que a luta culminou com a morte do imperador-criança, na altura com cerca de sete anos de idade.

Durante o reinado de Eskender era já sensível a presença europeia na Etiópia: um manuscrito da autoria de Francesco Suriano, datado por Teodosio Somigli[10] como tendo sido escrito em 1482, descreve ter encontrado dez italianos, de boa reputação, vivendo na corte de Eskender, alguns deles há mais de 25 anos. Suriano acrescenta que deste 1480, mais sete italianos tinha partido para a corte etíope. Tinham partido para a Etiópia à busca de riquezas, mas o imperador não permitia o seu regresso, pelo que, apesar de descontentes, ali tinha ficado, tendo o imperador concedido recompensas de acordo com os seus merecimentos[11].

Foi durante o reinado de Eskender, conhecido em Portugal por Alexandre, que Pêro da Covilhã chegou à Etiópia, sendo o primeiro explorador português que se conhece ter visitado aquela região. Apesar de se apresentar como enviado do rei D. João II de Portugal, tal como acontecera com os outros europeus, ficou impedido de regressar e foi obrigado a fixar-se no país, onde casou e deixou descendência. Assumiu as funções de conselheiro da corte, aconselhando a rainha Eleni a procurar a ajuda portuguesa quando o império foi ameaçada pelos seus vizinhos muçulmanos.

Notas

  1. Taddesse Tamrat, Church and State in Ethiopia, p. 286. Oxford: Clarendon Press, 1972.
  2. a b Richard Pankhurst, The Ethiopian Borderlands (Lawrenceville: Red Sea Press, 1997), pp. 121f
  3. Bruce, Travels to Discover the Source of the Nile (1805 edition), vol. 3, pp. 144f
  4. Como Richard Pankhurst.
  5. G.W.B. Huntingford, The historical geography of Ethiopia from the first century AD to 1704, (Oxford University Press: 1989), p. 109.
  6. Bruce, Travels, vol. 3 pp. 145f
  7. Burton, First Footsteps in East Africa [New York: Praeger, 1966], p. 179)
  8. "Local History in Ethiopia" The Nordic Africa Institute website (visitado a 28 de Janeiro de 2008)
  9. Taddesse Tamrat, Church and State, p. 292.
  10. Teodosio Somigli, Etiopia Francescana nei documenti dei secoli XVII e XVIII. Firenze : Quaracchi, 1928.
  11. O.G.S. Crawford, Ethiopian Itineraries, circa 1400-1524 (Cambridge: Hakluyt Society, 1958), pp. 40-54.