Rômulo Carbone

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Lucia Bonotti e Rômulo Carbone

Romolo Giovanni Maria Carbone, mais conhecido no Brasil como Rômulo Carbone (Itália, 19 de novembro de 1879 — Porto Alegre, 2 de dezembro de 1961) foi um médico ítalo-brasileiro.

De sua juventude pouco se sabe. Na publicidade que faria mais tarde alegava ser graduado cum laude na Universidade de Módena, aperfeiçoando-se em Turim com o cirurgião M. Anglesio, onde teria permanecido até 1904. Em seguida teria sido nomeado assistente do médico I. Lussana em Bérgamo, e depois de seis meses passou a auxiliar o professor Frantino, assim ficando por três anos. Uma carta de recomendação que lhe deu Frantino o qualificava como apto para dirigir qualquer estabelecimento de saúde. Em 1907 foi indicado primeiro cirurgião do hospital de Lovere e Pisone. Seu sucesso lhe teria valido em 1910 a confirmação no cargo em caráter vitalício, mas preferiu renunciar em 1912, viajando para Buenos Aires, onde de janeiro a junho de 1913 trabalhou sob a direção de L. Lenzi no Hospital Italiano.[1][2]

Em seguida dirigiu-se a Porto Alegre e ainda em 1913 passou para a antiga colônia italiana de Caxias do Sul, começando a trabalhar na Farmácia Peretti como cirurgião, logo ganhando respeito. A partir de outubro do mesmo ano já aparecia na imprensa elogiado como "valoroso cirurgião", dono de uma "perícia inconteste", realizando "delicadíssimas" operações.[2][3][4] Em 1920 assumiu a direção do Hospital Pompeia, mantido pelas Damas de Caridade, uma associação filantrópica. No ano seguinte elas o homenagearam instalando um retrato no Salão de Honra. Na ocasião diversas autoridades fizeram discursos enaltecendo suas virtudes.[5][6][7]

Em 1926, depois de passar vinte meses na Itália, voltou a Caxias, sendo recebido com uma festa apoteótica. Na estação ferroviária o esperavam duas bandas de música e centenas de admiradores, incluindo o intendente interino e o vigário da Matriz, cujo entusiasmo, segundo a imprensa da época, chegava às raias do delírio. Depois de muitos cumprimentos e discursos, o ilustre médico foi conduzido em cortejo solene até o hotel onde haveria de ficar, e por onde passava recebia salvas de vivas e chuvas de flores. Chegando ao hotel, recebeu cumprimentos de mais uma longa fila de amigos, e a comemoração encerrou com discursos proferidos da janela para a multidão reunida na praça, que aplaudia freneticamente.[6] No seu aniversário em novembro do mesmo ano recebeu novas homenagens, sendo levado em cortejo solene até a sede da Sociedade Príncipe de Nápoles, da qual era membro, onde foi recebido com uma ovação, chuva de flores e um grande banquete com baile.[8] Nesta época abriu uma clínica no piso superior da antiga casa de Vicente Rovea, que passou a se chamar Casa de Saúde ou Hospital Carbone, residindo no térreo. Carbone dirigiu o estabelecimento até 1931, quando foi reorganizado como Hospital Santo Antônio, continuando ali por mais alguns anos como médico assistente. Teve um grande colaborador no médico Henrique Fracasso.[9][10]

Arquivo Histórico Municipal, antigo Hospital Carbone

Reconhecido como um excelente profissional, "ilustre facultativo",[11] "dedicado apóstolo da ciência",[7] "distinto e humanitário clínico",[12] "médico, cirurgião e parteiro de incontestável valor, aliando a isso uma bondade infinita de coração", era "digno efetivamente dos maiores encômios".[13] Costumava reservar uma hora do seu dia para atender os pobres gratuitamente e atendia gratuitamente as internas do Orfanato Santa Teresinha, sendo instalado um retrato do médico no Salão de Honra.[14][15] Muito procurado pela elite, estava sempre de prontidão para atendimentos a domicílio, e a imprensa da época está cheia de agradecimentos de doentes que ele curou. Mesmo quando os pacientes iam ao óbito, as famílias reconheciam seu empenho "incansável", "nunca poupando esforços". Ganhou a estima geral, recebeu várias outras homenagens públicas, seus aniversários eram invariavelmente muito festejados, e foi um ativo membro da comunidade em outras esferas.[9][2][16][17][18][19]

Em 1916 foi membro da comissão de recepção de visitantes nas solenidades da posse do intendente e do Conselho,[20] e na recepção ao cônsul da Itália em Porto Alegre representou o Comitato Dante Alighieri, do qual era presidente, entidade dedicada a fomentar a cultura italiana e um senso de união coletiva.[21][22] Foi membro da diretoria da Sociedade Príncipe de Nápoles e do Clube Juvenil;[23][24] um dos fundadores de uma aula para menores carentes e de um curso gratuito de comércio no Clube Juvenil;[25] um dos fundadores e primeiro vice-presidente da Liga Pró-Pátria e Aliados e vice-presidente da Comissão Auxiliadora dos Belgas, associações filantrópicas ativas durante a I Guerra Mundial para dar ajuda aos soldados;[26][27] membro da comissão das festividades comemorativas do sexto centenário de Dante Alighieri em 1921,[28] membro da Liga de Defesa Nacional,[29] e participou do movimento fascista local, ideologia que teve grande penetração na região colonial italiana no início do século XX, sob a liderança de Mussolini, que ambicionava unir todos os italianos dispersos pelo mundo em uma comunidade internacional, defendendo princípios de ordem, raça, trabalho, disciplina e hierarquia para a criação de um novo homem, moderado, saudável e útil à sociedade.[30][31]

Em 1920 foi nomeado agente consular da Itália em Caxias,[32] em 1921 era agente consular no estado[9] e em 1933 recebeu do rei da Itália o título de cavaleiro da Coroa, quando a imprensa o louvou como "um homem que tem sido em Caxias um símbolo de bondade e de amor à sua pátria distante", e "um pai e um apoio sem restrições" para todos, pobres e ricos, que o procuravam em busca de auxílio e orientação.[33] Era dono de apreciada oratória e foi muitas vezes convidado a fazer discursos em solenidades oficiais,[9] como na recepção à embaixada italiana em 1918, quando também atuou como representante da Intendência,[34] na grande passeata que comemorou a capitulação dos inimigos do Brasil na I Guerra, no mesmo ano,[35] nas comemorações do Centenário da Independência em 1922,[36] na abertura da Festa da Uva de 1934,[37] e em 1938 falou como representante do povo de Caxias na recepção ao interventor federal no estado, o coronel Osvaldo Cordeiro de Farias.[38] Foi orador oficial da Sociedade Príncipe de Nápoles.[39] Também foi ator amador[40] e manteve atividades esportivas, sendo diretor de campo do Esporte Clube Juvenil[41] e delegado do clube junto à Associação Caxiense de Amadores de Desportos.[42]

Em 5 de setembro de 1937 anunciou sua mudança para Porto Alegre. A despedida foi marcada com uma grande festa no Cine-Teatro Central, com a presença do prefeito, muitas autoridades e a elite local,[43] mas em maio de 1938 estava de volta, abrindo um consultório nos altos da casa de Virgílio Ramos[44] e colaborando novamente no Hospital Santo Antônio e no Hospital Pompeia.[45][46] A família mudou-se várias vezes de residência, uma delas foi um palacete histórico que depois pertenceu à família Ungaretti/Triches e ainda sobrevive.[47] Em maio de 1945 instalou-se definitivamente em Porto Alegre, onde faleceu.[9] Foi casado com Lucia Bonotti, lembrada como uma mulher à frente de seu tempo, com quem teve um filho, Francisco Pedro, alcunhado Ferruccio, formado em Direito, piloto civil e instrutor do Aero Clube de Porto Alegre.[47][19][48]

Em pesquisa de opinião desenvolvida em 1999 junto a 100 líderes comunitários de diferentes áreas por acadêmicos do Curso de Jornalismo da Universidade de Caxias do Sul, foi eleito uma das 30 Personalidades de Caxias do Sul do Século XX.[49] Hoje Rômulo Carbone é nome de uma rua em Caxias. Rodrigo Lopes dedicou-lhe recentemente vários artigos em sua coluna "Memória" do jornal Pioneiro, e a lembrança do seu hospital permanece viva na comunidade. Embora o prédio tenha sido tombado pelo Patrimônio Histórico do Estado desde 1986 e passado a abrigar o Arquivo Histórico Municipal, muitas pessoas ainda se referem a ele como "o antigo Hospital Carbone".[9][50][51]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. "Casa de Saúde". A Federação, 25/09/1914
  2. a b c "Dr. Romolo Carbone". Città di Caxias, 12/10/1913
  3. "Ringraziamento". Città di Caxias, 29/01/1914
  4. "Importante operazione chirurgica". Città di Caxias, 27/10/1913
  5. "Hospital de Caxias". O Brasil, 30/06/1921
  6. a b "A chegada do Dr. Romulo Carbone". O Regional, 23/01/1926
  7. a b "Hospital de caridade". O Brasil, 14/05/1921
  8. "O anniversario do dr. Romulo Carbone". O Regional, 27/11/1926
  9. a b c d e f Lopes, Rodrigo. "Romulo Carbone, um aniversário para recordar". Pioneiro, 10/11/2015
  10. Lopes, Rodrigo. "Um casarão para a história". Pioneiro, 21/01/2014
  11. "Preito de gratidão". O Brasil, 05/11/1921
  12. "Agradecimento". O Brasil, 09/07/1921
  13. "Uma casa de caridade digna de amparo e protecção". O Brasil, 12/11/1921
  14. "Orfanato S. Teresinha". O Momento, 12/07/1934
  15. "Orfanato Santa Teresinha". O Momento, 27/11/1934
  16. "Agradecimento". O Brasil, 28/07/1921
  17. "Agradecimentos". O Brasil, 30/07/1921
  18. "Justas homenagens". O Brasil, 26/11/1921
  19. a b "Dr. Romulo Carbone". O Momento, 20/11/1943
  20. "Posse intendencial". O Brazil, 07/10/1916
  21. "Comitato Dante Alighieri di Caxias". Città di Caxias, 27/11/1916
  22. "Il Discorso del Dr. Romolo Carbone alla Dante Alighieri". Città di Caxias, 03/12/1916
  23. "Eleição de directoria". A Federação, 01/11/1928
  24. "Baile e banquete de casados". O Brasil, 23/10/1920
  25. "Pela extincção do analphabetismo". O Brasil, 26/02/1921
  26. "Liga Pró-Patria e Alliados". O Brazil, 23/11/1917
  27. "Commissão Auxiliadora dos Belgas". Città di Caxias, 03/09/1917
  28. "Centenario di Dante". Città di Caxias, 12/08/1921
  29. "Premios Semana da Patria". O Momento, 25/09/1939
  30. "Andrade, Andrei. "Os Escolhidos de Mussolini". O Caxiense, 04/05/2012
  31. "Comemorações do Fascio local". O Momento, 16/11/1936
  32. "Agente consular da Italia". A Federação, 09/08/1920
  33. "Premio merecido". O Momento, 02/05/1933
  34. "A Embaixada Italiana". O Brazil, 27/07/1918
  35. "A grande victoria". Città di Caxias, 11/11/1918
  36. "O centenario da Independencia do Brasil". A Federação, 27/09/1922
  37. "Graças ao concurso... etc". O Momento, 01/03/1924
  38. "Caxias hospeda o cel. Oswaldo Cordeiro de farias, D. D. Interventor Federal no Estado". O Momento, 08/08/1938
  39. "O 12º aniversario da Marcha sobre Roma". O Momento, 01/11/1934
  40. "O espetaculo de hoje". O Brazil, 22/09/1917
  41. "Sports". A Federação, 07/07/1921
  42. "A. C. Amadores de Desportos". O Brasil, 07/05/1921
  43. "Homenagem ao Cavalheiro Dr. Romulo Carbone". O Momento, 06/09/1937
  44. "Dr. Romulo Carbone". O Momento, 09/05/1938
  45. "Restabelecido o dr. Promotor Publico". O Momento, 24/06/1940
  46. "Ecos da tragedia do quarto 21". O Momento, 13/03/1943
  47. a b Lopes, Rodrigo. "Um relicário para Lucia Carbone". Pioneiro, 25/06/2015
  48. "Dr. Ferruccio Carbone". O Momento, 18/12/1943
  49. "Diplomas para destaques do século". Pioneiro, 02/12/1999
  50. Lopes, Rodrigo. "Endereços para recordar da história de Caxias do Sul". Pioneiro, 29/01/2015
  51. Secretaria da Cultura de Caxias do Sul. Arquivo Histórico Arquivado em 2 de agosto de 2017, no Wayback Machine..