Tetranêutron

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Um tetranêutron é um aglomerado hipotético estável de quatro nêutrons. A existência de tal aglomerado de partículas não é apoiada pelos modelos atuais de forças nucleares.[1] Há alguma evidência empírica que sugere que a partícula em questão realmente exista, com base em um experimento de 2001 realizado por Francisco-Miguel Marqués e colegas no acelerador Ganil, em Caen, utilizando um novo método de detecção em observações da desintegração de núcleos de berílio e lítio.[2] No entanto, tentativas subsequentes de replicar essa observação falharam.

Um trabalho posterior de 2019 sugere consequências potencialmente observáveis nas crostas de uma estrela de nêutrons, caso o tetranêutron exista. [3]

Assim como detalhado no fim deste artigo, observações subsequentes de experimentos com feixes de íons são consistentes com quatro nêutrons que apresentam alguma ligação entre si.

O experimento de Marqués[editar | editar código-fonte]

Assim como em muitos experimentos com aceleradores de partículas, a equipe de Marqués disparou núcleos atômicos em alvos de carbono e observou a dispersão das partículas a partir da colisão resultante. Nesse caso o experimento envolveu o uso de núcleos de berílio-14, boro-15 e lítio-11, sendo o primeiro o mais bem-sucedido. Esse isótopo do berílio tem um halo nuclear que consiste em quatro nêutrons aglomerados; isso permite que eles sejam facilmente separados intactos na colisão de alta velocidade com o alvo de carbono.[2] Os modelos nucleares atuais sugerem que quatro nêutrons separados deveriam ser o resultado de quando o berílio-10 é produzido, mas o único sinal detectado na produção deste isótopo sugeriu um aglomerado multinêutron entre os produtos da separação; o mais provável é um núcleo de berílio-10 e quatro nêutrons fundiram-se juntos em um tetranêutron.

Desde o experimento de Marqués[editar | editar código-fonte]

Uma análise posterior do método usado no experimento de Marqués sugeriu que o mecanismo de detecção era improvável[4] mas a sugestão foi refutada,[5]e tentativas de reproduzir essas observações com métodos diferentes não tiveram sucesso em detectar aglomerados de nêutrons.[6] Se, contudo, a existência de tetranêutrons estáveis for confirmada independentemente, ajustes consideráveis teriam que ser feitos no modelo nuclear atual. Bertulani e Zelevinsky propuseram que, caso exista, o tetranêutron poderia ser formado por um estado de ligação entre dois sistemas dinêutron.[7] Porém, tentativas de modelar interações que possam fazer surgir aglomerados multinêutron falharam,[8][9][10] e "não parece possível mudar os hamiltonianos nucleares modernos para ligar um tetranêutron sem destruir muitas outras previsões bem-sucedidas desses hamiltonianos. Ou seja, sendo uma alegação experimental recentemente de um tetranêutron ligado confirmada, nosso entendimento das forças nucleares terá que ser significativamente alterado."[11]

Em 2016, pesquisadores no RIKEN em Wako, Japão observaram uma evidência de que o tetranêutron existe brevemente como uma ressonância. Eles dispararam um feixe do núcleo rico em nêutrons de hélio-8 (dois prótons e seis nêutrons) em um alvo líquido composto de hélio-4 (dois prótons e dois nêutrons). Ocasionalmente, a reação produziu um núcleo de berílio-8 (quatro prótons e quatro nêutrons), deixando quatro nêutrons fora da conta. Se um núcleo de quatro nêutrons realmente ocorrei, ele durou aproximadamente 10−21 segundos antes de decair em outras partículas.[12][13][14]

Em 2021, por outro lado, uma equipe da Universidade Técnica de Munique bombardeou um alvo de lítio-7 e encontrou evidência preliminar de um estado de ligação de quatro nêutrons, com um tempo de vida estimado em vários minutos, similar ao de um nêutron livre.[15][16]

Um experimento de 2022, mais uma vez no RIKEN, direcionou um feixe de hélio-8 a um alvo rico em prótons, levando à ejeção de uma partícula alfa na direção oposta, e deixando quatro nêutrons na estrutura em movimento. A energia restante do próton detectado e a partícula alfa foram usados para obter a assinatura do Sistema de quatro nêutrons com o pico que foi interpretado como consistente com uma ressonância a 2,37 MeV e um comprimento de 1,75 MeV, correspondendo a um tempo de vida de cerca de 3.8×10−22 s.[17][18][19]

Referências

  1. Cierjacks, S.; et al. (1965). «Further Evidence for the Nonexistence of Particle-Stable Tetraneutrons». Physical Review. 137 (2B). pp. 345–346. Bibcode:1965PhRv..137..345C. doi:10.1103/PhysRev.137.B345 
  2. a b Marqués, F. M.; et al. (2002). «Detection of neutron clusters». Physical Review C. 65 (4). 044006 páginas. Bibcode:2002PhRvC..65d4006M. arXiv:nucl-ex/0111001Acessível livremente. doi:10.1103/PhysRevC.65.044006 
  3. Ivanytskyi, Perez-Garcia & Albertus (2019). «Tetraneutron condensation in neutron rich matter». TBA. TBA (TBA). pp. TBA. arXiv:nucl-th/0011512Acessível livremente 
  4. Sherrill, B. M.; Bertulani, C. A (2004). «Proton-tetraneutron elastic scattering». Physical Review C. 69 (2). 027601 páginas. Bibcode:2004PhRvC..69b7601S. arXiv:nucl-th/0312110Acessível livremente. doi:10.1103/PhysRevC.69.027601 
  5. Marqués, F. M.; et al. (2005). «On the possible detection of 4n events in the breakup of 14Be». arXiv:nucl-ex/0504009v1Acessível livremente 
  6. Aleksandrov, D. V.; et al. (2005). «Search for Resonances in the Three- and Four-Neutron Systems in the 7Li (7Li, 11C) 3n and 7Li (7Li, 10C) 4n Reactions». JETP Letters. 81 (2). pp. 43–46. Bibcode:2005JETPL..81...43A. doi:10.1134/1.1887912 
  7. Bertulani, C. A.; Zelevinsky, V. G. (2003). «Tetraneutron as a dineutron-dineutron molecule». Journal of Physics G. 29 (10). pp. 2431–2437. Bibcode:2003JPhG...29.2431B. arXiv:nucl-th/0212060Acessível livremente. doi:10.1088/0954-3899/29/10/309 
  8. Lazauskas, R.; Carbonell, J. (2005). «Three-neutron resonance trajectories for realistic interaction models». Physical Review C. 71 (4). 044004 páginas. Bibcode:2005PhRvC..71d4004L. arXiv:nucl-th/0502037v2Acessível livremente. doi:10.1103/PhysRevC.71.044004 
  9. Arai, K. (2003). «Resonance states of 5H and 5Be in a microscopic three cluster model». Physical Review C. 68 (3). 034303 páginas. Bibcode:2003PhRvC..68c4303A. doi:10.1103/PhysRevC.68.034303 
  10. Hemmdan, A.; Glöckle, W.; Kamada, H. (2002). «Indications for the nonexistence of three-neutron resonances near the physical region». Physical Review C. 66 (3). 054001 páginas. Bibcode:2002PhRvC..66e4001H. arXiv:nucl-th/0208007Acessível livremente. doi:10.1103/PhysRevC.66.054001 
  11. Pieper, S. C. (2003). «Can Modern Nuclear Hamiltonians Tolerate a Bound Tetraneutron?». Physical Review Letters. 90 (25). 252501 páginas. Bibcode:2003PhRvL..90y2501P. PMID 12857127. arXiv:nucl-th/0302048Acessível livremente. doi:10.1103/PhysRevLett.90.252501 
  12. Grant, Andrew (8 de fevereiro de 2016). «Physicists find signs of four-neutron nucleus». Science News. Consultado em 8 de fevereiro de 2016 
  13. Bertulani, Carlos A.; Zelevinsky, Vladimir (2016). «Four neutrons together momentarily». Nature. 532 (7600). pp. 448–449. Bibcode:2016Natur.532..448B. PMID 27049938. doi:10.1038/nature17884 
  14. Kisamori, K.; et al. (2016). «Candidate Resonant Tetraneutron State Populated by the 4He(8He,8Be) Reaction». Physical Review Letters. 116 (5). p. 052501. Bibcode:2016PhRvL.116e2501K. PMID 26894705. doi:10.1103/PhysRevLett.116.052501 
  15. «Tetra-Neutron Experiment: Understanding of Nuclear Forces Might Have To Be Significantly Changed». SciTech Daily. 12 de dezembro de 2021. Consultado em 13 de dezembro de 2021 
  16. Faestermann, Thomas; Bergmaier, Andreas; Gernhäuser, Roman; Koll, Dominik; Mahgoub, Mahmoud (Janeiro de 2022). «Indications for a bound tetraneutron». Physics Letters B. 824. p. 136799. Bibcode:2022PhLB..82436799F. ISSN 0370-2693. doi:10.1016/j.physletb.2021.136799 
  17. «Physicists may have finally spotted elusive clusters of four neutrons». ScienceNews. 22 de junho de 2022. Consultado em 26 de junho de 2022 
  18. Sobotka, Lee G.; Piarulli, Maria (Junho de 2022). «Collisions hint that four neutrons form a transient isolated entity». Nature. 606 (7915). pp. 656–657. Bibcode:2022Natur.606..656S. doi:10.1038/d41586-022-01634-x 
  19. Duer, M.; et al. (2022). «Observation of a correlated free four-neutron system». Nature. 606 (7915). pp. 678–682. Bibcode:2022Natur.606..678D. doi:10.1038/s41586-022-04827-6 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]