Censo demográfico


Um censo (do latim censere, "avaliar") ou recenseamento demográfico é o procedimento de registro e cálculo sistemático de informações sobre todos os membros de uma determinada população, geralmente exibidas na forma de estatísticas. Este termo é usado principalmente para se referir aos censos nacionais de população e habitação, mas outros censos comuns incluem censos agropecuários, escolares, de negócios, suprimentos e censos de população em situação de rua, por exemplo[1][2].
Segundo a definição da ONU, "um recenseamento de população pode ser definido como o conjunto das operações que consistem em recolher, agrupar e publicar dados demográficos, econômicos e sociais relativos a um momento determinado ou em certos períodos, a todos os habitantes de um país ou território"[1].
"O papel do censo populacional e habitacional é coletar, processar e disseminar estatísticas detalhadas de pequenas áreas sobre a população, sua composição, características, distribuição espacial e organização (indivíduos, famílias e domicílios). Os censos são realizados periodicamente na maioria dos países do mundo. Eles têm sido promovidos internacionalmente desde o final do século XIX, quando o Congresso Internacional de Estatística recomendou que todos os países do mundo os realizassem."[2]
Assim, os censos permitem o recolhimento de várias características e tipos de informações populacionais, que podem variar de um censo para o outro. No geral, envolvem dados como o número de homens, mulheres, crianças e idosos, onde e como vivem as pessoas. Esse tipo de levantamento é realizado, normalmente, de dez em dez anos.
Histórico e relevância
[editar | editar código-fonte]Sabe-se que censos foram realizados em todos os impérios da Idade Antiga, como o Babilônico, o Persa, o Egípcio e o Romano. Os romanos, por exemplo, realizavam censos em todo o império a cada cinco anos para enumerar as responsabilidades dos cidadãos do império. Ao contrário do censo moderno, os censos realizados nesse período não buscavam incluir todas as pessoas, nem mesmo uma parte representativa da população. Concentravam-se, em vez disso, naqueles pertencentes a certas categorias, como chefes de família, homens em idade militar, etc[3].
A palavra é de origem latina, significando avaliar, aferir, estimar. Estava relacionada na República Romana a uma lista de todos os homens adultos aptos para o serviço militar. O censo moderno passou a ser realizado por Estados nacionais na Europa e América do Norte a partir do século XVII[3]. Ele passou a ser essencial para o conhecimento das populações e territórios para ações do Estado por meio de políticas públicas e de agente não estatais, como empresas e ONGs, pois coletam dados sobre muitos atributos de uma população, não apenas o número de indivíduos[1][2].
Os censos normalmente começaram como o único método de coleta de dados demográficos nacionais e agora fazem parte de um sistema maior de diferentes pesquisas amostrais realizadas entre os intervalos de coleta de informações de todo o universo de pessoas (intercensitárias). A combinação com outras pesquisas de tipo amostral é relevante para manterem atualizadas informações de aspectos populacionais com oscilações maiores dentro do intervalo maior dos censos e que podem ser relevantes para governos, organizações sociais e empresas, como relacionadas ao mercado de trabalho, à atividade econômica e à situação habitacional. Além disso, apontam mudanças que podem direcionar a próxima rodada de coleta de informações censitárias[3].
As informações censitárias permitem análises estatísticas que descrevem a população e o território em termos de quantidades, mas também combinações de atributos, por exemplo, educação por idade e sexo em diferentes regiões. Isso faz com que dados censitários modernos sejam centrais para a formulação de políticas públicas baseadas em evidências, mas também comumente usados para pesquisa[4], marketing e planejamento empresarial, e como uma linha de base para a concepção de pesquisas amostrais, fornecendo uma estrutura de amostragem, como um registro de endereços.
As contagens censitárias são necessárias para ajustar as amostras para que sejam representativas de uma população, ponderando-as como é comum em pesquisas de opinião para qualquer finalidade. Da mesma forma, a estratificação requer o conhecimento dos tamanhos relativos de diferentes estratos populacionais, que podem ser derivados de dados censitários.[5] Em alguns países, o censo fornece as contagens oficiais usadas para distribuir o número de representantes eleitos (ex. senadores e deputados federais numa federação) para as regiões.
Censo no Brasil
[editar | editar código-fonte]O primeiro censo populacional do Brasil foi realizado em 1872, durante o Segundo Reinado, a pedido do imperador Dom Pedro II. O censo contou quase 10 milhões de "almas" no país na época, sendo 15% da população escravizada. Apesar de alguns problemas metodológicos, o censo foi um marco importante, pois antes disso o governo imperial só tinha números aproximados da população. O censo mostrou que 58% da população se declarava preta ou parda, 38% branca e 4% indígena. Além disso, 99,7% da população era católica e 82% analfabeta. Embora o censo tenha recebido elogios internacionais, seus números nunca foram muito utilizados na prática pelo governo. A série histórica de censos planejada acabou não se concretizando, com o próximo censo só sendo realizado em 1890, após o fim da escravidão.[6]
Desde sua criação em 1936, o responsável pelos censos demográficos é o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), feito realizado com a contribuição do demógrafo italiano Giorgio Mortara. A partir da edição do censo de 1940, inaugurou-se a moderna fase censitária no Brasil.
Caracterizada principalmente pela periodicidade decenal dos censos demográficos, nessa nova fase foi ampliada a abrangência temática do questionário com introdução de quesitos de interesse econômico e social, tais como os de mão-de-obra, emprego, desemprego, rendimento, fecundidade, migrações internas, dentre outros temas.
Assim, a experiência do IBGE na área dos Censos Demográficos remonta, portanto, a 1940, ano em que foi realizado o primeiro levantamento desse tipo pelo Instituto. A partir de então, o IBGE realiza a cada 10 anos o Censo Demográfico, que é a operação estatística mais importante para retratar a realidade sociodemográfica do país. Dos resultados do Censo Demográfico e das Contagens Populacionais são obtidas as tendências e parâmetros indispensáveis à elaboração de projeções e estimativas populacionais, que a partir de 1989 passaram a ser fornecidas anualmente, em cumprimento ao dispositivo constitucional, regulamentado pela Lei Complementar nº 59, de 22 de dezembro de 1988.
O IBGE realizou a primeira Contagem da População em 1996. Dentre os fatores determinantes da realização dessa contagem estão o surgimento de cerca de 1 500 novos municípios após o Censo Demográfico de 1991, os intensos movimentos migratórios na dinâmica populacional e a obrigatoriedade de fornecimento de estimativas populacionais anuais determinadas pela Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992.[7]
Os censos demográficos são planejados para serem executados nos anos de finais zero, ou seja, a cada dez anos. O último censo no Brasil deveria ter acontecido em 2020, mas a pandemia de covid-19 e cortes orçamentários do governo federal impediram a realização da coleta[8], que só foi realizada em 2022[9].
No intervalo entre dois censos demográficos, realiza-se a contagem de população. Todavia, por questões orçamentárias e financeiras, a contagem planejada para 2005 só foi concretizada em 2007, realizando-se simultaneamente ao Censo Agropecuário.[1]
Censo em Portugal
[editar | editar código-fonte]Em Portugal, as primeiras contagens populacionais recuam ao tempo de D. Afonso III (1260–1279) e D. João I (1421–1422), restringindo-se ao apuramento dos homens aptos para a guerra («Rol de Besteiros»).[10] A primeira contagem populacional de âmbito geral seria feita apenas em 1527, no reinado de D. João III, com base predominantemente nos fogos, do que resultou um arrolamento de 1 262 376 portugueses.[11] Outras recolhas se seguiram, de âmbito geral ou restrito, como a «Contagem de Homens Válidos» ou «Resenha de Gente de Guerra» de 1636–1639 (sob Filipe III), o «Censo do Marquês de Abrantes» de 1732–1736 (sob D. João V) ou o «Censo de Pina Manique» de 1776–1798 (sob D. Maria I).[10][11]
As primeiras contagens da população que se aproximam do conceito moderno de recenseamento só apareceram no século XIX. A primeira destas (Censo de [1802]) foi feita com base em números fornecidos pelas autoridades eclesiásticas das paróquias, opção da Coroa explicável pelo facto de que, em contraste com a debilidade da presença do Estado, a Igreja mantinha registos detalhados do percurso dos indivíduos (batismos, casamentos, óbitos).[12] Nestas condições, os dados enviados reflectiam a organização eclesiástica da altura (dioceses, isentos e paróquias), tendo a Coroa solicitado a reordenação dos dados segundo as circunscrições administrativas de então (províncias, comarcas e concelhos).[13]
Apesar do reforço dos poderes e da presença do Estado a seguir às Reformas Liberais (que dividiu o país em províncias, distritos, concelhos e freguesias), a máquina administrativa continuou débil ao nível local, pelo que no censo de 1849 foi ainda necessário recorrer aos párocos como fonte primária de informação.[14]
O I Recenseamento Geral da população portuguesa, regendo-se pelas orientações internacionais da época (Congresso Internacional de Estatística de Bruxelas de 1853), realizar-se-ia apenas em 1864, marcando o início dos recenseamentos da época moderna. Embora as orientações seguidas indicassem já que os recenseamentos deveriam ser realizados a cada 10 anos, o censo seguinte apenas se realizou em 1878, seguindo-se-lhe o de 1890. A partir de então os recenseamentos da população têm vindo a realizar-se, com algumas excepções (ditadas por diferentes circunstâncias), em intervalos regulares de 10 anosː[10][15] 1900, 1911,[16] 1920, 1930, 1940, 1950, 1960, 1970, 1981,[17] 1991, 2001, 2011 e 2021.
Em outros países lusófonos
[editar | editar código-fonte]Em alguns países foram realizados recenseamentos durante o período colonial, em 1930 em Moçambique e em 1950 nos restantes. Atualmente, em Portugal e em Moçambique, os responsáveis pelos censos são os Institutos Nacionais de Estatística de cada país.
Características do recenseamento
[editar | editar código-fonte]- É projetado e executado sob o apoio do Governo, logo, obrigatório responder;
- Universal - são contados uma única vez todos os habitantes do território;
- Simultaneidade de recolha de informações, que se referem todas a um período bem determinado. Isto é, realizado ao mesmo tempo em todas as zonas do país, para evitar duplas contagens;
- Recolha com base no indivíduo, das informações nele contidos sobre a população recenseada- as pessoas são contadas na sua residência e são criados boletins para cada indivíduo;
- Âmbito territorial bem delimitado, em que assenta a contagem da população- realiza-se o recenseamento no território de um país, podendo fazer-se em embaixadas (que são consideradas território de um país) e pessoas que vão a bordo de aviões portugueses, etc., no dia do recenseamento;
- Elaboração periódica dos dados- hoje em dia os dados não são guardados em segredo, encontrando-se à disposição de todos;
- Realização periódica (habitualmente, de 10 em 10 anos).
A contagem e a recolha periódica de informações relativas à população não é algo de novo. Ao longo da História do Homem têm-se registrado esforços para recolher periodicamente informações relativas à população.
Fases do recenseamento
[editar | editar código-fonte]- Notação e recolha;
- Compilação e verificação;
- Apuramento e publicação dos dados.
Ver também
[editar | editar código-fonte]- Recenseamentos gerais da população em Portugal
- Recenseamentos gerais da habitação em Portugal
- Instituto Nacional de Estatística (INE)
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
- Contagem de população
- Política pública
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- «Introdução à demografia com os dados do Censo». Revista Nova Escola.
- Projeto Censo - 50 anos de dados. Centro de Estudos da Metrópole (CEM).
- GeoReDUS - Análise e visualização de dados censitários.
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. XII Censo Demográfico - 2010.
Referências
- ↑ a b c «Principles and Recommendations for Population and Housing Censuses - Revision 2» (PDF). Department of Economic and Social Affairs - Statistics Division. New York: United Nations. 2008. ISBN 9789211615050. Consultado em 9 de junho de 2025
- ↑ a b c Vereinte Nationen, ed. (2017). Principles and recommendations for population and housing censuses: 2020 round (PDF). Col: Economic & social affairs Revision 3 ed. New York: United Nations. Consultado em 9 de junho de 2025
- ↑ a b c "History and Development of the Census in England and Wales"https://theforgottenfamily.wordpress.com/2017/01/19/history-and-development-of-the-census-in-england-and-wales/
- ↑ Arretche, Marta Teresa da Silva (2015). Trajetórias das desigualdades: como o Brasil mudou nos últimos cinquenta anos. São Paulo: Centro de estudos da metrópole
- ↑ ABDAL, Alexandre et al. (ORGS.). Métodos de pesquisa em Ciências Sociais: Bloco Quantitativo. 1. ed. São Paulo, Brasil: CEBRAP/SESC, 2016. https://bibliotecavirtual.cebrap.org.br/arquivos/2017_E-BOOK%20Sesc-Cebrap_%20Metodos%20e%20tecnicas%20em%20CS%20-%20Bloco%20Quantitativo.pdf
- ↑ «1º Censo do Brasil, feito há 150 anos, contou 1,5 milhão de escravizados». Senado Federal. Consultado em 17 de abril de 2024
- ↑ «Introdução | Memória IBGE». memoria.ibge.gov.br. Consultado em 17 de abril de 2024
- ↑ «O que é Censo e por que ele é importante para o futuro do Brasil?». Exame. 27 de junho de 2023. Consultado em 17 de abril de 2024
- ↑ «Conhecendo o Brasil - Censo 2022». Censo Demográfico 2022 - IBGE. Consultado em 17 de abril de 2024
- ↑ a b c Instituto Nacional de Estatística (2009) – "História dos Censos em Portugal".
- ↑ a b Nuno Valério, coord. (2001) – "Estatísticas Históricas Portuguesas, vol. I", p. 33 (ficheiro: p. 32). Lisboa: Instituto Nacional de Estatística.
- ↑ Luís Nuno Espinho da Silveira, coord. (2001) – "Os Recenseamentos da População Portuguesa de 1801 e 1849: Edição crítica, vol. I", p. 26 (ficheiro: p. 27). Lisboa: Instituto Nacional de Estatística.
- ↑ Luís Nuno Espinho da Silveira, coord. (2001) – op. cit., pp. 26-27 (ficheiro: pp. 27 e 34).
- ↑ Luís Nuno Espinho da Silveira, coord. (2001) – op. cit., p. 33 (ficheiro: p. 44).
- ↑ Instituto Nacional de Estatística (2009) – "Censos em Portugal de 1864 a 2001".
- ↑ Atraso provocado pela perturbação resultante da implantação da República em Outubro de 1910. Cf. Instituto Nacional de Estatística (2009) - "1911 - 1 de Dezembro (V Recenseamento Geral da População)".
- ↑ Adiado de Dezembro de 1980 para Março de 1981 de modo a ficar em consonância com o calendário censitário (de 1 de Março a 31 de maio de 1981) em vigor nos países da Comunidade Económica Europeia, a que Portugal pretendia aderir. Cf. Instituto Nacional de Estatística (2009) - "1981 - 16 de Março (XII Recenseamento Geral da População) (II Recenseamento Geral da Habitação)".