Estrela dupla

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Na astronomia observacional, uma estrela dupla ou dupla visual é um par de estrelas que parecem próximas uma da outra no céu, quando vistas da Terra através de um telescópio óptico.

Isto pode acontecer porque o par forma uma estrela binária, isto é, um sistema binário de estrelas em órbita recíproca, gravitacionalmente ligadas uma à outra, ou por causa de um alinhamento casual no céu de duas estrelas que estão a diferentes distâncias.[1][2] As estrelas binárias são importantes para os astrônomos estelares porque o conhecimento dos seus movimentos permite o cálculo direto da massa e outros parâmetros estelares.

Desde os anos 1780, observadores profissionais e amadores de estrela duplas mediram com telescópios as distâncias e ângulos entre as estrelas duplas para determinar os movimentos relativos dos pares.[3] Se o movimento relativo de um par determina um arco curvado de uma órbita, ou se o movimento relativo é pequeno comparado com o movimento próprio comum das duas estrelas, pode-se concluir que o par está em órbita recíproca como uma estrela binária. De outro modo, o par é óptico.[2] Estrelas múltiplas são também estudadas desta forma, embora a dinâmica de sistemas estelares múltiplos seja mais complexa do que a das estrelas binárias.

Existem três tipos de pares de estrelas:

  • Duplas ópticas são estrelas não relacionadas que parecem próximas por causa de um alinhamento casual com a Terra.
  • Binárias visuais são estrelas gravitacionalmente ligadas que podem ser vistas separadamente com um telescópio.
  • Binárias não visuais são estrelas cuja característica de binárias foi deduzida por meios mais complexos, como a ocultação (binárias eclipsantes), espectroscopia (binárias espectroscópicas) ou anomalias no movimento próprio (binárias astrométricas).

Melhorias nos telescópios podem transformar estrelas anteriormente binárias não visuais em binárias visuais, como aconteceu com Polaris A em 2006.[4] É apenas a impossibilidade de observar telescopicamente duas estrelas separadas que distingue binárias visuais das não visuais.

História[editar | editar código-fonte]

Mizar, em Ursa Major, foi observada como dupla por Benedetto Castelli e Galileu.[5] A identificação de outras duplas seguiu-se logo: Robert Hooke descobriu um dos primeiros sistemas de estrela dupla, Gamma Arietis, em 1664,[6] enquanto a brilhante estrela meridional Acrux, do Cruzeiro do Sul, foi descoberta como dupla por Fontenay em 1685.[1] A partir daí, a busca foi generalizada e todo o céu foi examinado para identificar estrelas duplas até uma magnitude aparente limite de aproximadamente 9,0.[7] Pelo menos uma em cada 18 estrelas com brilho maior que a magnitude 9,0, na metade setentrional do céu, é conhecida como estrela dupla visível com um telescópio de 910 mm.[8]

As categorias, não relacionadas entre si, de duplas ópticas e binárias verdadeiras são agrupadas por razões históricas e práticas. Quando Mizar foi descoberta como binária, era muito difícil determinar se uma estrela dupla era um sistema binário ou apenas uma dupla óptica. Telescópios melhores, espectroscopia[9] e fotografia são as ferramentas básicas para fazer a distinção. Depois que Mizar foi definida como uma binária visual, descobriu-se que os seus componentes, por sua vez, eram binárias espectroscópicas.[10]

Observação de estrelas duplas[editar | editar código-fonte]

Astrônomos também registraram erradamente observações de uma estrela dupla em lugar de J900 e uma estrela tênue da constelação de Gemini.[11]

A observação de estrelas duplas visuais por medição visual define a separação, ou distância angular, entre as duas estrelas componentes, bem como o ângulo de posição. O ângulo de posição indica a direção em que as estrelas estão separadas e é definido como a orientação do componente mais brilhante para o menos brilhante, em que o norte é 0°.[12] Essas medições são chamadas medidas. Na medida de uma binária visual, o ângulo de posição muda progressivamente e a separação entre as duas estrelas oscila entre os valores máximo e mínimo. Registrando-se as medidas em um plano produz-se uma elipse. Esta é a órbita aparente, a projeção da órbita das duas estrelas na esfera celeste; a órbita real pode ser calculada a partir dela.[13] Embora se imagine que a maioria das duplas visuais catalogadas sejam binárias visuais,[14] as órbitas foram calculadas para apenas alguns milhares dentre as mais de 100 mil estrelas duplas visuais conhecidas.[15][16]

Distinção entre estrelas binárias e outras estrelas duplas[editar | editar código-fonte]

Estrelas duplas visuais podem ser distinguidas das estrelas binárias pela observação do seu movimento relativo. Se o movimento é parte de uma órbita, ou se as estrelas têm velocidades radiais similares, ou ainda se a diferença em seus movimentos próprios for pequena comparada com o seu movimento próprio comum, o par é provavelmente físico. Quando observados por um curto período de tempo, os componentes tanto de duplas ópticas quanto de binárias visuais de longo período parecem se mover em linhas retas; por este motivo, pode ser difícil distinguir entre essas duas possibilidades.[17]

Designações[editar | editar código-fonte]

Algumas estrelas duplas visuais brilhantes têm uma designação de Bayer. Neste caso, os componentes podem ser designados por um sobrescrito. Um exemplo é α Crucis (Acrux), cujos componentes são α1 Crucis e α2 Crucis. Como α1 Crucis é uma binária espectroscópica, ela é na verdade uma estrela múltipla. Sobrescritos também são usados para distinguir pares de estrelas mais distantes, fisicamente não relacionadas, com a mesma designação de Bayer, tais como α1,2 Capricorni (separados por 0,11°), ξ1,2 Centauri (separados por 0,66°) e ξ1,2 Sagittarii (separados por 0,46°). Esses pares ópticos são distinguíveis a olho nu.

Fora esses pares, os componentes de uma estrela dupla são geralmente denotados pelas letras A (para a estrela mais brilhante, primária) e B (para a estrela mais fraca, secundária) acrescidos à designação, de qualquer tipo, da estrela dupla. Por exemplo, os componentes de α Canis Majoris (Sirius) são α Canis Majoris A e α Canis Majoris B (Sirius A e Sirius B); os componentes de 44 Boötis são 44 Boötis A e 44 Boötis B; os componentes de ADS 16402 são ADS 16402A e ADS 16402B, e assim por diante. As letras AB podem ser usadas juntas para designar o par. No caso de estrelas múltiplas, as letras C, D e seguintes podem ser usadas para denotar componentes adicionais, frequentemente em ordem crescente da separação em relação à estrela mais brilhante, A.[18]

Designações dos descobridores de estrelas duplas[19]
Descobridor Código tradicional Código WDS
Observatório de Brisbane Brs0 BSO
S. W. Burnham β BU
James Dunlop Δ DUN
William Herschel H I, II, etc. H 1, 2, etc.
N. Lacaille Lac LCL
F. G. W. Struve Σ STF
Struve Appendix Catalogue I Σ I STFA
Struve Appendix Catalogue I Σ II STFB
Otto Struve STT
Pulkova Appendix Catalogue OΣΣ STTA

Duplas visuais também são designadas por uma abreviação do nome do seu descobridor seguida por um número de catálogo único para aquele observador. Por exemplo, o par α Centauri AB foi descoberto por Father Richaud em 1689, e, portanto, é designado RHD 1.[1][20] Outros exemplos são Δ65, a 65ª dupla descoberta por James Dunlop, e Σ2451, descoberta por F. G. W. Struve.

O Catálogo de Estrelas Duplas Washington, uma grande base de dados de estrelas duplas e múltiplas, contém cerca de 100 mil entradas,[15] cada uma indicando as medidas para a separação dos componentes. Cada estrela dupla é uma entrada no catálogo; estrelas múltiplas com n componentes são representadas por entradas no catálogo para n-1 pares, cada uma indicando a separação de um componente para outro. Códigos como AC são usados para denotar quais componentes estão sendo medidos – neste caso, o componente C em relação ao componente A. Isto pode ser alterado para uma forma como AB-D, para indicar a separação de um componente para um par de componentes próximos (neste caso, o componente D em relação ao par AB). Códigos como Aa podem também ser usados para denotar um componente que está sendo medido em relação a outro componente, A neste caso.[21] Designações de descobridor são também relacionadas; entretanto, abreviações tradicionais de descobridor como Δ e Σ foram codificadas em uma sequência de letras romanas maiúsculas, de modo que, por exemplo, Δ65 ficou DUN 65 e Σ2451 ficou STF2451. Exemplos adicionais são mostrados na tabela ao lado.[19][22]

Exemplos[editar | editar código-fonte]

Representação artística dos discos em torno das estrelas jovens HK Tauri A e B.[23]

Binárias visuais[editar | editar código-fonte]

Duplas ópticas[editar | editar código-fonte]

Incertas[editar | editar código-fonte]

  • Sistema Alpha Centauri (AB) e Proxima Centauri (logo, α Cen C): associação é geralmente considerada um sistema fisicamente conectado.
  • Sistema Castor (Aa/Ab/Ba/Bb) e YY Geminorum (logo, Castor Ca/Cb) é geralmente considerado um sistema físico.
  • Sistema Mizar (Aa/Ab/Ba/Bb) e Alcor (ela própria, uma binária, logo Mizar CaCb, embora geralmente não considerado físico até 2009).

Referências

  1. a b c The Binary Stars, Robert Grant Aitken, New York: Dover, 1964, p. 1.
  2. a b Heintz, W. D. (1978). Double Stars. [S.l.]: D. Reidel Publishing Company, Dordrecht. p. 17. ISBN 90-277-0885-1 
  3. Heintz, W. D. (1978). Double Stars. [S.l.]: D. Reidel Publishing Company, Dordrecht. pp. 4–10. ISBN 90-277-0885-1 
  4. http://hubblesite.org/newscenter/archive/releases/2006/02/image/f/
  5. «A New View of Mizar»  Leos Ondra, acessado on line em 26/5/2007.
  6. Aitken, Robert G. (1935). The Binary Stars. New York: McGraw-Hill. 1 páginas 
  7. See The Binary Stars, Robert Grant Aitken, New York: Dover, 1964, pp. 24–25, 38, and p. 61, The present status of double star astronomy, K. Aa. Strand, Astronomical Journal 59 (March 1954), pp. 61–66, Bibcode1954AJ.....59...61S.
  8. The Binary Stars, Robert Grant Aitken, New York: Dover, 1964, p. 260.
  9. Fraunhofer, 1814
  10. Pickering, 1889
  11. «Masquerading as a double star». ESA/Hubble Picture of the Week. Consultado em 25 de março de 2013 
  12. p. 2, Observing and Measuring Double Stars, Bob Argyle, ed., London: Springer-Verlag, 2004, ISBN 1-85233-558-0.
  13. p. 53–67, Observing and Measuring Double Stars, Bob Argyle, ed., London: Springer-Verlag, 2004, ISBN 1-85233-558-0.
  14. Heintz, W. D. (1978). Double Stars. Dordrecht: D. Reidel Publishing Company. p. 12. ISBN 90-277-0885-1 
  15. a b "Introduction and Growth of the WDS", The Washington Double Star Catalog, Brian D. Mason, Gary L. Wycoff, and William I. Hartkopf, Astrometry Department, United States Naval Observatory, acessado on line em 20/8/2008.
  16. «Sixth Catalog of Orbits of Visual Binary Stars»  William I. Hartkopf and Brian D. Mason, United States Naval Observatory, acessado on line em 20/8/2008.
  17. Heintz, W. D. (1978). Double Stars. Dordrecht: D. Reidel Publishing Company. pp. 17–18. ISBN 90-277-0885-1 
  18. Heintz, W. D. (1978). Double Stars. Dordrecht: D. Reidel Publishing Company. p. 19. ISBN 90-277-0885-1 
  19. a b p. 307–308, Observing and Measuring Double Stars, Bob Argyle, ed., London: Springer-Verlag, 2004, ISBN 1-85233-558-0.
  20. Entry 14396-6050, discoverer code RHD 1AB,The Washington Double Star Catalog, United States Naval Observatory. Acessado on line em 20/8/2008.
  21. «Format of the current WDS». Consultado em 21 de fevereiro de 2017. Arquivado do original em 12 de abril de 2008 , Washington Double Star Catalog, United States Naval Observatory. Acessado on line em 26/8/2008.
  22. «References and discoverer codes, The Washington Double Star Catalog»  United States Naval Observatory. Acessado on line em 20/8/2008.
  23. «ALMA Finds Double Star with Weird and Wild Planet-forming Discs». ESO Press Release. Consultado em 1 de agosto de 2014