Golpe de Estado no Peru em 1919

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O golpe de Estado no Peru de 1919 foi um golpe de Estado perpetrado em 4 de julho pelo então candidato presidencial e ex-presidente Augusto B. Leguía, com o apoio da gendarmaria de Lima, contra o governo cessante de José Pardo y Barreda. O resultado do golpe foi exitoso para Leguía, que iniciou um processo político conhecido como «Patria Nueva», pelo qual pretendia modernizar o país por meio de uma mudança nas relações entre o Estado e a sociedade civil,[1] e que derivou em uma ditadura de onze anos conhecida como Oncenio.[2][3][4] Este governo terminou abruptamente por outro golpe de Estado, em 1930, liderado pelo comandante Luis Miguel Sánchez Cerro.[5][6]

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Nas eleições de 1919, convocadas pelo então presidente José Pardo, apresentaram-se como candidatos Ántero Aspíllaga (presidente do oficialista Partido Civil) e o ex-presidente Augusto B. Leguía (candidato do opositor Partido Democrático Reformista), que havia governado o país entre 1908 e 1912.[7] Durante a campanha presidencial, Leguía se apresentou como o defensor dos anseios da juventude universitária e das classes trabalhadoras e populares para mudar as estruturas do país.[8] Seu triunfo se vislumbrava, pois era o candidato mais carismático.[9]

As eleições foram realizadas e o escrutínio davam Leguía como o vencedor;[10] foi então que a Corte Suprema anulou um grande número de votos que favoreciam o Partido Democrático Reformista [Nota 1] e temia-se que as eleições fossem anuladas pelo Congresso.[6][12] Diante desse panorama, e alegando que sua vitória não seria reconhecida pelo governo civilista, Leguía e seus partidários deram um golpe de Estado na madrugada de 4 de julho de 1919.[8][12][13][14]

O golpe de 4 de julho[editar | editar código-fonte]

O plano consistia em dois batalhões da gendarmeria de Lima assaltando o Palácio do Governo. O complô, iniciado em 3 de julho,[15] foi um sucesso, pois o Exército Peruano não repeliu o golpe, os marinheiros da Base Naval de Callao se inclinavam a acabar com o governo civilista,[10] e os conjurados conseguiram aprisionar o presidente José Pardo, que terminaria seu mandato em apenas 45 dias, e parte de seu governo. Leguía fez sua flamante entrada no Palácio Presidencial às seis da manhã, sendo aplaudido por tropas afins e simpatizantes civis.[16]

O comandante-em-chefe do Exército Nacional saúda os chefes e oficiais dos diferentes corpos da guarnição e da marinha, informando-os que em virtude da movimentação realizada esta manhã, foi deposto o Presidente José Pardo e proclamado o eleito pelas pessoas A.B. Leguía.[16]
Proclamação do Coronel Gerardo Álvarez, 4 de julho de 1919

Houve uma tentativa de restabelecer a ordem constitucional por parte do Coronel Samuel del Alcázar, que comandava um batalhão do Exército implantado nas ruas próximas à Plaza de Armas de Lima. Ao chegarem à sede do governo, as companhias aderiram ao golpe. Após uma breve escaramuça entre os gendarmes que resguardavam o Palácio Presidencial e as tropas que acompanhavam o Coronel Alcázar, este último foi preso. Por sua vez, o chefe do Estado-Maior, coronel Pedro Pablo Martínez, tentou reunir as tropas acantonadas no quartel de Santa Beatriz para assaltar o Palácio do Governo, mas os soldados se juntaram ao golpe, aplaudindo Leguía.[16]

Uma turba invadiu as instalações do jornal El Comercio,[12] enquanto outra incendiou a residência do presidente Pardo.[16]

Pardo foi exilado em Nova York.[6] Leguía assumiu o poder como presidente provisório e seu primeiro ato foi dissolver o Congresso,[7] que lhe era adverso.[17] Em 21 de julho, Leguía publicou um manifesto no diário oficial El Peruano justificando suas ações:

A consideração de que é um dever iniludível assegurar que o voto popular já emitido não seja frustrado, obriga-me a assumir a Liderança Suprema da República como Presidente Provisório.[18]
Augusto Leguía em manifesto à Nação, 21 de julho de 1919

O golpe de Estado foi apoiado apenas pelo Partido Constitucional do marechal e herói nacional Andrés Avelino Cáceres.[12]

Consequências[editar | editar código-fonte]

Leguía convocou um plebiscito para submeter ao voto dos cidadãos uma série de reformas constitucionais que considerava necessárias; dentre essas reformas, estava contemplada a eleição simultânea do Presidente da República e dos membros do Congresso, ambos com mandatos de cinco anos (antes, o mandato presidencial era de quatro anos e o Parlamento era renovado por terços a cada dois anos).[9] Dessa forma, queria fortalecer o Executivo frente ao Legislativo e evitar a oposição parlamentar exacerbada que havia sofrido em seu primeiro governo. Apelou ainda à realização de eleições em setembro para integrar um novo congresso constituinte, que passaria a denominar-se Assembleia Nacional, cuja missão seria a de criar uma nova Constituição Política, em substituição da Constituição de 1860, então em vigor.[19] A Assembleia foi instalada em 24 de setembro de 1919 e presidida pelo sociólogo e jurista Mariano H. Cornejo.[20] Em 12 de outubro, a Assembleia proclamou Leguía como Presidente Constitucional da República.[1][21]

Para recompensar o Exército por sua cumplicidade no golpe, o presidente Leguía promoveu ascensões entre a oficialidade.[22]

Notas e referências

Notas

  1. A Suprema Corte anulou cerca de 15.000 votos a favor de Leguía.[11]

Referências

  1. a b Historia visual del Perú (em espanhol). Lima: El Comercio. 2004. p. 191. ISBN 9972021203. OCLC 906224436 
  2. López, Félix (2010). Dos siglos de mitos mal curados (em espanhol). [S.l.]: CELARG, Fundación Centro de Estudios Latinoamericanos Rómulo Gallegos. ISBN 9803990071. OCLC 664669272 
  3. Rivera Serna, Raúl (1974). Historia del Perú, República 1822-1968 (em espanhol). [S.l.]: Editorial Jurídica. p. 187 
  4. Basadre, Jorge; López Martínez, Héctor (2005). Historia de la República del Perú (1822-1933) (em espanhol). 14 9ª ed. Lima: El Comercio. pp. 20–25. ISBN 9972205622. OCLC 71830020 
  5. «Sucedió. El caso Leguía». larepublica.pe (em espanhol). 22 de maio de 2019 
  6. a b c «¿Quiénes fueron los presidentes peruanos destituidos o forzados a renunciar?». larepublica.pe (em espanhol). 29 de julho de 2019 
  7. a b Pons Muzzo 1980, p. 212.
  8. a b Orrego, Juan Luis (23 de junho de 2019). «Historia: Se cumplen 100 años del golpe de Leguía». El Comercio (em espanhol) 
  9. a b Contreras, Carlos; Cueto, Marcos (2016). Tomo 6: Oncenio de Leguía. La Patria Nueva y la crisis mundial (1919-1933). Col: Historia del Perú republicano (em espanhol). Lima: Editorial Septiembre. p. 8. ISBN 978-612-308-174-4 
  10. a b Basadre 1998, p. 2865.
  11. Basadre 1998, p. 2862.
  12. a b c d López Martínez, Héctor (4 de julho de 2019). «El cuartelazo de Leguía». El Comercio (em espanhol) 
  13. Barra, Felipe de la (1967). Objetivo: Palacio de Gobierno; reseña histórico-cronológica de los pronunciamentos políticos y militares de la conquista a la república y que permitieron la ocupación del Palacio de Gobierno (em espanhol). Lima: J. Mejia Baca. p. 138. OCLC 954669847 
  14. Quiroz, Alfonso W. (22 de outubro de 2014). Historia de la corrupción en el Perú (em espanhol). [S.l.]: Instituto de Estudios Peruanos. p. 296. ISBN 9789972515071 
  15. Basadre 1998, p. 2863.
  16. a b c d Basadre 1998, p. 2864.
  17. Ramos, Javier Alejandro (9 de agosto de 2019). «A 100 años del Oncenio». elperuano.pe (em espanhol) 
  18. «Manifiesto del Sr. Leguía» (PDF). El Peruano. 21 julho de 1919 
  19. Parodi, Daniel (6 de outubro de 2019). «¿Cuántas veces se ha disuelto el Congreso de la República?». El Comercio (em espanhol) 
  20. Basadre 2005, p. 37.
  21. Basadre 2005, pp. 39-40.
  22. Basadre 1998, p. 2867.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]