Usuário:Yleite/Vantagem do heterozigoto

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A vantagem do heterozigoto comumente chamado de sobredominância reflete o caso dos heterozigotos que possuem valores adaptativos maiores do que os dos homozigotos, tanto recessivos, quanto dominantes. Os seres humanos possuem um número grande de genes. O número exato ainda é desconhecido, mas as estimativas variam entre 23.000 a 75.000 genes. Ocasionalmente, um ou outro gene sofre mutação que em grande parte das vezes é maléfica causando alguma doença genética ou algum problema anatômico, mas, como esses genes não são vantajosos para o indivíduo, o gene mutante tende a desaparecer por seleção natural. No entanto, por vezes, observa-se uma prevalência consideravelmente grande de doenças genéticas recessivas dentro de uma população (geralmente uma maior prevalência do que seria estimado). Por serem doenças recessivas, para ela ser expressa no indivíduo é necessário que haja duas cópias desse gene. Caso o indivíduo tenha uma cópia apenas, ele será, então, portador da doença.[1] Estudos têm relatado que existe, frequentemente, uma vantagem de ser portador de certas doenças de relativa prevalência em certas populações. Essa vantagem mantém o gene circulando em uma taxa superior à média dentro de uma população, uma vez que os portadores possuem uma vantagem que os não portadores não irão apresentar.

Drosophila melanogaster: modelo de estudo para a confirmação da vantagem heterozigótica[editar | editar código-fonte]

Muitos cientistas observaram que os heterozigotos possuíam valores adaptativos superiores aos os homozigotos. Para provar que polimorfismos são mantidos quando existe alguma vantagem pelo heterozigoto o cientista Hans Kalmus[2] fez um estudo muito importante para elucidar a dúvida que pairava sobre muitos pesquisadores. Hans avaliou e identificou um alelo mutante de uma herança autossômica que expressava a cor ébano e mais algumas vantagem seletivas num padrão dominante.Porém esse mesmo alelo, quando recessivo, transmitia várias desvantagens ao indivíduo. Uma vez que a mosca herdou duas cópias dessa mutação, a cor ébado foi associada com aptidão bem menor e com uma desvantagem considerável de se reproduzir. Se a desvantagem da fraqueza fosse o único efeito do alelo mutante a seleção natural iria atuar para abominar esse gene. No entanto, as drosófilas portadoras de um único alelo foram beneficiadas com vantagens. O homozigoto selvagem não possuía as desvantagens mas também não era beneficiado e se comparado com os heterozigotos eles sofrem uma desvantagem na melhor aptidão para a sobrevivência e reprodução. A mutação, a uma primeira vista tende a parecer desvantajosa, mas os heterozigotos foram beneficiados. O fato dela ter se mantido em aproximadamente 8% a 30% da população de Drosófila melanogaster demonstra que apresentar a heterozigose para esse gene é extremamente vantajoso principalmente em ambientes com temperaturas mais baixa e mais secas.

Por que manter um polimorfismo nas populações humanas?[editar | editar código-fonte]

Um polimorfismo pode ser mantido por seleção natural quando existe vantagem do heterozigoto. Assim, exemplificando um caso em que o heterozigoto é bem mais adaptado do que os dois homozigotos: os genótipos (AA) possuem valor adaptativo de (1-s), (Aa) possui valor adaptativo de (1) e (aa) com valor adaptativo de (1-t), onde s e t são coeficientes de seleção e possuem valores entre 0 e 1. A partir desses valores adaptativos, três possibilidades de equilíbrio existirão. De acordo com a Lei do Equilíbrio de Hardy-Weinberg em que p + q = 1, teremos que dessas três possibilidades, duas são comuns: p= 1 e p = 0. Essas duas possibilidades de equilíbrio são estáveis, já a terceira possui os dois genes. Essa condição em que uma população apresenta mais de um gene é chamada de polimorfismo. No equilíbrio os dois genes devem possuir a mesma chance de serem removidos pela seleção. Se um gene possui uma chance maior de ser removido então a freqüência do outro irá aumentar, ou vice versa. A partir do momento em que a chance para os genes é a mesma as freqüências gênicas serão estáveis. Observa-se que um gene (A) poderá estar tanto em homozigose (AA) (com chance p) e que terá uma chance s de vir a falecer, como em um heterozigoto (Aa) (com chance q), que sobreviverá. A chance de esse gene ser eliminado é, pois, (ps). Da mesma forma ocorre com um gene (a). Ele poderá estar em homozigose (aa) (com chance q) que acabará tendo uma chance t de vir a falecer. A sua chance de ser eliminado em homozigose será de (qt). No equilíbrio [p*s=q*t]. Substituindo: [p*s= (1-p*)t] e rearranjando: [p*=t (s+t)]. Substituindo q = (1-p), q*=s/(s+t), temos, assim, a derivação das freqüências gênicas no equilíbrio quando ambos os homozigotos dominantes e recessivos possuem valores adaptativos menores que os heterozigotos. Mesmo os homozigotos sendo inferiores e por motivos óbvios serem selecionados de forma desfavorável o equilíbrio possuirá todos os três genótipos. Os homozigotos continuarão a existir porque é impossível eliminá-los. Cruzamentos entre heterozigotos geram homozigotos. A freqüência gênica exata é dependente da seleção relativa contra os dois homozigotos. Se caso, (AA) e (aa) possuírem valores adaptativos iguais, então s=t e p=1/2, isso, no equilíbrio. Se (AA) for não tão bem adaptado quanto (aa), então s>t e p<1/2; os genótipos que existem em menor número são os mais fortemente selecionados.[3] Quando os heterozigotos são mais bem–adaptados do que os homozigotos, consequentemente, a seleção natural irá manter um polimorfismo. Fisher, em 1922, através de seus estudos e Haldane de maneira independente confirmaram essa hipótese[3].

A anemia Falciforme é um polimorfismo com vantagem do heterozigoto[editar | editar código-fonte]

Um clássico exemplo de um polimorfismo mantido pela vantagem do heterozigoto é a anemia falciforme. Essa doença é praticamente letal para as populações e é responsável por mais de 100 mil mortes a cada ano. Ela é causada devido a uma variante genética da α-hemoglobina o que gera uma grave alteração nos glóbulos vermelhos do indivíduo, que nesse caso, perde a forma arredondada e elástica passando a ter um aspecto endurecido e de foice. A célula com essa morfologia tem dificuldade na passagem do sangue em vasos de pequeno calibre o que compromete a oxigenação dos tecidos e provocam uma anemia severa quando os capilares bloqueados são os do cérebro. Se formos simbolizar o alelo da hemoglobina normal como (A) e o da variante como (S), então as pessoas que sofrem dessa doença são (SS). É a hemoglobina (S) então, que irá conferir todas essas características desvantajosas para a célula. O fato é que 80% dos indivíduos que têm anemia falciforme (SS) morrem antes de se reproduzirem. Alguns pesquisadores compararam o mapa de incidência de malária com as freqüências do alelo (S). Eles observaram que em locais os quais a incidência de malária é grande a freqüência da hemoglobina (S) também é grande. Eles observaram que com uma seleção tão aparentemente forte contra a hemoglobina (S), ela ter persistido com uma freqüência de 10% ou mais em algumas populações humanas não seria por coincidência. Eles então começaram a acreditar que a hemoglobina (S) pudesse fornecer alguma vantagem em zonas onde a malária é disseminada. Allison[4] (1954) em seu trabalho mostrou que (SS) é extremamente prejudicial porque é letal, porém, o heterozigoto (AS) é mais resistente (AA) malária do que o homozigoto (AA). A razão desse fato ocorrer é devido as hemácias AS não possuírem, normalmente, a forma de foice, a menos que a concentração de oxigênio diminua. Quando o parasita da malária, Plasmodium falciparum, contamina uma hemácia ele acaba destruindo a hemoglobina. A destruição das hemoglobinas resulta na baixa concentração de oxigênio. A célula em forma de foice é destruída, assim, junto com o parasita. Porém, a pessoa sobrevive pois a maioria das hemácias não está infectada e transporta oxigênio de maneira normal. Ou seja, em localidades onde Plasmodium falciparum é comum, as pessoas (AS) sobrevivem melhor que as (AA) que sofrem de malária. Quando os heterozigotos mostram fisiologicamente possuírem uma vantagem que os homozigotos não apresentam, as freqüências genotípicas dos adultos podem ser usadas para calcular o valor adaptativo aos três genótipos. O genótipo (AA) teria um valor adaptativo de (1-s). O genótipo (AS) teria um valor adaptativo de (1) e o genótipo (SS) teria (1-t). Se a frequência do gene A=P e a do gene S=q, temos que as freqüências genotípicas entre os adultos serão: p²(1-s):2pq:q²(1-t). Caso não exista seleção, então (s=t=0), assim, os três genótipos teriam as freqüências de Hardy-Weinberg de p²:2pq:q². A seleção natural instiga desvios nas freqüências de Hardy-Weinberg. A razão da freqüência observados nos adultos que não sofrem de anemia falciforme e nem são portadores do gene (S) ou seja, (AA) é de (1-s)/1. A freqüência esperada é de p², onde p é a proporção de (AA) que foi observada, mais a metade da proporção observada de (AS). Esse método só é avaliado se os desvios das proporções e Hardy-Weinberg são causados por vantagem do heterozigoto e os genótipos serem diferentes apenas na sua chance de sobrevivência. O fato é: a ocorrência maior de heterozigotos demonstra que eles possuem valor adaptativo maior. Todavia, existe também a possibilidade de ser por outras razões. Cruzamentos preferenciais negativos também produzem o mesmo resultado. Mas, para a anemia falciforme, todas as observações demonstram que o heterozigoto é muito mais adaptado. Além disso, nesse caso, embora não tenha sido avaliado se os cruzamentos foram ou não aleatórios, a enorme letalidade dos (SS) significa que os cruzamentos preferenciais negativos não importantes.[3]

A Fibrose Cística também é um polimorfismo onde os heterozigotos são favorecidos.[editar | editar código-fonte]

A fibrose cística é uma doença genética recessiva provocada por uma mutação no gene CFTR. Esse gene é responsável pelo transporte de íons cloreto para dentro e fora das células. Se o indivíduo possuir os dois genes mutantes da fibrose cística, ele irá desenvolver a doença. A fibrose cística altera a produção do suor, dos sucos digestivos e do muco. Pode também causar a obstrução do pâncreas, o que leva ao indivíduo ter dificuldade na digestão dos alimentos e, além disso, a doença também causa secreções pulmonares engrossadas o que leva a infecções pulmonares e até a morte. A fibrose cística é uma doença bastante comum entre os europeus. A maior incidência é na Irlanda, onde uma em cada dezenove pessoas é portadora da doença. Com uma alta concentração de portadores em uma área geográfica específica, os pesquisadores levantaram a hipótese de que ter o gene da doença poderia ser vantajoso de alguma forma. Foi observado que os portadores da mutação genética CFTR têm uma vantagem sobre aqueles que não possuem esse gene. Certas doenças como a cólera e o tifo, na maioria das vezes provocam um desequilíbrio eletrolítico e uma desidratação extremamente grave devido a diarréias agudas. Em um estudo realizado pela Universidade de Chapell Hill, na Carolina do Norte (EUA). Camundongos portadores da doença foram infectados com a bactéria da cólera, porém nenhum deles teve desidratação e seus intestinos não liberaram fluidos por não terem seus canais de cloreto abertos e funcionando adequadamente. Apresentar a fibrose cística não é benéfico, mas ser apenas portador do gene é uma vantagem para essas populações. Em heterozigotos existe um equilíbrio alcançado. O portador da mutação CFTR não terá a doença, mas terá apenas a metade dos canais de cloreto. Ou seja, com metade dos canais de cloreto, haverá um limite da quantidade de líquido perdido devido à diarréia no caso desse indivíduo ser contaminado por cólera ou pelo tifo. Mas, por que a vantagem de ser limitada à população européia? Tifo e a cólera são doenças que são disseminadas por todo o globo, porém, o aumento e portadores de fibrose cística é observado na região norte da Europa, e uma hipótese podem explicar esse relato: portadores do gene CFTR vão perdendo mais sal no suor e essa é uma clara desvantagem em localidades com clima mais quente, uma vez que em climas quentes o indivíduo sua mais e isso acarretaria em uma desidratação. Para aqueles indivíduos que residem em áreas mais quentes ser portador do gene CFTR não seria vantajoso. Já em climas frios, no entanto, o fato de ser portador da fibrose cística oferece proteção aos sintomas terríveis da cólera e tifo os indivíduos não sofrem de desidratação devido ao clima. [1]

A vantagem do heterozigoto está intimamente ligada a preferência dos parceiros[editar | editar código-fonte]

Estudos de Penn[5] e colaboradores inferem que as mulheres têm preferência por homens heterozigotos e os escolhem através de seus odores. A hipótese levantada por eles afirma que mais alelos diferentes conferem maior aptidão para o indivíduo no combate a muitas doenças e assim, aumentando a taxa de sobrevivência do mesmo. Homens que superam diversas doenças demonstram que seu valor adaptativo é mais alto do que se comparado aos que são sucumbidos por elas. As mulheres tendem a ser atraídas por diversos motivos, mas um deles, sendo, pois, até um dos principais é a probabilidade de seus descendentes serem tão fortes quanto o pai.

Vantagem do heterozigoto x efeito materno[editar | editar código-fonte]

O efeito materno é uma hipótese que inviabiliza a vantagem do heterozigoto, pois ela credita o benefício a alelos que são transmitidos por efeito materno ou efeito paterno. Um exemplo seria a transmissão de alelos mutantes no loco do gene RB1 para retinoblastoma. Alguns autores observaram que a freqüência de transmissão do loco RB1 é devida ao sexo parental e não a vantagem do heterozigoto, porém muitas das diferenças não são estatisticamente significativas e, além disso, essa hipótese leva a distorção da razão mendeliana. Por apresentar pouca literatura que aborda a fundo essa hipótese, atualmente a vantagem do heterozigoto é muito mais aceita.[6]

Conclusões[editar | editar código-fonte]

O valor adaptativo de um genótipo pode ser dependente de sua freqüência. Quando o genótipo é raro ou comum o valor adaptativo varia de (1, 1-s ou outro valor qualquer que seja) sempre é constante, mas no caso da vantagem do heterozigoto, o valor adaptativo do genótipo aumenta ou diminui à medida que a sua freqüência aumenta na população. Esse caso é então chamado de seleção dependente de freqüência. A seleção dependente de freqüência pressupõem que o valor adaptativo dos genótipos variam de acordo com a freqüência dos mesmos. Os principais tipos são a dependência negativa da freqüência que informa que o valor adaptativo de um genótipo diminui à medida que a sua freqüência aumenta, e a dependência positiva da freqüência, no qual o valor adaptativo de um genótipo aumentará de acordo com a o aumento da sua freqüencia. Algumas vezes a seleção positiva dependente da freqüência não produz polimorfismos estáveis. Ela pode, por vezes, eliminar ativamente os polimorfismos, produzindo assim uma população geneticamente uniforme. O que ocorre é que, muitas vezes, a vantagem é do todo e não do indivíduo com vantagem heterozigótica quando o polimorfismo é raro, por isso, a freqüência desse polimorfismo para que haja benéfico real é preciso encontrar-se com uma freqüência relativamente considerável. No caso da grande parte maciça das vantagens heterozigóticas por se apresentarem em uma alta taxa de freqüência o problema da raridade não ocorre e os polimorfismo são estáveis e o número de heterozigotos, nesse caso, tenderá a aumentar sempre que a vantagem lhe oferecer mais aptidão. Existem outros estudos voltados a uma outra linha de pensamento que acreditam que a manutenção desses polimorfismos não é dada através da vantagem do heterozigoto e sim, baseada na fertilidade diferencial ou efeito parental . Alguns autores observaram uma distorção que favorecia a transmissão de alelos mutantes em áreas onde a malária não era endêmica. A partir dessas observações, esses autores acreditam que um efeito materno pode explicar tais distorções, mas por falta de estudos, a viabilidade da vantagem do heterozigoto é muito mais aceita e teorizada.

Referências

  1. a b "The Heterozygote Advantage: Examples of Disease Causing Genes that Give Humans an Edge" 2011. Disponível em http://hubpages.com/hub/The-Heterozygote-Advantage-Examples-of-Disease-Causing-Genes-that-Give-Humans-an-Edge.
  2. Kalmus, H. "Adaptive and selective responses of a population of Drosophila melanogaster containing e and e+ to differences in temperature, humidity, and to selection for development speed". Journal of Genetics, 1945.
  3. a b c Ridley, M. "Evolução". Artmed Ed., Porto Alegre, 2003.
  4. Allison, A. C. "Protection afforded by sickle-cell trait against subtertian malarial infection". British Medical Journal 1, 290-294, 1954.
  5. Penn,D. J; Damjanovich, K; Potts, W. K. "MHC heterozygosity confers a selective advantage against multiple-strain infections", Proc. Natl. Acad. Sci, U.S.A. 2002.
  6. Torres, F. R; Bonini-Domingos, C. R. "Hemoglobinas humanas – hipótese malária ou efeito materno?" Rev. bras. hematol. hemoter. 27(1):53-60, 2005.