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Campanha de desinformação ChinaAngVirus

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Postagem sobre a campanha de desinformação em russo, marcando países da Ásia Central e muçulmanos. A postagem afirma que as vacinas chinesas contém gelatina de porco e, portanto, são haram

A campanha de desinformação #ChinaAngVirus (Inglês: #ChinaIsTheVirus) foi uma campanha secreta, conduzida pelo Departamento de defesa dos Estados Unidos, de propaganda anti-vacinação na internet, no auge da pandemia de COVID-19, da primavera de 2020 à primavera de 2021. Essa campanha tinha como objetivo impedir que os cidadãos filipinos, da Ásia Central e do Oriente Médio recebessem a vacina Coronavac da Sinovac Biotech e que usassem outros suprimentos médicos chineses contra a COVID-19. A campanha de propaganda usou em média 300 contas falsas no Twitter, Facebook, Instagram e outras redes sociais, a fim de parecerem como os usuários da Internet local.

A Reuters publicou um relátorio em junho de 2024, com a descoberta da operação da campanha de propaganda e entrevistou os oficiais do Departamento de defesa dos EUA, que confirmaram as medidas deliberadas da operação.[1] Reuters disse que a iniciativa foi designada para "conter o que considerava a crescente influência da China nas Filipinas" e foi comandada pelo "[medo] que a diplomacia da COVID da China e propaganda pudessem atrair outros países do Sudeste asiático, como Camboja e Malásia, mais perto para Pequim".[1]

A divulgação pública da campanha de propaganda fez com que os legisladores do Congresso das Filipinas abrissem uma investigação a respeito dos prejuízos e danos causados pela operação, a culpabilização dos militares dos EUA na violação da lei internacional e possíveis ações legais contra as partes responsáveis.[2]

O embaixador chinês Huang Xilian (à esquerda) e o presidente filipino Rodrigo Duterte em uma cerimônia de entrega da CoronaVac em fevereiro de 2021

A China anunciou, em maio de 2020, que iria mandar máscaras, ventiladores e vacinas para os países em desenvolvimento e aos países que mais sofrem com a pandemia, como um "bem público global". As vacinas Sinovac começariam a ser distribuídas nas Filipinas em março de 2021 e seriam a principal vacina disponível para o público filipino até o começo de 2022, quando as vacinas dos EUA começassem a ser distribuídas. O presidente filipino Rodrigo Duterte solicitou à China que concedesse as vacinas as Filipinas assim que estivessem concluídas, o que foi aprovado pela China.[3]

Em junho de 2021, foram registrados mais de 1,3 milhões de casos de COVID nas Filipinas, com aproximadamente 24.000 filipinos mortos pela doença. Isso gerou a pior taxa de mortalidade entre as nações da região do Sudeste asiático. Apenas 2,1 milhões dos filipinos de 114 milhões de cidadãos foram totalmente vacinados, em comparação com o valor de referência de 70 milhões de cidadãos estabelecido pelo governo filipino, o que levou o presidente Rodrigo Duterte a fazer uma declaração pública ameaçando prender os cidadãos que não fossem vacinados.[4] Em abril de 2022, cerca de 66,7 milhões de filipinos foram totalmente vacinados, embora a resistência a vacina persistiu no país.[5]

Durante do mandato presidencial do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e até alguns meses durante o mandato de Joe Biden, os militares dos EUA criaram e usaram ao menos 300 contas falsas no Twitter para personificar cidadãos filipinos, fingindo que a vacina chinesa contra COVID-19 da Sinovac e outros produtos feitos na China, como máscaras, eram ineficazes ou perigosos. A ação ocorreu no centro de operações psicológicas dos militares dos EUA em Tampa, Flórida. As contas eram usadas pelos militares dos EUA e empreiteiros em estruturas na Base Aérea MacDill de Tampa. Os tweets postados continham a hashtag #ChinaAngVirus, significando #ChinaIsTheVirus em inglês. Muitos dos tweets postados sobre a China ser a fonte do vírus gerou a falta de confiança a respeito dos suprimentos médicos enviados pela China.[1]

Exemplos de tweets incluem:

"COVID veio da China e a vacina também veio da China, não confie na China!"
— Postado em tagalo
"Vieram da China - EPI, máscara, vacina: FALSO. Mas o Coronavirus é real."
— Postado em tagalo


A maioria dos tweets continham imagens e memes criados que associavam a China e os suprimentos médicos chineses como sendo ineficazes ou perigosos. Um oficial militar sênior alegou que o Departamento de defesa priorizou explicitamente "arrastar a China pela lama" ao invés da saúde pública, com vários diplomatas dos EUA no Sudeste Asiático tendo sua forte oposição rejeitada.[1]

A campanha de propaganda se expandiu para além das Filipinas. Foram criadas novas contas direcionadas a outros países do Sudeste Asiático, da Ásia Central e do Oriente Médio no verão de 2021. As contas criadas para países de muçulmanos postavam alegações de que a vacina Sinovac continha gelatina de porco e, portanto, não era halal e não deveria ser permitida pela lei islâmica. Algumas mensagens diretas postadas incluem:

Isso é o que os #Estados_Unidos estão oferecendo para ajudar os países, incluíndo os países árabes, a obter vacinas de #Coronavirus (#Covid_19) e mitigar os efeitos secundários da pandemia. Compare isso com a #Russia e a #China, que usam a pandemia como desculpa para expandir sua influência e lucro, embora a vacina russa seja ineficiênte e a vacina chinesa contenha gelatina de porco.
— Postado em árabe
Cientistas muçulmanos da Academia de Raza em Mumbai relataram que a vacina de coronavirus chinesa contém gelatina de porco e recomendam ser contra a vacinação com a vacina haram. A China esconde do que exatamente a droga é feita, o que causa desconfiança entre os muçulmanos.
— Postado em russo

O relatório publicado pela Reuters notou que mesmo depois de os executivos das redes sociais terem abordado a nova administração de Joe Biden sobre a campanha de desinformação da COVID-19, a operação continuou até que a administração a proibiu na primavera de 2021 e começou uma revisão interna.[1] A revisão concluiu que a campanha não teve nenhum cidadão americado como alvo.[6] Os militares dos EUA pediram aos oficiais da Meta que não retirassem o conteúdo postado nas contas. Algumas das contas envolvidas ficaram ativas no Facebook até junho de 2024.[1]

Os investigadores da Reuters entrevistaram mais de duas dúzias de autoridades e militares dos EUA para saber mais sobre as contas falsas e a razão pela qual foram utilizadas. Uma porta-voz do Pentágono afirmou que, embora os militares usassem as redes sociais para influenciar opiniões, as contas foram criadas para conter ataques de desinformação contra os Estados Unidos e os seus aliados, especificamente para combater a China, que usou as plataformas digitais para espalhar a falsa ideia de que o inicio da pandemia ocorreu pelos Estados Unidos. Ela afirmou que a campanha e outras táticas de informação usadas pelos militares dos EUA foram "deliberadas, metódicas e compreensivas".[7]

Após a descoberta da campanha de propaganda, X, antigo Twitter, deletou as contas envolvidas após as investigações concluírem que as contas apresentaram padrões de atividade irregulares. Uma investigação interna do X descobriu mais de 150 contas falsas operadas em Tampa, usando o endereço IP e dados de navegação das contas.[1]

A Embaixada das Filipinas em Washington, DC, afirmou que as descobertas sobre a campanha de propaganda merecem ser investigadas e que as autoridades dos outros países afetados mereciam saber disso.[1]

Muitos especialistas em saúde pública americanos condenaram a campanha como favorecendo a geopolítica acima das vidas humanas e meios de subsistência. Eles afirmaram que a campanha de desinformação contribuiu para uma desconfiança nas medidas governamentais de saúde pública dos Estados Unidos e no mundo todo, ao invés de apenas confiar nas medidas da China, bem como reduziu a confiança geral na segurança e eficácia das vacinas para além das vacinas Sinovac. Então, a Organização Mundial da Saúde e a conselheira da saúde das Filipinas, Doutora Nina Castillo-Caradang, afirmou que a alta taxa de mortalidade na época da campanha está relacionada a inabilidade de produzir doses substanciais de vacinas, tornando a campanha ainda mais prejudicial e mortal para o público filipino. A secretária da saúde das Filipinas, Esperanza Cabral, afirmou que a população filipina ficou muito desconfiada sobre a eficácia da vacina Sinovac, quando esta chegou às Filipinas, em março de 2021 e acreditava que a campanha contribuiu a um numero significativo de mortes desnecessárias.[1]

Um porta-voz representando a Embaixada da China em Manila denunciou a aparente "hipocrisia, intenção maligna e duplo padrão" dos militares dos EUA e como suas metas contrariaram diretamente os direitos humanos e a saúde do povo filipino.[8]

Yuan Youwei, uma porta-voz da Sinovac, afirmou que os efeitos da campanha da desinformação colaboraram com a diminuição das taxas de vacinação e confiança e nas iniciativas de saúde pública, o que gerou uma piora na propagação das doenças e também numa maior ansiedade e desconfiança do público como um todo. Ela enfatizou a missão da Sinovac na prevenção de doenças e melhora dos meios de subsistências, e que as diferentes profissões devem concentrar-se nas suas próprias especialidades.[9]

Em junho de 2024, a senadora filipina Imee Marcos e a representante da Câmara das Filipinas, France Castro, aprovaram declarações para começar uma investigação a respeito do impacto que a campanha de desinformação causou e as possíveis respostas legais para isso, caso o direito internacional fosse violado, afirmando que a campanha foi uma ameaça direta à segurança nacional das Filipinas.[2]

  1. a b c d e f g h i Bing, Chris; Schechtman, Joel (14 de junho de 2024). «Pentagon Ran Secret Anti-Vax Campaign to Undermine China during Pandemic». Reuters. Consultado em 22 de junho de 2024 
  2. a b Lema, Karen; Bing, Christopher (20 de junho de 2024). «Lawmakers in Philippines push for probe into Pentagon's anti-vax propaganda operation». Reuters. Consultado em 21 de junho de 2024 
  3. Cirineo, Julian (27 de julho de 2020). «FULL TEXT: President Duterte's State of the Nation Address 2020». Rappler (em inglês). Consultado em 21 de junho de 2024. Cópia arquivada em 21 de junho de 2024 
  4. «Philippines' Duterte threatens vaccine decliners with jail, animal drug». Reuters. 22 de junho de 2021. Consultado em 21 de junho de 2024. Cópia arquivada em 17 de maio de 2023 
  5. Villa, Kathleen de (14 de abril de 2022). «Amid push for boosters, many in PH still fear 'side effects'». Philippine Daily Inquirer (em inglês). Cópia arquivada em 13 de abril de 2022 
  6. Nakashima, Ellen (19 de setembro de 2022). «Pentagon opens sweeping review of clandestine psychological operations». The Washington Post. Consultado em 21 de junho de 2024. Cópia arquivada em 30 de dezembro de 2023 
  7. Toropin, Konstantin (14 de junho de 2024). «Pentagon Stands by Secret Anti-Vaccination Disinformation Campaign in Philippines After Reuters Report». Military.com (em inglês). Consultado em 21 de junho de 2024. Cópia arquivada em 21 de junho de 2024 
  8. «China accuses U.S. of "malign intention" to discredit its COVID vaccines». Reuters. 18 de junho de 2024. Consultado em 21 de junho de 2024 
  9. Wong, Kandy (16 de junho de 2024). «Sinovac hits back over reported US campaign to discredit China's Covid vaccine». South China Morning Post (em inglês). Consultado em 21 de junho de 2024. Cópia arquivada em 21 de junho de 2024