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Controvérsia da Revolução: diferenças entre revisões

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'''Controvérsia da Revolução''' foi um debate sobre a [[Revolução Francesa]], envolvendo diversos escritores, a partir de uma publicação de Edmund Burke. Segundo Marilyn Butler, foram seis anos de discussões, desde os primeiros comentários, em 1789, até a introdução de medidas para interromper a circulação de ideias radicais, fossem elas impressas ou faladas, pelo governo de William “[[William Pitt, o Novo|Pitt]]”, em 1795. A maioria dos britânicos celebraram a [[Tomada da Bastilha|queda da Bastilha]] em 1789, acreditando que a monarquia da França deveria ser substituída por uma forma mais democrática de governo. No entanto, em dezembro de 1795, após o [[Terror (Revolução Francesa)|período do Terror]] e da guerra com a França, foram poucos os sustentavam seu apoio.
'''Controvérsia da Revolução''' foi um debate entre escritores ingleses sobre a [[Revolução Francesa]], logo após o levante. Segundo [[Marilyn Butler]], foram seis anos de discussões, desde os primeiros comentários, em 1789, até a introdução de medidas para interromper a circulação de ideias radicais, fossem elas impressas ou faladas, pelo governo “[[William Pitt, o Novo|Pitt]]”, em 1795.<ref name="Butt, Introduction, 1">Butler, "Introdução", 1.</ref> A maioria dos britânicos celebraram a [[Tomada da Bastilha|queda da Bastilha]] em 1789, acreditando que a monarquia da França deveria ser substituída por uma forma mais democrática de governo. No entanto, em dezembro de 1795, após o [[Terror (Revolução Francesa)|Reinado do Terror]] e da guerra com a França, foram poucos que ainda apoiavam a causa francesa.


Em 1790, na obra ''Reflexões sobre a Revolução em França'', o inglês [[Edmund Burke]] inflamou outros pensadores por suas ideias de patriotismo e apoio à conservação do sistema aristocrático de governo. As réplicas de [[William Godwin]],&nbsp;[[Thomas Paine]] e [[Mary Wollstonecraft]] conduziram o debate com tons republicanos, socialistas e anarquistas. Alfred Cobban chama o debate que entrou em erupção, "talvez a última discussão real dos fundamentos da política" na Grã-Bretanha.<ref>Qtd. em Butler, "Introdução", 1.</ref> e os temas por ele mobilizados foram centrais para o [[Cartismo|movimento radical operário na Grã-Bretanha no século XIX]] e para o [[Romantismo]] inglês.
Em 1790, na obra ''Reflexões sobre a Revolução em França'', o inglês [[Edmund Burke]] inflamou outros pensadores que rebateram suas ideias de patriotismo e apoio à conservação do sistema aristocrático de governo. As réplicas de [[William Godwin]],&nbsp;[[Thomas Paine]] e [[Mary Wollstonecraft]]<ref name="Butt, Introduction, 1" /> conduzem o debate com tons republicanos, socialistas e anarquistas. Os temas articulados por aqueles que responderam Burke se tornaram uma característica central do [[Cartismo|movimento radical operário na Grã-Bretanha no século XIX]] e do [[Romantismo]].<ref name="Butler, Introduction, 12">Butler, "Introdução", 1.</ref> [[Alfred Cobban]] chama o debate que entrou em erupção, "talvez a última discussão real dos fundamentos da política" na Grã-Bretanha.<ref>Qtd. em Butler, "Introdução", 1.</ref>


== Reflexões de Edmund Burke ==
== Reflexões de Edmund Burke ==
[[Ficheiro:EdmundBurke1771.jpg|miniaturadaimagem|Edmund Burke|215x215px]]
[[Ficheiro:EdmundBurke1771.jpg|miniaturadaimagem|Edmund Burke|215x215px]]
Membro do [[Partido Whig (Reino Unido)|''Whig Party'']], partido político britânico que reunia tendências liberais, Burke defendia que os acontecimentos desencadeados durante a Revolução Francesa, não passavam de uma guerra partidária entre a antiga ordem civil, política e moral em face de uma seita de ateístas fanáticos e ávidos para inverter a ordem social que aspiravam pelo império universal a partir da França.
Membro do [[Partido Whig (Reino Unido)|''Whig Party'']], partido político britânico que reunia tendências liberais, Burke defendia que os acontecimentos desencadeados durante a Revolução Francesa, não passavam de uma guerra partidária entre a antiga ordem civil, política e moral em face de uma seita de ateístas fanáticos e ávidos para invertera ordem social que aspiravam pelo império universal a partir da França.


Para Burke, a [[Dia da Independência dos Estados Unidos|crise americana]] (julho de 1776), a qual nunca chamou de revolução, era uma oposição ao inadequado modelo de governo na Inglaterra, ao passo que suas vertentes na França tomavam formas de entusiasmo por uma nova teoria sobre o homem e a sociedade, referindo-se ao [[Iluminismo]]. Ao se basear nos ditames para justificar uma reforma gradual e incremental, defendeu que a revolução na França abalaria bem mais do que as estruturas políticas vigentes, e que o movimento não se tratava da soberania partidária ou governamental, mas de uma mobilização que causaria impactos que viriam a desestruturar toda uma sociedade.
Para Burke, a [[Dia da Independência dos Estados Unidos|independência dos Estados Unidos]] (julho de 1776), a qual nunca chamou de revolução, era uma oposição ao inadequado modelo de governo da Inglaterra, ao passo que suas vertentes na França tomavam formas de entusiasmo por uma nova teoria sobre o homem e a sociedade, referindo-se ao [[Iluminismo]]. Ao se basear nos ditames para justificar uma reforma gradual e incremental, defendeu que a revolução na França abalaria bem mais do que as estruturas políticas vigentes, e que o movimento não se tratava da soberania partidária ou governamental, segundo Burke, essa mobilização causaria impactos que viriam a desestruturar toda uma sociedade.


Na obra
Na obra
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== Reflexões sobre a Revolução em França ==
== Reflexões sobre a Revolução em França ==
[[Ficheiro:BurkeReflections.jpg|miniaturadaimagem|433x433px]]
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O texto evidencia que Burke agia enviando cartas criticando a Revolução Francesa desde a queda da Bastilha, e essa primeira fase de ação se deve ao receio que tais ideais chegassem à Inglaterra, sendo o primeiro a alertar tais perigos no país. Ele decidiu publicar este livro por acreditar que a revolução deveria honrar um dos seus principais lemas - a liberdade -, afirmando que a instauração de um governo autoritário era uma situação de contradição por parte dos revolucionários; pregava que os escritos iluministas deveriam cair na ilegalidade. Na época em que publicou a obra, passava por dificuldades financeiras, portanto chegou a ser apontado por alguns como um interesseiro que fora subornado para escrever a obra. Defensor do catolicismo, tinha o protestantismo como uma ideologia inaceitável.
O texto evidencia que Burke agia enviando cartas criticando a Revolução Francesa desde a queda da Bastilha, e essa primeira fase de ação se deve ao receio que tais ideais chegassem à Inglaterra, sendo o primeiro a alertar tais perigos no país. Ele decidiu publicar este livro por acreditar que a revolução deveria honrar um dos seus principais lemas - a liberdade -, afirmando que a instauração de um governo autoritário era uma situação de contradição por parte dos revolucionários; pregava que os escritos iluministas deveriam cair na ilegalidade. Na época em que publicou a obra, passava por dificuldades financeiras, portanto chegou a ser apontado por alguns como um interesseiro que fora subornado para escrever a obra. Defensor do catolicismo, tinha o protestantismo como uma ideologia inaceitável. É de grande notoriedade os três estilos assumidos por Burke na escrita de seu livro: o estilo Whig - fazendo referência ao partido liberal britânico-&nbsp; apresentando racionalidade e perspicácia no objetivo de persuadir a todos explicando que tinham muito a perder ao apoiar a revolução; outro estilo foi o nomeado como [[Jacobitismo|jacobita]], que mostrava algumas ideias advindas do [[gongorismo]] - estilo literário vigente na época que demonstra extravagância, exagero de metáforas e comparações, além de uma linguagem rebuscada e soturna; por fim, e não menos importante, está a ironia - marca registrada da literatura irlandesa -, administrada de maneira agressiva na maioria das vezes. Burke costumava mesclar o estilo Whig com os outros dois estilos individualmente.

É de grande notoriedade os três estilos assumidos por Burke na escrita de seu livro: o estilo Whig - fazendo referência ao partido liberal britânico-  apresentando racionalidade e perspicácia no objetivo de persuadir a todos explicando que tinham muito a perder ao apoiar a revolução; outro estilo foi o nomeado como [[jacobita]], que mostrava algumas ideias advindas do [[gongorismo]] - estilo literário vigente na época que demonstra extravagância, exagero de metáforas e comparações, além de uma linguagem rebuscada e soturna; por fim, e não menos importante, está a ironia - marca registrada da literatura irlandesa -, administrada de maneira agressiva na maioria das vezes. Burke costumava mesclar o estilo Whig com os outros dois estilos individualmente.


=== Argumentos ===
=== Argumentos ===
* “O espírito da renovação total e radical; a destruição de todos os direitos consagrados pela tradição; o confisco da propriedade, a destruição da Igreja, da nobreza, da família, dos costumes, da veneração aos ancestrais, da nação - esse é o catálogo de tudo aquilo que Burke odiava nos seus momentos sombrios, e todos esses elementos ele encontraria no marxismo.”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=03|páginas=}}</ref>;
* “O espírito da renovação total e radical; a destruição de todos os direitos consagrados pela tradição; o confisco da propriedade, a destruição da Igreja, da nobreza, da família, dos costumes, da veneração aos ancestrais, da nação - esse é o catálogo de tudo aquilo que Burke odiava nos seus momentos sombrios, e todos esses elementos ele encontraria no marxismo.”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=03|páginas=}}</ref>;
* “Ele enfatiza sua ignorância sobre o estado atual da situação e desconfia do seu próprio julgamento 'Se eu me pareço'... diz ele, 'expressar-me em uma linguagem de desaprovação, seja gentil em olhá-la como uma mera expressão de dúvida'. Ele explica qual a liberdade que ele admira: 'a liberdade a qual me refiro é a liberdade social. É aquele estado de coisas no qual a liberdade é garantida pela igualdade na aplicação de sanções, um estado de coisas no qual a liberdade de nenhum homem, de nenhum grupo de homens e de nenhuma corporação de homens possa ter meios de se impor à liberdade de qualquer homem ou de qualquer grupo de homens na sociedade. (...)'”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=|páginas=5-6}}</ref>;
* “Ele enfatiza sua ignorância sobre o estado atual da situação e desconfia do seu próprio julgamento 'Se eu me pareço'... diz ele, 'expressar-me em uma linguagem de desaprovação, seja gentil em olhá-la como uma mera expressão de dúvida'. Ele explica qual a liberdade que ele admira: 'a liberdade a qual me refiro é a liberdade social. É aquele estado de coisas no qual a liberdade é garantida pela igualdade na aplicação de sanções, um estado de coisas no qual a liberdade de nenhum homem, de nenhum grupo de homens e de nenhuma corporação de homens possa ter meios de se impor à liberdade de qualquer homem ou de qualquer grupo de homens na sociedade. (...)'”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=|páginas=5-6}}</ref>;
* “Tivesse ele nascido em circunstâncias sociais similares em Arras em 1750 ou em Dublin ou Belfast em 1760, ele provavelmente teria sido um revolucionário perigoso, já que era inteligente. Mary Wollstonecraft pensou dessa forma: 'Lendo as suas “Reflexões” demoradamente, cheguei à conclusão de que, se você tivesse sido francês e apesar de seu respeito pela hierarquia e autoridade, você teria sido um revolucionário violento.'”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=|páginas=08}}</ref>;
* “Tivesse ele nascido em circunstâncias sociais similares em Arras em 1750 ou em Dublin ou Belfast em 1760, ele provavelmente teria sido um revolucionário perigosos, já que era inteligente. Mary Wollstonecraft pensou dessa forma: 'Lendo as suas “Reflexões” demoradamente, cheguei à conclusão de que, se você tivesse sido francês e apesar de seu respeito pela hierarquia e autoridade, você teria sido um revolucionário violento.'”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=|páginas=08}}</ref>;
* “Burke pode não ter visto 'nenhuma razão para abandonar' a Igreja da Inglaterra, mas as suas tradições familiares eram tão fortes - e seus sentimentos também - que não lhe era possível encarar os ataques feitos à Igreja de Roma com a típica atitude inglesa, ou seja, com indiferença, complacência e uma certa aprovação.”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=12|páginas=}}</ref>;
* “Burke pode não ter visto 'nenhuma razão para abandonar' a Igreja da Inglaterra, mas as suas tradições familiares eram tão fortes - e seus sentimentos também - que não lhe era possível encarar os ataques feitos à Igreja de Roma com a típica atitude inglesa, ou seja, com indiferença, complacência e uma certa aprovação.”<ref>{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=12|páginas=}}</ref>;
* "A minha maior preocupação é que se chegue na Inglaterra a considerar o confisco como um direito do Estado em prover-se de recursos ou que certas categorias de cidadãos sejam levadas a tomar outras como objeto de pilhagem... As revoluções são favoráveis ao confisco, e é impossível saber sob que nomes odiosos os próximos confiscos serão autorizados. Estou certo de que os princípios vigentes na França são destinados à aplicação em todo o país, a um grande número de indivíduos e a classes inteiras, que imaginam que sua calma indolência é a garantia da sua segurança. Nada mais fácil que tomar a indolência dos proprietários como inutilidade, e, depois disso, transformar tal inutilidade em capacidade de possuir bens.”<ref name=":0">{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=18|páginas=}}</ref> - Sobre o estilo Whig;
* "A minha maior preocupação é que se chegue na Inglaterra a considerar o confisco como um direito do Estado em prover-se de recursos ou que certas categorias de cidadãos sejam levadas a tomar outras como objeto de pilhagem... As revoluções são favoráveis ao confisco, e é impossível saber sob que nomes odiosos os próximos confiscos serão autorizados. Estou certo de que os princípios vigentes na França são destinados à aplicação em todo o país, a um grande número de indivíduos e a classes inteiras, que imaginam que sua calma indolência é a garantia da sua segurança. Nada mais fácil que tomar a indolência dos proprietários como inutilidade, e, depois disso, transformar tal inutilidade em capacidade de possuir bens.”<ref name=":0">{{citar livro|título=Reflexões Sobre a Revolução em França|ultimo=BURKE|primeiro=Edmund|editora=Universidade de Brasília|ano=1982|local=Brasília|página=18|páginas=}}</ref> - Sobre o estilo Whig;
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== Respostas ==
== Respostas ==
=== William Godwin ===
=== William Godwin ===
[[Ficheiro:WilliamGodwin.jpg|miniaturadaimagem|145x145px|William Godwin]]
[[Ficheiro:WilliamGodwin.jpg|miniaturadaimagem|212x212px|William Godwin]]
Um dos pioneiros do [[utilitarismo]] e forte contestador dos privilégios aristocráticos, o filósofo [[William Godwin]] era reconhecido no meio radical de escritores da década de 1790 em Londres. Casou-se com [[Mary Wollstonecraft]], uma das figuras principais no debate britânico a respeito da Revolução, em 1797.
Um dos pioneiros do [[utilitarismo]] e forte contestador dos privilégios aristocráticos, o filósofo [[William Godwin]] era reconhecido no meio radical de escritores da década de 1790 em Londres. Casou-se com [[Mary Wollstonecraft]], uma das figuras principais no debate britânico a respeito da Revolução, em 1797.


Em seu livro [[:en:Enquiry_Concerning_Political_Justice|Inquérito Acerca da Justiça Política]], publicado em 1793, Godwin aponta o governo como um fator intensivamente corruptivo dentro da sociedade, e que aos poucos viria a ser percebido como desnecessário e diluído com o avanço do conhecimento. Desta forma, ao formular as concepções políticas e econômicas do [[anarquismo]], ainda que não tenha nomeado suas ideias desta maneira, Godwin passou a ser considerado como um dos precursores deste pensamento. As leis, escreveu ele, não são produto da sabedoria de nossos ancestrais: são produto de suas paixões, de sua timidez, de seus ciúmes e de sua ambição. O remédio que eles oferecem é pior do que os males que fingem curar.<ref>KROPOTKIN, Peter. "[https://www.marxists.org/reference/archive/kropotkin-peter/1910/britannica.htm Works of Peter Kropotkin]". www.marxists.org. Acesso em 03 fev 2021.</ref>
Em seu livro [[:en:Enquiry_Concerning_Political_Justice|Inquérito Acerca da Justiça Política]], publicado em 1793, Godwin aponta o governo como um fator intensivamente corruptivo dentro da sociedade e que aos poucos viria a ser percebido como desnecessário e diluído com o avanço do conhecimento. Desta forma, ao formular as concepções políticas e econômicas do [[anarquismo]], ainda que não tenha nomeado suas ideias, Godwin passou a ser considerado como um dos precursores deste pensamento. As leis, escreveu ele, não são produto da sabedoria de nossos ancestrais: são produto de suas paixões, de sua timidez, de seus ciúmes e de sua ambição. O remédio que eles oferecem é pior do que os males que fingem curar.<ref>KROPOTKIN, Peter. "[https://www.marxists.org/reference/archive/kropotkin-peter/1910/britannica.htm Works of Peter Kropotkin]". www.marxists.org. Acesso em 03 fev 2021.</ref>


=== Thomas Paine ===
=== Thomas Paine ===
[[Ficheiro:Thomas Paine.jpg|miniaturadaimagem|156x156px|Thomas Paine]]
[[Ficheiro:Thomas Paine.jpg|miniaturadaimagem|229x229px|Thomas Paine]]
Revolucionário, [[Thomas Paine]] acreditava que a resistência era algo legítimo diante de um sistema de governo que suprimiu a liberdade, o desenvolvimento social e econômico. Embora concordasse com Edmund Burke de que as ideias políticas deveriam resultar em ações, Paine defendia a concepção utilitarista do trato social, admitindo que um tipo de gestão de governo que não adere às exigências sociais, deveria ser substituído e não reformado.
Revolucionário, [[Thomas Paine]] acreditava que a resistência era algo legítimo diante de um sistema de governo que suprimiu a liberdade, o desenvolvimento social e econômico. Embora concordasse com Edmund Burke de que as ideias políticas deveriam resultar em ações, Paine defendia a concepção utilitarista do trato social, admitindo que um tipo de gestão de governo que não adere às exigências sociais, deveria ser substituído e não concertado.


No ano de 1790, Paine enviou uma carta a Burke explicitando “o entusiasmo dos revolucionários” e os propósitos de não abandonarem o plano revolucionário, mesmo que esse plano lhes custasse a própria destruição, bem como a destruição de seu país.
No ano de 1790, Paine enviou uma carta a Burke explicitando “o entusiasmo dos revolucionários” e os propósitos de não abandonarem o plano revolucionário, mesmo que esse plano lhes custasse a própria destruição, bem como a destruição de seu país. &nbsp;


Em 1791 escreveu o livro The Rights of Man, uma espécie de manual com ideias iluministas, atacando diretamente o governo monárquico e a tirania desse regime, defendendo que “todo o governo hereditário é tirânico por natureza”. Para Paine o despotismo era a paráclase que impedia a aplicação da liberdade e dos direitos individuais e sociais.
Em 1791 escreveu o livro ''[[The Rights of Man]]'', uma espécie de manual com ideias iluministas, atacando diretamente o governo monárquico e a tirania desse regime, defendendo que “todo o governo hereditário é tirânico por natureza”. Para Paine o despotismo era a paráclase que impedia a aplicação da liberdade e dos direitos individuais e sociais.


Uma das principais controvérsias entre Thomas Paine e Edmund Burke está em que Paine julgava as revoluções como uma forma de reescrever a história a partir de um novo sistema de governo, ao passo que Burke defendia os novos princípios com base no antigo sistema.
Uma das principais controvérsias entre Thomas Paine e Edmund Burke está em que Paine julgava as revoluções como uma forma de reescrever a história a partir de um novo sistema de governo, ao passo que Burke defendia os novos princípios com base no antigo sistema.


=== Mary Wollstonecraft ===
=== Mary Wollstonecraft ===
[[Ficheiro:Mary Wollstonecraft by John Opie (c. 1797).jpg|miniaturadaimagem|146x146px|Mary Wollstonecraft]]
[[Ficheiro:Mary Wollstonecraft by John Opie (c. 1797).jpg|miniaturadaimagem|213x213px|Mary Wollstonecraft]]
Defensora dos direitos das mulheres, sendo considerada mãe do feminismo moderno, Mary Wollstonecraft juntamente com William Godwin (com quem foi casada) e Thomas Paine participavam de movimentos a favor da revolução com o objetivo de reordenar o poder estabelecido por autoridades monárquicas antecessoras. Com a obra de Burke, Wollstonecraft decide escrever numa clara resposta ao mesmo, no qual ela descreve como “Muito honorável Edward Burke” a carta em forma de panfleto político [[Uma Reivindicação dos Direitos dos Homens|“''A vindication of the rights of men''”]] onde debate diversos pontos por ele propostos no seu livro, e evidencia a importância desta revolução para a França.
Defensora dos direitos das mulheres, sendo considerada mãe do feminismo moderno, Mary Wollstonecraft juntamente com William Godwin (com quem foi casada) e Thomas Paine participavam de movimentos a favor da revolução com o objetivo de reordenar o poder estabelecido por autoridades monárquicas antecessoras. Com a obra de Burke, Wollstonecraft decide escrever numa clara resposta ao mesmo, no qual ela descreve como “Muito honorável Edward Burke” a carta em forma de panfleto político [[Uma Reivindicação dos Direitos dos Homens|“''A vindication of the rights of men''”]] onde debate diversos pontos por ele propostos no seu livro, e evidencia a importância desta revolução para a França.


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== Desdobramentos ==
== Desdobramentos ==

=== Alternativas de sistemas propostos ===
Aqueles que discordavam da visão conservadora de Edmund Burke apresentaram diferentes propostas para a substituição do sistema aristocrático vigente, dentre elas: o [[republicanismo]], o [[socialismo agrário]] e o [[anarquismo]].
Aqueles que discordavam da visão conservadora de Edmund Burke apresentaram diferentes propostas para a substituição do sistema aristocrático vigente, dentre elas: o [[republicanismo]], o [[socialismo agrário]] e o [[anarquismo]].


=== Movimento operário e movimento romântico literário ===
No momento inicial do debate, os participantes estavam argumentando a respeito da revolução britânica, não francesa - a [[Revolução Gloriosa]] do séc. XVII. Ao final já não mais escrevem sobre uma revolução política iminente ou praticável. No entanto, temas e técnicas dos anos 1790 ressurgiram em pelo menos duas áreas distintas no século XIX: no movimento radical operário durante a era pós-napoleônica; e na literatura do movimento Romântico.
No momento inicial do debate, os participantes estavam argumentando a respeito da revolução britânica, não francesa - a [[Revolução Gloriosa]] do séc. XVII. Ao final já não mais escrevem sobre uma revolução política iminente ou praticável. No entanto, temas e técnicas dos anos 1790 ressurgiram em pelo menos duas áreas distintas no século XIX: no movimento radical operário durante a era pós-napoleônica; e na literatura do movimento Romântico.


=== Receio dos conservadores diante do avanço do radicalismo em meio a opinião pública ===
O período compreendido entre fevereiro de 1792 a fevereiro de 1793, intitulado como annus mirabilis (ano maravilhoso) da atuação dos radicais do século dezoito, não só pela aparição de seus textos clássicos, como também pelo pico da atividade de associação radicais em Londres e nas províncias agora dirigidas por trabalhadores. Segundo Marilyn Butler, em seu livro ''Burke, Paine, Godwin and the Revolution Controversy'', passa a ser uma preocupação para os conservadores o fato da opinião pública aos poucos estar sob influência de intelectuais radicais como [[Joseph Priestley]], [[John Aikin]], [[Anna Laetitia Barbauld|Anna Laetitia Barbuald]], [[Joel Harlow|Joel Barlow]], [[William Blake]], [[Erasmus Darwin]], [[Maria Edgeworth]], [[Johann Heinrich Füssli|Henry Fuseli]], [[William Wordsworth]], [[Thomas Christian Tychsen|Thomas Christie]], [[William Godwin]], [[Thomas Paine|Tom Paine]], [[John Horne|John Horne Tooke]], [[Mary Wollstonecraft]], Thomas Beddoes e [[Humphry Davy]]. A ascensão deste grupo foi vista como perigosa especialmente por ser um período que a importância política da opinião pública começava a ser reconhecida: no início do séc XIX, o governo britânico poderia cair se a imprensa o contrariasse.
O período compreendido entre fevereiro de 1792 a fevereiro de 1793, intitulado como annus mirabilis (ano maravilhoso) da atuação dos radicais do século dezoito, não só pela aparição de seus textos clássicos, como também pelo pico da atividade de associação radicais em Londres e nas províncias agora dirigidas por trabalhadores. Segundo Marilyn Butler, em seu livro ''Burke, Paine, Godwin and the Revolution Controversy'', passa a ser uma preocupação para os conservadores o fato da opinião pública aos poucos estar sob influência de intelectuais radicais como [[Joseph Priestley]], [[John Aikin]], [[Anna Laetitia Barbauld|Anna Laetitia Barbuald]], [[Joel Harlow|Joel Barlow]], [[William Blake]], [[Erasmus Darwin]], [[Maria Edgeworth]], [[Johann Heinrich Füssli|Henry Fuseli]], [[William Wordsworth]], [[Thomas Christian Tychsen|Thomas Christie]], [[William Godwin]], [[Thomas Paine|Tom Paine]], [[John Horne|John Horne Tooke]], [[Mary Wollstonecraft]], Thomas Beddoes e [[Humphry Davy]]. A ascensão deste grupo foi vista como perigosa especialmente por ser um período que a importância política da opinião pública começava a ser reconhecida: no início do séc XIX, o governo britânico poderia cair se a imprensa o contrariasse.


=== Derrota do radicalismo e retorno ao debate anos mais tarde ===
A derrota radicalista em meados de 1790 foi um retrocesso temporário. Em 1816, [[William Cobbett]] fez com jornal ''Cobbett's Weekly Political Register'' o que Paine fez com ''Rights of Man'' em 1792: dirigiu-se diretamente ao público massivo.
A derrota radicalista em meados de 1790 foi um retrocesso temporário. Em 1816, [[William Cobbett]] fez com jornal ''[[Cobbett's Weekly Political Register]]'' o que Paine fez com ''Rights of Man'' em 1792: dirigiu-se diretamente ao público massivo.

=== Repercussão dos ideais de William Godwin dentre intelectuais do século XX ===


O autor Don Locke, em seu livro ''Uma Fantasia da Razão: A Vida e o Pensamento de William Godwin'', interpreta William Godwin - em Inquérito Acerca da Justiça Política - como alguém lutando com problemas perenes, por exemplo: o progresso governamental e humano, o poder da verdade e da natureza do homem, amizade e obrigação, casamento, sexo e população. O historiador [[E. P. Thompson|E.P. Thompson]], em seu livro ''Benevolent Mr. Godwin'', preocupado com a influência de Godwin, afirma que o autor estava confinado em um pequeno e alto círculo literário. Alguns críticos literários apontam a obra de Godwin ''Inquérito Acerca da Justiça Política'' como periférica para a sua disciplina.
O autor Don Locke, em seu livro ''Uma Fantasia da Razão: A Vida e o Pensamento de William Godwin'', interpreta William Godwin - em [[Inquérito Acerca da Justiça Política]] - como alguém lutando com problemas perenes, por exemplo: o progresso governamental e humano, o poder da verdade e da natureza do homem, amizade e obrigação, casamento, sexo e população. O historiador [[E. P. Thompson|E.P. Thompson]], em seu livro ''Benevolent Mr. Godwin'', preocupado com a influência de Godwin, afirma que o autor estava confinado em um pequeno e alto círculo literário. Alguns críticos literários apontam a obra de Godwin ''Inquérito Acerca da Justiça Política'' como periférica para a sua disciplina.


{{notas e referências}}
{{notas e referências}}

Revisão das 03h13min de 25 de fevereiro de 2021

Era do Terror na Revolução Francesa

Controvérsia da Revolução foi um debate entre escritores ingleses sobre a Revolução Francesa, logo após o levante. Segundo Marilyn Butler, foram seis anos de discussões, desde os primeiros comentários, em 1789, até a introdução de medidas para interromper a circulação de ideias radicais, fossem elas impressas ou faladas, pelo governo “Pitt”, em 1795.[1] A maioria dos britânicos celebraram a queda da Bastilha em 1789, acreditando que a monarquia da França deveria ser substituída por uma forma mais democrática de governo. No entanto, em dezembro de 1795, após o Reinado do Terror e da guerra com a França, foram poucos que ainda apoiavam a causa francesa.

Em 1790, na obra Reflexões sobre a Revolução em França, o inglês Edmund Burke inflamou outros pensadores que rebateram suas ideias de patriotismo e apoio à conservação do sistema aristocrático de governo. As réplicas de William GodwinThomas Paine e Mary Wollstonecraft[1] conduzem o debate com tons republicanos, socialistas e anarquistas. Os temas articulados por aqueles que responderam Burke se tornaram uma característica central do movimento radical operário na Grã-Bretanha no século XIX e do Romantismo.[2] Alfred Cobban chama o debate que entrou em erupção, "talvez a última discussão real dos fundamentos da política" na Grã-Bretanha.[3]

Reflexões de Edmund Burke

Edmund Burke

Membro do Whig Party, partido político britânico que reunia tendências liberais, Burke defendia que os acontecimentos desencadeados durante a Revolução Francesa, não passavam de uma guerra partidária entre a antiga ordem civil, política e moral em face de uma seita de ateístas fanáticos e ávidos para invertera ordem social que aspiravam pelo império universal a partir da França.

Para Burke, a independência dos Estados Unidos (julho de 1776), a qual nunca chamou de revolução, era uma oposição ao inadequado modelo de governo da Inglaterra, ao passo que suas vertentes na França tomavam formas de entusiasmo por uma nova teoria sobre o homem e a sociedade, referindo-se ao Iluminismo. Ao se basear nos ditames para justificar uma reforma gradual e incremental, defendeu que a revolução na França abalaria bem mais do que as estruturas políticas vigentes, e que o movimento não se tratava da soberania partidária ou governamental, segundo Burke, essa mobilização causaria impactos que viriam a desestruturar toda uma sociedade.

Na obra Reflections on the Revolution in France (1790), Edmund Burke reuniu o sentimento inglês e o patriotismo em apoio a existência da aristocracia como sistema de governo e recebeu muitas críticas de escritores radicais como William Godwin e Thomas Paine que refutaram com críticas à monarquia e a aristocracia e defendiam como propostas o republicanismo, o socialismo agrário e o anarquismo. Em Letters on a Regicide Peace (1796) escreveu: “Minhas ideias e princípios me levaram, nessa disputa, a ver a França não como Estado, mas como facção”[4].

A inquietação de Burke era a de que o governo inglês fosse afetado pelas insurreições da França, transversalmente pelos radicais ingleses descontentes e com o potencial para alavancar uma crise aos moldes franceses. Em seus argumentos, Burke aborda a forma complexa que os revolucionários tratam o passado como algo a ser superado, sem levar em conta a constituição desse passado. Para o autor, essa análise os levará ao fracasso.

Reflexões sobre a Revolução em França

O texto evidencia que Burke agia enviando cartas criticando a Revolução Francesa desde a queda da Bastilha, e essa primeira fase de ação se deve ao receio que tais ideais chegassem à Inglaterra, sendo o primeiro a alertar tais perigos no país. Ele decidiu publicar este livro por acreditar que a revolução deveria honrar um dos seus principais lemas - a liberdade -, afirmando que a instauração de um governo autoritário era uma situação de contradição por parte dos revolucionários; pregava que os escritos iluministas deveriam cair na ilegalidade. Na época em que publicou a obra, passava por dificuldades financeiras, portanto chegou a ser apontado por alguns como um interesseiro que fora subornado para escrever a obra. Defensor do catolicismo, tinha o protestantismo como uma ideologia inaceitável. É de grande notoriedade os três estilos assumidos por Burke na escrita de seu livro: o estilo Whig - fazendo referência ao partido liberal britânico-  apresentando racionalidade e perspicácia no objetivo de persuadir a todos explicando que tinham muito a perder ao apoiar a revolução; outro estilo foi o nomeado como jacobita, que mostrava algumas ideias advindas do gongorismo - estilo literário vigente na época que demonstra extravagância, exagero de metáforas e comparações, além de uma linguagem rebuscada e soturna; por fim, e não menos importante, está a ironia - marca registrada da literatura irlandesa -, administrada de maneira agressiva na maioria das vezes. Burke costumava mesclar o estilo Whig com os outros dois estilos individualmente.

Argumentos

  • “O espírito da renovação total e radical; a destruição de todos os direitos consagrados pela tradição; o confisco da propriedade, a destruição da Igreja, da nobreza, da família, dos costumes, da veneração aos ancestrais, da nação - esse é o catálogo de tudo aquilo que Burke odiava nos seus momentos sombrios, e todos esses elementos ele encontraria no marxismo.”[5];
  • “Ele enfatiza sua ignorância sobre o estado atual da situação e desconfia do seu próprio julgamento 'Se eu me pareço'... diz ele, 'expressar-me em uma linguagem de desaprovação, seja gentil em olhá-la como uma mera expressão de dúvida'. Ele explica qual a liberdade que ele admira: 'a liberdade a qual me refiro é a liberdade social. É aquele estado de coisas no qual a liberdade é garantida pela igualdade na aplicação de sanções, um estado de coisas no qual a liberdade de nenhum homem, de nenhum grupo de homens e de nenhuma corporação de homens possa ter meios de se impor à liberdade de qualquer homem ou de qualquer grupo de homens na sociedade. (...)'”[6];
  • “Tivesse ele nascido em circunstâncias sociais similares em Arras em 1750 ou em Dublin ou Belfast em 1760, ele provavelmente teria sido um revolucionário perigosos, já que era inteligente. Mary Wollstonecraft pensou dessa forma: 'Lendo as suas “Reflexões” demoradamente, cheguei à conclusão de que, se você tivesse sido francês e apesar de seu respeito pela hierarquia e autoridade, você teria sido um revolucionário violento.'”[7];
  • “Burke pode não ter visto 'nenhuma razão para abandonar' a Igreja da Inglaterra, mas as suas tradições familiares eram tão fortes - e seus sentimentos também - que não lhe era possível encarar os ataques feitos à Igreja de Roma com a típica atitude inglesa, ou seja, com indiferença, complacência e uma certa aprovação.”[8];
  • "A minha maior preocupação é que se chegue na Inglaterra a considerar o confisco como um direito do Estado em prover-se de recursos ou que certas categorias de cidadãos sejam levadas a tomar outras como objeto de pilhagem... As revoluções são favoráveis ao confisco, e é impossível saber sob que nomes odiosos os próximos confiscos serão autorizados. Estou certo de que os princípios vigentes na França são destinados à aplicação em todo o país, a um grande número de indivíduos e a classes inteiras, que imaginam que sua calma indolência é a garantia da sua segurança. Nada mais fácil que tomar a indolência dos proprietários como inutilidade, e, depois disso, transformar tal inutilidade em capacidade de possuir bens.”[9] - Sobre o estilo Whig;
  • “O mais notável exemplo desse estilo nas Reflexões é o famoso trecho sobre a Rainha, que muitos foram levados a acreditar como sendo um exemplo típico do estilo de Burke.”[9] - Sobre o estilo “jacobita”;
  • “O rei foi levado a declarar que o Delfim deveria ser educado de conformidade com a sua situação. Se ele deve se ajustar a sua condição, ele não deverá ter nenhuma educação.”[9] - Sobre o estilo “ironia”;
  • “Nenhum outro orador ou escritor político, antes ou depois dele, teve essa combinação de qualidades: seu poder de articular as emoções, sua percepção instrutiva das forças sociais, sua capacidade de argumentação analítica, sua ternura, fantasia, sabedoria e poder de combiná-las, por meio de um controle total sobre os recursos da língua, buscando atingir fins claramente escolhidos e apaixonadamente desejados.”[10];
  • “Não há dúvida de que hoje Burke é lido e admirado basicamente como um conservador e um contrarrevolucionário, disponível para apoiar e legitimar a contenção do comunismo.”[11].

Respostas

William Godwin

William Godwin

Um dos pioneiros do utilitarismo e forte contestador dos privilégios aristocráticos, o filósofo William Godwin era reconhecido no meio radical de escritores da década de 1790 em Londres. Casou-se com Mary Wollstonecraft, uma das figuras principais no debate britânico a respeito da Revolução, em 1797.

Em seu livro Inquérito Acerca da Justiça Política, publicado em 1793, Godwin aponta o governo como um fator intensivamente corruptivo dentro da sociedade e que aos poucos viria a ser percebido como desnecessário e diluído com o avanço do conhecimento. Desta forma, ao formular as concepções políticas e econômicas do anarquismo, ainda que não tenha nomeado suas ideias, Godwin passou a ser considerado como um dos precursores deste pensamento. As leis, escreveu ele, não são produto da sabedoria de nossos ancestrais: são produto de suas paixões, de sua timidez, de seus ciúmes e de sua ambição. O remédio que eles oferecem é pior do que os males que fingem curar.”[12]

Thomas Paine

Thomas Paine

Revolucionário, Thomas Paine acreditava que a resistência era algo legítimo diante de um sistema de governo que suprimiu a liberdade, o desenvolvimento social e econômico. Embora concordasse com Edmund Burke de que as ideias políticas deveriam resultar em ações, Paine defendia a concepção utilitarista do trato social, admitindo que um tipo de gestão de governo que não adere às exigências sociais, deveria ser substituído e não concertado.

No ano de 1790, Paine enviou uma carta a Burke explicitando “o entusiasmo dos revolucionários” e os propósitos de não abandonarem o plano revolucionário, mesmo que esse plano lhes custasse a própria destruição, bem como a destruição de seu país.  

Em 1791 escreveu o livro The Rights of Man, uma espécie de manual com ideias iluministas, atacando diretamente o governo monárquico e a tirania desse regime, defendendo que “todo o governo hereditário é tirânico por natureza”. Para Paine o despotismo era a paráclase que impedia a aplicação da liberdade e dos direitos individuais e sociais.

Uma das principais controvérsias entre Thomas Paine e Edmund Burke está em que Paine julgava as revoluções como uma forma de reescrever a história a partir de um novo sistema de governo, ao passo que Burke defendia os novos princípios com base no antigo sistema.

Mary Wollstonecraft

Mary Wollstonecraft

Defensora dos direitos das mulheres, sendo considerada mãe do feminismo moderno, Mary Wollstonecraft juntamente com William Godwin (com quem foi casada) e Thomas Paine participavam de movimentos a favor da revolução com o objetivo de reordenar o poder estabelecido por autoridades monárquicas antecessoras. Com a obra de Burke, Wollstonecraft decide escrever numa clara resposta ao mesmo, no qual ela descreve como “Muito honorável Edward Burke” a carta em forma de panfleto político A vindication of the rights of men onde debate diversos pontos por ele propostos no seu livro, e evidencia a importância desta revolução para a França.

Sua carta foi a primeira dentro do debate em questão. A autora escreve sobre sua indignação diante da aristocracia e defende a república como solução. Um ponto digno de destaque é o caráter feminista que se faz presente em seus argumentos contra o filósofo: contestava, por exemplo, a tese igualitária de Burke, que admitia a passividade das mulheres. Os escritos de Wollstonecraft, em um primeiro momento se fizeram presentes em grandes jornais, mas aos poucos os leitores começaram a interpretá-los como um texto de caráter emocional, contra o caráter racional de Edmund Burke. Somente no século XX estudantes mulheres questionaram tal visão e reconheceram a obra como de caráter intelectual.

Desdobramentos

Alternativas de sistemas propostos

Aqueles que discordavam da visão conservadora de Edmund Burke apresentaram diferentes propostas para a substituição do sistema aristocrático vigente, dentre elas: o republicanismo, o socialismo agrário e o anarquismo.

Movimento operário e movimento romântico literário

No momento inicial do debate, os participantes estavam argumentando a respeito da revolução britânica, não francesa - a Revolução Gloriosa do séc. XVII. Ao final já não mais escrevem sobre uma revolução política iminente ou praticável. No entanto, temas e técnicas dos anos 1790 ressurgiram em pelo menos duas áreas distintas no século XIX: no movimento radical operário durante a era pós-napoleônica; e na literatura do movimento Romântico.

Receio dos conservadores diante do avanço do radicalismo em meio a opinião pública

O período compreendido entre fevereiro de 1792 a fevereiro de 1793, intitulado como annus mirabilis (ano maravilhoso) da atuação dos radicais do século dezoito, não só pela aparição de seus textos clássicos, como também pelo pico da atividade de associação radicais em Londres e nas províncias agora dirigidas por trabalhadores. Segundo Marilyn Butler, em seu livro Burke, Paine, Godwin and the Revolution Controversy, passa a ser uma preocupação para os conservadores o fato da opinião pública aos poucos estar sob influência de intelectuais radicais como Joseph Priestley, John Aikin, Anna Laetitia Barbuald, Joel Barlow, William Blake, Erasmus Darwin, Maria Edgeworth, Henry Fuseli, William Wordsworth, Thomas Christie, William Godwin, Tom Paine, John Horne Tooke, Mary Wollstonecraft, Thomas Beddoes e Humphry Davy. A ascensão deste grupo foi vista como perigosa especialmente por ser um período que a importância política da opinião pública começava a ser reconhecida: no início do séc XIX, o governo britânico poderia cair se a imprensa o contrariasse.

Derrota do radicalismo e retorno ao debate anos mais tarde

A derrota radicalista em meados de 1790 foi um retrocesso temporário. Em 1816, William Cobbett fez com jornal Cobbett's Weekly Political Register o que Paine fez com Rights of Man em 1792: dirigiu-se diretamente ao público massivo.

Repercussão dos ideais de William Godwin dentre intelectuais do século XX

O autor Don Locke, em seu livro Uma Fantasia da Razão: A Vida e o Pensamento de William Godwin, interpreta William Godwin - em Inquérito Acerca da Justiça Política - como alguém lutando com problemas perenes, por exemplo: o progresso governamental e humano, o poder da verdade e da natureza do homem, amizade e obrigação, casamento, sexo e população. O historiador E.P. Thompson, em seu livro Benevolent Mr. Godwin, preocupado com a influência de Godwin, afirma que o autor estava confinado em um pequeno e alto círculo literário. Alguns críticos literários apontam a obra de Godwin Inquérito Acerca da Justiça Política como periférica para a sua disciplina.

Notas e referências

Notas

Referências

  1. a b Butler, "Introdução", 1.
  2. Butler, "Introdução", 1.
  3. Qtd. em Butler, "Introdução", 1.
  4. Burke, Edmund (1796). Letters on a Regicide Peace. [S.l.: s.n.] p. 16 
  5. BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. p. 03 
  6. BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. pp. 5–6 
  7. BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. 08 páginas 
  8. BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. p. 12 
  9. a b c BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. p. 18 
  10. BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. p. 21 
  11. BURKE, Edmund (1982). Reflexões Sobre a Revolução em França. Brasília: Universidade de Brasília. p. 28 
  12. KROPOTKIN, Peter. "Works of Peter Kropotkin". www.marxists.org. Acesso em 03 fev 2021.

Bibliografia

  • BURKE, E. Introdução: Reflexões sobre a Revolução em França. Tradução: Renato Assumpção Faria; Denis de Souza Pinto; Carmen Lídia Richter Ribeiro Moura. Editora Universidade de Brasília, 1982, p.3-33.
  • LEVIN, Y. O Grande Debate: Edmund Burke, Thomas Paine e o nascimento da direita e da esquerda. Editora Record, 2017.
  • BURKE, Edmund. Introdução - Reflexões sobre a Revolução em França. Tradução de Renato de Assumpção Faria, Denis Fontes de Souza Pinto e Carmen Lidia Richter Ribeiro Moura. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982, p. 3-33.
  • WOLLSTONECRAFT, Mary. A Vindication of the Rights of Men, in a letter to the Right Honourable Edmund Burke; occasioned by his Reflections on the Revolution in France. J. Johnson, 1790.
  • WOLLSTONECRAFT, Mary et al. Wollstonecraft: A Vindication of the Rights of Men and A Vindication of the Rights of Woman and Hints. Cambridge University Press, 1995.