Deus vult: diferenças entre revisões
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[[File:GA_Ordre_du_Saint-Sépulcre.svg|thumb|"Deus lo vult" é o lema da [[Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém|Ordem do Santo Sepulcro]] (1824).|240x240px]] |
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'''''Deus vult''''' ("Deus o quer!" em [[latim]]) foi um [[grito de guerra]] da [[Igreja Católica]] associado às [[Cruzada|Cruzadas]].<ref>{{Citar periódico|ultimo=Agnew|primeiro=John|data=2010|titulo=Deus Vult: The Geopolitics of the Catholic Church|url=http://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/14650040903420388|jornal=Geopolitics|lingua=en|volume=15|numero=1|paginas=39–61|doi=10.1080/14650040903420388|issn=1465-0045|acessodata=}}</ref> |
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'''''Deus vult''''' ([[Latim eclesiástico]]: 'Deus quer') é um lema [[cristão]] relacionado à [[providência divina]].<ref>https://www.merriam-webster.com/dictionary/Deus%20vult</ref> Foi entoado pela primeira vez pelos católicos durante a [[Primeira Cruzada]] em 1096 como um grito de guerra, provavelmente sob a forma '''''Deus le veult''''' ou '''''Deus lo vult''''', conforme relatado pela ''[https://en.wikipedia.org/wiki/Gesta_Francorum Gesta Francorum]'' ([[ca.]] 1100) e a ''[https://en.wikipedia.org/wiki/Historia_belli_sacri Historia Belli Sacri]'' ([[ca.]] 1130).{{Nre|Os manuscritos da Gesta Francorum apresentam Deus le volt, Deus lo vult, bem como as formas "corrigidas" Deus hoc vult e Deus vult. Hagenmeyer (1890) cita Barth: "Barbaro-latina vulgi exclamatio vel et tessera est. Videri autem hinc potest, tum idiotismum Francicum propiorem adhuc fuisse latine matrici".|nome=|grupo=lower-alpha}} |
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Nos tempos modernos, o lema latino tem significados diferentes dependendo do contexto. Tem sido usado como uma [[metáfora]] referindo-se à "vontade de Deus" por cristãos ao longo da história, como os [[puritanos]], ou como lema de [[Ordem de cavalaria|ordens de cavalaria]], como a [[Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém]].<ref>https://berkleycenter.georgetown.edu/responses/the-alt-right-and-medieval-religions</ref> |
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A frase foi repetida por toda a Europa quando o [[papa Urbano II]] declarou a [[Primeira Cruzada]] no [[Concílio de Clermont]], em 1095, após a [[Igreja Ortodoxa]] pedir ajuda ao [[Mundo ocidental|ocidente]] para interromper a [[expansão islâmica]] do [[Império Seljúcida]] na [[Anatólia]].<ref>Morwood, J. ''[[iarchive:dictionaryoflati00morw|A Dictionary of Latin Words and Phrases]]'', Oxford, Oxford University Press, 1998. p. 46. {{en}}</ref><ref>{{Citar periódico|ultimo=Gomez|primeiro=Adam|data=2012|titulo=Deus Vult: John L. O’Sullivan, Manifest Destiny, and American Democratic Messianism|url=https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/667616|jornal=American Political Thought|lingua=en|volume=1|numero=2|paginas=236–262|doi=10.1086/667616|issn=2161-1580|acessodata=}}</ref> |
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== Significado e variantes == |
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A frase aparece de outra forma na tradução da [[Vulgata]] do [[II Samuel|Segundo Livro de Samuel]] 14:14 da [[Bíblia]]: ''nec vult Deus perire animam'' ("Deus não quer que nenhuma alma pereça"). |
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As variantes ''Deus le volt'' e ''Deus lo vult'', incorretas no [[latim clássico]], são formas influenciadas pelas [[línguas românicas]]. De acordo com [https://en.wikipedia.org/wiki/Heinrich_Hagenmeyer Heinrich Hagenmeyer], o pronome pessoal 'le' (ou 'lo') provavelmente fazia parte do lema original gritado durante a [[Primeira Cruzada]] em [[Amalfi]], uma vez que ambos os autores da [https://en.wikipedia.org/wiki/Gesta%20Francorum ''Gesta Francorum''] e da [https://en.wikipedia.org/wiki/Historia%20belli%20sacri ''Historia Belli Sacri''] o relatam.<ref>https://archive.org/details/anonymigestafra01hagegoog</ref> Variantes posteriores incluem o [[Francês antigo|frânces antigo]] ''Dieux el volt'' e o [[latim clássico]] ''Deus id vult'' ("Deus quer") ou D''eus hoc vult'' ("Deus quer isso").<ref>https://books.google.fr/books?id=e4caAQAAIAAJ&pg=RA1-PA327#v=onepage&q&f=false</ref> |
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==História== |
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=== Primeira Cruzada === |
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O grito de guerra da [[Primeira Cruzada]] é relatado pela primeira vez na [https://en.wikipedia.org/wiki/Gesta%20Francorum ''Gesta Francorum''], uma crônica escrita [[ca.]] 1100 por um autor anônimo associado a [[Boemundo I de Antioquia]] logo após a campanha bem-sucedida. De acordo com este relato, enquanto a [[Primeira Cruzada|Cruzada dos Príncipes]] estava reunida em [[Amalfi]] no final do verão de 1096, um grande número de cruzados armados com o sinal da cruz no ombro direito ou nas costas gritaram em uníssono "Deus le volt, Deus le volt, Deus le volt”.<ref>https://archive.org/details/anonymigestafra00hagegoog/page/151/mode/1up?view=theater</ref> O historiador medieval [[Guiberto de Nogent]] menciona que "Deus le volt" foi retido pelos peregrinos em detrimento de outros gritos. |
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A ''[https://en.wikipedia.org/wiki/Historia_belli_sacri Historia belli sacri]'', escrita mais tarde por volta de 1131, também cita o grito de guerra.<ref>https://archive.org/details/anonymigestafra01hagegoog</ref> É novamente mencionado no contexto da [[Cerco de Antioquia|captura de Antioquia]] em 3 de junho de 1098. O autor anônimo da ''Gesta'' estava entre os soldados que capturaram as torres da muralha e conta que "vendo que já estavam nas torres, começaram a gritar ''Deus le volt'' com vozes alegres; então, de fato, nós gritamos".<ref>https://archive.org/details/anonymigestafra00hagegoog/page/304/mode/1up?view=theater</ref> |
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=== Roberto, o Monge === |
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Roberto, o Monge, que reescreveu o ''[https://en.wikipedia.org/wiki/Gesta%20Francorum Gesta Francorum]'' [[ca.]] 1120, acrescentou um relato do discurso de [[Papa Urbano II|Urbano II]] no [[Concílio de Clermont]], do qual foi testemunha ocular. O clímax do discurso é o apelo de [[Papa Urbano II|Urbano]] à ortodoxia, à reforma e à submissão à Igreja. Roberto registra que o papa pediu aos cristãos ocidentais, pobres e ricos, que ajudassem os gregos no leste: |
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{{Quote|texto=Quando o Papa Urbano disse essas e muitas coisas semelhantes em seu discurso urbano, ele influenciou tanto para um propósito os desejos de todos os presentes que eles gritaram: 'É a vontade de Deus! É a vontade de Deus!' Quando o venerável Romano Pontífice os ouviu, com os olhos elevados ao céu dava graças a Deus e, com a mão ordenando silêncio, dizia: Caríssimos irmãos, hoje se manifesta em vós o que o Senhor diz no Evangelho: "Onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles”. A menos que o Senhor Deus estivesse presente em seus espíritos, todos vocês não teriam proferido o mesmo grito. Pois, embora o grito tenha saído de várias bocas, a origem do grito era uma. Portanto, eu digo a vocês que Deus, que implantou isso em seus seios, o desenhou em vocês. Que este seja os seus gritos de guerra nos combates, porque esta palavra é dada a vocês por Deus. Quando um ataque armado é feito contra o inimigo, que este único grito seja levantado por todos os soldados de Deus: É a vontade de Deus! É a vontade de Deus!<ref>https://sourcebooks.fordham.edu/source/urban2-5vers.asp#robert</ref>}} |
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Roberto também relata que o grito de ''Deus lo vult'' foi primeiro gritado em tom de brincadeira pelos soldados de [[Boemundo I de Antioquia|Boemundo]] durante seus exercícios de combate, e mais tarde se transformou em um verdadeiro grito de guerra, que [[Boemundo I de Antioquia|Boemundo]] interpretou como um sinal divino.<ref>https://archive.org/details/anonymigestafra00hagegoog?view=theater#page/n167/mode/1up</ref> |
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[[Christopher Tyerman|Tyerman]], escrevendo em 2006, sugere que os aplausos ao discurso de [[Papa Urbano II|Urbano]] foram "provavelmente liderados por uma claque papal". |
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==Outros usos== |
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''Deus lo vult'' é o lema da [[Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém]], uma ordem [[Igreja Católica|católica romana]] de cavalaria (restaurada em 1824). |
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O almirante [[Alfred Thayer Mahan]] (1840–1914), um [[Igreja episcopal|episcopal protestante]], usou a expressão para seu argumento do domínio de Cristo como "essencialmente imperial" e que o cristianismo e a guerra tinham muito em comum: {{"'}}Deus vult!' digo eu. Foi o grito dos cruzados e dos puritanos e duvido que o homem tenha proferido um mais nobre [um]." |
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A 1ª Divisão CCNN "Dio lo Vuole" ("Deus quer") foi uma das três divisões [[Itália|italianas]] de [[Camisas-negras|Camisas Negras]] enviadas à [[Espanha]] em 1937 durante a [[Guerra Civil Espanhola]] para formar o "[[Corpo Truppe Volontarie]]" (Corpo de Tropas Voluntárias), ou CTV. |
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Em 1947, o [[prelado]] [[Canadenses|canadense]] [[George Bernard Flahiff|George Flahiff]] usou a expressão ''Deus Non Vult'' como título de um exame da perda gradual de entusiasmo pelas cruzadas no final do século XII, especificamente das primeiras [[Críticas à Igreja Católica|críticas às cruzadas]] por [https://en.wikipedia.org/wiki/Ralph%20Niger Ralph Niger], escrevendo em 1189. |
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Divulgado na forma de hashtags e [[Meme (Internet)|memes da internet,]] ''Deus vult'' goza de popularidade entre os membros da [[direita cristã]], bem como da [[direita alternativa]], por causa de sua representação percebida do [[choque de civilizações]] entre o [[Cristianismo ocidental|Ocidente cristão]] e o [[mundo islâmico]].<ref>https://www.washingtonpost.com/outlook/2019/01/22/what-politicians-mean-when-they-call-border-wall-medieval/</ref><ref>https://berkleycenter.georgetown.edu/responses/the-alt-right-and-medieval-religions</ref><ref>https://www.npr.org/2017/09/04/548505783/scholars-say-white-supremacists-chanting-deus-vult-got-history-wrong</ref><ref>https://www.washingtonpost.com/graphics/2017/local/charlottesville-videos/</ref> Os [[Meme (Internet)|memes]] dos [[Cruzada|cruzados]], como a imagem de um [[Ordem dos Templários|Cavaleiro Templário]] acompanhado da legenda "Verei sua [[jihad]] e levantarei uma [[cruzada]] contra você", são populares nas páginas de [[extrema-direita]] da Internet.<ref>https://time.com/5696546/far-right-history-crusades/</ref> O lema também é usado por grupos [[nacionalismo cristão|nacionalistas cristãos]] na [[Europa]] e foi retratado em grandes faixas durante as marchas que comemoraram o Dia da Independência Nacional da Polônia em 2017.<ref>https://www.washingtonpost.com/outlook/2019/01/22/what-politicians-mean-when-they-call-border-wall-medieval/</ref><ref>https://www.theguardian.com/world/2017/nov/13/polish-president-condemns-far-right-scenes-at-independence-day-march</ref><ref>https://www.timesofisrael.com/polish-president-sharply-condemns-weekend-nationalist-march/</ref> |
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== Notas == |
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Mais recentemente, com a ascensão do [[Governo Jair Bolsonaro|governo Bolsonaro]], a [[extrema-direita]] [[Brasileiros|brasileira]] tem se utilizado da expressão em um contexto semelhante ao utilizado pelos apoiadores do presidente dos Estados Unidos, [[Presidência de Donald Trump|Donald Trump]].<ref>{{Citar web|titulo=Deus vult: uma velha expressão na boca da extrema direita|url=https://apublica.org/2019/04/deus-vult-uma-velha-expressao-na-boca-da-extrema-direita/|obra=Agência Pública|data=2019-04-30|publicado=|ultimo=Rudnitzki|primeiro=Ethel|wayb=20190620001811|acessodata=|ultimo2=Oliveira|primeiro2=Rafael}}</ref><ref>{{Citar web|titulo=Why the Brazilian Far Right Loves the European Middle Ages|url=https://psmag.com/ideas/why-the-brazilian-far-right-is-obsessed-with-the-crusades|obra=Pacific Standard|lingua=en|primeiro=Paulo|ultimo=Pachá|data=12-03-2019|publicado=|wayb=20190620001813|acessodata=}}</ref> Isso aconteceu depois da frase ''Deus vult'' ser usada em seu contexto histórico no videogame ''[[Crusader Kings II]]'', de 2012, e ter evoluído para um [[Meme (Internet)|meme de internet]] que depois foi utilizado pelos apoiadores de Trump em sua [[Eleição presidencial nos Estados Unidos em 2016|campanha presidencial de 2016]]. A frase se tornou "uma espécie de palavra de código de extrema-direita, uma ''hashtag'' propagada em mídias sociais e [[Grafito|grafites]] da [[direita alternativa]]".<ref>{{Citar web|titulo=Get to Know the Memes of the Alt-Right and Never Miss a Dog-Whistle Again|url=https://www.vice.com/en_us/article/ezagwm/get-to-know-the-memes-of-the-alt-right-and-never-miss-a-dog-whistle-again|obra=Vice|data=2017-01-25|lingua=en-US|primeiro=Justin|ultimo=Caffier|publicado=|acessodata=|wayb=20190620003208}}</ref><ref>{{citar jornal|url=https://www.washingtonpost.com/news/worldviews/wp/2016/11/16/isis-wants-to-fight-a-holy-war-so-do-some-trump-supporters/|título=ISIS wants to fight a holy war. So do some Trump supporters|autor =Ishaan Tharoor|data=2016|jornal=[[The Washington Post]]|ultimo=|primeiro=|acessodata=}}</ref><ref>{{citar web|url=http://www.newsweek.com/paradox-interactive-875640|título='CRUSADER KINGS 2' USED ALT-RIGHT BATTLECRY TO PROMOTE FREE STEAM DOWNLOAD|obra=[[Newsweek]]|data=2018|primeiro =Jason|último =Murdock|acessodata=30-05-2018|publicado=}}</ref><ref>{{citar web|url=https://www.vice.com/en_us/article/ezagwm/get-to-know-the-memes-of-the-alt-right-and-never-miss-a-dog-whistle-again|título=Get to Know the Memes of the Alt-Right and Never Miss a Dog-Whistle Again|obra=[[Vice Media|Vice]]|data=2017|primeiro =Justin|último =Caffier|acessodata=30-05-2018|publicado=}}</ref> Várias [[Mesquita|mesquitas]] e outros lugares foram vandalizados com a frase em 2016.<ref>{{citar jornal|url=http://www.huffingtonpost.com/entry/mosques-arkansas-fort-smith-vandalized_us_580a57b6e4b000d0b1566e5d|título=Two Arkansas Mosques Defaced With Racist, Islamophobic Graffiti|autor =Christopher Mathias|data=2016-10-21|jornal=[[The Huffington Post]]}}</ref><ref>{{citar jornal|url=http://www.pressherald.com/2016/11/03/usm-investigating-possible-hate-crime-graffiti-at-student-senate-office/|título=Graffiti of Crusades’ rallying cry investigated as possible hate crime at USM|autor =Noel K. Gallagher|data=2016|publicado=[[Portland Press Herald]]|ultimo=|primeiro=|acessodata=}}</ref><ref>{{citar jornal|url=http://metro.co.uk/2016/12/17/vandals-spray-paint-mosque-with-anti-muslim-slogans-from-the-crusades-6329663/|título=Vandals spray paint mosque with anti-Muslim slogans from the Crusades|autor =Ashitha Nagesh|data=2016-12-17|publicado=[[Metro (British newspaper)|The Metro]]}}</ref> |
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== Veja Também == |
== Veja Também == |
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Revisão das 11h12min de 18 de dezembro de 2022
Deus vult (Latim eclesiástico: 'Deus quer') é um lema cristão relacionado à providência divina.[1] Foi entoado pela primeira vez pelos católicos durante a Primeira Cruzada em 1096 como um grito de guerra, provavelmente sob a forma Deus le veult ou Deus lo vult, conforme relatado pela Gesta Francorum (ca. 1100) e a Historia Belli Sacri (ca. 1130).[a]
Nos tempos modernos, o lema latino tem significados diferentes dependendo do contexto. Tem sido usado como uma metáfora referindo-se à "vontade de Deus" por cristãos ao longo da história, como os puritanos, ou como lema de ordens de cavalaria, como a Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém.[2]
Significado e variantes
A frase aparece de outra forma na tradução da Vulgata do Segundo Livro de Samuel 14:14 da Bíblia: nec vult Deus perire animam ("Deus não quer que nenhuma alma pereça").
As variantes Deus le volt e Deus lo vult, incorretas no latim clássico, são formas influenciadas pelas línguas românicas. De acordo com Heinrich Hagenmeyer, o pronome pessoal 'le' (ou 'lo') provavelmente fazia parte do lema original gritado durante a Primeira Cruzada em Amalfi, uma vez que ambos os autores da Gesta Francorum e da Historia Belli Sacri o relatam.[3] Variantes posteriores incluem o frânces antigo Dieux el volt e o latim clássico Deus id vult ("Deus quer") ou Deus hoc vult ("Deus quer isso").[4]
História
Primeira Cruzada
O grito de guerra da Primeira Cruzada é relatado pela primeira vez na Gesta Francorum, uma crônica escrita ca. 1100 por um autor anônimo associado a Boemundo I de Antioquia logo após a campanha bem-sucedida. De acordo com este relato, enquanto a Cruzada dos Príncipes estava reunida em Amalfi no final do verão de 1096, um grande número de cruzados armados com o sinal da cruz no ombro direito ou nas costas gritaram em uníssono "Deus le volt, Deus le volt, Deus le volt”.[5] O historiador medieval Guiberto de Nogent menciona que "Deus le volt" foi retido pelos peregrinos em detrimento de outros gritos.
A Historia belli sacri, escrita mais tarde por volta de 1131, também cita o grito de guerra.[6] É novamente mencionado no contexto da captura de Antioquia em 3 de junho de 1098. O autor anônimo da Gesta estava entre os soldados que capturaram as torres da muralha e conta que "vendo que já estavam nas torres, começaram a gritar Deus le volt com vozes alegres; então, de fato, nós gritamos".[7]
Roberto, o Monge
Roberto, o Monge, que reescreveu o Gesta Francorum ca. 1120, acrescentou um relato do discurso de Urbano II no Concílio de Clermont, do qual foi testemunha ocular. O clímax do discurso é o apelo de Urbano à ortodoxia, à reforma e à submissão à Igreja. Roberto registra que o papa pediu aos cristãos ocidentais, pobres e ricos, que ajudassem os gregos no leste:
Quando o Papa Urbano disse essas e muitas coisas semelhantes em seu discurso urbano, ele influenciou tanto para um propósito os desejos de todos os presentes que eles gritaram: 'É a vontade de Deus! É a vontade de Deus!' Quando o venerável Romano Pontífice os ouviu, com os olhos elevados ao céu dava graças a Deus e, com a mão ordenando silêncio, dizia: Caríssimos irmãos, hoje se manifesta em vós o que o Senhor diz no Evangelho: "Onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles”. A menos que o Senhor Deus estivesse presente em seus espíritos, todos vocês não teriam proferido o mesmo grito. Pois, embora o grito tenha saído de várias bocas, a origem do grito era uma. Portanto, eu digo a vocês que Deus, que implantou isso em seus seios, o desenhou em vocês. Que este seja os seus gritos de guerra nos combates, porque esta palavra é dada a vocês por Deus. Quando um ataque armado é feito contra o inimigo, que este único grito seja levantado por todos os soldados de Deus: É a vontade de Deus! É a vontade de Deus![8]
Roberto também relata que o grito de Deus lo vult foi primeiro gritado em tom de brincadeira pelos soldados de Boemundo durante seus exercícios de combate, e mais tarde se transformou em um verdadeiro grito de guerra, que Boemundo interpretou como um sinal divino.[9]
Tyerman, escrevendo em 2006, sugere que os aplausos ao discurso de Urbano foram "provavelmente liderados por uma claque papal".
Outros usos
Deus lo vult é o lema da Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém, uma ordem católica romana de cavalaria (restaurada em 1824).
O almirante Alfred Thayer Mahan (1840–1914), um episcopal protestante, usou a expressão para seu argumento do domínio de Cristo como "essencialmente imperial" e que o cristianismo e a guerra tinham muito em comum: "'Deus vult!' digo eu. Foi o grito dos cruzados e dos puritanos e duvido que o homem tenha proferido um mais nobre [um]."
A 1ª Divisão CCNN "Dio lo Vuole" ("Deus quer") foi uma das três divisões italianas de Camisas Negras enviadas à Espanha em 1937 durante a Guerra Civil Espanhola para formar o "Corpo Truppe Volontarie" (Corpo de Tropas Voluntárias), ou CTV.
Em 1947, o prelado canadense George Flahiff usou a expressão Deus Non Vult como título de um exame da perda gradual de entusiasmo pelas cruzadas no final do século XII, especificamente das primeiras críticas às cruzadas por Ralph Niger, escrevendo em 1189.
Divulgado na forma de hashtags e memes da internet, Deus vult goza de popularidade entre os membros da direita cristã, bem como da direita alternativa, por causa de sua representação percebida do choque de civilizações entre o Ocidente cristão e o mundo islâmico.[10][11][12][13] Os memes dos cruzados, como a imagem de um Cavaleiro Templário acompanhado da legenda "Verei sua jihad e levantarei uma cruzada contra você", são populares nas páginas de extrema-direita da Internet.[14] O lema também é usado por grupos nacionalistas cristãos na Europa e foi retratado em grandes faixas durante as marchas que comemoraram o Dia da Independência Nacional da Polônia em 2017.[15][16][17]
Notas
- ↑ Os manuscritos da Gesta Francorum apresentam Deus le volt, Deus lo vult, bem como as formas "corrigidas" Deus hoc vult e Deus vult. Hagenmeyer (1890) cita Barth: "Barbaro-latina vulgi exclamatio vel et tessera est. Videri autem hinc potest, tum idiotismum Francicum propiorem adhuc fuisse latine matrici".
Veja Também
- In hoc signo vinces, "com este sinal vencerás"
- Allāhu akbar, "Deus é grande (o maior)"
- Castigo divino
- Doutrina da guerra justa
- Jus ad bellum
Referências
- ↑ https://www.merriam-webster.com/dictionary/Deus%20vult
- ↑ https://berkleycenter.georgetown.edu/responses/the-alt-right-and-medieval-religions
- ↑ https://archive.org/details/anonymigestafra01hagegoog
- ↑ https://books.google.fr/books?id=e4caAQAAIAAJ&pg=RA1-PA327#v=onepage&q&f=false
- ↑ https://archive.org/details/anonymigestafra00hagegoog/page/151/mode/1up?view=theater
- ↑ https://archive.org/details/anonymigestafra01hagegoog
- ↑ https://archive.org/details/anonymigestafra00hagegoog/page/304/mode/1up?view=theater
- ↑ https://sourcebooks.fordham.edu/source/urban2-5vers.asp#robert
- ↑ https://archive.org/details/anonymigestafra00hagegoog?view=theater#page/n167/mode/1up
- ↑ https://www.washingtonpost.com/outlook/2019/01/22/what-politicians-mean-when-they-call-border-wall-medieval/
- ↑ https://berkleycenter.georgetown.edu/responses/the-alt-right-and-medieval-religions
- ↑ https://www.npr.org/2017/09/04/548505783/scholars-say-white-supremacists-chanting-deus-vult-got-history-wrong
- ↑ https://www.washingtonpost.com/graphics/2017/local/charlottesville-videos/
- ↑ https://time.com/5696546/far-right-history-crusades/
- ↑ https://www.washingtonpost.com/outlook/2019/01/22/what-politicians-mean-when-they-call-border-wall-medieval/
- ↑ https://www.theguardian.com/world/2017/nov/13/polish-president-condemns-far-right-scenes-at-independence-day-march
- ↑ https://www.timesofisrael.com/polish-president-sharply-condemns-weekend-nationalist-march/
Ligações externas
- «Deus Vult». Nova Enciclopédia Internacional (em inglês). 1905