Mulheres do Couço

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Mulheres do Couço é como são conhecidas as trabalhadoras agrícolas e resistentes anti-fascistas da aldeia do Couço, das quais se destacam cinco prisioneiras políticas que estiveram na prisão de Caxias e foram torturadas pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE), durante o Estado Novo em Portugal. A tortura a que foram sujeitas foi descrita no Manifesto de Caxias. Foi alegadamente este o primeiro grupo de mulheres a ser torturadas tanto moral como fisicamente, "como os homens", apesar de Cesaltina Maria Feliciano e Maria Rosa Viseu, presas em 1960 e 1961, respectivamente, já terem sido torturadas. Foi no entanto a partir da detenção destas mulheres que a tortura de mulheres se generalizou.[1]

Contexto histórico[editar | editar código-fonte]

Preparava-se em 1962 no Couço uma greve contra o trabalho de sol a sol, e pela jornada de 8 horas, que envolvera a organização de reuniões clandestinas. Estas tiveram lugar na Serra da Burra, em pescarias no rio Sorraia e num piquenique na Ponte Caleira. A PIDE, alertada para a preparação desta greve, prendeu 15 pessoas, antecedendo manifestações e greves no 1° de Maio.[2][3] Detidas na madrugada de 27 de Abril de 1962, juntamente com dez homens, as cinco mulheres foram levadas para um matadouro nos arredores da aldeia, e depois para o Posto da Guarda Republicana de Coruche. Daí, foram transferidas para Caxias, revistadas e encarceradas, ficando todas na mesma cela.[4][5][3] Nos interrogatórios, levados a cabo na sede da PIDE, na Rua António Maria Cardoso, foram sujeitas a tortura, incluindo espancamentos com cassetete, cutelos, privação de sono e estátua.[2][4][6]

As mulheres[editar | editar código-fonte]

Maria da Conceição Figueiredo[editar | editar código-fonte]

Maria da Conceição Figueiredo, (Couço, 4 de abril de 1934 - ) era padeira. No início da década de 60, abandona o Couço e vai viver para Courelas com o marido, João Pedro Marrafa, que foi preso na mesma data.[3] Na sede da PIDE, foi sujeita a sessenta e seis horas de tortura do sono.[7][8] Libertada em 6 de setembro de 1962.[9]

Maria Custódia Chibante[editar | editar código-fonte]

Maria Custódia Chibante (Couço, 6 de fevereiro de 1933 - Évora, 2020), de pseudónimo Ernesto[10], filha de Palmira dos Santos Canejo, trabalhadora agrícola e de José Ramalho Chibante, pedreiro e trabalhador agrícola sazonal, foi militante do PCP, e resistente anti-fascista. Cresceu no Couço, e cedo deixou a escola para se dedicar ao trabalho agrícola, desenvolvendo uma consciência social ao observar a desigualdade que a rodeava. Mais tarde, tornar-se-ia comerciante, com uma loja que tinha com o marido numa aldeia próxima, Foros de Lagoíços. Aí distribui o jornal Avante! e mobiliza a população para a luta de classes. Foi presa no dia 27 de abril de 1962, e torturada e ameaçada durante 98 horas na sede da PIDE, 75 das quais em tortura do sono.[8] Mais tarde, é colocada em isolamento durante 19 dias, e nos cinco meses e meio que está presa não tem direito a receber visitas. Foi libertada em 11 de outubrl do mesmo ano, quando a PIDE não conseguiu provar as acusações. Em 1965 mudou-se para Évora.[4][5]

Maria Galveias[editar | editar código-fonte]

Maria Guilhermina Ferreira Galveias (Couço, 23 de junho de 1934 - ), ou a Maria Galveias[11], era uma militante comunista iletrada, casada com António Luís de Oliveira, preso desde 1960.[12] Quando é detida, leva consigo a filha, em idade escolar.[2] Na sede da PIDE, foi sujeita a onze dias e onze noites de interrogação, com espancamentos, tortura de sono, e sem a deixarem lavar-se.[7][8] É liberada em 6 de setembro do mesmo ano, por falta de provas para ser levada a julgamento.[13]

Maria Madalena Henrique Castanhas[editar | editar código-fonte]

Maria Madalena Henrique Castanhas, (Couço, 6 de novembro de 1925 - ) era operária agrícola. Vivia com o companheiro, Joaquim Castanhas, que fazia parte do comité do PCP no Couço, a cerca de um quilómetro desta povoação. A sua casa era usada para reuniões do partido. O marido já se encontrava preso desde 1960, e ela é interdita de o visitar porque não eram casados, pelo que se casam enquanto ele está em Caxias.[2] Esteve sessenta e seis horas sem dormir e a ser espancada.[7]

Olímpia Brás[editar | editar código-fonte]

Olímpia Ribeiro da Silva Brás (Couço, 20 de outubro de 1929 - França, 24 de setembro de 2011), nasce Olímpia Ribeiro da Silva, filha de Luísa Maria e David Ribeiro da Silva, que eram proprietários de terras no Couço. Olímpa Brás era a mais nova de três irmãos, e casa aos 16 anos com o militante comunista Arnato Brás, de 21 anos.[14] Em 1947, quando o marido é preso pela primeira vez, Olímpia Brás, grávida de dois meses, inicia a sua ligação ao Partido Comunista Português.[6] Em 1961 promove o boicote do Couço à eleição de deputados para a Assembleia Nacional.[10] Foi presa dia 27 de abril de 1962, na sequência das eleições para a Assembleia Nacional de 1961 e da agitação política do ano seguinte. Levada inicialmente para Coruche, foi depois transferida para a prisão de Caxias, onde esteve durante seis meses, nos quais foi sujeita a várias formas de tortura que lhe causariam problemas de saúde durante anos.[6][8]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. «A História da Pide 9789727599561». dokumen.pub (em inglês). Consultado em 25 de abril de 2023 
  2. a b c d Godinho, Paula (1998). «Memórias da resistência rural no sul - Couço (1958-1962)». Consultado em 25 de abril de 2023 
  3. a b c Godinho, Paula (1 de maio de 2000). «A celebração como mecanismo de reiteração de uma cultura resistente: o caso do Couço (1958-1962)». Etnográfica. Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia (vol. 4 (1)): 129–152. ISSN 0873-6561. doi:10.4000/etnografica.2740. Consultado em 25 de abril de 2023 
  4. a b c Carneiro, Mariana (25 de abril de 2017). «Mulheres de Abril: Testemunho de Maria Custódia Chibante». Esquerda. Consultado em 20 de abril de 2023 
  5. a b «No Limite da Dor de 22 mar 2014 - RTP Play - RTP». RTP Play. Consultado em 25 de abril de 2023 
  6. a b c Auteur., Nobre de Melo, Rose Nery, (1975). Mulheres portuguesas na resistência. [S.l.]: Seara Nova. OCLC 490078656 
  7. a b c Madeira, João (2010). Vítimas de Salazar : Estado Novo e violência política. Luís Farinha, Irene Flunser Pimentel, Fernando Rosas 3. ed ed. Lisboa: Esfera dos Livros. OCLC 838143638 
  8. a b c d «irene pimentel_ A polícia política e a tortura em Portugal, entre 1933 e 1974 - Free Download PDF - 1 MB». xdocz.com.br (em inglês). Consultado em 25 de abril de 2023 
  9. Elas estiveram nas prisões do fascismo. Unión de Resistentes Antifascistas Portugueses 1a edição ed. Lisboa: [s.n.] 2021. OCLC 1258022426 
  10. a b «Cousso de Resistentes – Parte II». Consultado em 25 de abril de 2023 
  11. «"Maria Guilhermina Ferreira Galveias" - Arquivo Nacional da Torre do Tombo - DigitArq». digitarq.arquivos.pt. Consultado em 25 de abril de 2023 
  12. «"António Luís de Oliveira" - Arquivo Nacional da Torre do Tombo - DigitArq». digitarq.arquivos.pt. Consultado em 25 de abril de 2023 
  13. Maria Galveias e o seu contributo para Abril, consultado em 25 de abril de 2023 
  14. «Silêncios e Memórias». silenciosememorias.blogspot.com. Consultado em 25 de abril de 2023 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]