Zonas proibidas

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A Cidade Proibida em Pequim foi residência dos imperadores chineses e suas famílias e centro cerimonial e político do governo chinês durante mais de 500 anos.

Uma zona proibida ou área proibida (do inglês no-go zone) é um bairro ou outra zona geográfica onde alguns ou todos os forasteiros estão fisicamente impedidos de entrar ou podem entrar com risco. O termo inclui zonas de exclusão, que são áreas oficialmente mantidas fora dos limites pelo governo, tais como zonas fronteiriças e zonas de exclusão militar. Inclui também áreas detidas por actores violentos não estatais, tais como organizações paramilitares, de crime organizado e terroristas. [1]

Em alguns casos, estas áreas têm sido detidas por organizações insurgentes que tentam derrubar o governo, tais como a Free Derry, uma área na Irlanda do Norte que foi detida pelo Exército Republicano Irlandês de 1969 a 1972. Noutros casos, as áreas coexistem simplesmente ao lado do Estado; um exemplo é Kowloon Walled City, uma área em Hong Kong essencialmente governada por organizações de tríades desde os anos 50 até aos anos 70.

No século XXI, o termo tem sido mais frequentemente utilizado para se referir a áreas que a polícia ou os trabalhadores médicos consideram demasiado perigosas para entrarem sem pesadios reforços . Funcionários do governo, políticos, jornalistas e pessoas comuns de vários países europeus, incluindo França [2] e Alemanha[3] utilizaram o termo para descrever bairros dentro do seu próprio país. Este uso do termo é controverso, gerando um debate significativo sobre quais as áreas, se as houver, que estão verdadeiramente fora dos limites da polícia.[4][5]

Zonas proibidas na História[editar | editar código-fonte]

Cidade murada de Kowloon[editar | editar código-fonte]

A cidade murada de Kowloon em 1989.

Sem nenhuma fiscalização dos governos chinês ou britânico, exceto por algumas incursões da Polícia de Hong Kong, a cidade murada de Kowloon, um enclave chinês, tornou-se um paraíso para o crime e as drogas. [6]

A partir da década de 1950, grupos da Tríade, como o 14K e o Sun Yee On, dominaram os incontáveis ​​bordéis, casas de jogo e antros de ópio da Cidade Murada . A Cidade tornara-se um refúgio tão bom para os criminosos que a polícia só se aventurava nela em grandes grupos.[7][6]

Foi apenas durante um julgamento de 1959 por um assassinato ocorrido dentro da Cidade Murada que o governo de Hong Kong foi considerado tendo jurisdição em Kowloon. Nessa época, a Cidade Murada era praticamente governada pelos sindicatos do crime organizado, as Tríades. [8]

Em 1994 toda a área acabou convertida num parque.[6]

Irlanda do Norte[editar | editar código-fonte]

O mural que marcava a entrada da Free Derry.

Durante o conflito da Irlanda do Norte, o termo no-go zone foi aplicado às suas áreas urbanas onde o Royal Ulster Constabulary (RUC) e o Exército Britânico não conseguiam agir abertamente. [9] Entre 1969 e 1972, bairros irlandeses nacionalistas/republicanos em Belfast e Derry foram fechados com barricadas pelos residentes. As áreas eram policiadas por vigilantes e pelas facções oficiais e provisórias do Exército Republicano Irlandês (IRA) que operavam abertamente. A área proibida mais notável foi chamada de Free Derry.[10]

A existência dessas áreas foi um desafio à autoridade do governo britânico. A 31 de Julho de 1972, o exército britânico demoliu as barricadas e restabeleceu o controlo na Operação Motorman. [11][12] Foi a maior operação militar britânica desde a Crise do Suez. [13] Embora as áreas já não estivessem barricadas, as forças de segurança britânicas continuavam a ter dificuldade em operar e eram regularmente atacadas. [9] Como resultado, entraram apenas em colunas blindadas e em certas circunstâncias, tais como raides a casas.[14] Barricadas nas áreas interditas em vários povoados da região foram novamente criadas por amotinados nacionalistas e republicanos quando a violência, apoiada por paramilitares republicanos, irrompeu após o desfile da Ordem de Orange de Drumcree em Julho de 1997, poucos dias antes do segundo e último cessar-fogo provisório do IRA.[15] A RUC e o exército britânico foram forçados a retirar-se debaixo de fogo de vários bairros de Belfast. [16][17] A presença da polícia nestas áreas permaneceu controversa até aos anos 2000, uma vez que o principal partido político republicano, o Sinn Féin, se recusou a apoiar a polícia. Em 2007, contudo, o partido votou a favor do novo Serviço de Polícia da Irlanda do Norte (PSNI).[18] Em Julho de 2007, o Ministério da Defesa britânico publicou Operation Banner: An analysis of military operations in Northern Ireland, que avalia o papel do Exército no conflito da Irlanda do Norte; o documento reconhece que, já em 2006, ainda existiam "áreas da Irlanda do Norte fora do alcance dos soldados".[19]

Cidade Proibida em Pequim[editar | editar código-fonte]

A Cidade Proibida foi o palácio do Imperador da China desde a Dinastia Ming até o final da Dinastia Qing. Por quase 500 anos, foi o lar dos imperadores e suas famílias, bem como o centro cerimonial e político do governo chinês. A construção durou mais de 14 anos e usou mais de um milhão de trabalhadores.

Na década de 1410, foi o imperador Ming Yongle (1403-24) que moveu a sua corte de Nanjing para Pequim, para a qual concebeu um grande plano. A Cidade Proibida, cercada por um muro exterior , continha no seu interior uma série de edifícios, que incluiam os diversos ministérios, e uma série de portões e barreiras, cobrindo mais de 72 hectares e possuindo mais de 900 quartos. Foi concebida a uma escala monumental, de modo a inspirar temor não só aos súbditos da China, mas também aos povos tributários que viviam ao longo das extensas fronteiras do território. [20]

Alegadas zonas proibidas na atualidade[editar | editar código-fonte]

Europa[editar | editar código-fonte]

Nos séculos XX e XXI, há debates sobre a existência e a importância de alegadas "zonas proibidas" em vários países da Europa Ocidental . [21] Certas áreas de cidades na Europa Ocidental que são chamadas de "zonas proibidas" são a maior parte das vezes habitadas por muçulmanos imigrantes de África e de países árabes do sudoeste da Ásia, não integrados.[22] Tal tipo de zonas são conhecidas por diversas designações, tais como "áreas vulneráveis" na Suécia.[23][24][25] ou "zonas urbanas sensíveis" (ZUS) em França.[26][27]

A esquadra de polícia de Rinkeby, na Suécia, foi fechada em 2014. Uma nova esquadra deveria ter sido construída , mas nenhuma construtora aceitava a obra por não existir segurança. [28] Por fim, a nova esquadra foi inaugurada em Setembro de 2020.[29]

O grau de inacessibilidade de tais zonas apresenta diversas graduações, variando por vezes de acordo com o país de origem dos imigrantes. Daniel Pipes, que visitou algumas dessas áreas, sem problemas excepto em Marselha, nota que civis não-muçulmanos geralmente podem entrar em áreas de maioria muçulmana sem receio, desde que não mostrem claramente pertencer a certos grupos: judeus com quipás, sacerdotes, gays.[27] A esses primeiros grupos, porém, a ativista de direitos humanos Hirsi Ali acrescenta mais um, o mais importante em números e muitas vezes negligenciado: as mulheres.[30]

Após os ataques de Paris em 2015 , o município de Molenbeek em Bruxelas, Bélgica, foi descrito por Brice De Ruyver, um conselheiro de segurança do primeiro-ministro Guy Verhofstadt , como uma "zona proibida", onde jovens com pouca instrução, atraídos pelo pequeno crime, acabam em conflito com a polícia e são recrutados por grupos radicais.. Molenbeek é uma das áreas mais pobres do país, em 2015 com uma taxa de desemprego de 30% . [31] Outros acadêmicos, comentaristas, jornalistas e residentes contestam a descrição de Molenbeek como zona proibida.[32]

Na Alemanha, em conexão com o caso das agressões sexuais no Ano Novo de 2016 em Colónia e noutras mais cidades, a vereadora Judith Wolter do movimento anti-islâmico de oposição Pro Köln afirmou em 2016, que algumas áreas da cidade podem ser perigosas não só para os turistas mas também para os residentes locais, e as autoridades aí não podem garantir a segurança. Ela recomendou especialmente às mulheres que evitassem certas partes da cidade. [33]

Em Julho de 2015, um relatório confidencial da polícia de Duisburg sobre a crescente impotência dos policiais diante de gangues criminosas e clãs familiares alimentou ainda mais a discussão sobre vácuos legais em partes da Renânia do Norte-Vestfália. Segundo o documento, existem bairros em que as gangues já ocuparam ruas inteiras. Moradores e empresários são intimidados, as linhas de elétricos tornam-se pesadelos à noite e as mulheres policiais, em particular, são confrontadas com um alto grau de agressividade e desrespeito.[34]

Dois anos após o caso do Ano Novo em Colónia, a então Chanceler Angela Merkel teve finalmente de admitir que existiam zonas proibidas na Alemanha: "(...) áreas onde ninguém se atreve a ir" e acrescentou: "Existem tais áreas e é preciso chamá-las pelo seu nome e fazer qualquer coisa a seu respeito". [35]

Tais zonas têm dois pontos em comum: baixos rendimentos e um grande número de imigrantes provenientes de países de maioria muçulmana. Nelas se vive a progressiva, lenta e silenciosa erosão dos direitos da mulher e o seu desaparecimento dos espaços públicos, ou por serem habitualmente perseguidas e assediadas, ou por viverem em casa, longe das vistas, ou porque conseguiram mudar-se para outros locais.[36][37]

Israel[editar | editar código-fonte]

Haredim dirigindo-se à sinagoga. (Rehovot, Israel , 2004)

Em Israel, os judeus ultra-ortodoxos conhecidos como os haredim entram frequentemente em choque não só com israelitas seculares mas também com os crentes de outros ramos do judaísmo. [38]

Os haredim compreendem cerca de 7 a 12 por cento da população judia em Israel. Usam um vestuário específico e bem reconhecível, têm uma vida comunitária intensiva dentro dos seus verdadeiros enclaves, são antissionistas e empenham-se a fundo no estudo das escrituras judaicas, principalmente o Talmud.[39] São por vezes chamados de "taliban judaicos", praticando a segregação de género. [40]

As semelhanças entre o fundamentalismo haredim e o fundamentalismo islâmico saltam à vista. Considerando-se a si mesmos como os autênticos crentes, os haredim usam de violência, verbal e mesmo física, contra todos os que no seu ver desrespeitam as suas superiores crenças: reformistas, conservadores, seculares, patologistas, arqueólogos, jornalistas e fotógrafos, policiais, mulheres com vestuário "impróprio" e assim por diante.[39] [38]Os haredim pretendem impor o seu modelo de vida não somente aos seus, mas a todos os que penetram no seu "território", ou mesmo se encontram fora dele. [38]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Chaudhry, Rajeev (2013). «Violent Non-State Actors: Contours, Challenges and Consequences» (PDF). CLAWS Journal l Winter 2013167.  Citando: Embora os padrões de causalidade nem sempre sejam claros, existe uma correlação entre a fraqueza de um estado e a emergência de um ou outro tipo de actores violentos não estatais. Estados com baixos níveis de legitimidade, por exemplo, são incapazes de criar ou manter a lealdade e fidelidade das suas populações. Nestas circunstâncias, indivíduos e grupos voltam normalmente a, ou desenvolvem, padrões alternativos de filiação. O resultado é muitas vezes a criação de zonas ou espaços "no-go" em que os actores violentos não estatais emergem como uma forma de governação alternativa.
  2. Stainville, Raphaël (3 de Agosto de 2010). «Insécurité : «C'était intenable, nous sommes partis»». Le Figaro (em francês) 
  3. Associated Press (28 de Fevereiro de 2018). «Merkel says Germany has 'no-go areas;' gov't won't say where». Washington Post (Arq. em WayBack Machine) 
  4. Palma, Bethania (31 de março de 2017). «Crime in Sweden, Part III: Does Sweden Have 'No-Go Zones' Where the Police Can't Enter? - Swedish police have identified "problem areas," but say there is no such thing as a "no-go zone."». Snopes (em inglês) 
  5. Chalmers, Robert (21 de junho de 2017). «Is Molenbeek really a no-go zone?». British GQ (em inglês) 
  6. a b c Rackard, Nicky (18 de abril de 2013). «Infographic: Life Inside The Kowloon Walled City». ArchDaily (em inglês) 
  7. Carney, John (3 de Janeiro de 2015). «Kowloon Walled City: Life in the City of Darkness». The travel club 
  8. Wilkinson, Julia (1993). «Cap: A Chinese Magistrate's Fort». City of Darkness: Life in Kowloon Walled City. [S.l.]: Watermark Publications. pp. 60–71 
  9. a b Gillespie, Gordon (2009). The A to Z of the Northern Ireland Conflict. [S.l.]: Scarecrow Press. pp. 177–178 
  10. «Introduction». The Museum of Free Derry (Arq. em WayBack Machine). Consultado em 16 de março de 2023 
  11. «IRA left Derry 'before Operation Motorman». BBC News (em inglês). 6 de Dezembro de 2011 
  12. «History – Operation Motorman». The Museum of Free Derry (Arq. em WayBack Machine). 21 de julho de 2010 
  13. «Chronology of the Conflict 1972». CAIN Archive - Conflict and Politics in Northern Ireland. Consultado em 16 de março de 2023 
  14. Bruce, Steve (Maio de 1993). «Alienation Once Again». Fortnight (magazine) (317): 18-19. JSTOR 25554014 
  15. Robinson, Carmel (8 de Julho de 1997). «RUC lists over 100 injured in disturbances». The Irish Times (em inglês). Consultado em 16 de março de 2023 
  16. «IRA engages Crown Forces». Republican News. 10 de Julho de 1997 
  17. «Not this time». Beaver County Times (Arq. em Google News). 8 de Julho de 1997 
  18. Joyce, Peter (2011). Policing: Development and Contemporary Practice (em inglês). [S.l.]: Sage. pp. 21–22 
  19. «Operation Banner» (PDF). Julho de 2006. p. 16 (cap.2) 
  20. Barmé, Geremie (2008). The Forbidden City. [S.l.]: Harvard University Press. pp. xi–xii 
  21. «‚No-go zóny přerůstají Paříži přes hlavu: žena tu není totéž co muž' (Zonas proibidas estão a crescer demais em Paris: uma mulher aqui não é igual a um homem )». Echo24 (em checo). 25 de Janeiro de 2016 
  22. «Nemuslimům vstup zakázán? Ghetta a no-go zóny jsou podhoubím kriminality v Evropě (Não-muçulmanos proibidos de entrar? Guetos e zonas proibidas são a raiz do crime na Europa)». ČT24 - Česká televize (em checo). 14 de Agosto de 2015 
  23. «Police add eight new "especially vulnerable" areas in Sweden». Sveriges Radio (em inglês). 12 de Junho de 2017 
  24. Lowe, Josh (21 de Junho de 2017). «Swedish Police Identify Dozens of 'Vulnerable Areas'». Newsweek (em inglês) 
  25. Magnus, Anders (e outros) (8 de Maio de 2016). «Svensk politi: – Vi er i ferd med å miste kontrollen (Polícia sueca: - Estamos prestes a perder o controle).». NRK (em norueguês bokmål) 
  26. Pipes, Daniel (17 de Janeiro de 2015). «The 751 No-Go Zones of France». Daniel Pipes (em inglês) 
  27. a b Pipes, Daniel (2 de Dezembro de 2015). «Muslim "No-go Zones" in Europe?». Daniel Pipes (em inglês) 
  28. Björklund, Andreas (10 de Março de 2017). «Källor till SVT: Ingen vill bygga ny polisstation i Rinkeby (Fontes à SVT: ninguém quer construir uma nova delegacia em Rinkeby)». SVT Nyheter (em sueco) 
  29. «Police officers will receive a protection patrol at night». Teller report (em inglês). 8 de Julho de 2020 
  30. Hirsi Ali, Ayaan (2021). Prey: immigration, Islam, and the erosion of women’s rights. [S.l.]: Harper Collins 
  31. Cendrowicz, Leo (17 de novembro de 2015). «Visiting Molenbeek - home of two of the gunmen in the Paris attack». The Independent (em inglês) 
  32. Nast, Condé (21 de junho de 2017). «Is Molenbeek really a no-go zone?». British GQ (em inglês) 
  33. «V některých oblastech v centru vám nemůžeme zajistit bezpečnost, vzkazuje radní Kolína nad Rýnem». Novinky.cz (em checo). 1 de Junho de 2016. Consultado em 15 de abril de 2023 
  34. «Polizei warnt: Banden haben ganze Straßenzüge im Griff». WAZ (Arq. em WayBack Machine). 27 de Julho de 2015 
  35. «Merkel says Germany has 'no-go areas;' gov't won't say where». AP NEWS (em inglês). 28 de fevereiro de 2018. Consultado em 15 de abril de 2023 
  36. Hirsi Ali, Ayaan (2021). «Cap. 1 - The Clock Turns Back». Prey: immigration, Islam, and the erosion of women’s rights. [S.l.]: Harper Collins 
  37. Galien, Michael van der (15 de Dezembro de 2016). «Shocking Video: Muslim Immigrants Ban Women From Entire Neighborhoods in France». pjmedia.com (em inglês) 
  38. a b c Guimarães, Maria João (28 de Dezembro de 2011). «Aumenta a fúria e a indignação contra o fundamentalismo ultra-ortodoxo». Público 
  39. a b Bryant, Clifton (editor) (2011). «Cap.: Theocrats versus democrats - Unconventionality and deviance in a Kulturkampf (por Nachman Ben-Yehuda)». The Routledge Handbook of Deviant Behavior. [S.l.]: Routledge. pp. 242– 243 
  40. Hoffman, Gil (10 de Novembro de 2021). «Haredi party wants to turn Israel into Taliban state». The Jerusalem Post (em inglês) 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Barmé, Geremie R. (2008) - The Forbidden City - Harvard University Press
  • Hirsi Ali, Ayaan (2021) - Prey: immigration, Islam, and the erosion of women’s rights - Harper Collins
  • Kassam, Raheem (2017) - No go zones: How Sharia Law is coming to a neighborhood near you - Regnery Publishing

Ligações externas[editar | editar código-fonte]