Viva e deixe viver

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Viva e deixe viver (em inglês: live and let live; em francês: vivre et laisser vivre) foi o aumento espontâneo de comportamento cooperativo não agressivo que se desenvolveu durante a Primeira Guerra Mundial, especialmente durante períodos prolongados de guerra de trincheira no "Front'' Ocidental. Talvez um dos mais famosos exemplos seja a Trégua de Natal de 1914.

É um processo que pode ser caracterizado como a abstenção deliberada do uso de violência durante a guerra. Às vezes, ele assumiu a forma de tréguas ostensivas ou de pactos negociados localmente pelos combatentes. Em outros momentos, manifestou-se como um acordo tácito de comportamento — às vezes caracterizado como "deixar os cães dormindo"—com a qual ambos os lados se abstinham deliberadamente de atirar e de usar suas armas, ou de descarregá-las num ritual ou uma rotina de maneira que fosse sinalizada sua intenção não letal.

Exemplos[editar | editar código-fonte]

Este comportamento foi encontrado em unidades militares de pequeno porte, tais como, seções, pelotões ou companhias, geralmente observadas pelas "outras patentes", por exemplo, soldados, cabos e sargentos. Exemplos foram encontrados em soldados durante a sentinela, recusando-se a atirar em soldados inimigos expostos, até franco-atiradores, grupos portando metralhadoras e até mesmo baterias de artilharia.

Comandantes de escalões superiores — tais como os de divisões, corpos de exército e exércitos—e suas equipes estavam cientes desta tendência à não agressão, e, por vezes, analisavam estatísticas dos baixas letais e não letais para detectá-lo. Os grupamentos e as patrulhas foram ordenadas a promover o correto "espírito ofensivo" das tropas.[1]

O sistema de "Viva e deixe Viver" era frágil e facilmente interrompido à primeira ocorrência de uso de força letal, enfraquecendo-se cada vez mais com o avanço da guerra.

Pesquisa[editar | editar código-fonte]

Tony Ashworth[2] pesquisou este tópico baseado em diários, cartas e depoimentos de veteranos de guerra. Ele descobriu que o "viva e deixe viver" foi amplamente conhecido à época e era mais comum em determinadas épocas e lugares. A condição era frequentemente mais vivida e encontrada quando uma unidade havia sido retirada da combate ativo e havia sido enviada para descanso.

Teoria dos jogos[editar | editar código-fonte]

Alguns estudiosos da teoria dos jogos, tais como Robert Axelrod, têm caracterizado o Viva e Deixe Viver como uma variante reafirmada e reiterada do dilema do prisioneiro. Axelrod vincula Viva e Deixe Viver à estratégia de cooperação referida como Tit for Tat.

A interpretação de Axelrod acerca do "Viva e Deixe Viver" como o "dilema do prisioneiro" foi contestada pelos cientistas políticos Joanne Gowa[3][4] que em momentos distintos argumentaram que os pressupostos subjacentes ao dilema do prisioneiro não se sustentam nesse exemplo.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Ashworth, Tony. (1968). "The Sociology of Trench Warfare", British Journal of Sociology, 21:407–20.
  • Axelrod, Robert. (2006). The Evolution of Cooperation Revised edition. Perseus Books Group, ISBN 0465005640
  • Sheffield, G. D. (2000). 'Leadership in the Trenches: Officer-Man Relations, Morale and Discipline in the British Army in the Era of the First World War'. Basingstoke: Macmillan. ISBN 0333654110
  • Collaboration. (2007)'Meetings in No Man’s Land'. Constable & Robinson. ISBN 1845295137
  • Dawkins, Richard. (1976). "The Selfish Gene" 30th Anniversary Edition Oxford. ISBN 978-0-19-929115-1

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. Kellett, Anthony. Combat Motivation: The Behaviour of Soldiers in Battle. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-89838-106-1 
  2. Ashworth, Tony (2000).
  3. Anarchy, Egoism, and Third Images: The Evolution of Cooperation and International Relations The Evolution of Cooperation. by Robert Axelrod. Review by: Joanne Gowa. International Organization, Vol. 40, No. 1 (Winter, 1986), pp. 167-186. https://www.jstor.org/stable/pdfplus/2706746.pdf
  4. Andrew Gelman, Game theory as ideology: some comments on Robert Axelrod's The Evolution of Cooperation. QA-Rivista dell'Associazione Rossi-Doria 2, 167-176 (1988). http://www.stat.columbia.edu/~gelman/research/published/gelmanaxelrod_001.pdf