Batalha de Marcianópolis

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Batalha de Marcianópolis
Guerra Gótica (376–382)

Movimentos dos tervíngios e grutungos no Império Romano em 376
Data 376/377
Local Ca. 14 de Marcianópolis (moderna Devnja, na Bulgária)
Coordenadas 43° 13' N 27° 35' E
Desfecho Vitória esmagadora tervíngia
Beligerantes
  Tervíngios rebeldes
Império Romano
Comandantes
  Fritigerno Império Romano Lupicino
Forças
5 000[1]
(ca. 1 000 ginetes)[1]
7 000-8 000[2]
(ca. 1 000 ginetes)[1]
Baixas
Desconhecidas Desconhecidas
Marcianópolis está localizado em: Bulgária
Marcianópolis
Localização de Marcianópolis no que é hoje a Bulgária

A Batalha de Marcianópolis, o primeiro confronto notável da Guerra Gótica de 376-382, ocorreu em 376 ou 377 após a migração gótica tervíngia sobre o Danúbio. Foi travada entre as forças do rei tervíngio Fritigerno, que rebelou-se contra o Império Romano após uma tentativa de assassinato durante um banquete em Marcianópolis, e as forças do governador romano Lupicino. O conflito teve como resultado uma derrota esmagadora para os romanos, com Lupicino sendo obrigado a fugir do campo de batalha.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Em 375/376, os hunos avançaram contra os godos nas margens do mar Negro.[3] As incursões hunas causaram atritos no seio da confederação dos tervíngios, o ramo ocidental dos godos, enquanto obrigou os grutungos, o ramo oriental, a migrar em direção a fronteira tervíngia. O juiz Atanarico reuniu um exército para confrontar os invasores, mas foi derrotado e teve que fugir para a Caucalândia.[4] No verão de 376, o rei Fritigerno persuadiu muitos dos seguidores de Atanarico a abandoná-lo e então propôs aos tervíngios que solicitassem ajuda aos romanos. Alavivo, outro nobre gótico, é mencionado nas fontes como líder da negociação.[5] Ele conseguiu permissão do imperador Valente para assentarem-se no império.[6][7]

Segundo a resposta de Valente, que estava em Antioquia, seriam assentados na Mésia e Dácia e receberiam assistência romana durante a migração através do rio e antes de tornarem-se auto-suficientes e serem capazes de prover seu próprio sustento. Por estar em guerra com o Império Sassânida, Valente esperava poder recrutar boa parte deles como soldados para fortificar as cidades orientais,[8] bem como esperava que os demais seriam assentados como fazendeiros e então pagariam impostos.[9] O plano, contudo, acabou frustrado.[10]

Os godos atravessaram próximo de Durostoro (atual Silistra, na Bulgária)[10] e seu número excedeu a quantidade prevista, tornando insuficiente os suprimentos recolhidos, situação agravada pela demora de quase dois meses para a chegada da resposta imperial. Outrossim, tirando proveito da consequente fome sentida pelos recém-chegados, os oficiais romanos Lupicino e Máximo conseguiram muito dinheiro com a venda de miúdas porções de alimentos e carcaças de cachorros pelo preço da escravização de crianças tervíngias,[8] inclusive aquelas de origem nobre.[10]

Batalha e rescaldo[editar | editar código-fonte]

Soldo de Valente (r. 364–378)

Como forma de controlar os inquietos tervíngios, Lupicino ordenou que as tropas da Trácia fossem enviadas à escolta dos imigrantes para um acampamento nas cercanias de Marcianópolis (atual Devnja).[11] Em Marcianópolis, provavelmente no outono de 376[12] ou inverno de 376/377,[13] Lupicino convocou Fritigerno e Alavivo para um banquete reconciliatório. Nesse ínterim, um grupo de godos famintos atacou as proximidades do assentamento e o oficial romano, interpretando como um golpe, mandou que seus homens matarem os guardas dos líderes tervíngios. Segundo Jordanes, Alavivo foi morto em meio à confusão enquanto Fritigerno escapava;[14] para Amiano Marcelino, no entanto, Fritigerno conseguiu convencer Lupicino a deixá-lo ir sob pretexto de poder acalmar seu povo.[15]

Fritigerno formou um exército com o qual começou a saquear vilas e fazendas próximas à cidade e incendiou tudo em seu caminho. Lupicino agrupo todas as unidades romanas disponíveis em Marcianópolis para fazer frente à destruição gótica e marchou ca. 14 quilômetros para encontrar os rebeldes.[16][17] Simon MacDowall estima que o contingente de Fritigerno era composto de 5 000 homens, dos quais 1 000 eram ginetes, enquanto Lupicino comandou 7 000-8 000, dos quais 1 000 eram ginetes.[18] Apesar da vantagem numérica, Lupicino foi severamente derrotado e quase perdeu sua vida em combate. Para evitar esse destino, decidiu abandonar seus soldados à morte,[19] bem como perdeu seus estandartes.[20]

Essa vitória tervíngia abriu caminho à depredação das províncias balcânicas sem oposição pelos meses consecutivos[9] e motivou os mineiros trácios, os romanos subalternos sobretaxados e os escravos de origem goda a unirem-se à revolta,[21] bem como um destacamento romano de origem tervíngia liderado por Colias e Suérido que realizou um cerco mal-sucedido contra Adrianópolis.[22]

Referências

  1. a b c MacDowall 2011, p. 43.
  2. MacDowall 2011, p. 42.
  3. Frassetto 2013, p. 262.
  4. Hughs 2013, p. 149.
  5. Wolfram 1990, p. 72.
  6. Curran 1998, p. 95.
  7. Heather 2005, p. 152-153.
  8. a b Hughs 2013, p. 153-154.
  9. a b Frassetto 2013, p. 263.
  10. a b c Wolfram 1990, p. 119-120.
  11. Hughs 2013, p. 154.
  12. Burns 1994, p. 26.
  13. Heather 2005, p. 164.
  14. Martindale 1971, p. 374.
  15. Lenski 2002, p. 328.
  16. Kulikowski 2006, p. 133–134.
  17. Heather 2005, p. 171.
  18. MacDowall 2011, p. 42-43.
  19. Coombs-Hoar 2015, p. 55.
  20. Hughs 2013, p. 156.
  21. Wolfram 1990, p. 120.
  22. Wolfram 1990, p. 120-121.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Burns, Thomas S. (1994). Barbarians Within the Gates of Rome: A Study of Roman Military Policy and the Barbarians, Ca. 375-425 A.D. Bloomington, Indiana: Indiana University Press. ISBN 0253312884 
  • Coombs-Hoar, Adrian (2015). Eagles in the Dust: The Roman Defeat at Adrianopolis AD 378. Barnsley, South Yorkshire: Pen and Sword. ISBN 1473852463 
  • Curran, John (1998). Cameron, Averil, ed. The Cambridge Ancient History. Volume XIII. The Late Empire, A.D. 337—425. Cambridge: Cambridge University Press. ISBN 978-0-521-30200-5 
  • Frassetto, Michael (2013). Early Medieval World, The: From the Fall of Rome to the Time of Charlemagne. Santa Barbara, Califórnia: ABC-CLIO. ISBN 1598849964 
  • Hughs, Ian (2013). Imperial Brothers: Valentinian, Valens and the Disaster at Adrianople. Barnsley: Pen and Sword. ISBN 1848844174 
  • Kulikowski, Michael (2006). Rome's Gothic Wars: From the Third Century to Alaric. Cambridge: Cambridge University Press 
  • Lenski, Noel Emmanuel (2002). Failure of Empire: Valens and the Roman State in the Fourth Century A.D. Berkeley e Los Angeles: California University Press. ISBN 978-0-520-23332-4 
  • MacDowall, Simon (2011). Oriol Poveda Guillén (trad.), ed. El ocaso de Roma. Adrianópolis. Madri: Osprey Publishing. ISBN 978-84-473-7336-9 
  • Martindale, J. R.; A. H. M. Jones (1971). The Prosopography of the Later Roman Empire, Vol. I AD 260-395. Cambridge e Nova Iorque: Cambridge University Press 
  • Wolfram, Herwig (1990). History of the Goths. Berkeley, Los Angeles e Londres: University of California Press. ISBN 9780520069831