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Gambiarra evolutiva

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Gambiarra evolutiva[1] (Evolutionary kluge[2] ou simplesmente Kluge[3]) tem sido um termo utilizado nos campos da ciência evolucionista para descrever estruturas, comportamentos e órgãos imperfeitos, desajeitados, inelegantes, ineficientes, difíceis de entender ou prejudiciais que são resultantes do processo evolutivo [4][5][3][1]. O termo tem aparecido na literatura[4][2] e se tornado familiar entre muitos dos cientistas, aparecendo até como título no livro Kluge do psicólogo Gary Marcus, da Universidade de Nova York, que usa desta analogia para descrever a mente humana[3]. Richard Brodie define kluge em seu livro "Virus of the Mind: The New Science of the Meme" como um jargão para o uso de uma peça não particularmente adequada para seu propósito, ele aborda que a evolução favorece e até mesmo valoriza a formação de gambiarras ou kluges[2].

Passagens na literatura científica

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Ano Nome da obra / título do artigo Autor Ref
2007 O Vazio da Máquina André Cancian [1]
Mas o fato é que somos uma gambiarra evolutiva, e mesmo que essa ideia seja incômoda, ela nos permite compreender em função de que está programada essa realidade virtual chamada consciência – e as emoções que a norteiam - , e assim finalmente entendamos um pouco melhor por que somos tão contraditórios e tão complicadamente incoerentes.
2007 The Accidental Mind David Linden [5]
Não é que tenhamos pensamentos e sentimentos fundamentalmente humanos, apesar do design gambiarra do cérebro moldado pelas reviravoltas da história evolutiva. Pelo contrário, nós os temos precisamente por causa dessa história.
2008 Kluge Gary Marcus [3]
Outro exemplo bem conhecido de uma gambiarra evolutiva vem a partir de um detalhe bastante íntimo da anatomia masculina. A tubulação que funciona desde o testículo até a uretra (o canal deferente) é muito mais necessário: ele corre de volta para a frente, dá voltas ao redor, e faz um grau de 180 graus olta para o pênis.
2009 Virus of the Mind Richard Brodie [2]
Exemplo clássico de uma gambiarra evolutiva é o olho humano. Os nervos que conectam as células sensíveis à luz ao cérebro realmente saem pela frente da retina, em vez da parte de trás - a "fiação" se projeta no campo de visão do olho. É difícil imaginar um engenheiro, muito menos Deus, projetando algo dessa maneira. Mas a evolução tomou que teve que trabalhar e com gambiarra por gambiarra, construiu um olho.
2011 Inside Jokes Matthew Hurley et al. [6]
Nosso raciocínio rápido como humanos é o resultado de uma série de gambiarras evolutivas empilhados uns sobre os outros - um dos quais é o traço do humor. Este capítulo apresenta as características do pensamento que criam um nicho para o humor.
2012 O Cérebro Imperfeito Dean Buonomano [7]
O neurocientista David Linden descreveu o cérebro humano como uma progressiva acumulação de soluções de contorno ou remendos temporários, as famosas gambiarras. Durante a evolução do cérebro, novas estruturas foram colocadas sobre estruturas funcionais mais antigas, o que gerou redundâncias, desperdícios de recursos, complexidade desnecessária e, às vezes, soluções conflitantes para o mesmo problema.
2013 Fofuchos de Darwin Superinteressante [8]
[...] Para entender melhor o significado desse fato, é importante levar em conta que a evolução é mestra em pegar características já existentes e usá-las para criar “gambiarras” se isso for capaz de favorecer as chances de um indivíduo de sobreviver e se reproduzir.
2018 Ateísmo e Niilismo André Cancian [9]
Caímos de paraquedas nessa megaestrutura de gambiarras evolutivas, e não foi fácil colocar cada peça em seu lugar. mesmo assim, parecem ser poucos os que conseguem assimilar esses fatos sem enlouquecer, pelo menos um pouco.
2019 Darwin sem frescura Pirula e Reinaldo J. Lopes [10]
[...] Também pode ser um ótimo exemplo de exaptação: quando uma estrutura que evoluiu com determinada função vira uma “gambiarra” evolutiva de sucesso, sendo usada para funções diferentes. Um exemplo do papel que muitos.
2021 Ensino de Biologia Leonardo Araújo e Gilberto Vieira [11]
[...] Ou seja, os organismos seriam, de alguma forma, "gambiarras evolutivas". Podemos descrever quatro vias pelas quais a modulação da expressão gênica pode proporcionar o aparecimento de variações fenotípicas, que serão alvo, posteriormente, da seleção natural.

Exemplos nos seres vivos

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Ver artigo principal: Lista de gambiarras evolutivas
  1. Caracóis defecam acima da cabeça
  2. Olhos do linguado precisam migrar
  3. A bolsa do coala abre-se para baixo
  4. Cogumelos com lamelas do lado de dentro
  5. Figos são flores invertidas
  6. Receptores ópticos dos tetrápodes
  7. Nervo laríngeo das girafas gasta 4,5 metros
  8. Nervo laríngeo dos saurópodes gasta 50 metros
  9. Nervo laríngeo de 3,5 metros em cobras aquáticas
  10. Nervo de voo dos gafanhotos africanos
  11. Cacho da bananeira dentro da planta
  12. Canal espermático dos primatas de 40 cm
  13. Via neural dos olhos até a glândula pineal
  14. Palmas que perfuram seus próprios cladódios
  15. Candelabros que perfuram seus próprios troncos
  16. Dentes do Babirusa perfuram próprio crânio
  17. Sapo que cria garras quebrando seus ossos
  18. Gatos possuem espinhos no pênis
  19. Morcegos possuem espinhos no pênis
  20. O percevejo que realiza cópula forçada
  21. Kiwis colocam ovos desproporcionais
  22. Hienas dão à luz por um pseudo-pênis
  23. Reprodução do maracujá depende do clima
  24. Vivipação em diferentes espécies vegetais
  25. Macrófitas submersas requerem polinização
  26. O ferrão das abelhas fica preso à vítima
  27. Jabutis podem não conseguir se desvirar
  28. Muitos besouros não conseguem se desvirar
  29. Formigas e a espiral da morte
  30. Galhada do alce irlandês causou sua extinção
  31. Seres aquáticos que podem se asfixiar
  32. Tubarões que não podem parar de nadar
  33. Cetáceos podem se asfixiar
  34. Peixes pacus podem se asfixiar
  35. Tartarugas marinhas podem se afogar
  36. Sirênios podem se asfixiar
  37. Ictiossauros e mosassauros podiam se asfixiar
  38. Mariposas que não possuem boca
  39. Moscas que não possuem boca
  40. Ácaros que não possuem ânus
  41. Desprovidos de outros órgãos
  42. Cavalos não possuem o centro de vômito
  43. Plantas que colocam frutos sem sementes
  44. Cavalos possuem somente um dedo
  45. Folhas que não possuem clorofila
  46. Vespas que inseminam fêmeas antes de nascerem
  47. Cuco: o pássaro que mata os irmãos adotivos
  48. Tubarão-touro devora irmãos ainda no útero
  49. Louva-a-deus devora o macho na relação sexual
  50. Viúva-negra devora macho e os próprios irmãos
  51. Micromalthus debilis devora a mãe viva
  52. Cecidomiídeos: moscas que devoram a mãe viva
  53. Stegodyphus: aranhas que devoram a mãe viva
  54. Infanticídio para sobrevivência
  55. Ovelhas e cabras podem rejeitar seus filhotes
  56. Pandas escolhem um filho para morrer
  57. Bonobos devoram os filhotes para se impor
  58. Aves eliminam filhotes indesejáveis
  59. Hamister pode devorar os filhotes
  60. Vespa que injeta larvas em si mesma
  61. Coalas necessitam fazer coprofagia
  62. Coelhos necessitam fazer acecotrofia
  63. Tatuzinhos-de-jardim necessitam comer suas fezes
  64. Preguiças podem morrer de fome saciadas
  65. Preguiças precisam descer da árvore para defecar
  66. Pandas dependem de até 14 horas de alimentação
  67. Sistema de defesa da cigarra é saciar o predador
  68. Preguiças podem confundir os braços com galhos
  69. Albatrozes não podem voar corretamente
  70. Kakapos saltam de árvores altas sem saber voar
  71. Anuros machos cruzam com cadáveres
  72. Moscas podem se decapitar ao se limparem

Exemplos envolvendo bioquímica

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  • O reflexo da respiração é estimulado não diretamente pela ausência de oxigênio, mas indiretamente pela presença de dióxido de carbono. O resultado é que, em grandes altitudes, a privação de oxigênio pode ocorrer em indivíduos não adaptados que não aumentam conscientemente sua frequência respiratória.
  • Quase todos os animais e plantas sintetizam sua própria vitamina C, mas os seres humanos não podem porque o gene dessa enzima está com defeito (pseudogene ΨGULO).[14]  A falta de vitamina C resulta em escorbuto e, eventualmente, morte. O gene também não é funcional em outros primatas e em cobaias, mas é funcional na maioria dos outros animais.[15]

Referências

  1. a b c Cancian, André (1 de janeiro de 2007). O Vazio da Máquina: Niilismo e outros abismos (em inglês). [S.l.]: André Cancian. ISBN 9788590555827 
  2. a b c d Brodie, Richard (15 de maio de 2009). Virus of the Mind: The New Science of the Meme (em inglês). [S.l.]: Hay House, Inc. ISBN 9781401926007 
  3. a b c d Marcus, Gary (2008). Kluge: The Haphazard Construction of the Human Mind. Houghton Mifflin Co. pp. 4–5. ISBN 0-618-87964-1.
  4. a b «Folha de S.Paulo - Falha de conexão - 07/12/2008». www1.folha.uol.com.br. Consultado em 25 de abril de 2017 
  5. a b Linden, David J. (2007). The Accidental Mind: How Brain Evolution Has Given Us Love, Memory, Dreams, and God. Belknap Press. pp. 245–246. ISBN 0-674-02478-8.
  6. Hurley, Matthew M.; Dennett, Daniel C.; Adams, Reginald B. (4 de março de 2011). Inside Jokes: Using Humor to Reverse-Engineer the Mind (em inglês). [S.l.]: MIT Press. ISBN 9780262294812 
  7. BUONOMANO, Dean. O Cérebro Imperfeito: Como as Limitações do Cérebro Condicionam as Nossas Vidas. Editora Elsevier Brasil. Rio de Janeiro. 2012. ISBN: 978-85-352-4760-2.
  8. Redação. Fofuchos de Darwin: Como a evolução produziu bebês rechonchudos, lindinhos e completamente dependentes dos papais e das mamães. Superinteressante. 2013.
  9. CANCIAN. André. Ateísmo e Niilismo: Reflexões sobre a morte de deus. Volume 3. Editora André Cancian, 2018. ISBN: 978-04-634-9720-3.
  10. PIRULA; LOPES, Reinaldo José. Darwin sem frescura: Como a ciência evolutiva ajuda a explicar algumas polêmicas da atualidade. Editora HarperCollins. Rio de Janeiro. 2019. ISBN: 9788595085145.
  11. ARAÚJO, Leonardo Augusto Luvison; VIEIRA, Gilberto Cavalheiro. Ensino de Biologia: uma perspectiva evolutiva/ Volume I: Interdisciplinaridade & Evolução. Porto Alegre: Instituto de Biociências da UFRGS, 2021. ISBN 978-65-86232-84-4.
  12. Spreitzer, Robert J.; Salvucci, Michael E. (1 de junho de 2002). «RUBISCO: Structure, Regulatory Interactions, and Possibilities for a Better Enzyme». Annual Review of Plant Biology. 53 (1): 449–475. ISSN 1543-5008. doi:10.1146/annurev.arplant.53.100301.135233 
  13. Ellis, R. John (2010). «Biochemistry: Tackling unintelligent design». Natur (em inglês). 463 (7278): 164–165. ISSN 0028-0836. doi:10.1038/463164a 
  14. Nishikimi, M.; Yagi, K. (1 de dezembro de 1991). «Molecular basis for the deficiency in humans of gulonolactone oxidase, a key enzyme for ascorbic acid biosynthesis». The American Journal of Clinical Nutrition (em inglês). 54 (6): 1203S–1208S. ISSN 0002-9165. doi:10.1093/ajcn/54.6.1203s 
  15. Ohta, Yuriko; Nishikimi, Morimitsu (18 de outubro de 1999). «Random nucleotide substitutions in primate nonfunctional gene for l-gulono-γ-lactone oxidase, the missing enzyme in l-ascorbic acid biosynthesis1The nucleotide sequences reported in this paper have been submitted to GenBank under accession Nos. AB025719, AB025786, and AB025787.1». Biochimica et Biophysica Acta (BBA) - General Subjects (em inglês). 1472 (1): 408–411. ISSN 0304-4165. doi:10.1016/S0304-4165(99)00123-3