Língua ticuna

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
(Redirecionado de Língua Ticuna)
Ticuna

Duüxügu

Pronúncia:(na língua Ticuna)
Outros nomes:Magüta
Tikuna
Tukuna
Falado(a) em:  Brasil
 Colômbia
 Peru
Região: Rio Amazonas/ Solimões[1][2]
Total de falantes: 47 000[3]
Família: Tïcuna–Yuri
 Ticuna
Escrita: Alfabeto latino[4]
Códigos de língua
ISO 639-1: --
ISO 639-2: ---
ISO 639-3: tca

Tïcuna ou Tïkuna, é uma língua falada por aproximadamente 40 000 pessoas no Brasil, Peru e na Colômbia. É a língua nativa dos Ticunas. O tïcuna é geralmente classificado como uma língua isolada, entretanto pode estar relacionada à língua yuri, já extinta. É uma língua tonal, e, assim sendo, uma mesma palavra pode assumir diferentes significados, dependendo do tom de suas sílabas.

Outros nomes[editar | editar código-fonte]

A língua é também chamada Magta, Maguta, Tucuna/Tukuna, Tukna. Em Ticuna é chamada Duüxügu.

Escrita[editar | editar código-fonte]

O Ticuna usa uma forma do alfabeto latino com as 5 vogais tradicionais mais ü; Não se usam as consoantes Q, X, Z; usam-se os diacríticos em Ñ e em Č e o ?.

Situação Sociolinguística[editar | editar código-fonte]

Brasil[editar | editar código-fonte]

Apesar de ser o local de mais de 50% dos Ticunas, o Brasil só recentemente começou a investir na educação indígena em língua nativa. Os Ticunas no Brasil têm agora uma literatura escrita e educação fornecida pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e pelo Ministério da Educação. Livros didáticos em Ticuna são usados ​​por professores nativos qualificados em português e ticuna para ensinar a língua às crianças. Um projeto de grande escala tem gravado e transcrito narrativas tradicionais fornecendo material literário aos Ticunas alfabetizados. A educação fornecida aos Ticuna não é um privilégio isolado, mas parte de um projeto mais amplo realizado pelo governo brasileiro para fornecer educação à todas minorias significativas suas línguas nativas. Em 2012, o governo brasileiro lançou uma campanha educativa para a prevenção da AIDS e da violência contra a mulher, sendo a primeira campanha no Brasil conduzida em língua indígena.[5] Também as Testemunhas de Jeová disponibilizam vídeos e publicações em formato impresso e eletrônico na língua ticuna, é possível fazer downloads totalmente gratuitos no site da organização.[6]

Em 2023, foi declarada língua oficial do Amazonas, juntamente com outras 15 línguas indígenas.[7]

Peru[editar | editar código-fonte]

No Peru, a educação aos Ticunas foi oferecida desde pelo menos os anos 1960. Eles utilizam um sistema de escrita que foi, aparentemente, a base para o sistema utilizado pelos Ticunas no Brasil. Apesar deste sistema de escrita próprio, grande parte do material didático disponível aos Ticunas no Peru são livros textos comuns a todas outras escolas.

Colômbia[editar | editar código-fonte]

As oficinas organizadas pelos professores ticuna entre 1987 e 1993 foram o ponto de partida para o programa de etno-educação bilíngüe que tem sido desenvolvido até hoje e é aconselhado por lingüistas e pedagogos.[8]

Alfabetização[editar | editar código-fonte]

Além de seu uso nas escolas Ticuna, a língua tem uma dezena de livros publicados todos os anos, no Brasil e no Peru. Esses livros não empregam o alfabeto fonético internacional, mas sim um sistema de escrita fonética especialmente concebido a eles, utilizando convenções semelhantes às encontradas em português (com exceção do K ao invés do C e da letra Ñ ao invés do NH).

Fonologia[editar | editar código-fonte]

A língua ticuna registra os siguientes fonemas consoantes:[9][10]

Consoantes Bilabial Dental Palatal Velar
Oclusivas surdas p t k
Oclusivas sonoras b d ɟ ɡ
Africada
Líquida ɾ
Aproximante w

As consoantes oclusivas sonoras são nasalizadas e executadas como [m], [n], [ɳ], [ŋ] quando estão no inicio de uma sílaba com vogal nasal. Porem, há uma tendência de enfraquecimento da regra de nasalização, de forma que além das sílabas orais e nasais, surgem as sílabas nasa-orais, o que provoca alterações, principalmente no caso do alofone [ŋ] que torna-se um fonema /ŋ/ o qual pode ser seguido por uma oral vogal, característica que era exclusiva das falas ribeirinhas do leste e agora se estende. A substituição da sequência fonológica / k + u / antes das vogais anteriores / e /, / i / e até / a /, por / f /, também avança.[9]

O inventário de vogais é composto por três vogais fechadas / i, ɯ, u / e três abertas / e, a, o / sem oposição de quantidade. Todas as vogais orais têm sua vogal nasal correspondente. Uma vogal fonológicamente nasal e não fechada, pertencente a uma sílaba com tom baixo, se realiza como um som laríngealizado.[9]

Vogais Orais Nasais
coronais dorsais labiais coronais dorsais labiais
altas i ɯ u ĩ ɯ̃ ũ
médias e o õ
baixas a ã

Tons[editar | editar código-fonte]

O ticuna é uma língua tonal que distingue tons contrastivos. Na análise da língua, Lambert Anderson reconheceu cinco tons de altura, "o primeiro sistema de tom assim intrincado aser encontrado na América do Sul". Ele denotou estes tons de nível como: 1alto, 2medio-alto, 3medio, 4medio-bajo e 5bajo.[11] Denis Bertet tem feito um inventário de dez tons fonêmicos.[12]

Porem, para Marília Facó Soares no ticuna se trata com um sistema tonal complexo em que as manifestações fonéticas não se apresentam de forma transparente e direta todas as motivações dos processos que as originam. Embora ela registrasse seis níveis fonéticos de altura (alto, médio-alto , médio, médio-baixo, baixo e extra baixo), reduziu os tons fonológicos a dois (alto e baixo) ou no máximo três (debatendo-se si o tom médio é considerado como ausência de tom).[13][14] María Emilia Montes identificou 6 tons específicos (super alto, alto caído, alto, médio, baixo e superbaixo) e 2 modulados, ascendente (médio-alto) e descendente (médio-baixo), distinguindo os fonemas de seus alótones e apresentando apenas três tons fonéticos: alto, médio e baixo.[9]

Estrutura linguística[editar | editar código-fonte]

Morfologicamente a língua ticuna é razoavelmente analítica, ou seja, a maior parte dos seus morfemas são livres, os quais se consideram "palavras" com significado próprio. No entanto, as palavras em ticuna geralmente têm mais de uma sílaba, diferente de outras línguas isolantes. Sendo uma língua tonal, devido ao fato de que cada falante tem um registro de voz próprio, o que distingue cada tom numa frase é seu tom relativo ao restante da frase, e não um certo tom absoluto (como no caso da música). Cada sílaba "escolhe" um dos três tons possíveis, com algumas restrições, e diferentes possibilidades de combinação são geradas para palavras de bisílabas e trissílabas Os tons são indicados ortograficamente com diacríticos.

O gênero (masculino feminino ou genérico) é uma categoria central no ticuna, manifestada em formas clíticas que combinam animosidade, distância e tempo expirado ou atual. Eles expressam apenas as categorias de "passado" e "não passado", ao contrário do que acontece em línguas nas quais também há marcadores para o tempo futuro ou para o passado remoto.[15] Também os sufixos aspectuais –ãtchi que marca uma ‘duração curta, limitada’ e -cü’ü ‘ação repetitiva e rápida’ têm como sua característica poderem ou não ocorrer em uma estrutura verbal, logo, não devem ser considerados como sufixos de conjugação verbal. Tipologicamente, o tikuna pertenceria ao grupo em que o tempo marca toda a proposição e não somente o verbo.[16]

Na língua ticuna a ordem preferencial na oração é sujeito-verbo-objeto (SVO).

Amostra do texto em ticuna[editar | editar código-fonte]

Tradução do texto na língua portuguesa.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. An Ethnologue Country Report, 118 pp.
  2. Crúbadán language data for Ticuna. Kevin Scannell. 2015. The Crúbadán Project.
  3. Tïcuna at Ethnologue (18th ed., 2015)
  4. jw.org; acesso da página: 10/9/2016
  5. Associated Press (11 de outubro de 2012). «Brazilian government uses indigenous language for the first time in anti-AIDS campaign». The Washington Post. Consultado em 21 de outubro de 2012 
  6. «Testemunhas de Jeová e Ticunas». Consultado em 17 de abril de 2018 
  7. https://www-em-com-br.cdn.ampproject.org/v/s/www.em.com.br/app/noticia/diversidade/2023/07/21/noticia-diversidade,1523437/amp.html?amp_gsa=1&amp_js_v=a9&usqp=mq331AQIUAKwASCAAgM%3D#amp_tf=De%20%251%24s&aoh=17069806520707&referrer=https%3A%2F%2Fwww.google.com&ampshare=https%3A%2F%2Fwww.em.com.br%2Fapp%2Fnoticia%2Fdiversidade%2F2023%2F07%2F21%2Fnoticia-diversidade%2C1523437%2Festado-do-amazonas-passa-a-ter-16-linguas-indigenas-oficiais.shtml  Em falta ou vazio |título= (ajuda)
  8. Ahué Coello, Francisco; et al. (2002). María Emilia Montes, ed. Libro guía del maestro. Materiales de lengua y cultura ticuna. Bogotá: Universidad Nacional. ISBN 958-701-238-0 
  9. a b c d Montes, María Emilia (2004). «Lengua ticuna: resultados de fonología y morfosintaxis». Forma y Función. 17 (17). Departamento de Lingüística, Universidad Nacional de Colombia. pp. 145–178 (151–153). ISSN 0120-338X 
  10. Montes, María Emilia (2000). «Fonología del ticuna». In: María Stella González de Pérez. Lenguas indígenas de Colombia. una visión descriptiva. Bogotá: Instituto Caro y Cuervo. pp. 289–312. ISBN 958-611-083-4 
  11. Anderson, Lambert (1959). «Ticuna vowels with special regard to the system of five tonemes». Série lingüística especial. 1. Rio de Janeiro: Publicações do Museu Nacional. pp. 76–119 
  12. Bertet, Denis (2018) "The Ten Tonemes of Ticuna, an Amazonian Oddity". Amazónicas 7. Baños.
  13. Soares, Marília Facó (2000). O supra-segmental em Tikuna e a teoria fonológica. I: "Investigação de aspectos da sintaxe Tikuna. Campinas: UNICAMP. ISBN 978-8526805026 
  14. Soares, Marília Facó. «Língua Ticuna (ou Tikuna)» (PDF). Povos Indígenas no Brasil. Consultado em 14 de outubro de 2021 
  15. Montes, María Emilia (2019). «Tiempo nominal en Tikuna (hurí-tikuna)». Forma y Función. 32 (2). pp. 191–222. doi:10.15446/fyf.v32n2.80819. Consultado em 12 de outubro de 2021 
  16. Soares, Marília Facó (2008). «Língua/linguagem e tradução cultural: algumas considerações a partir do universo Ticuna». Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas. 3 (1). Belém. pp. 51–63. Consultado em 14 de outubro de 2021 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

Ligações externas[editar | editar código-fonte]