Minoria (filosofia)

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Minoria (em francês: minorité) é um conceito filosófico desenvolvido por Gilles Deleuze e Félix Guattari nos livros Kafka: por uma literatura menor (1975), Mil Platôs (1980) e em outros trabalhos de sua obra. Nesses textos, eles criticam o conceito de "maioria". Para Deleuze e Guattari, o devir-minoritário é principalmente uma ação ética, e o comprometimento com tal devir afeta os indivíduos quando os devia em agir subordinados ao devir-fascista. Além disso, Deleuze e Guattari argumentam que o conceito de povo, quando invocado por grupos subordinados ou alinhados a eles, sempre se refere a uma minoria, qualquer que seja sua ordem numérica.[1]

Para Deleuze e Guattari, menor e o devir-minoritário não se referem a grupos minoritários como descritos na linguagem comum, mas a uma espécie de construto. Os grupos minoritários são definidos por identidades e, portanto, pelas configurações molares que pertencem ao complexo militar-industrial. Tais configurações molares[2] são compostas de infinitas linhas de partículas, ou seja, linhas de devir.[3]

Visão geral[editar | editar código-fonte]

O exemplo central utilizado por Deleuze e Guattari é Franz Kafka. Kafka não se sente em casa tanto entre os judeus de Praga como entre a estrutura de poder dominante alemã e austro-húngara. Para Kakfa, há a "falta de um povo", de modo que sua literatura se propõe a convocar este povo. No entanto, há uma conexão entre o que é comumente referido como minorias e a concepção de Deleuze e Guattari do menor e do devir-minoritário. Deleuze e Guattari argumentam que se, frequentemente, o tornar-se menor refere-se ao contexto formado por grupos minoritários, então isso ocorre porque o tornar-se menor é catalisado pela existência em espaços sociais restritos. Desse modo, tornar-se menor não está relacionado a identidades molares, nem é uma política que busca representação ou reconhecimento de tais identidades (embora Deleuze e Guattari enfatizem que essas são ambições políticas valiosas).[1][4]

Outro exemplo citado é o do patriarcado, que fornece uma ilustração de como o conceito de minoria é usado: embora possa haver mais mulheres do que homens em termos numéricos, na argumentação de Deleuze e Guattari, que são sensíveis às relações de poder, os homens ainda constituem a maioria enquanto as mulheres formam uma minoria. Assim, o conceito de devir-minoritário converge com o de devir-mulher. Como afirmam Deleuze e Guatarri, "todos estão subscritos ao processo do devir-mulher, mesmo as mulheres", seguidos pelo devir-animal, devir-molecular, devir-imperceptível e, finalmente, ao devir-revolucionário. Cada tipo de devir afetivo marca uma nova fase de um processo maior, o qual Deleuze e Guattari se referem como desterritorialização.[5]

O homem macho, adulto não tem devir. Pode devir mulher e vira minoria. A esquerda é o conjunto dos processos de devir minoritário. Eu afirmo: a maioria é ninguém e a minoria é todo mundo. Ser de esquerda é isso: saber que a minoria é todo mundo e que é aí que acontece o fenômeno do devir. É por isso que todos os pensadores tiveram dúvidas em relação à democracia, dúvidas sobre o que chamamos de eleições. Mas isso são coisas bem conhecidas.
 
L'abécédaire de Gilles Deleuze, transcrição de vídeo[6].

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b Laurie, Timothy; Khan, Rimi (2017), «The Concept of Minority for the Study of Culture», Continuum: Journal of Media & Cultural Studies, 31 (1): 3–4 
  2. Barbosa, Jéssica Cássia (7 de novembro de 2014). Involução criadora: o maior e o menor na obra de Gilles Deleuze (Tese). "Há as segmentaridades duras, isto é, de estrutura molar, com divisões e repartições, onde os centros, todos os buracos negros caem num centro, num ponto de acumulação: o rosto do pai, do professor primário, do coronel, do patrãol ou num Estado central assim organizado, como uma espécie de ressonância para os poderes tanto privados como públicos.". Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 173 páginas 
  3. Charles Stivale, Gilles Deleuze: Key Concepts (Routledge, 2014), p. 118.
  4. Albuquerque, Paulo Germano Barrozo de (2008). «O Devir-minoritário e a crítica da democracia: literatura e política em Deleuze». Consultado em 2 de fevereiro de 2021 
  5. Tedeschi, Losandro Antonio (24 de abril de 2018). «Por uma história menor — uma análise deleuziana sobre a história das mulheres». Revista Estudos Feministas (1). ISSN 1806-9584. doi:10.1590/%x. Consultado em 2 de fevereiro de 2021 
  6. Gilles Deleuze e Claire Parnet (1996). L'abécédaire de Gilles Deleuze [O abecedário de Gilles Deleuze] (em francês)