Modelo de Nice

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Simulação mostrando os gigantes gasosos e o cinturão de planetesimais:
a) A configuração inicial, antes de Júpiter e Saturno terem atingido uma ressonância de 2:1.
b) Dispersão de planetesimais dentro do interior do Sistema Solar, após a migração planetária de Neptuno (em azul escuro) e Urano (em azul claro)
c) Após a ejeção dos planetesimais pelos planetas.[1]

O modelo de Nice é um cenário da evolução do Sistema Solar. Foi assim nomeado pela localização do Observatório Côte d'Azur, onde foi desenvolvido, em Nice, França.[2][3] O modelo propõe a migração planetária dos gigantes gasosos de uma configuração compacta inicial nas suas posições atuais, bem após a dissipação do disco protoplanetário.

O modelo de Nice é utilizado em simulações dinâmicas do Sistema Solar, para explicar eventos históricos, incluindo o intenso bombardeio tardio do interior do Sistema Solar, a formação da Nuvem de Oort, e a existência de agrupamentos de corpos menores do Sistema Solar, incluindo o cinturão de Kuiper, os asteroides troianos de Júpiter e Neptuno, e a formação de vários objetos resonantes trans-neptunianos.

O sucesso do modelo na reprodução de várias características observadas no Sistema Solar faz com que a teoria possua ampla aceitaçcão como o modelo mais realístico de formação do Sistema Solar.[3]

Descrição[editar | editar código-fonte]

Exemplo de simulação do modelo de Nice, mostrando a evolução das órbitas dos planetas gigantes

A fundação original do modelo de Nice é um trio de artigos publicados na revista científica Nature em 2005 por uma colaboração internacional de cientistas: Rodney da Silva Gomes, Hal Levison, Alessandro Morbidelli, e Kleomenis Tsiganis.[1][4][5] Neles, os autores propuseram que após a dissipação do gás e poeira do Sistema Solar primordial, os quatro planetas gigantes (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno) se encontravam em órbitas quase circulares entre aproximadamente 5,5 e 17 unidades astronômicas (UA) do Sol, muito mais próximos e compactos do que no presente. Depois da órbita do planeta mais externo, havia um grande e denso disco de planetesimais de rocha e gelo, totalizando cerca de 35 massas terrestres. Os planetesimais na borda interna do disco ocasionalmente interagiam gravitacionalmente com o planeta mais externo, sendo normalmente empurrados para perto do Sol, então por conservação de momento angular o planeta acaba se movendo para fora. Simulações numéricas mostram que os planetesimais acabaram aumentando as órbitas de Netuno, Urano e Saturno, mas o contrário aconteceu com Júpiter, que ejetou os planetesimais para fora e portanto o planeta se aproximou do Sol. Cada encontro individual muda a órbita do planeta por uma quantidade infinitesimal apenas, mas essas variações acumuladas por milhões de anos causam variações significativas (migração planetária).[4]

A velocidade de migração dos planetas é determinada pela taxa em que planetesimais são perdidos do disco. No modelo de Nice original, Júpiter e Saturno atingem uma ressonância 1:2 após centenas de milhões de anos de migração lenta. Essa ressonância aumenta a excentricidade orbital dos dois planetas e gera uma instabilidade no Sistema Solar. A configuração dos planetas gigantes é alterada de forma rápida e drástica.[6] Júpiter empurra Saturno para sua posição atual, e essa mudança causa encontros gravitacionais entre Saturno e os dois gigantes de gelo, enviando Urano e Netuno para órbita muito mais excêntricas. Em 50% das simulações, Urano e Netuno trocam de posição. Os dois gigantes de gelo então varrem a região do disco de planetesimais, desestabilizando milhares de planetesimais de suas órbitas anteriormente estáveis no Sistema Solar externo. Essa perturbação destrói o disco primordial quase totalmente, removendo 99% de sua massa, o que explica a pequena população transnetuniana observada atualmente.[4] Alguns dos planetesimais são jogados para o Sistema Solar interno, produzindo um influxo súbito de impactos nos planetas terrestres—o intenso bombardeio tardio.[1] Eventualmente, os planetas gigantes atingem seus semieixos maiores atuais, e fricção dinâmica com os planetesimais restantes circulariza novamente as órbitas de Urano e Netuno.[7]

Modelos mais recentes são mais consistentes com uma instabilidade acontecendo logo no começo da formação do Sistema Solar, ao invés de centenas de milhões de anos depois.[8]


Referências

  1. a b c R. Gomes, H. F. Levison, K. Tsiganis, A. Morbidelli (2005). «Origin of the cataclysmic Late Heavy Bombardment period of the terrestrial planets» (PDF). Nature. 435. 466 páginas. doi:10.1038/nature03676 
  2. «Solving solar system quandaries is simple: Just flip-flop the position of Uranus and Neptune». Press release. Arizona State University. 11 de dezembro de 2007. Consultado em 22 de março de 2009 
  3. a b Crida, A. (2009). «Solar System formation». Invited review talk on Solar System formation, at the JENAM 2008 conference. Proceeding to appear in "Reviews in Modern Astronomy, 21" 
  4. a b c Tsiganis, K.; Gomes, R.; Morbidelli, A.; F. Levison, H. (2005). «Origin of the orbital architecture of the giant planets of the Solar System» (PDF). Nature. 435 (7041): 459–461. Bibcode:2005Natur.435..459T. PMID 15917800. doi:10.1038/nature03539 
  5. Morbidelli, A.; Levison, H.F.; Tsiganis, K.; Gomes, R. (2005). «Chaotic capture of Jupiter's Trojan asteroids in the early Solar System» (PDF). Nature. 435 (7041): 462–465. Bibcode:2005Natur.435..462M. OCLC 112222497. PMID 15917801. doi:10.1038/nature03540. Cópia arquivada (PDF) em 21 de fevereiro de 2014 
  6. Hansen, Kathryn (7 de junho de 2005). «Orbital shuffle for early solar system». Geotimes. Consultado em 26 de agosto de 2007 
  7. Levison HF, Morbidelli A, Van Laerhoven C, Gomes RS, Tsiganis K (2007). «Origin of the Structure of the Kuiper Belt during a Dynamical Instability in the Orbits of Uranus and Neptune». Icarus. 196 (1): 258–273. Bibcode:2008Icar..196..258L. arXiv:0712.0553Acessível livremente. doi:10.1016/j.icarus.2007.11.035 
  8. Ribeiro de Sousa, Rafael; et al. (março de 2020). «Dynamical evidence for an early giant planet instability». Icarus. 339. Bibcode:2019arXiv191210879R. arXiv:1912.10879Acessível livremente. doi:10.1016/j.icarus.2019.113605 
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