Uanhenga Xitu

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Uanhenga Xitu
Nome completo Agostinho André Mendes de Carvalho
Nascimento 29 de agosto de 1924
Ícolo e Bengo, Angola
Morte 13 de fevereiro de 2014 (89 anos)
Luanda, Angola
Nacionalidade Angola Angolano
Ocupação Escritor, político
Prémios Prémio de Cultura e Artes 2006

Agostinho André Mendes de Carvalho, mais conhecido pelo pseudónimo literário Uanhenga Xitu (Ícolo e Bengo, 29 de agosto de 1924Luanda, 13 de fevereiro de 2014), foi um enfermeiro, politólogo, político e escritor angolano.[1][2]

Nos últimos anos, sua vida e obra tem sido objeto de estudos científicos e homenagens, e recebendo reconhecimento em território angolano e outros países.[3]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Nasceu na aldeia de Calomboloca,[4] no município de Ícolo e Bengo, província de Luanda.[5] Seu pai era André Gaspar Mendes de Carvalho, e sua mãe era Luísa Miguel Fernandes.[4]

Agostinho fez os seus estudos primários nas escolas das missões da Igreja Metodista que operavam em Ícolo e Bengo,[4] rumando para a cidade de Luanda, em meados da década de 1930,[4] para concluir os estudos secundários.[2] A partir de 1942 começa a trabalhar como agente de sanitário na zona de Catete-Luanda, nos Serviços de Assistência Médica ao Indígena e nas Campanhas de Combate a Doença do Sono.[4]

Matricula-se em uma escola técnica de enfermagem em Luanda e, em 1947,[4] forma-se como auxiliar de enfermagem.[4] Passa a exercer, nos postos sanitários de Dinge, Cuíto, Calumbo,[4] Mungo,[2][6] Cabiri e Bom Jesus do Cuanza,[4] nos hospitais de Benguela e Lubango, e depois nos serviços de saúde em Luanda,[4] a função de enfermeiro auxiliar de segunda classe concursado dos Serviços de Saúde e Higiene de Angola.[4] Em Dinge, em 1947,[4] chegou a se tornar sindicalista e organizar uma greve laboral pelas melhorias das condições de trabalho.[4] Foi transferido de Dinge para o Cuíto como punição pelo ocorrido.[4]

Em 1957 passou a exercer, clandestinamente, atividades políticas relacionadas a independência de Angola dentro dos Comitês de Panfletagem na periferia de Luanda ligados ao ainda tímido Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e ao grupo Espalha Brasas.[4] Filiou-se ao Exército de Libertação de Angola (ELA) em 1958, e acabou por ser implicado juridicamente no âmbito daquilo que viria a ser chamado o "Processo dos 50".[7][8] Por conseguinte, foi preso pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) em 1959, no seguimento da detenção no aeroporto de Luanda.[2] Foi desterrado para o Campo de Concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, onde ficou de 1962 a 1970.[2]

Foi julgado pelo Tribunal Militar e condenado a doze anos de prisão maior, medidas de segurança de seis meses a três anos prorrogáveis e perda de direitos políticos por quinze anos.[4] Sua família sofreu severas dificuldades financeiras após sua prisão, com sua esposa Maria sendo obrigada a trabalhar como lavadeira de roupas.[4] Na prisão começou a escrever as suas histórias.[4]

Em liberdade condicional a partir de 1970,[4] filiou-se novamente ao MPLA, ascendendo a liderança do Departamento de Organização Municipal (DOM) do partido em Luanda no mesmo ano.[4] Somente conseguiu retomar suas funções como enfermeiro auxiliar de segunda classe concursado em 1974, após a Revolução dos Cravos. Ascendeu a membro do Comitê Central do MPLA em 1974, estando em funções até 1988, chegando a ser presidente da Comissão Diretiva do partido.[4]

Depois de alcançada a independência de Angola, foi nomeado para o Conselho Revolucionário do Povo (ou "Conselho da Revolução"),[4] além de exercer as funções de Comissário Provincial de Luanda entre 1979 e 1980 e de Ministro da Saúde entre 1980 e 1983.[5] Em seguida passou a acumular funções diplomáticas como Embaixador da República Popular de Angola na Checoslováquia,[4] na Polónia[3] e na Alemanha Oriental[9][2] — onde chegou a formar-se em ciências políticas. Foi, ainda, deputado à Assembleia Nacional pelo MPLA,[5] posteriormente vindo a ser "reformado" por motivos de idade não mais compatível ao exercício da função.[3]

Carreira literária[editar | editar código-fonte]

Origem do pseudónimo literário[editar | editar código-fonte]

Em entrevista com Ana Lopes de Sá, Agostinho Mendes de Carvalho explicou que o nome Uanhenga Xitu é de origem quimbunda, sendo que xitu significa literalmente «carne» e uanhenga significa «andar com alguma coisa ao pendurão», sendo que a expressão «uanhenga xitu» veicula uma noção idiomática de «os poderosos contam sempre com inimigos à espreita» ou de que «o poder desperta o ódio nos outros».[6] Eminente contador de histórias populares, a narrativa de Uanhenga Xitu, está despida do rigor literário, pois a preocupação primária do autor é estabelecer uma ligação semiótica com o seu povo, que o estimula a escrever.

Desenvolvimento de sua escrita[editar | editar código-fonte]

Uanhenga Xitu, enquanto escritor, nasce na prisão, impelido pelo desejo de preservação memorialística do passado para conhecimento das gerações futuras[10], bem como pelo encorajamento dos companheiros de cela, para que escrevesse. Os textos escritos no cárcere, assestam um tempo e um espaço primordiais para o autor: a infância ou a juventude, na sua terra natal, assim como as histórias presenciadas por si, em primeira mão, e as estórias escutadas, na tradição oral local.[11].

Foram estas vivências na senzala transformou-o num homem solidário e interessado com as necessidades humanas. Numa entrevista, Uanhenga Xitu afirmou que "o que me preocupa é a situação social do povo".[1]

Em 2006, recebe a distinção do Prémio de Cultura e Artes na categoria de literatura pela qualidade do conjunto da sua obra literária, causando-lhe uma enorme surpresa e dando-lhe lugar na lista de melhores autores da história literária angolana.[1] Foi, ainda, membro fundador da União dos Escritores Angolanos (UEA).[4]

Obras[editar | editar código-fonte]

  • Mestre Mestre Tamoda Tamoda (1974)
  • Mestre Tamoda e Outros Contos (1977)
  • Manana (1974)
  • Maka na Sanzala (1979)
  • Vozes na Sanzala (Kahitu) (1976)
  • Mungo: Os Sobreviventes da Máquina Colonial Depõem (1980)[7]
  • Os Discursos de "Mestre" Tamoda (1984)[12]
  • Bola com Feitiço (1974)
  • O Ministro (1989)
  • Cultos Especiais (1997)
  • Meu Discurso (1974)

Morte[editar | editar código-fonte]

Em 13 de fevereiro de 2014, aos 89 anos, Uanhenga Xitu morre por motivo de doença.[5]

Vida pessoal[editar | editar código-fonte]

Em 1949 Uanhenga Xitu casou-se com Maria António Jorge de Carvalho, tendo com ela, destacadamente, os filhos Luiza Maria Fernandes de Carvalho, Miguel Gaspar, André de Carvalho Miau e Margarida Jorge de Carvalho.[4] Teve outros sete filhos, alguns de relacionamentos extraconjugais.[4]

Referências

  1. a b c Venâncio, José Carlos (1 de dezembro de 2013). «Laudatio de Agostinho André Mendes de Carvalho (Uanhenga Xitu), escritor e nacionalista angolano». Revista Angolana de Sociologia (12): 117–123. ISSN 1646-9860. doi:10.4000/ras.773. Consultado em 1 de maio de 2022 
  2. a b c d e f Infopédia. «Uanhenga Xitu - Infopédia». Infopédia - Porto Editora. Consultado em 1 de maio de 2022 
  3. a b c Venâncio, José Carlos (1 de dezembro de 2013). «Laudatio de Agostinho André Mendes de Carvalho (Uanhenga Xitu), escritor e nacionalista angolano». Revista Angolana de Sociologia (12): 117–123. ISSN 1646-9860. doi:10.4000/ras.773. Consultado em 13 de maio de 2022 
  4. a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v w x y z Nathalia Rocha Siqueira (2020). O enfermeiro e a Quijinga: Trajetória política e construção do capital simbólico de Uanhenga Xitu (1947-1975) (PDF). Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro 
  5. a b c d RDP-África, RTP, Rádio e Televisão de Portugal-. «Morreu Agostinho Mendes de Carvalho `Uanhenga Xitu` - Noticias Africa - RDP África». www.rtp.pt. Consultado em 1 de maio de 2022 
  6. a b Santos Nascimento, Washington (2013). Gentes do Mato: Os "Novos Assimilados" em Luanda (1926 - 1961) (PDF). São Paulo: Universidade de São Paulo. p. 80. 235 páginas 
  7. a b Sá, Ana Lúcia (2012). A ruralidade na narrativa Angolana do século XX: elemento de construção da nação. Kilombelombe, Angola: Kilombelombe. p. 75. 698 páginas. ISBN 9898368233 
  8. Cunha, Anabela (1 de dezembro de 2011). «"Processo dos 50": memórias da luta clandestina pela independência de Angola». Revista Angolana de Sociologia (8): 87–96. ISSN 1646-9860. doi:10.4000/ras.543. Consultado em 1 de maio de 2022 
  9. Sá, Ana Lúcia (2012). A ruralidade na narrativa Angolana do século XX: elemento de construção da nação. Kilombelombe, Angola: Kilombelombe. p. 218. 698 páginas. ISBN 9898368233 
  10. Sá, Ana Lúcia (2012). A ruralidade na narrativa Angolana do século XX: elemento de construção da nação. Kilombelombe, Angola: Kilombelombe. p. 217. 698 páginas. ISBN 9898368233 
  11. Sá, Ana Lúcia (2012). A ruralidade na narrativa Angolana do século XX: elemento de construção da nação. Kilombelombe, Angola: Kilombelombe. p. 13. 698 páginas. ISBN 9898368233 
  12. Xitu, Uanhenga (1984). Os discursos do "Mestre" Tamoda. Luanda: Mayamba. 188 páginas. ISBN 9789898370105