Convento da Trindade (Lagos)

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Convento da Trindade
Convento da Trindade (Lagos)
Fachada principal do convento, em 2020.
Nomes alternativos Convento dos Frades Trinos
Convento da Santíssima Trindade
Tipo
Construção Século XVII
Religião Igreja Católica Romana
Diocese Diocese do Algarve
Património Nacional
SIPA 2896
Geografia
País Portugal Portugal
Cidade Lagos
Coordenadas 37° 05' 42.4" N 8° 40' 10.7" O
Mapa
Localização do edifício em mapa dinâmico

O Convento da Trindade, igualmente conhecido como Convento dos Frades Trinos, e oficialmente denominado de Convento da Santíssima Trindade, é um antigo edifício religioso junto à cidade de Lagos, em Portugal. O convento foi concluído em 1606 pela Ordem da Santíssima Trindade, embora a igreja fosse mais antiga, tendo sido construída nos meados do século XVI por comunidades italianas radicadas em Lagos.[1] O complexo foi destruído pelo Sismo de 1755 e convertido num hospital militar no século XIX, tendo sido depois deixado ao abandono, chegando a um acentuado estado de degradação.[1]

Antigo claustro do convento, em 2020.
Corredor no interior do edifício, em 2020.

Descrição[editar | editar código-fonte]

O convento está situado na orla costeira a Sul de Lagos, tendo acesso pela Estrada Nacional 125.[1] É composto por vários corpos adossados, formando um quadrado com um claustro no centro,[1] onde existe um poço.[2] Todos estes volumes são de um só piso, salvo o que está no canto Noroeste, que tem primeiro andar.[1] A igreja está situada a Norte do claustro.[1] O complexo do convento tinha três portas de acesso, sendo a fachada principal virada a Oeste.[2] Destacam-se igualmente os vários bancos, tanto no claustro como no exterior do convento, que provavelmente serão um testemunho da sua utilização como hospital.[1] Anexo à fachada Norte do convento está um edifício de construção posterior.[2]

A igreja do Convento da Trindade foi descrita na obra História chronologica da esclarecida ordem da Ss. Trindade, Redempção de Cativos, da Provincia de Portugal, publicada nos finais do século XVIII pelo frei jerónimo São José:

«Foi estabelecido em huma Ermida de Nossa Senhora com o titulo de Porto Salvo, pertencente aos Estrangeiros de Levante, aonde tinhão principiado huma bella Igreja, levantada até às simalhas [...]. A Igreja que dissemos estava nas simalhas, se concluio, ficando huma das mais perfeitas da Cidade. [...] Tem tres altares, o da Capella Mór, que era a Ermida dedicada à Santissima Trindade, com seu retabolo dourado em que estão as Imagens dos Santos Patriarcas, e no meio outra da Sagrada Virgem dos Remédios de Seis Palmos».[3]
Alçado ocidental do edifício, mostrando a antiga torre.

História[editar | editar código-fonte]

Antecedentes e construção[editar | editar código-fonte]

O primeiro edifício religioso na área do Rossio da Trindade foi a Igreja de São Brás,[4] motivo pelo qual esta zona era conhecida no século XVI como Rossio de São Brás.[5]

O historiador João Baptista da Silva Lopes, na sua obra Corografia ou memoria economica, estadistica, e topografica do reino do Algarve, publicada em 1841, refere que no Rossio de São Brás foi instalada uma ermida ou igreja dedicada a dedicada a Nossa Senhora do Porto Salvo, cuja construção foi promovida por um grupo de estrangeiros residentes em Lagos, formado por nobres messinenses e cidadãos de Milão e Génova.[6] Segundo Manuel João Paulo Rocha, antes da construção do novo edifício, os fundadores utilizaram a Igreja de São Brás para fazerem as suas reuniões.[4] De acordo com o Santuario Mariano, publicado em 1716, a confraria tinha sido fundada pelos sicilianos, tendo alcançado uma grande importância.[7] O domínio dos sicilianos em relação à restante comunidade ficou expresso na invocação da igreja, já que em Palermo havia uma grande devoção à Nossa Senhora do Porto Salvo.[7] Com efeito, Silva Lopes afirma que a irmandade utilizou esta igreja «para fazerem as suas juntas, em quando durarão as obras, que se concluirão em 29 de Junho de 1564».[6] Refere igualmente que o compromisso da comunidade «constava de 37 artigos», e que «constituirão hum capellão douto, de boa vida e costumes, para lhes dizer missa nas quartas feiras, sabbados, e domingos, e administrar-lhes os sacramentos, na forma do breve que alcançarão do Papa».[6]

Originalmente não era permitida a entrada de novos membros, mas esta situação começou a mudar devido à quebra na produção piscatória, que levou ao abandono de vários sicilianos, pelo que admitiram alguns espanhóis,[7] que segundo Silva Lopes eram da «nação valenciana, e catalã».[6] Ainda assim, a comunidade continuou a decair devido a problemas nas pescarias, e à progressiva saída dos membros sicilianos.[7] Entretanto, em 1597[1] ou 1598[6] os frades da Ordem da Trindade pediram autorização para construir um convento junto à Igreja de Porto Salvo,[1] com o apoio do Bispo do Algarve, D. Fernando Martins de Mascarenhas, que foi o mediador entre o rei e a Câmara Municipal de Lagos.[8] Com efeito, em 7 de Março de 1597 o prelado enviou uma carta à autarquia de Lagos, no sentido de pedir autorização e apoios para a construção do convento.[4] A Ordem da Trindade foi formada para apoiar o resgate os cristãos cativos, normalmente através da angariação de esmolas, tendo sido de grande significado na região do Algarve, já que as populações costeiras eram nessa altura assoladas por piratas islâmicos vindos do Norte de África, que raptavam os habitantes para serem vendidos como escravos.[5] Neste sentido, a cidade de Lagos foi considerada um local ideal para construir o convento, devido à sua importância e às suas ligações à costa africana.[5]

Depois de ter obtido autorização da Câmara Municipal de Lagos,[6] iniciaram-se as obras do convento, mas pouco depois foram embargadas por uma carta de 17 de Agosto de 1598 do rei D. Filipe II, a pedido da Confraria de Porto Salvo.[6] Como forma de resolver a situação, os frades trinos pediram que a confraria lhes cedesse a igreja,[7] tendo as duas partes assinado um acordo neste sentido em 27 de Julho de 1600, numa cerimónia que contou com a presença do Governador do Algarve, D. Rui Lourenço de Távora e Rodrigo Rebelo Falcão, escrivão das Almadravas.[5] Segundo Silva Lopes, em contrapartida pela posse da igreja, os religiosos da Ordem da Trindade ficaram «obrigados ás missas, funeraes, e mais exercicios espirituaes que antes tinhão na sua igreja do Porto Salvo, e esperando sempre por elles hum, como capellão, para lhes dizer missa quando estivessem occupados em seus negocios».[6]

O convento da Trindade foi concluído em 1606.[1] Esteve envolvido até 1627 em várias operações de resgate no Norte de África, incluindo em Argel e em Tetuão, tendo vários frades do convento participado nas negociações para a libertação dos cativos.[5] Ficou registada a presença de dezasseis superiores no convento, entre 1599 e 1641.[5] Em 1716, ano em que foi publicada a obra Santuario Mariano, já não restavam quaisquer vestígios da irmandade do Porto Salvo, e da antiga invocação italiana de Nossa Senhora só restava uma pintura num quadro.[7]

Além do Convento da Trindade, existiu pelo menos mais um edifício religioso fundado pela comunidade milanesa e siciliana de Lagos, a Ermida de São Roque, situado na área da Meia Praia, que foi destruída no Sismo de 1755, não tendo sido reconstruída.[4]

Antigo Convento da Trindade, nos princípios do século XX.

Séculos XVIII a XIX[editar | editar código-fonte]

O Convento e a Igreja da Trindade foram totalmente destruídos pelo Sismo de 1755, tal como a Igreja de São Brás.[4][9]

De acordo com uma carta de 23 de Março de 1760, emitida pelo bispo D. Lourenço de Santa Maria, na área do Rossio da Trindade existiu igualmente uma «casa de compromisso», pertencendo à irmandade de São Nicolau Bispo, que tinham sido os antecessores do Compromisso Marítimo.[10]

Em 4 de Dezembro de 1762 o padre ministro da Ordem da Trindade pediu à autarquia de Lagos para indicar três pessoas, de forma a escolher uma para o posto de tesoureiro na Igreja da Raposeira, onde seria responsável pela recolha de esmolas para a reconstrução do convento.[4] Na relação dos bens e rendas do condado de Odemira, em 1761, faz-se referência ao Moinho de Odeceixe de Baixo, que pertencia aos Frades da Trindade, em Lagos.[11] Em 13 de Março de 1789 foi feito o levantamento gráfico das ruínas pelo coronel engenheiro Teodósio da Silva Reboxo, do Regimento de Artilharia do Reino do Algarve, por ordem do Conde de Vale de Reis.[1] Em 1834 o governo extinguiu as ordens religiosas masculinas em território nacional, levando ao encerramento dos conventos e à sua inventariação, incluindo o de Lagos, que então possuía o próprio terreno e a sua cerca, além de dois prédios avaliados em 705$000 réis, e vários foros, tanto em dinheiro como géneros, relativos a trigo, milho, figos e galinhas.[5] Silva Lopes afirma na sua obra de 1841 que «as duas igrejas de Porto Salvo e de S. Braz estão hoje servindo de armazéns de arrecadação do regimento que alli está de quartel».[6] Nos princípios do século XIX, o antigo convento foi reconvertido num hospital da Marinha Portuguesa,[4] tendo sido adquirido por um particular nos finais da centúria.[1]

Séculos XX e XXI[editar | editar código-fonte]

No século XX, surgiu a ideia de construir um hotel nos terrenos junto ao convento, que não chegou a avançar.[1] Posteriormente foi abandonado, entrando num processo de profunda degradação.[12] Em 1998, o complexo do convento estava à venda.[1]

Vista aérea do Convento da Trindade, em 2023.

Em Junho de 2019, a Câmara Municipal de Lagos abriu o concurso público para o Plano de Pormenor do Rossio da Trindade, no valor de 100 mil Euros, que incluía a recuperação do convento, e a sua transformação num hotel de luxo.[12] Numa entrevista com a presidente da Câmara Municipal de Lagos, Joaquina Matos, esta afirmou que estava a ser estudada a instalação de um hotel com 120 quartos nos terrenos junto às ruínas do convento.[13] A coligação Lagos com Futuro criticou os artigos 83 e 84 do Plano de Pormenor, que iriam permitir ao proprietário a recuperação e instalação de uma unidade hoteleira de luxo no antigo Convento da Trindade, alegando que o edifício que estava programado, com dois pisos e 120 quartos, em conjunto com o seu parque de estacionamento, iria ocupar uma vasta área junto às arribas, numa zona que era considerada de grande instabilidade geológica.[14]

Entrada do complexo, em 2020.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c d e f g h i j k l m n CELADA, Marta; COSTA, Anouk (1998). «Convento dos Frades Trinos / Ruínas do Convento da Trindade». Sistema de Informação para o Património Arquitectónico. Direcção Geral do Património Cultural. Consultado em 17 de Junho de 2020 
  2. a b c «Ruínas do antigo Convento da Trindade». Câmara Municipal de Lagos. Consultado em 11 de Outubro de 2020 
  3. COUTINHO, Maria João Pereira (Junho de 2019). «Entre a memória e o devir: fragmentos da fachada da igreja do convento da Trindade» (PDF). Gabinete de Estudos Olisiponenses / Direcção Municipal de Cultura / Departamento de Património Cultural. Rossio - Estudos de Lisboa (8). Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa. p. 25-27. ISSN 2183-1327. Consultado em 11 de Outubro de 2020 – via Universidade Nova de Lisboa 
  4. a b c d e f g ROCHA, 1909:88-89
  5. a b c d e f g JESUS, Artur Vieira de (1 de Setembro de 2020). «O antigo Convento da Trindade e a História dos Lugares que hoje não têm História». Nova Costa de Oiro (47). Lagos: JL Unipessoal. p. 26-29. Consultado em 10 de Outubro de 2020 – via Issuu 
  6. a b c d e f g h i LOPES, 1841:229-230
  7. a b c d e f OLIVEIRA, Ataíde (7 de Janeiro de 1909). «Lacobrica, Lacobriga ou Lagos» (PDF). Correio do Algarve. Ano 1 (14). Lagos. p. 2. Consultado em 13 de Outubro de 2020 – via Hemeroteca Digital do Algarve 
  8. MARTINS, José António (6 de Maio de 2019). «De Faro a Oxford em busca da biblioteca perdida». Barlavento. Consultado em 17 de Junho de 2020 
  9. «Lagos» (PDF). O Panorama. 2.ª Série - Volume I (45). 5 de Novembro de 1842. p. 45-46. Consultado em 10 de Outubro de 2020 – via Hemeroteca Digital de Lisboa 
  10. ROCHA, 1909:50
  11. QUARESMA, 2009:118
  12. a b EUSÉBIO, José Carlos (21 de Junho de 2019). «Lagos quer hotel de luxo em antigo convento». Correio da Manhã. Consultado em 17 de Junho de 2020 
  13. EUSÉBIO, Jorge (3 de Julho de 2019). «Hotel de 120 quartos previsto para o Rossio da Trindade». Algarve Marafado. Consultado em 17 de Junho de 2020 
  14. «Publicidade Institucional». Correio de Lagos. Ano XXXII (363). Lagos. Janeiro de 2021. p. 20 
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Bibliografia[editar | editar código-fonte]

Ligações externas[editar | editar código-fonte]


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