Kithaab

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Kithaab, também Kitab, (em malabar: കിത്താബ്) é uma obra de teatro escrita em malabar - língua do estado indiano de Kerala - que faz o retrato humorístico de uma menina que sonha com poder recitar o adhan, o chamado islâmico à oração realizada habitualmente por um homem, o almuadem. A menina questiona a misoginia em sua comunidade, e rebela-se contra as normas da comunidade que lhe impedem dançar com seus amigos, rouba a comida que lhe negam a ela por ser menina, e reclamando a oportunidade de chamar à oração.[1][2]

A obra foi escrita pelo roteirista e diretor Rafeeq Mangalassery.[3][4][5] Estreou em novembro de 2018 no estado de Kerala, em paralelo ao movimento de defesa dos direitos das mulheres que começava a se criar reivindicado a entrada das mulheres no templo indiano Sabiramala, o direito das mulheres muçulmanas a participar nos rituais religiosos e a igualdade de gênero em espaços religiosos, incluindo a designação de mulheres como ímans, e a participação na liderança das orações nas principais mesquitas.[1]

Inspiração[editar | editar código-fonte]

Rafeeq Mangalassery tem explicado que sua obra Kithaab não está baseada diretamente na história de Vaangu, sendo que é uma adaptação independente inspirada no trabalho do escritor e roteirista Unni R. sobre Vaangu. Por sua vez Unni R. distanciou-se da obra de Mangalassery declarando que a obra não estava em sintonia com suas ideias e que carecia de valor espiritual.[6] O diretor malabar V.K. Prakash tinha também um projeto independente para adaptar a história de Unni R. para o cinema.[7]

Trama[editar | editar código-fonte]

Uma menina muçulmana deseja converter-se numa almuadem como seu pai, e fazer o apelo da oração. Rouba o pescado fritado que sua mãe cozinha para os homens da casa e diz que o fazer não é moralmente mau porque Padachon (deus) entendê-lo-ia dado que às meninas não se lhes dá suficiente comida, uma vez que na tradição as meninas e as mulheres recebem menos alimentos que os homens da casa. Seu pai a censura e diz-lhe que as mulheres deveriam ter só a metade do que os homens têm. A isto, a menina lhe pergunta com picardia por que as mulheres não têm o mesmo direito.[8]

Nestas brigas, ela expressa seu desejo de liderar a oração e seguindo a tradição de seu pai, chamar ao adhan (a oração muçulmana). Seu pai responde a todas suas perguntas se referindo ao grande livro (Kithab), a encerra para que não volte a atuar numa obra (uma peça dentro da obra de teatro) e lhe diz que não atingirá o céu se continuar fazendo estas coisas.[8]

"Se perdesse a entrada ao céu porque canto e danço, não quero esse céu," responde a menina. O pai está disposto inclusive a matar à menina se atuar na obra contradizendo suas ordens. Mas sua mãe recorda ao pai que além de muecín é também pai. Finalmente este permite que a menina faça o chamado do muecín e a peça de teatro termina com a menina chamando à oração (adhan) e os demais rezando.[8]

Controvérsia[editar | editar código-fonte]

A escola secundária Memunda Higher na zona rural de Kozhikode organizou uma representação da obra no marco do concurso entre escolas no distrito de Vatakara, ganhando os prêmios ao melhor drama e à melhor atriz e supunha-se que continuaria participando no concurso a nível estadual de Kerala. Kithaab retrata a discriminação social contra as mulheres em vários aspectos da família muçulmana tradicional. Questiona temas como a discriminação das meninas na provisão de alimentos, a educação deficiente e a prática da poligamia.[9] Dado que a obra trata sobre a justiça de gênero no contexto de Islã, teve oposição por parte da ortodoxia político-religiosa e os conservadores conseguiram bloquear a participação da escola Memunda Higher invocando a questões de fé.[1][3] A obra provocou o debate sobre a igualdade de gênero e a intolerância religiosa. A obra de teatro representou-se depois por separado numa data posterior.[10]

Posteriormente representou-se uma contra-obra chamada Kithabile Koora, com uma personagem feminina que procura a liberdade de religião. Abbas Kalathode, um dos ativistas teatrais do idioma malabar, ainda que não se mostrou entusiasmado com a contra-obra, criticou a obra Kithaab de Mangalassery porque não considerava uma série de mudanças recentes de grande alcance na comunidade muçulmana. "Representar a um mukri como o vilão na comunidade é um eufemismo porque outros villãos têm surgido entre os muçulmanos", acrescentou. Mangalassery não esteve de acordo e respondeu que "não é correto dizer que a comunidade muçulmana tem registrado um progresso constante na vida social. Poderia ter mudanças entre os muçulmanos como em outras comunidades. Mas as forças conservadoras também têm começado a dominar. O Purdah, que foi indumentaria de uma minoria insignificante em Kerala, agora se converteu na identidade das mulheres muçulmanas. Sei que o íman é só um empregado da mesquita, mas representa ao clero, cujo controle se fortaleceu entre os muçulmanos. A obra termina com a abertura de novas perspectivas para a comunidade".[11] "Aqui a história de fundo é a de uma família muçulmana, e por tanto, a obra fala da vida muçulmana. Não há nenhuma tentativa de insultar a qualquer religião em particular," tem insistiu Mangalassery.[3]

Ativistas e escritores, entre eles K. Satchidanandan e S. Hareesh mostraram sua oposição à exclusão de Kithaab no festival estatal de Kerala. Numa declaração conjunta condenaram a interferência de organizações religiosas nos valores do movimento reformista de Kerala e a liberdade de expressão.[5] O diretor de cinema Prathap Joseph liderou uma campanha nos meios de comunicação social denunciando a situação e assinalando que a retirada da obra era uma "ameaça aos valores do movimento reformista e a liberdade de expressão".

A. Santha Kumar, roteirista, escreveu no Facebook que "a escola lavou as mãos ao retirar a obra se rendendo ao ditado de dirigentes religiosos. Denuncia também que tenham isolado o autor da obra, Rafeeq Mangalassery." Kumar perguntou por que os que falam muito sobre os "valores reformistas" guardaram silêncio sobre o isolamento de Mangalassery a mãos do "fundamentalismo minoritário".[5]

Rafeeq Mangalassery[editar | editar código-fonte]

Rafeeq Mangalaserry é um escritor em língua malabar e diretor de Chettippadi (Malappuram Kerala) na Índia, comprometido em temas sociais. Em sua obra Annaperuna descreve o desperdício de comida enquanto muitos outros passam fome.[12] Também tem dirigido Kottem Kareem.[3]

Venceu o prêmio Kerala Sahitya Akademi pela obra Jinnu Krishnan em 2013; e o prêmio Kerala Sangeetha Nataka Akademi ao melhor roteiro por Iratta Jeevithangaliloode (Através das Vidas Gêmeas).[13][14][15] É um autor chave no teatro infantil.[16]

Referências

  1. a b c «In Kerala's Kozhikode, a play about a girl who dreams about giving azaan call has Muslim conservatives up in arms». Firstpost. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  2. «Kozhikode School Withdraws Play Calling out Gender Disparity After Muslim Groups Protest». The Wire. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  3. a b c d «Kozhikode: SDPI, MSF up in arms against Kithab». Deccan Chronicle (em inglês). 25 de novembro de 2018. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  4. «Play showing girl performing 'azaan' raises conservatives' ire - Times of India». The Times of India. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  5. a b c «Campaign for Kithaab takes off» (em inglês). ISSN 0971-751X 
  6. «Controversial play 'Kitab' dropped from Kerala school art festival». OnManorama (em inglês). Consultado em 21 de janeiro de 2019 
  7. «Unni R short story Vanku to be adapted on screen by V K Prakash daughter Kavya Prakash Shabna Mohammed വാങ്ക് വിളിക്കാൻ ആഗ്രഹിച്ച റസിയയുടെ കഥ സിനിമയാകുന്നു: ഉണ്ണി ആറിന്റെ കഥയ്ക്ക് ദൃശ്യഭാഷ്യമൊരുക്കാന്‍ രണ്ടു പെണ്‍കുട്ടികള്‍». Indian Express Malayalam (em malaiala). 20 de setembro de 2018. Consultado em 21 de janeiro de 2019  zero width joiner character character in |titulo= at position 201 (ajuda)
  8. a b c «Following protests by Muslim groups Kozhikode school withdraws students play». www.thenewsminute.com. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  9. «After dropped by school Kalolsavam, 'Kithaab' to be staged across Kerala». The New Indian Express. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  10. «ക്ലബുകളും വായനശാലകളും സാംസ്കാരിക സംഘടനകളും ഏറ്റടുത്തു; ബാലസംഘവും ഡിവൈഎഫ്ഐയും നാടകം പ്...». www.marunadanmalayali.com. Consultado em 16 de janeiro de 2019 
  11. «Purdah phobia». Times of India Blog (em inglês). 1 de dezembro de 2018. Consultado em 17 de janeiro de 2019 
  12. «The show will go on, with aplomb» (em inglês). ISSN 0971-751X 
  13. «2013-ലെ കേരള സാഹിത്യ അക്കാദമി അവാര്‍ഡുകള്‍ പ്രഖ്യാപിച്ചു» (PDF). Kerala Sahitya Akademi. 20 de dezembro de 2014. Consultado em 18 de janeiro de 2019. Cópia arquivada (PDF) em 13 de junho de 2018  zero width joiner character character in |titulo= at position 36 (ajuda)
  14. «Sahitya Akademi award for Meera's 'Aarachar' - Times of India». The Times of India. Consultado em 18 de janeiro de 2019 
  15. «Beedi wins best short play award of akademi» (em inglês). ISSN 0971-751X 
  16. «Ennu Mammali Enna Indiakkaran». Consultado em 16 de janeiro de 2019