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Conferência de Carnunto

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Conferência de Carnunto
Conferência de Carnunto
Ruínas de Carnunto
Participantes Diocleciano, Galério, Maximiano, Licínio
Localização Carnunto, Áustria (antiga Panônia I)
Data 11 de novembro de 308
Resultado Inconclusivo

A Conferência de Carnunto (em latim: Carnuntum) foi uma conferência militar ocorrida em 11 de novembro de 308 na cidade de Carnunto (atual Petronell-Carnuntum, na Áustria), que à época situava-se na província da Panônia I. Foi convocada pelo imperador sênior do Oriente (augusto) Galério (r. 293–311) como forma de tentar resolver a disputa pelo título de augusto do Ocidente e, por conseguinte, cessar os conflitos em curso desde o ano anterior quando de sua invasão e a anterior de Valério Severo (r. 305–307) à Itália de Magêncio (r. 306–312) e Maximiano (r. 286-308; 310). Nela estiveram presentes Diocleciano (r. 284–305), que estava aposentado desde 305, e Maximiano.

Segundo deliberado neste encontro, Maximiano seria definitivamente removido de sua posição imperial, Licínio (r. 308–324), um antigo general de Galério, foi nomeado como Augusto do Ocidente e deveria lidar com Magêncio, que fora tratado como usurpador, e Constantino, o Grande (r. 306–337) foi demovido de sua posição de Augusto para César. Essas decisões, contudo, não agradaram a maioria dos monarcas, com Constantino questionando sua despromoção e Maximino Daia (r. 305–313) exigindo alguma promoção. Além disso, Maximino não se contentaria com sua despromoção e ainda tentaria uma última conspiração na corte constantiniana na Gália, enquanto Licínio nada faria nos anos seguintes para deter Magêncio.

Argênteo de Constâncio Cloro (r. 293–306) emitido em Antioquia ca. 294-295
Fólis de Valério Severo (r. 305–307) emitido em Augusta dos Tréveros

Desde 293, o Império Romano está dividido em duas metades, cada qual governada por um Augusto (imperador sênior) e um César (imperador júnior). Em 1 de maio de 305, os augustos Diocleciano (r. 284–305) e Maximiano (r. 285-308; 310) abdicam voluntariamente e seus césares Constâncio Cloro (r. 293–306) e Galério (r. 293–311) foram elevados à posição augustal ocidental e oriental respectivamente,[1] enquanto Valério Severo (r. 305–307) e Maximino Daia (r. 305–313) tornar-se-iam césares do Ocidente e Oriente respectivamente.[2][3][4]

Em 306, o augusto do Ocidente Constâncio Cloro (r. 293–306) falece em Eboraco (atual Iorque, Inglaterra)[5] e seus soldados elevam seu filho Constantino, o Grande (r. 306–337) como seu sucessor.[6] O augusto do Oriente Galério (r. 293–311), no entanto, eleva Valério Severo (r. 305–307) à posição de augusto, pois pelas prerrogativas do sistema tetrárquico vigente, sendo ele o césar ocidental, deveria suceder o augusto morto. Após algumas discussões diplomáticas, Galério demoveu Constantino para a posição de césar, o que ele aceitou, permitindo assim que Severo assumisse sua posição.[7]

Magêncio (r. 306–312), filho de Maximiano (r. 285-308; 310), o augusto antecessor de Constâncio Cloro, com inveja da posição de Constantino, declara-se imperador na Itália com o título de príncipe e chama seu pai da aposentadoria para co-governar consigo. Por 307, ambos sofrem invasões de Valério Severo, que é derrotado e morto, e Galério, que decide retirar-se.[7] Em 308, talvez em abril, Maximiano tentou depor seu filho num fracassado plano, forçando-o a fugir para a corte de Constantino na Gália.[8] Ciente da situação no Ocidente, Galério resolve convocar uma conferência e Maximiano depositou suas esperanças de ascensão nela.[9]

Altar dedicado a Mitra por Galério, Diocleciano e Maximino na conferência em nome de todos os imperadores. Museu de Carnunto

Em 11 de novembro de 308, Galério convocou a Conferência de Carnunto (atual Petronell-Carnuntum, Áustria) para tentar estabilizar a situação nas províncias ocidentais. Na conferência estavam presentes o aposentado imperador Diocleciano, que brevemente retornou à vida pública, Galério e Maximiano. Nela, Maximiano foi forçado a abdicar novamente e Constantino foi demovido para sua antiga posição de César.[7]

Além disso, Licínio, um dos companheiros militares de Galério que estava participando da conferência, foi nomeado Augusto do Ocidente[7] e recebeu as regiões da Trácia, Panônia e Ilíria, bem como a missão de neutralizar Magêncio na Itália.[10] Por fim, os augustos presentes reconstruíram o mitreu de Carnunto e dedicaram-o para os césares ausentes (Constantino e Maximino Daia) e para eles próprios:[11]

D(eo) S(oli) i(nvicto) M(ithrae)
Fautori imperii sui
Iovii et Herculii
religiosissimi Augusti et Caesares
Sacrarium restituerunt

Para o estudioso A. L. Frothingham, tendo em vista que pelo século IV o culto a Mitra e Sol Invicto estava em alta, não é de se estranhar que tenha sido feita uma dedicatória em nome dos imperadores para estes deuses. Segundo ele, isso poderia ser interpretado como uma entrega simbólica do Estado para estes deuses, que a partir desse momento teriam a missão de tutelá-lo e evitar que voltasse ao caos de outrora.[12]


Consequência

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Fólis de Magêncio (r. 306–312) emitido em Ticino ca. 307-308

Esse novo sistema não viria a durar muito: Constantino, o Grande recusou-se a aceitar sua despromoção e continuou a estilizar-se como Augusto em sua cunhagem, mesmo com os demais membros da Tetrarquia referindo-se a ele como César. Licínio, por conseguinte, nada fez para remover o usurpador Magêncio do poder e preferiu lidar com os problemas internos e invasões bárbaras nas províncias a ele conferidas.[10] Maximino Daia, por conseguinte, frustrou-se por ter sido desconsiderado como possível ocupante da posição concedida a Licínio, e exigiu de Galério uma promoção. Galério ofereceria chamar Maximino e Constantino "filhos dos Augustos" (em latim: filii Augustorum),[13][14][15][16][17][18][19] um título recusado por ambos; pela primavera de 310, contudo, ambos eram chamados Augustos por Galério.[20][21]

Em 310, aproveitando-se da ausência de Constantino, que estava na fronteira do rio Reno lutando contra invasores francos, Maximiano rebelou-se em Arelate (atual Arles, na França) e tentou tomar sua posição. Ele conseguiria pouca adesão à revolta e logo Constantino ficaria ciente do ocorrido. Constantino dirigiu-se imediatamente para o sul da Gália e pode com facilidade sufocar a revolta, capturando-o e encorajando-o ao suicídio.[9][22][23][24][25] [26][27] No ano seguinte, Magêncio, conclamando vingança pela morte de seu pai, declara guerra a Constantino, que responde com uma invasão ao norte da Itália em 312.[28][29] No mesmo ano, Galério falece e o Império Romano do Oriente é dividido entre Maximino Daia e Licínio que após alguns desentendimentos resolvem assinar a paz por 312 no Bósforo. Ela duraria pouco, com eles declarando guerra um ao outro por 313.[7][30]

Referências

  1. Potter 2004, p. 342.
  2. Barnes 1981, p. 25–27.
  3. Williams 1997, p. 191.
  4. Southern 2001, p. 152.
  5. DiMaio 1996c.
  6. Eutrópio século IV, 10.1–2.
  7. a b c d e DiMaio 1996b.
  8. DiMaio 1997a.
  9. a b DiMaio 1997b.
  10. a b DiMaio 1997c.
  11. Frothingham 1914, p. 151.
  12. Frothingham 1914, p. 146; 151.
  13. Elliott 1996, p. 42–43.
  14. Barnes 1981, p. 32–34.
  15. Lenski 2006, p. 65.
  16. Odahl 2004, p. 90–91.
  17. Pohlsander 2004, p. 17.
  18. Potter 2004, p. 349–50.
  19. Treadgold 1997, p. 29.
  20. Jones 1978, p. 61.
  21. Barnes 1981, p. 33.
  22. Barnes 1981, p. 34–35.
  23. Pohlsander 2004, p. 17.
  24. Elliott 1996, p. 43.
  25. Lenski 2006, p. 65–66.
  26. Odahl 2004, p. 93.
  27. Potter 2004, p. 352.
  28. Anônimos século III-IV, (9)5.1–3.
  29. MacMullen 1969, p. 71.
  30. DiMaio 1996d.
  • Barnes, Timothy D. (1981). Constantine and Eusebius. Cambridge, MA: Harvard University Press. ISBN 978-0-674-16531-1 
  • Elliott, T. G. (1996). The Christianity of Constantine the Great. Scranton, PA: University of Scranton Press. ISBN 0-940866-59-5 
  • Frothingham, A. L. (1914). «Diocletian and Mithra in the Roman Forum». Archaeological Institute of America. American Journal of Archaeology. 18 (2): 146-155 
  • Jones, A. H. M. (1978). Constantine and the Conversion of Europe. Buffalo: University of Toronto Press 
  • Lenski, Noel Emmanuel (2006). The Cambridge companion to the Age of Constantine. Cambridge: Cambridge University Press. ISBN 0-521-52157-2 
  • MacMullen, Ramsay (1969). Constantine. Nova Iorque: Dial Press. ISBN 0-7099-4685-6 
  • Odahl, Charles Matson (2004). Constantine and the Christian Empire. Nova Iorque: Routledge. ISBN 0-415-38655-1 
  • Pohlsander, Hans (2004). The Emperor Constantine. Londres & Nova Iorque: Routledge. ISBN 0-415-31937-4 
  • Potter, David Stone (2004). The Roman Empire at Bay AD 180–395. Londres/Nova Iorque: Routledge. ISBN 0-415-10057-7 
  • Southern, Pat (2001). The Roman Empire from Severus to Constantine. Londres & Nova Iorque: Routledge. ISBN 0-415-23943-5 
  • Treadgold, Warren T. (1997). A History of the Byzantine State and Society. Stanford, Califórnia: Stanford University Press. ISBN 0-8047-2630-2 
  • Williams, Stephen (1997). Diocletian and the Roman Recovery. Nova Iorque: Routledge. ISBN 0-415-91827-8