Ensino doméstico: diferenças entre revisões

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Revisão das 00h34min de 11 de março de 2019

Crianças estudando em casa.

Ensino doméstico ou domiciliar é "aquele que é leccionado, no domicílio do aluno, por um familiar ou por pessoa que com ele habite",[1] em oposição ao ensino numa instituição tal como uma escola pública, privada ou cooperativa, e ao ensino individual, em que o aluno é ensinado individualmente por um professor diplomado, fora de uma instituição de ensino [1].

O ensino doméstico é legalizado em vários países como Estados Unidos, Áustria, Bélgica, Canadá, Austrália, França, Noruega, Portugal, Rússia, Itália e Nova Zelândia e proibido em países como a Alemanha e a Suécia, onde é crime. A maioria dos países exige uma avaliação anual dos alunos que recebem educação domiciliar. Em inglês é chamado de Homeschooling.

No Brasil é considerado crime, previsto no artigo 246 do Código Penal e ocorre quando o pai, mãe ou responsável deixa de matricular o filho em alguma escola pública ou privada autorizada pelo Ministério da Educação. De acordo com o juiz Leandro Cunha Bernardes Silveira, do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, a criminalização da conduta tem como principal objetivo coibir a prática e "garantir que toda criança tenha direito à educação".[2] No Brasil o ensino é obrigatório entre os 4 e 17 anos. Os pais ficam responsáveis por colocar as crianças na educação infantil a partir dos 4 anos e por sua permanência até os 17 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).[3] O artigo 1.634 do Código Civil Brasileiro diz que compete aos pais, quanto aos filhos menores, dirigir-lhes a criação e a educação.[4] O artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores. E o artigo 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos na rede regular de ensino.[5]

Há um extenso debate entre educadores na sociedade sobre os benefícios dessa modalidade de educação.

História

Antes da criação da escolaridade obrigatória e subsequente criação de instituições públicas de ensino, a maioria da educação em todo o mundo decorria no seio da família ou comunidade, e apenas uma pequena proporção da população se deslocava a escolas ou empregava tutores. Por exemplo, no ano de 1900, já após a Reforma de João Franco e Jaime Moniz (Decretos de 22/12/1894 e 14/8/1895), o "ensino liceal" português contava ainda 247 dos 4606 alunos (5%) em ensino doméstico.[6]

Métodos

O ensino doméstico é sempre a partir de casa e os tutores ou professores são pessoas da própria família ou comunidade, regra geral os pais. Este ensino pode ou não ser apoiado por uma escola, que pode providenciar explicações para os pais-tutores, ou um ambiente social para que a criança possa passar algumas horas da semana com outras crianças da mesma idade que frequentam a escola.

O currículo pode ser dirigido, sendo bastante semelhante ao existente nas escolas, ou os pais-tutores podem seguir um currículo livre, ou mesmo a ausência de currículo, permitindo à criança que aprenda de forma autodidática. Esta última forma de ensino doméstico teve como principal proponente o educador americano John Holt (19231985), que cunhou o termo unschooling ("des-escolar") em 1977 na sua revista Growing Without Schooling.

Seja como for, a educação domiciliar exige mais dos pais, que passam a supervisionar intensamente o ensino-aprendizagem de seus filhos.

Motivações

As motivações para educar uma criança em casa podem incluir as seguintes[7]:

  • perigos do ambiente escolar (aliciamento para o consumo de drogas, abusos sexuais, bullying etc);
  • proteção contra desrespeito a valores morais, culturais, religiosos ou ideológicos;
  • flexibilidade na aplicação do conteúdo curricular
  • possibilidade de experimentar modelos educativos alternativos, tais como o ensino adaptado ao desenvolvimento particular da criança;
  • flexibilidade de horários;
  • mobilidade geográfica dos pais.

Críticas

Algumas críticas feitas à educação em casa incluem[carece de fontes?]:

  • falta de socialização com crianças da mesma idade;
  • limitação da aquisição de conhecimentos e da cosmovisão do educando aos conhecimentos e cosmovisão do tutor;
  • confusão do papel de pai-professor.
  • carência do conhecimento colectivo

Visão Religiosa

Muitos defensores da educação fora da instituição escolar alegam motivos religiosos, dizendo terem direito a proporcionarem aos filhos uma educação inteiramente voltada a seus valores morais. Tal ideia costuma ser difundida principalmente nos meios conservadores católicos e evangélicos.

As igrejas evangélicas possuem autonomia doutrinal a esse respeito; no tocante à Igreja Católica, entretanto, a doutrina oficial defende que, embora os pais devam indiscutivelmente ser os principais educadores dos filhos, essa responsabilidade deve ser dividida com outras instituições, principalmente a escola. Conforme esclarece o Compêndio da Doutrina Social da Igreja (nº 240):

"Os pais são os primeiros, mas não os únicos educadores de seus filhos. Compete-lhes, pois, a eles exercer com sentido de responsabilidade a sua obra educativa em colaboração estreita e vigilante com os organismos civis e eclesiais. [...] "Estas forças são todas elas necessárias, mesmo que cada uma possa e deva intervir com a sua competência e o seu contributo próprio». [...] Neste contexto, se coloca antes de mais o tema da colaboração entre a família e a instituição escolar." [8]

A Exortação Apostólica Amoris Laetitia, por sua vez, explica que a função dos pais deve ser de educação de valores, mas não ser a única referência nesse aspecto:

"Os pais necessitam também da escola para assegurar uma instrução de base aos seus filhos [...]. A tarefa dos pais inclui uma educação da vontade e um desenvolvimento de hábitos bons e tendências afectivas para o bem. [...] Esta formação deve ser realizada de forma indutiva, de modo que o filho possa chegar a descobrir por si mesmo a importância de determinados valores, princípios e normas, em vez de lhos impor como verdades indiscutíveis [nº 263/264]. Não é bom que os pais se tornem seres omnipotentes para seus filhos, de modo que estes só poderiam confiar neles, porque assim impedem um processo adequado de socialização e amadurecimento afectivo [nº 279]".[9]

O Catecismo aponta o importante direito dos pais a escolherem uma escola de acordo com suas convicções, e cobra do Estado que lhes assegure este direito (nº 2229) [10]. Aos pais que se sentem insatisfeitos com os modelos educacionais oferecidos, é recomendado que procurem escolas católicas ou até mesmo que fundem e mantenham instituições escolares, as quais deveriam ser subsidiadas pelo poder publico:

"Os pais têm o direito de fundar e manter instituições educativas. As autoridades públicas devem assegurar que «se distribuam as subvenções públicas de modo tal que os pais sejam verdadeiramente livres para exercer o seu direito, sem ter de suportar ônus injustos [...]. Deve-se, portanto, considerar uma injustiça negar a subvenção econômica pública às escolas não estatais que dela necessitem e que prestam um serviço à sociedade civil" [CDSI, nº 241]. [8]

Por fim, a Exortação Apostólica Familiaris Consortio ressalta que, mesmo quando apresenta valores contrários, a escola não deve ser encarada como a única força formadora dos filhos (nº 40):

"Se nas escolas se ensinam ideologias contrárias à fé cristã, cada família juntamente com outras, possivelmente mediante formas associativas, deve com todas as forças e com sabedoria ajudar os jovens a não se afastarem da fé. Neste caso, a família tem necessidade de especial ajuda da parte dos pastores, que não poderão esquecer o direito inviolável dos pais de confiar os seus filhos à comunidade eclesial". [11]

Sociabilidade

Encontro de famílias de homeschoolers.

Embora críticas sejam levantadas quanto à sociabilidade de crianças educadas por ensino doméstico, pesquisas feitas principalmente nos Estados Unidos, onde o ensino doméstico é mais comum, mostram que o número de crianças socialmente privadas entre as educadas em casa é pequeno. A sociabilidade se dá por participação comunitária, social e política. A auto-estima e a satisfação em viver parecem ser melhores, em média, em crianças que foram educadas em casa do que naquelas que frequentaram a escola.[12][13]

Avaliação

A maioria dos países impõem uma avaliação anual. Um exemplo de avaliação é a França[14], que apesar dos pais serem livres na forma de ensinar seus filhos, estes são obrigados a apresentar, até os 16 anos, as seguintes linhas de competência:

  • Escrever e falar em francês
  • Matemática, ciências básicas e tecnologia
  • pelo menos uma língua estrangeira
  • História, Geografia e Arte da França, da Europa e do resto do mundo
  • Ciência da Computação
  • competências sociais e cívicas
  • iniciativa e autonomia

Alunos de educação domiciliar devem demonstrar que são capazes de:

  • responder a perguntas
  • fazer deduções de suas próprias observações e de documentos
  • raciocinar
  • criar idéias e produzir um trabalho final
  • usar computadores
  • avaliar riscos
  • fazer bom uso de recursos disponíveis

Em Portugal

Em Portugal a legislação permite o ensino doméstico[15], no entanto essa opção é relativamente desconhecida da quase totalidade da população. .[16]

No ano letivo 2006/2007 apenas quatro crianças, de três famílias diferentes, estavam a receber ensino doméstico .[17]

Em 2014/2015 estavam inscritas 199 crianças, em 2017/18 estão inscritos no ensino doméstico e individual 620 alunos.[18]

Os alunos domésticos deverão efectuar exames de equivalência à frequência dos 1.º, 2.º e 3.º ciclos, após o 4.º, o 6.º e o 9.º ano respetivamente. Após o 9.º ano os alunos domésticos também deverão inscrever-se nos exames nacionais de Língua Portuguesa e de Matemática tal como os restantes alunos que concluem o 9.º ano; a única diferença é que os alunos das escolas são inscritos pelas próprias escolas, enquanto os alunos domésticos deverão ser inscritos pelos seus pais-tutores.[19]

No Brasil

No Brasil, é obrigatória aos pais a matrícula dos filhos na educação básica a partir dos 4 (quatro) anos de idade[20], do que decorre a vedação ao ensino doméstico. Segundo parecer do Conselho Nacional de Educação, a adoção da educação domiciliar dependeria de manifestação do legislador, que viesse a abrir a possibilidade, segundo normas reguladoras específicas;[21] em setembro de 2018, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se contrário a essa prática. [22]

Em função da imposição legal à matrícula dos filhos, o próprio Poder Público, inclusive o Ministério Público, pode compelir judicialmente a matrícula de menores de idade em instituições de ensino. Além disso, os pais podem ser processados criminalmente por não levarem os filhos à escola, pelo crime de abandono intelectual, tipificado no art. 246 do Código Penal Brasileiro.

Há, contudo, publicações que se posicionam favoravelmente à educação domiciliar, como é o caso de artigo publicado pelo Ministro do STJ Domingos Netto[23].

Referências

  1. a b Decreto-Lei n.º 553/80 (Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo). Diário da República n.º 270, Série I de 1980-11-21 (ficha, PDF).
  2. Criminalizar abandono intelectual facilita controle. Consultor Jurídico, 20 de outubro de 2013.
  3. Lei obriga pais a matricular crianças a partir dos 4 anos na pré-escola. UOL, 5 de abril de 2013.
  4. Código Civil Brasileiro
  5. Estatuto da Criança e do Adolescente
  6. Carlos Fontes, Cronologia do Ensino Secundário. Navegando na Educação. Acedido em 19 Set 2006. Texto idêntico a Amélia Martins e Ana Patrícia Silva, Como Surgiu o Liceu em Portugal. Site profissional de Olga Pombo. Acedido em 19 Set 2006.
  7. Definição e motivações para o ensino domiciliar
  8. a b «Compêndio da Doutrina Social da Igreja». www.vatican.va. Consultado em 30 de janeiro de 2019 
  9. «Amoris laetitia: Exortação Apostólica Pós-Sinodal sobre o amor na família (19 de março de 2016) | Francisco». w2.vatican.va. Consultado em 30 de janeiro de 2019 
  10. «Catecismo da Igreja Católica. Parágrafos 2196-2557». www.vatican.va. Consultado em 30 de janeiro de 2019 
  11. «Familiaris Consortio (22 de novembro de 1981) | João Paulo II». w2.vatican.va. Consultado em 30 de janeiro de 2019 
  12. Self-Concept in home-schooling children, John Wesley Taylor V, Ph.D., Andrews University, Berrien Springs, MI
  13. http://www.hslda.org/research/ray2003/
  14. Exigências na França
  15. O DL n.º 553/80 (Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) já citado define ensino doméstico, mas não o regulamenta. A Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei 46/86, DR 1.ª série, n.º 237, de 14.10.1986, ficha, PDF) não se refere ao ensino doméstico.
  16. Sónia Balasteiro, Aprender em casa, in Sol n.º 1, de 16 Set 2006, p. 40.
  17. . Duas crianças de duas famílias no artigo citado do jornal Sol, e duas crianças irmãs referidas em Brasil: camião-câmara fotográfica português em viagem inédita. Diário Digital/Lusa, 4 de agosto de 2006, acedido em 19 Set 2006.
  18. «Ensino doméstico triplica em dois anos» 
  19. Calendário de exames do ensino básico e secundário. Portal do Governo, 13 Fev 2006. Acedido em 19 Set 2006.
  20. Art. 4º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com redação dada pela Lei nº 12.796/2013. Antes da alteração promovida pela Lei de 2013, a matrícula era obrigatória a partir dos 7 (sete) anos de idade.
  21. PARECER CNE/CEB 34/2000
  22. «Notícias STF :: STF - Supremo Tribunal Federal». stf.jus.br. Consultado em 30 de janeiro de 2019 
  23. Aspectos Constitucionais e Infraconstitucionais do Ensino em casa pela Família. Superior Tribunal de Justiça.

Ver também

Ligações externas

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