A Erva do Diabo

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
(Redirecionado de A erva do diabo)
Pictograma de um lagarto (Cuetzpalin) de um dos calendários astecas tonalpohualli. O lagarto faz parte de um dos rituais realizados com a Datura descritos no livro "A Erva do Diabo".

The Teachings of Don Juan: A Yaqui Way of Knowledge (lançado no Brasil com o título A Erva do Diabo) é um livro do antropólogo e escritor peruano Carlos Castaneda. No livro, lançado em 1968 a partir da dissertação de mestrado apresentada pelo autor à Universidade da Califórnia, Castaneda descreve a utilização da planta Datura inoxia (popularmente conhecida como "erva-do-diabo") em rituais mágicos de origem ameríndia.

Repercussão[editar | editar código-fonte]

Segundo documentário sobre Carlos Castaneda realizado pela British Broadcasting Corporation,[1] o livro, na época de sua publicação, chegou a vender cerca de 16 000 exemplares por semana, merecendo, inclusive, a capa da revista Time Magazine em março de 1973.

Controvérsias[editar | editar código-fonte]

Até hoje, o livro gera controvérsias. Seus defensores alegam que, embora possa conter eventuais elementos ficcionais, o livro expressa valores filosóficos importantes. Seus detratores, por outro lado, alegam que o escritor, na época um estudante de antropologia da Universidade da Califórnia (UCLA), com alguma experiência de trabalho de campo e pesquisas bibliográficas sobre a etnologia de povos americanos, criou um texto que simulava um estudo de observação participante com integrantes da cultura Yaqui, publicando este como se realmente fosse uma pesquisa etnográfica.

A narrativa de Carlos Castaneda[editar | editar código-fonte]

O livro relata os primeiros encontros com Don Juan Matus, um índio de Sonora, que veio a ser o seu mestre no que era denominado pelo índio de "Caminho do Conhecimento". Relata também o quanto foi difícil para ele, um representante da sociedade americana, compreender os valores de Don Juan, que se comportava de acordo com a cultura milenar dos chamados "Videntes" da América Central.

Por parte de Carlos Castaneda, a assimilação dos conhecimentos dos índios e particularmente de seu personagem - informante, Don Juan Matus, tinha por objetivo a realização de um estudo antropológico para sua tese de mestrado, sobre a cultura indígena da América Central, com o fim de publicar livros e outros trabalhos acadêmicos. O paradigma de Carlos Castaneda naquela época, sobre o mundo e a vida em geral, era o da grande maioria dos cidadãos ocidentais mais instruídos, isto é, o uso do referencial científico para explicar a realidade.

O índio Don Juan tinha o objetivo de provocar uma quebra no padrão cognitivo habitual de Castaneda e levá-lo a vislumbrar a existência de outros padrões da realidade. A capacidade de vislumbrar outros padrões da realidade é um dos principais objetivos dos Videntes ou "homens de conhecimento", como designados no livro..

Os eventos que chamam a atenção da maioria dos leitores - mas não o objetivo principal do livro - são os relatos de Castaneda sobre os rituais dos pueblos de Sonora do México, nos quais utilizavam alucinógenos preparados a partir de plantas em suas formas originais, maceradas, ou mesmo in natura como mastigação de botões de cactos. Essas plantas têm marcantes propriedades psicoativas de expansão da percepção habitual, e por isso os índios as chamam de "Plantas de Poder". Observe-se que os descendentes dos Yaquis, segundo pesquisa do referido documentário da BBC, 2006 não utilizam o cacto peiote em seus rituais, mas é comum entre xamãs o contato intertribal e assimilação de práticas de outros grupos inclusive, como se sabe, da cultura dos colonizadores.

Sobre a Datura, planta que dá nome a esse livro no Brasil, Castaneda escreveu:

A erva-do-diabo tem quatro cabeças: a raiz, a haste e as folhas, as flores, e as sementes. Cada qual é diferente, e quem a tornar sua aliada tem de aprender a respeito delas nessa ordem. A cabeça mais importante está nas raízes. O poder da erva-do-diabo é conquistado por meio de suas raízes. A haste e as folhas são a cabeça que cura as moléstias; usada direito, essa cabeça é uma dádiva para a humanidade. A terceira cabeça fica nas flores e é usada para tornar as pessoas malucas ou para fazê-las obedientes, ou para matá-Ias. O homem que tem a erva por aliada nunca absorve as flores, nem mesmo a haste e as folhas, a não ser no caso de ele mesmo estar doente; mas as raízes e as sementes são sempre absorvidas; especialmente as sementes, que são a quarta cabeça da erva-do-diabo e a mais poderosa das quatro. "Meu benfeitor dizia que as sementes são a "cabeça sóbria': ...a única parte que poderia fortalecer o coração do homem. A erva-do-diabo é dura com seus protegidos, dizia ele, porque pretende matá-Ios depressa, coisa que geralmente consegue antes de eles descobrirem os segredos da "cabeça sóbria". [2]

A ingestão das Plantas de Poder não era para Don Juan, um método eficiente para a evolução dos seus aprendizes. Foi somente a primeira tentativa de uma série de muitas outras diferentes que utilizou, para que Castaneda assimilasse, ao longo de anos, o nexo da complexa e rica cultura milenar dos "Videntes". Nas fases seguintes do aprendizado, as Plantas de Poder deixaram de ser utilizadas em favor de intensas práticas realizadas diretamente na vida cotidiana.

Críticas à obra[editar | editar código-fonte]

O título do livro no Brasil, "A Erva do Diabo", gerou um desvio na compreensão do sentido original da obra, que enfatiza os ensinamentos de Don Juan - The Teachings of Don Juan: A Yaqui Way of Knowledge" ("Os Ensinamentos de Don Juan: O Caminho Yaqui do Conhecimento").

A gradativa compreensão e aprofundamento nos elementos cognitivos que antes eram propagados somente entre os mestres e aprendizes, num processo de iniciação, foram relatados também nos outros livros da obra de Carlos Castaneda, que em termos de ciência social, afasta-se da condição de observador participante para tornar-se um iniciado (convertido). Segundo Beyer[3] fundamentando-se em sua própria experiência de autor, com pesquisa de campo em antropologia do uso de plantas psicodélicas, na referida pesquisa da BBC (2006) e na extensa reportagem de Marshal no Salon Media Group, 2007 [4]: Castaneda progressivamente se afastou da antropologia para pura ficção e mistificação desde seu terceiro livro, com nenhuma contribuição para o conhecimento dos povos "pesquisados".

Deserto de Sonora onde vivem Pueblos Yaquis

O Livro

Prefácio de Walter Goldschmidt, antropólogo Prof. da UCLA
Introdução
Parte Um: Os ensinamentos
Parte Dois: Uma análise estrutural
Apêndices
(A) O processo de comprovar (o consenso especial)
(B) Esboço de análise estrutural

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. BBC Four - Tales from the Jungle, Series 1, Carlos Castaneda, What happens when anthropology goes bad? bbc.co.uk November 2007 Acesso Jul. 2014
  2. CASTANEDA, Carlos. A erva do diabo, os ensinamentos de dom Juan. 34ª Ed. RJ, Nova Era, 2009. p.82
  3. BEYER, Stephan V. The Tragedy of Don Carlos. Singing to the Plants Consulta em Jul. 2014
  4. MARSHALL, Robert. The dark legacy of Carlos Castaneda. Salon Media Group, Apr. 12,2007 Acesso Jun, 2014

Ligações externas[editar | editar código-fonte]