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Carlos Benjamin de Lyra

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Carlos Benjamin de Lyra
Carlos Benjamin de Lyra
Nascimento Carlos Benjamin de Lyra
23 de novembro de 1927
Recife
Morte 21 de julho de 1974 (46 anos)
São Paulo
Cidadania Brasil
Cônjuge Leda Lacerda de Lyra
Filho(a)(s) Jorge Lacerda de Lyra, Sylvia Lacerda de Lyra, Eduardo Lacerda de Lyra
Alma mater
Ocupação matemático, professor universitário
Empregador(a) Universidade de São Paulo, Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo, Instituto de Estudos Avançados de Princeton
Causa da morte tumor cerebral
Assinatura

Carlos Benjamin de Lyra (Pernambuco, 23 de novembro de 1927São Paulo, 21 de julho de 1974) foi um proeminente matemático brasileiro, pioneiro na topologia algébrica no Brasil e professor da Universidade de São Paulo.[1][2][3][4]

Nascido em Recife, Pernambuco, veio de uma família de usineiros e seu pai era proprietário do “Diário de Pernambuco”, um jornal conhecido nacionalmente[1][2]. Lyra foi um importante matemático para a sua área, seu curso “Introdução à Topologia Algébrica” ministrado no 1° Colóquio Brasileiro de Matemática[3] viria a ser o primeiro material da área escrito em português.[1]

Depois que seu pai faleceu, sua mãe se casou com um corretor da Bolsa de Valores em Wall Street e, juntos, o casal se mudou para Nova Iorque com Carlos e seu irmão[1][2]. Foi morando nos subúrbios da cidade que Lyra conheceu Richard Courant aos 15 anos, o fundador do Institute of New York University foi o responsável por despertar o interesse de Carlos pela matemática.[1]

Lyra construiu uma carreira sólida ao longo de sua vida. Começou como Professor Auxiliar na Universidade de São Paulo ao lado de Elza Gomide, ajudou a organizar e ministrou um curso no 1° Colóquio Brasileiro de Matemática, tornou-se doutor em Matemática com sua tese “Sobre os espaços de mesmo tipo de homotopia que o dos poliedros”, foi um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Matemática, colaborou na fundação do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP), atuou como professor em diversos cursos, além de participar da reestruturação dos cursos graduação e pós-graduação da Matemática na USP.[1][3][4]

Em 21 de julho de 1974, Carlos Benjamin de Lyra faleceu em decorrência de um tumor cerebral. Sua tese “H-equivalencia de grupos topológicos”, foi revisada e publicada por seu amigo Peter Hilton[3]. Em sua homenagem, a biblioteca do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo leva seu nome, assim como uma rua no bairro de Chácara São João, na capital paulista.

Início de vida

Primeiros anos e educação

Carlos Benjamin de Lyra nasceu na cidade de Recife em Pernambuco no dia 23 de novembro de 1927. Seus pais eram Carlos de Lyra Filho, um usineiro e dono do jornal “Diário de Pernambuco” que possuía muita influência nacionalmente e Elizabeth Lau de Lyra, que veio da Alemanha para o Brasil com sua família. O casamento de seus pais foi arranjado devido a proximidade das duas famílias nos negócios e na religião. Carlos de Lyra Filho já vinha de outro casamento, no qual teve cinco filhos, após a morte de sua esposa, casou-se com Elizabeth, com quem teve mais dois herdeiros: Carlos e George.[1][2]

O pai de Carlos morreu quando ele tinha apenas 9 anos. Viúva, sua mãe se casou com Paul Nortz, um corretor da Bolsa de Valores de Wall Street em Nova Iorque. Juntos o casal se mudou para os Estados Unidos e levou Carlos e seu irmão com eles.[1][2]

Lyra não foi para a escola em seus primeiros anos, foi educado em casa por uma professora, nessa época aprendeu alemão. Nos Estados Unidos, estudou em escolas católicas, concluiu o ensino fundamental e cursou o médio na Iona High School, New Rochelle. Por volta dos seus 15 anos, Carlos conheceu o pesquisador matemático fundador do Institute of New York University, Richard Courant (1888 - 1972), durante as várias viagens de trem que fazia diariamente. Foi Courant quem despertou o interesse de Carlos pela matemática, antes disso, ele dizia querer ser astrônomo.[1][2]

Retorno ao Brasil

Com o ensino médio concluído, Carlos teve a possibilidade de obter a cidadania americana para seguir os planos de seu padrasto que queria encaminhá-lo para trabalhar em Wall Street e estudar em uma das várias universidade em que fora aceito, como a Yale, mas recusou ambos, pois era muito apegado ao Brasil e crítico à sociedade americana. Em 1945, de volta ao Brasil e em um cenário pós Segunda Guerra Mundial, Lyra se alista no exército brasileiro para continuar com a sua cidadania e passa um tempo morando com um de seus irmãos por parte de pai como tutor até atingir a maioridade. No ano seguinte, ele se muda para São Paulo, para a casa de Manuel Tavares, um advogado amigo de sua família e foi nessa época que ele deu início aos seus estudos em matemática.[1][5]

Família e início de carreira

Em São Paulo, no ano de 1947, Carlos ingressou no curso de Matemática da antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFCL). Foi estudando lá, que conheceu os matemáticos franceses André Weil (1906-1998) e Jean Dieudonné (1906-1992) e teve aulas com o professor Cândido Lima da Silva Dias (1913-1998), na disciplina de topologia algébrica, área que seguiu durante toda sua carreira científica e acadêmica.[1][2][3]

Depois de se formar, em 1950, Lyra despertou seu interesse em Topologia Algébrica ao assistir um curso sobre Teoria da Homologia Simplicial, ministrado pelo professor Cândido Lima, nesse mesmo ano, ele obteve sua licenciatura. Com isso, foi para a França, no ano letivo de 1952/53, cursar a pós-graduação como bolsista do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq). Durante esse período, ele estudou com Henri Cartan e participou dos seminários de seu grupo, também assistiu às palestras de Hurewicz sobre homotopia no Collège de France em Paris.[1][2][3]

No seu tempo na França, Lyra conheceu a carioca Leda Lacerda, formada em Física pela Faculdade Nacional de Filosofia. Leda estava na Europa para estudar no Instituto Europeu de Física. Depois de conhecer Carlos e começar um namoro, os dois se mudaram para o Hotel des Grands Hommes, em Paris, onde viveram juntos até o final de sua estadia no país. Pouco tempo depois, Leda engravidou do primeiro filho do casal e retornou ao Brasil, Carlos a seguiu rapidamente após terminar a pós-graduação. Juntos no Brasil, eles se casaram na casa de Lasar Segall, pai do artista plástico Maurício Segall, um amigo do casal.[1][2]

Em 1954, nasce Jorge Lacerda de Lyra, o primeiro filho do casal. Ao todo, Carlos e Leda tiveram três filhos, Jorge, Sylvia (1956) e Eduardo (1958). Nesse mesmo ano, Carlos foi contratado pela FFCL para, junto da professora Elza Gomide, exercer o cargo de Professor Auxiliar na Cátedra de Análise Matemática que era comandada pelo professor Omar Catunda. Assim, ele deu início a sua carreira acadêmica na Universidade de São Paulo.[1][2][3]

Carreira acadêmica

A Universidade de São Paulo

Em 1954, Carlos foi contratado pela FFCL, junto da professora Elza Furtado Gomide, para exercer o cargo de professor auxiliar junto à Cátedra de Análise Matemática, cargo que ocupou até 1958. Por influência do professor visitante da USP, o alemão Alexander Grothendieck, Carlos conheceu a cohomologia, o que ampliou sua própria área de topologia. Em 1956, Carlos passou a organizar um seminário semanal sobre topologia algébrica, onde discutiam os tópicos importantes da área.[1][5]

Defendeu seu doutorado em 1958, sob o título Sobre os espaços de mesmo tipo de homotopia que o dos poliedros, com orientação de Cândido Lima da Silva Dias. Conseguiu uma bolsa da Fundação Rockefeller, em 1961 e mudou-se com a família para Nova Jérsei, onde visitou o Instituto de Estudos Avançados de Princeton. Lá ampliou seus conhecimentos sobre operações cohomológicas e, com orientação de John Milnor (1931 - ), desenvolveu estudos em topologia diferencial.[2][1][5]

Temendo não conseguir retornar ao Brasil por suas filiações socialistas, Carlos voltou após um ano em Nova Jérsei, sendo que sua bolsa tinha duração de dois anos. Após receber uma herança da família, Carlos comprou uma casa espaçosa na Vila Mariana. Em 1963, tornou-se coordenador do curso noturno de análise matemática do Departamento de Matemática da USP, cargo que ocupou até 1970.[1][5]

Carlos foi figura fundamental para a criação do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP em janeiro de 1970. Em 1972, foi contratado como professor colaborador de dedicação exclusiva da instituição. Era conhecido como um professor e pesquisador dedicado e inspirador por alunos e colegas.[2][1][5]

Em 1968 defendeu tese de livre-docência, chamada “H-Equivalência de grupos topológicos”, obtendo assim do título de livre-docente da cátedra de Complementos de Geometria e Geometria Superior pela FFCL.[1][5]

Colóquios de Matemática

O professor Lyra teve participações ativas em eventos como os Colóquios de Matemática. Foi no 1° Colóquio Brasileiro de Matemática que ele ministrou um curso baseado em sua tese de doutorado “Introdução à Topologia Algébrica” e no 5° e 7° que veio se apresentar novamente. Ele também participou da Comissão Organizadora da reunião em seu primeiro ano, coordenou a comissão no 2° Colóquio e participou novamente no 6°.

Em 1967, durante o 6° Colóquio Brasileiro de Matemática, Lyra integrou uma comissão cujo objetivo era definir o caráter científico e a organização da Escola Latino-Americana de Matemática. Essa Comissão foi composta pelos professores: Emilio Lluis (México), Orlando Villamayor (Argentina) e Carlos Benjamin de Lyra (Brasil). Juntos, eles elaboraram um documento que foi aprovado pelo plenário.[3][4]

Sociedades de Matemática

Entre 1966 e 1967, Lyra foi presidente eletivo da Sociedade de Matemática de São Paulo, esta não durou muito tempo e, na época de seu fim, teve uma nota publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo.

Anos depois, em 1969, ele se tornou um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Matemática, eleito como um dos quatro conselheiros. Seu mandato nesse cargo durou até 1972, mais tarde, ele se tornou o Secretário Geral.[3]

Últimos anos e morte

Em seus últimos anos de vida, Carlos continuou ativo em seus trabalhos. Após a fundação do IME-USP em 1970, ele foi indicado pelo CNPq para ser professor conferencista e, dois anos depois, foi nomeado, pelo presidente do CNPq, como representante brasileiro na Comissão Permanente da Escola Latino-Americana de Matemática (ELAM). Entretanto, durante esse período, a família Lyra perdeu um de seus membros. Eduardo Lacerda de Lyra faleceu em 1971, aos 12 anos, em um acidente na praia.[1][3]

No seu último ano, Lyra fez o concurso para livre-docência, escreveu e entregou seu Memorial para o concurso de Professor Adjunto do IME. Curiosamente, Carlos tinha o hábito de dizer aos amigos que morreria cedo e, segundo Jorge e Sylvia, os homens de sua família viviam relativamente pouco, isso se confirmou com a morte do professor.[1][3]

Em 21 de julho de 1974, aos 46 anos, faleceu Carlos Benjamin de Lyra. Após um mal estar, ele ficou internado por quatro dias e foi diagnosticado com um tumor cerebral. De acordo com Leda, Carlos voltou para casa com a ressalva de voltar ao hospital em três dias. Esse período em casa te deu o tempo suficiente para finalizar o artigo que estava em seu escritório e apenas isso.[1][3][4]

A sua tese para a livre-docência foi revisada e submetida ao post mortem à publicação por seu amigo Peter Hilton que também levou o artigo que Lyra deixara em seu escritório para a Inglaterra e lá solicitou a publicação do trabalho sob o título “SHM-maps of CW-groups”.[1][3]

Posicionamento político

Carlos era descrito como um intelectual socialista e, entre os anos de 1950 e 1955, foi membro do Partido Socialista Brasileiro, tendo como companheiros Paul Singer, Febus Gikovate e outros. Um dos motivos para ter negado a cidadania americana, foi sua visão crítica à sociedade do país.[2]

Ele também atuou como membro da Comissão de Elaboração do Livro Branco sobre os acontecimentos da Rua Maria Antônia na função de relator. Os eventos desse dia, causados por conflitos entre estudantes da Universidade de São Paulo e alunos do Instituto Presbiteriano Mackenzie durante a ditadura militar no Brasil, ficaram conhecidos como Batalha da Maria Antônia.[6]

Principais trabalhos publicados

Sociedades Científicas que pertenceu

Ver também

Referências

  1. a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v w COBRA, Thiago Taglialatela Lima (2014). Carlos Benjamin de Lyra e a topologia algébrica no Brasil (PDF) (Tese). Rio Claro: Universidade Estadual de São Paulo (UNESP). Consultado em 16 de julho de 2020 
  2. a b c d e f g h i j k l m Magalhães, Luiz Edmundo de (2012). Humanistas e Cientistas do Brasil. São Paulo: Edusp. p. 53. ISBN 978-85-316-0189-7 
  3. a b c d e f g h i j k l m Lyra, Carlos Benjamin de (1974). Coletânea das obras de Carlos Benjamin de Lyra. Memorial. 3. São Paulo: [s.n.] 
  4. a b c d Hilton, Peter (1974). «Carlos B. de Lyra». Sociedade Brasileira de Matemática. Boletim da Sociedade Brasileira de Matemática. 5 (2): 113-122 
  5. a b c d e f J.J. O'Connor e E.F. Robertson (ed.). «Carlos Benjamin de Lyra». Mac Tutor. Consultado em 16 de julho de 2020 
  6. Cardoso, Irene; Tavares, Abílio (2018). Livro Branco sobre os acontecimentos da Rua Maria Antônia (2 e 3 de outubro de 1968). São Paulo: FFLCH-USP. p. 41 
  7. Lyra, Carlos Benjamin de (1976). «SHM-maps of CW-groups». The Quarterly Journal of Mathematics. Oxford Second Series. 27 (106): 139-157 
  8. Lyra, Carlos Benjamin de (1975). «Caracterização dos SHM-Morfismos para grupos topológicos». Anais da Academia Brasileira de Ciências. 47 (1): 1-2 
  9. Lyra, Carlos Benjamin de (1965). «On a conjecture in homotopy theory». Anais da Academia Brasileira de Ciências. 37 (2): 167-184 
  10. Lyra, Carlos Benjamin de (1959). «On circle bundles over complex projective space». Anais da Academia Brasileira de Ciências. 31 (1): 17-24 
  11. Lyra, Carlos Benjamin de (1958). «On the homotopy type of a factor space». Anais da Academia Brasileira de Ciências. 30 (1): 37-45 
  12. Lyra, Carlos Benjamin de (1957). «On spaces of the some homotopy type as polyhedra». Boletim da Sociedade de Matematica de São Paulo. 12 (1/2): 43-62 
  13. Lyra, Carlos Benjamin de (1952). «Minimal complexes and maps». Boletim da Sociedade de Matematica de São Paulo. 7 (1/2): 85-98 
  14. Lyra, Carlos Benjamin de (1949). «A note on Zorn's theorem». Boletim da Sociedade de Matematica de São Paulo. 4 (1/2): 63-65 
  15. Lyra, Carlos Benjamin de (1972). Introdução à topologia algébrica. São Paulo: IME-USP. 106 páginas 
  16. Lyra, Carlos Benjamin de (1963). Sobre os métodos de Whitehead na teoria da homotopia. São Carlos: EESC-USP 
  17. Lyra, Carlos Benjamin de. Espaços de recobrimento. In: Rodrigues, Alexandre (1958). Teoria das superfícies de Riemann. São Paulo: [s.n.] p. 22–70.
  18. Lyra, Carlos Benjamin de. Grupo fundamental e revestimentos. In: Colóquio Brasileiro de Matemática, 7., 1969, Poços de Caldas. Trabalho. Rio de Janeiro: IMPA, 1969. 139p.
  19. Lyra, Carlos Benjamin de. Sobre uma conjetura na teoria da homotopia. In: Colóquio Brasileiro de Matemática, 5., 1965, Poços de Caldas. Atas. São Paulo. 1965. p. 125-126.
  20. Lyra, Carlos Benjamin de. Introdução à topologia algébrica. In: Colóquio Brasileiro de Matemática, 1., 1957, Poços de Caldas. Trabalho. São Paulo. 1957. 96p.
  21. Lyra, Carlos Benjamin de (1968). «H-equivalencia de grupos topológicos» (PDF). Repositório da USP 
  22. Lyra, Carlos Benjamin de (1958). «Sobre os espaços de mesmo tipo de homotopia que o dos poliedros» (PDF). Repositório da USP