João Martins Pereira

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João Martins Pereira
Nascimento 24 de novembro de 1932
Lisboa
Morte 13 de novembro de 2008 (75 anos)
Lisboa
Cidadania Portugal
Ocupação engenheiro, político, jornalista

João Manuel Midosi Bahuto Pereira da Silva Martins Pereira (Lisboa, Belém, 24 de Novembro de 1932Lisboa, 13 de Novembro de 2008) foi um engenheiro industrial, economista, jornalista, ensaísta e político português.[1][2]

Entre Março e Agosto de 1975 foi secretário de Estado da Indústria e Tecnologia do IV Governo Provisório, presidido por Vasco Gonçalves, no ministério da Indústria e Tecnologia, tutelado por João Cravinho,[3] e foi o autor da nacionalização das grandes empresas industriais: siderurgia, cimentos, estaleiros navais, química pesada, petroquímica e celuloses.[4]

Fez parte da redacção da revista Seara Nova, foi fundador e colaborador da segunda série da revista O Tempo e o Modo, coordenador da secção de Economia da revista Vida Mundial, director interino do semanário Gazeta da Semana e director da Gazeta do Mês. Também colaborou na revista Arte Opinião [5] (1978-1982).

Foi autor de inúmeros ensaios e artigos de opinião e de vários livros na área da economia industrial e da história da indústria e do capitalismo em Portugal. Entre as suas obras, destaca-se: À esquerda do possível (1993), com João Paulo Cotrim e Francisco Louçã, 'O socialismo, a transição e o caso português, Indústria, ideologia e quotidiano e Para a História da indústria em Portugal (2005).[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Primeiros anos[editar | editar código-fonte]

Filho de Flávio Martins Pereira e de sua mulher Carlota do Rosário Midosi Bahuto Pereira da Silva, de ascendência Italiana.

Quando tem um ano de idade, a sua família muda-se para Algés, onde viverá até aos sete anos. Em 1939 mudam-se para Lisboa, para uma casa na Av. 5 de Outubro, que ocupará até 1966.

De 1939 a 1942 faz a instrução primária em casa, com uma professora particular, juntamente com a irmã. É nesta altura que começa a escrever e a fazer livros e jornais ilustrados (Rim-tim-tim, O Tareco, Tiro-liro).

Em 1942 é admitido no Colégio Académico, mas é obrigado a interromper as aulas por doença e a fazer um ano de repouso. São deste período a 2ª série do Tiro-Liro, o jornal Júpiter e o começo do seu interesse pelas notícias, que não o abandonará ao longo da vida. Entre 1944 e 1949 frequenta o Colégio Valsassina, onde completa o curso liceal.

Vida estudantil[editar | editar código-fonte]

Em 1950 entra para o Instituto Superior Técnico (IST) da Universidade Técnica de Lisboa (UTL), onde frequenta o curso de Engenharia Químico-Industrial.[6]

É durante estes anos que descobre Jean-Paul Sartre, que se tornará uma referência central no seu pensamento. Falará dessa época no seu livro "No reino dos falsos avestruzes" (1983):

"Eu fiz 20 anos em 1952. Não crente já então, se é que o fui alguma vez, eu era a ignorância do mundo, das coisas, das pessoas. Estudava engenharia, afincadamente. Mas desencantadamente. Punham-se-me as questões metafísicas (e físicas) do costume, as ditas «próprias da idade», e outras menos próprias. No meio disto, apenas duas armas, que já deviam vir, como hoje se diz, no meu «código genético»: uma enorme curiosidade, uma visceral propensão para o «não-alinhamento». Debicava sem nexo, como qualquer galináceo, nos grãos que, ao acaso das circunstâncias, me vinham cair no minúsculo pedaço em que me movia: livros, filmes (cine-clubes), associação de estudantes, pouco mais. E sem nexo continuei, anos fora, até que, já nem sei como, dei comigo embrenhado no mundo sartriano."[7]

É no IST que conhece João Cravinho, três anos mais novo, com quem manterá uma relação de amizade ao longo da vida. Cravinho descrevê-lo-á como "um participante destacado nas actividades associativas", "um interventor selectivo com particular queda para ajudar a pensar e a resolver os problemas de fundo com que a Associação se debatia", possuidor de "uma cabeça bem arrumada, uma grande bagagem intelectual, uma lógica de intervenção coerentemente sustentada", "muito exigente para consigo próprio" e ressalta "o rigor do seu espírito aberto ao aprofundamento sistemático de uma síntese de saberes"[8]

Entre 1954 e 1956 integra a Direcção da Associação dos Estudantes do Instituto Superior Técnico (AEIST), a convite de José Manuel Prostes da Fonseca, tendo participado nas lutas estudantis contra o Decreto 40.900 (que retirava poderes às Associações de Estudantes) e na criação da RIA (Reunião Inter-Associações). Colabora até 1958 no Boletim da AEIST.[8]

Em 1955, nas férias entre o 5º e o 6º ano do IST, faz um estágio numa empresa siderúrgica francesa, em Longwy. No regresso a Portugal, de comboio, é detido pela PIDE na fronteira de Vilar Formoso. É possível que a polícia política do Estado Novo tenha suspeitado de que Martins Pereira, dirigente estudantil, tinha ido participar num congresso realizado em Varsóvia em Agosto, o 5º Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes, que reuniu 30.000 jovens de 114 países. As suas malas são revistadas e são encontrados prospectos em russo. É detido no Aljube até serem traduzidos os prospectos, que se vem a constatar serem provenientes do pavilhão da União Soviética numa feira industrial que se tinha realizado em Julho desse ano em Estocolmo.[8]

Em 1956 licencia-se em Engenharia Químico-Industrial, com a média final de 17 valores.

Serviço militar[editar | editar código-fonte]

É incorporado na tropa em Setembro de 1956, no R.A.C. (Regimento de Artilharia de Costa), em Oeiras, para fazer o Curso de Oficiais Milicianos. Findo o curso, em que ficou em primeiro lugar, e após a promoção a Aspirante a Oficial Miliciano, é colocado na Bateria de Alcabideche, onde se manteve até meados de Fevereiro de 1958. É durante o serviço militar que conhece o artista plástico José Escada, de quem se tornará amigo.[8]

Actividade profissional[editar | editar código-fonte]

Em Fevereiro de 1958 começa a trabalhar na CUF (Companhia União Fabril), no Barreiro, na Divisão de Metais Não-Ferrosos, onde participa no arranque de uma unidade de silicato de sódio. A sua entrada faz-se por convite da empresa, que tradicionalmente convidava para integrar os seus quadros os melhores alunos do curso de Química.[8] Em Agosto de 1958 é contratado pela Siderurgia Nacional por um período de quatro anos. As peripécias da sua transferência da CUF de Jorge de Mello para a Siderurgia Nacional de António Champalimaud são contadas pelo próprio num relato pessoal que ilustra a relação então existente entre os dois grupos industriais rivais.[8]

Os dois primeiros anos de trabalho na Siderurgia Nacional são passados em estágios em siderurgias no estrangeiro: 16 meses na Alemanha (Hattingen, Dortmund), cinco meses na Áustria (Donawitz, Linz). É na Alemanha, segundo conta, que descobre o que é a esquerda e a direita, graças a leituras de revistas francesas como L'Express, o France Observateur (mais tarde rebaptizado Le Nouvel Observateur), Les Temps Modernes e à discussão que tem lugar nas suas páginas sobre a Guerra da Argélia.[6]

Quando regressa a Portugal, em 1960, é nomeado engenheiro-chefe da aciaria, no Seixal, e encarregado de preparar o arranque da unidade, incluindo o recrutamento e treino do pessoal, a aquisição de materiais e a organização interna.

Em Agosto de 1962 deixa a Siderurgia Nacional e aceita um convite para ir dirigir uma fábrica de vidro impresso e garrafaria na Venezuela: o Centro Vidriero de Venezuela, em Guarenas, propriedade de Carlos Galo, um industrial vidreiro da Marinha Grande. Ficará aí apenas um ano, o suficiente para poupar o dinheiro que lhe permitirá ir estudar Sociologia e Economia para Paris.[8]

Em 1963 vai estudar para Paris, no Institut des Sciences Sociales du Travail, onde obtém os certificados de Sociologia do Trabalho, Economia do Trabalho e Problemas do Trabalho em Países em Vias de Desenvolvimento. Entre os professores que recorda dessa época conta-se Alain Touraine, Michel Rocard e André Philip.[6]

Bibliografia activa[editar | editar código-fonte]

Obra publicada[editar | editar código-fonte]

1963 - As instalações da aciaria da Siderurgia Nacional. Lisboa: [S.n.], 1963

1971 - Pensar Portugal Hoje / João Martins Pereira. 1ª ed. e 2ª ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1971 (Colecção Diálogos) [9]

1974 - Indústria, ideologia e quotidiano (ensaio sobre o capitalismo em Portugal). Porto: Editora Afrontamento, 1974 (Colecção Luta de Classes) [10]

1975 - Portugal 75: Dependência externa e vias de desenvolvimento. Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1975[11]

1976 - O Socialismo, a Transição e o Caso Português. Lisboa: Edições Livraria Bertrand, 1976[12]

1979 - Pensar Portugal Hoje: Os caminhos actuais do capitalismo português. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 3ª ed., 1979 (Colecção Diálogos) [Inclui Introdução][13]

1980 - Sistemas Económicos e Consciência Social: Para uma teoria do socialismo como sistema global. Oeiras: Instituto Gulbenkian de Ciência, 1980 (Colecção Centro de Estudos de Economia Agrária - Instituto Gulbenkian de Ciência) Trabalho realizado com apoio da Fundação Calouste Gulbenkian.[14][15]

1983 - No Reino dos Falsos Avestruzes: Um olhar sobre a política. Lisboa: Edições A Regra do Jogo, 1983[16]

1986 - O Dito e o Feito: Cadernos 1984-1987. Lisboa: Edições Salamandra, 1986[17]

1988 - Urgent infrastructural needs of portuguese industry in science, research and technology development / João Martins Pereira. 1ª ed. SL: Commission of the European Communities, 1988.

1995 - Indústria e Sociedade Portuguesa Hoje. Porto: Página a Página, 1995 Realizada no âmbito das “Conferências de Matosinhos – 1ª série”, em 14 de Abril de 1994, por iniciativa da CMM.[18]

1996 - As PMEs industriais em números. Lisboa: IAPMEI, 1996[19]

2002 – “Como entrou a siderurgia em Portugal?”. Comunicação apresentada ao Seminário "Com os Homens do Aço – história, memória e património”, organizado pelo Ecomuseu Municipal do Seixal em 25 e 26 de Outubro de 2002[20][21]

2005 - Para a História de Indústria em Portugal 1941-1965: Adubos azotados e siderurgia. Lisboa: ICS - Imprensa de Ciências Sociais, 2005 (Colecção Estudos e Investigação, 37) Trabalho realizado no âmbito do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, projecto financiado pelo Observatório das Ciências e das Tecnologias, do Ministério da Ciência e Tecnologia.[22]

2008 - As voltas que o capitalismo (não) deu. Lisboa: Edições Combate, 2008

Referências

  1. a b Morreu João Martins Pereira, pensador da esquerda portuguesa[ligação inativa], Jornal Público, 14 de Novembro de 2008
  2. Homenagem a João Martins Pereira. 1932-2008, Casa da Achada, Centro Mário Dionísio. 13 de Novembro de 2009
  3. Composição do IV Governo Provisório, Portal do Governo de Portugal
  4. João Martins Pereira, 1932-2008: O radical que gostava de compreender as coisas[ligação inativa], Jornal Público, 15 de Novembro de 2008
  5. Rita Correia (16 de maio de 2019). «Ficha histórica:Arte Opinião (1978-1982)» (PDF). Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 22 de Maio de 2019 
  6. a b c "Conversa com vista para... João Martins Pereira"[ligação inativa] Entrevista de Maria João Seixas Jornal Público. Revista Pública de 1 de Abril de 2001
  7. No Reino dos Falsos Avestruzes: Um olhar sobre a política. Lisboa: Edições A Regra do Jogo, 1983
  8. a b c d e f g "Bio-Bibliografia. João Martins Pereira - E o seu, nosso tempo", Coimbra, 2011: Centro de Documentação 25 de Abril
  9. Pensar Portugal Hoje, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  10. Indústria, ideologia e quotidiano (ensaio sobre o capitalismo em Portugal), edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  11. Portugal 75: Dependência externa e vias de desenvolvimento, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  12. O Socialismo, a Transição e o Caso Português, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  13. Pensar Portugal Hoje: Os Caminhos Actuais do Capitalismo Português, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  14. Sistemas Económicos e Consciência Social: Para uma teoria do socialismo como sistema global, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  15. Recensão de Sistemas Económicos e Consciência Social: Para uma teoria do socialismo como sistema global Revista Crítica de Ciências Sociais, nº7/8 - Dezembro 1981
  16. No Reino dos Falsos Avestruzes: Um olhar sobre a política, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  17. O Dito e o Feito: Cadernos 1984-1987, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  18. Indústria e Sociedade Portuguesa Hoje, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  19. As PME industriais em números Catálogo Bibliográfico ISCTE-IUL
  20. "Como entrou a siderurgia em Portugal?"[ligação inativa] comunicação de João Martins Pereira ao Seminário "Com os Homens do Aço – história, memória e património”, organizado pelo Ecomuseu Municipal do Seixal em 25 e 26 de Outubro de 2002, Ecomuseu Municipal do Seixal
  21. Como entrou a siderurgia em Portugal?, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
  22. Para a História de Indústria em Portugal 1941-1965: Adubos azotados e siderurgia, edição fac-similada, texto integral, Centro de Documentação 25 de Abril, 1996
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