Maria da Graça Amado da Cunha

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Maria da Graça Amado da Cunha
Nome completo Maria da Graça Macedo e Faro Amado da Cunha
Nascimento 24 de novembro de 1919
Lubango, Angola
Morte 12 de fevereiro de 2001 (81 anos)
Lisboa, Portugal
Nacionalidade Portuguesa

Maria da Graça Amado da Cunha (Lubango, Angola, 24 de novembro de 1919 - Lisboa, Portugal, 12 de fevereiro de 2001) foi uma pianista clássica portuguesa, célebre por interpretar as obras do compositor português Fernando Lopes-Graça. Era também uma reconhecida ativista feminista e opositora do regime ditatorial do Estado Novo que governou Portugal entre 1933 e 1974.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Nascimento e Família[editar | editar código-fonte]

Nascida a 24 de novembro de 1919, em Sá da Bandeira (atual cidade de Lubango), Angola colonial, Maria da Graça Macedo e Faro Amado da Cunha era filha de Manuel de Barros Amado da Cunha, capitão piloto aviador da Aeronáutica Militar e governador civil do Distrito de Faro,[1][2] e de D. Guilhermina de Macedo Pinto Menezes e Faro, sendo ainda irmã mais velha de Francisco Manuel de Macedo e Faro Amado da Cunha (1921-2014), que se tornou tenente piloto aviador e posteriormente realizou várias viagens inaugurais enquanto piloto pela companhia aérea TAP.[3][4] Com um ano de idade, viajou com a sua família para Portugal, fixando-se em Lisboa.

Educação[editar | editar código-fonte]

Frequentou durante a década de 1930 o Conservatório Nacional, tornando-se pupila do pianista José Vianna da Motta, o compositor Luís de Freitas Branco e a compositora francesa Francine Benoît.[5]

Carreira Artística[editar | editar código-fonte]

Em 1942, foi fundadora, juntamente com Lopes-Graça, Francine Benoît, Joaquim da Silva Pereira, Macario Santiago Kastner e outros músicos, maestros e compositores, da Sociedade de Concertos Sonata, realizando vários eventos públicos de música portuguesa e contemporânea na Academia dos Amadores de Música ou nos salões da Sociedade Nacional de Belas Artes e do periódico O Século.[6] Reconhecida seis anos depois, sob a direcção de Luís de Freitas Branco, como a secção portuguesa da Internationale Gesellschaft für Neue Musik (também conhecida à época como Société Internationale pour la Musique Contemporaine), nos primeiros anos após à sua fundação,[7] a sociedade destacou, em particular, as obras criadas pelas compositoras Francine Benoît, Berta Alves de Sousa e Elvira de Freitas, entre outras, numa tentativa de divulgar o trabalho desconhecido ou até mesmo desvalorizado até então das mulheres compositoras.[8][9]

Durante a década de 40 e 50, Maria da Graça Amado da Cunha colaborou por diversas ocasiões com a imprensa portuguesa, escrevendo críticas musicais para várias revistas e jornais, como o Seara Nova.[10]

Em 1950, após Lopes-Graça ter deixado a redacção do Seara Nova, devido a divergências ideológicas, sendo assumidamente antifascista, juntamente com Francine Benoît e Maria da Graça Amado da Cunha, o trio fundou a revista mensal Gazeta Musical (1950-1957), sendo escolhido para director de redacção Luís de Freitas Branco e posteriormente Maria Vitória Quintas,[11] quando a revista alterou o seu nome para Gazeta Musical e de Todas as Artes (1957-1971).[12]

Tornou-se sobretudo conhecida como promotora da música portuguesa e como intérprete de composições para piano do compositor Fernando Lopes-Graça. Embora se tenha aposentado ainda relativamente jovem, na década de 1960, manteve uma relação de amizade com Lopes-Graça por mais de 50 anos.[13][14][15]

Casamento[editar | editar código-fonte]

Na década de 1940, Maria da Graça Amado da Cunha casou-se com Roger D'Avellar, tenente da marinha, piloto e superintendente de operações, que tal como o seu irmão, trabalhava para a companhia aérea portuguesa TAP.[16][17][18][19] Do seu casamento teve um filho, Pedro Avelar (1945-), que se tornou pintor e foi discípulo em Paris de Maria Helena Vieira da Silva, Manuel Cargaleiro e Árpád Szenes.[20]

Ativismo[editar | editar código-fonte]

De ideais feministas, antifascistas e pacifistas, na década de 1940, a pianista travou uma longa amizade com Clementina Carneiro de Moura, sócia da Associação Feminina Portuguesa para a Paz (AFPP), aderindo, tal como Francine Benoît, pouco depois na mesma organização e no Movimento da Unidade Democrática (MUD), cujas acções se opunham ao regime do Estado Novo.[21]

Dentro do âmbito do movimento político, em novembro de 1946, integrou a Comissão de Escritores, Jornalistas e Artistas do MUD que entregou uma petição em protesto contra a censura, a prisão indiscriminada e a demissão de vários académicos e outros professores pelas suas opiniões políticas, sendo muitos destes militantes do Partido Comunista Português. A petição, assinada por mais de 200 pessoas, apenas continha a assinatura de oito mulheres, sendo estas, nomeadamente, Maria da Graça Amado da Cunha, Clementina Carneiro de Moura, Manuela Porto, Irene Lisboa, Alice Gomes, Maria Keil, Natália Correia e Maria Barreira.

Em março de 1947 assinou uma carta ao Governador Civil de Lisboa João Ferreira Dias Moreira, juntamente com Maria Keil, Cesina Bermudes, Maria Palmira Tito de Morais, Maria Valentina Trigo de Sousa e Elina Guimarães, em nome do Comité de Mulheres do MUD de Lisboa, para protestar contra a criação das prisões políticas, como o campo de concentração do Tarrafal em Cabo Verde.[22]

Morte[editar | editar código-fonte]

Faleceu em Lisboa a 12 de fevereiro de 2001, com 81 anos de idade.

Legado e Homenagens[editar | editar código-fonte]

Em 1961, Maria da Graça Amado da Cunha foi retratada numa obra de Abel Manta, um dos mais proeminentes pintores modernistas portugueses, casado com Clementina Carneiro de Moura. Atualmente a pintura a óleo encontra-se exposta no Museu Nacional da Música em Lisboa.[23]

Em 2019, realizou-se no Museu da Música Portuguesa - Casa Verdades de Faria, em Cascais, uma exposição documental sobre a vida e carreira da pianista, assente no espólio doado pela família, em cooperação com o INET-MD, Instituto de Etnomusicologia – Música e Dança e do CESEM, Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical.[24]

Discografia[editar | editar código-fonte]

Durante a sua vida, Maria da Graça Amado da Cunha produziu dois discos de música para piano, da autoria de Lopes-Graça:

  • Maria da Graça Amado da Cunha Interpreta Lopes-Graça. Vol. I. Onze variações; oito bagatelas. Ed. PortugalSom/Strauss, 1996.
  • Maria da Graça Amado da Cunha Interpreta Lopes-Graça. Vol. II. Nove danças breves; Sonata No. 2; Variações sobre um tema popular português. Ed. PortugalSom/Strauss, 1996.

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. Boletim geral das colónias. [S.l.]: Agência Geral das Colónias. 1936 
  2. Almeida, Maria Antónia Pires de (28 de julho de 2014). Dicionário biográfico do poder local em Portugal, 1936-1913. [S.l.]: Leya 
  3. Renascença, Rádio (14 de maio de 2021). «Recordamos hoje o Piloto da TAP, Amado da Cunha, no dia em que, se estivesse vivo, faria 100 anos de idade.». Ruas com História. Consultado em 1 de setembro de 2021 
  4. Portugal, Voa (26 de agosto de 2014). «Cessna sobrevoam Arouca em homenagem ao Comandante Amado da Cunha». News Avia. Consultado em 1 de setembro de 2021 
  5. «Matrícula de Maria da Graça de Macedo e Faro Amado da Cunha». Arquivo Digital da Secretaria-Geral da Educação e Ciência. 1930–1938. Consultado em 1 de setembro de 2021 
  6. França, José-augusto (17 de fevereiro de 2014). O «Ano XX» Lisboa 1946 - Estudos de Factos Socioculturais. [S.l.]: INCM 
  7. Haefeli, Anton (1982). Die Internationale Gesellschaft für Neue Musik (IGNM): ihre Geschichte von 1922 bis zur Gegenwart (em alemão). [S.l.]: Atlantis Musikbuch-Verlag 
  8. Revista municipal Lisboa. [S.l.]: C.M.L., Direcção do Serviços Centrais. 1957 
  9. VIEIRA, Sofia SOUSA (1 de agosto de 2012). Estudio de la actividad musical compositiva y crítica de Francine Benoit (em espanhol). [S.l.]: Ediciones Universidad de Salamanca 
  10. «Maria da Graça Amado da Cunha». Revistas de Ideias e Cultura. Consultado em 1 de setembro de 2021 
  11. Fontes Artis Musicae (em inglês). [S.l.]: Kassel und Bärenreiter-verlag. 1988 
  12. Lopes, Guilhermina (2019). «Itinerários de um mundo musical: a música de câmara brasileira nos concertos da Sonata (Portugal)». Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. doi:10.11606/issn.2316-901X.v0i73p27-46. Consultado em 4 de março de 2021. Cópia arquivada em 6 de julho de 2020 
  13. «CUNHA, Maria da Graça Amado da, 1919-2001». Biblioteca Nacional de Portugal. Consultado em 4 de março de 2021 
  14. «Fernando Lopes-Graça». Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira. Consultado em 4 de março de 2021. Cópia arquivada em 21 de janeiro de 2020 
  15. Fernandes, Cristina (7 de junho de 2018). «Vianna da Motta, o mestre infalível». O Explorador. Consultado em 4 de março de 2021 
  16. Serrão, Joaquim Veríssimo (2007). História de Portugal: O terceiro mundo contra o Portugal ultramarino (1951-1960) : Pt. 2, História diplomática, institucional, económica e cultural. [S.l.]: Verbo 
  17. «Carta de Roger D'Avellar e Maria da Graça Amado da Cunha». Casa Comum | Fundação Mário Soares. Consultado em 4 de março de 2021 
  18. Valente, Vasco Pulido (6 de novembro de 2016). «31 de Outubro a 5 de Novembro, 2016». Observador. Consultado em 4 de março de 2021. Cópia arquivada em 7 de dezembro de 2016 
  19. «Linha Aérea Imperial inaugurada em Dezembro de 1946». Jornal TAP. Consultado em 4 de março de 2021 
  20. «Pedro Avelar». Fundação Árpád Szenes-Vieira da Silva. Consultado em 1 de setembro de 2021 
  21. Lopes da Silva Braga, Helena Margarida (2013). «De Francine Benoît e algumas das suas redes de sociabilidade: Invisibilidades, género e sexualidade entre 1940 e 1960 (Master's Thesis)». Universidade Nova de Lisboa. Consultado em 4 de março de 2021. Cópia arquivada em 13 de fevereiro de 2021 
  22. Marques, Diana Dionísio Monteiro (2007). «Um teatro com sentido : a voz crítica de Manuela Porto (Appendices)». Repositório da Universidade de Lisboa. Consultado em 4 de março de 2021. Cópia arquivada em 3 de fevereiro de 2021 
  23. «Maria da Graça Amado da Cunha». Meloteca. Consultado em 4 de março de 2021 
  24. «CESEM Exposição: Maria da Graça Amado da Cunha – Uma presença singular no meio musical português». Consultado em 1 de setembro de 2021