Poder constituinte
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Poder constituinte é, no Direito, o poder de criar, modificar, revisar, revogar ou adicionar algo à Constituição do Estado.[1] É historicamente atribuído a Emmanuel Joseph Sieyès, em sua obra O Que É o Terceiro Estado?, um manifesto da Revolução Francesa. Bastante influenciado por Jean-Jacques Rousseau, Sieyès afirma que o "terceiro estamento", ou o povo, é uma nação completa, titular de poder político.[2]
As legitimidades do Poder Constituinte, do procedimento constituinte e da Constituição são indissociáveis e delas depende a legitimação do exercício da soberania no Estado Democrático de Direito. Tal constatação pode resumir-se na máxima formulada pelo ex-presidente norte americano Abraham Lincoln no sentido de que “Democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo”, pensamento este essencialmente correto se dermos interpretação real aos termos que o compõem. Pode-se afirmar ainda que a famosa citação corresponde precisamente à democracia direta.
A legitimidade do Poder Constituinte decorre diretamente do princípio da soberania popular. Só o povo, concebido como uma pluralidade de forças culturais, sociais e políticas, pode deliberar sobre a conformação da sua ordem político-social. Um ou mais indivíduos manifestam vontade soberana que pode ser o início de um novo núcleo social.[3] Daí decorre, portanto, que a legitimidade da Constituição verifica-se através da correspondência de suas normas aos valores e aspirações do povo, não se contentando com a simples legalidade formal. É dessa correspondência com a vontade geral, aliada à lisura da representação popular no procedimento constituinte que este se legitima. A esta cadeia procedimental de legitimação democrática Canotilho atribui a denominação de “Justiça da Constituição”.
Espécies de poder constituinte
[editar | editar código-fonte]Os doutrinadores dividem o poder constituinte em duas espécies: poder constituinte originário e poder constituinte derivado. Alguns doutrinadores modernos ainda listam o poder constituinte difuso, que na verdade é um outro nome que se dá a mutação constitucional, que não é um poder constituinte em si, mas sim a adequação da constituição de um Estado em face da nova realidade que a sociedade vê naquele texto legal.[4]
Poder constituinte originário
[editar | editar código-fonte]É o poder que se tem de constituir uma nova Constituição quando um novo Estado é criado ou quando uma Constituição é trocada por outra, em um Estado já existente, seja essa substituição feita de forma democrática, revolucionária ou por um golpe de estado.[5] Entende-se que é o próprio poder constituinte que dá legitimidade à nova Constituição.
O poder constituinte derivado, segundo a tradição jusnaturalista, é um poder de fato anterior ao próprio Estado; já os juspositivistas entendem que se trata de um poder político concomitante à criação do Estado, uma vez que o direito não pode existir antes do Estado.
São características do poder constituinte originário:[6]
- Inicial: não existe nenhum outro antes ou acima dele.
- Incondicionado: não está submetido a nenhuma regra de forma ou de conteúdo.
- Permanente: continua existindo mesmo após concluir a sua obra.
- Inalienável: sua titularidade não é possível de transferência (a nação, ou o povo, nunca perde o direito de "mudar sua vontade").
Poder constituinte derivado
[editar | editar código-fonte]É o poder de modificar uma Constituição. Por exemplo no Brasil (nação lusófona), para Constituição ser rígida, é necessária um processo chamado de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que deve ser votado em dois turnos por cada casa do Congresso Nacional antes de virar uma Emenda constitucional e assim modificar a Constituição da República Federativa do Brasil.[7] Conforme ensinado pelo Constitucionalista Paulo Bonavides:
“O Poder de reforma constitucional exercitado pelo poder Constituinte Derivado é por sua natureza jurídica mesma um poder limitado, contido num quadro de limitações explícitas e implícitas, decorrentes da Constituição, a cujos princípios se sujeita, em seu exercício, o órgão revisor.”
O poder constituinte derivado (também denominado reformador, secundário, instituído, constituído, de segundo grau, de reforma) é um tipo de poder constituinte que se ramifica em três espécies:
- reformador: que abrange as prerrogativas de modificar, implementar ou retirar dispositivos da Constituição.
- revisor: que, como exemplo retirado de nossa própria Constituição, possibilita a revisão de dispositivos constitucionais que necessitem de reformas. Tais reformas não se confundem com a reforma stricto sensu, pois esta perpassa por procedimentos mais dificultosos e quórum mais específico.
- decorrente: pressupõe uma forma descentralizada de estado, como o caso de uma república federal. Trata-se de um poder investido aos Estados Membros para elaborar sua própria Constituição, estabelecer sua auto-organização, por meio de suas Assembleias Legislativas.
Poder constituinte derivado decorrente no Brasil
[editar | editar código-fonte]O poder constituinte derivado decorrente é o poder que os Estados-membros possuem para elaborar, suas Constituições Estaduais. A Constituição brasileira de 1988 atribuiu autonomia, manifestada pela capacidade de auto-organização, autogoverno e autoadministração, aos Estados federados.[8]
Art. 25 Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.[2]
É importante salientar que o poder constituinte derivado decorrente das Assembleias legislativas pode também ser inicial, consistindo na elaboração da própria Constituição, ou reformador, tendo a competência para reformar sua Constituição. O Distrito Federal possui autonomia limitada, uma vez que a União tutela parcialmente as competências distritais. Já os Municípios são entes que não possuem autonomia para promulgar Constituição.
Referências
- ↑ Pinto Ferreira, Luiz (1983). Princípios Gerais do Direito Constitucional Moderno. 2 6ª ed. [S.l.]: Saraiva. 1222 páginas
- ↑ Ferreira, Pinto (1985). «Teoria Geral do Poder Constituinte» (PDF). Revista de Informação Legislativa
- ↑ TEMER, Michel. Elementos de direito constitucional, 12ª edição, revista e ampliada. Malheiros, página 29
- ↑ ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 7ª Edição. Niterói:Editora Método, 2011, página 82
- ↑ ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 7ª Edição. Niterói:Editora Método, 2011, página 83
- ↑ CERA, Denise C. M. Quais as características essenciais do poder constituinte originário?[1] Acesso em 19.nov.2013
- ↑ ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 7ª Edição. Niterói:Editora Método, 2011, página 86
- ↑ Pensamentos, Estrelas e (30 de abril de 2020). «Poder Constituinte Derivado Decorrente». Medium (em inglês). Consultado em 8 de junho de 2020
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora da UnB, 1995.
- BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13ª ed., Malheiros.
- LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 22ª ed., São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
- SARLET, Ingo Wolfgang, MARINONI, Luiz Guilherme, MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 13ª ed., São Paulo: SaraivaJur, 2024.