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'''Huang Di''' ou '''Huang-Ti'''<ref>BLOFELD, J. ''Taoismo: o caminho para a imortalidade''. São Paulo. Editora Pensamento. p. 10.</ref> (黃帝) ([[pinyin]]: huángdì), conhecido como o '''Imperador Amarelo''', é um dos [[Três Augustos e os Cinco Imperadores|Cinco Imperadores]], reis lendários, sábios e moralmente perfeitos que teriam governado a [[China]] após o período de milênios regido pelos também lendários [[Três Augustos e os Cinco Imperadores|Três Augustos]] ou Três Soberanos. O Imperador Amarelo teria reinado de 2697 a.C. a 2597 a.C.<ref>BLOFELD, J. |
'''Huang Di''' ou '''Huang-Ti''' <ref>BLOFELD, J. ''Taoismo: o caminho para a imortalidade''. São Paulo. Editora Pensamento. p. 10.</ref> (黃帝) ([[pinyin]]: huángdì), conhecido como o '''Imperador Amarelo''', é um dos [[Três Augustos e os Cinco Imperadores|Cinco Imperadores]], reis lendários, sábios e moralmente perfeitos que teriam governado a [[China]] após o período de milênios regido pelos também lendários [[Três Augustos e os Cinco Imperadores|Três Augustos]] ou Três Soberanos. O Imperador Amarelo teria reinado de 2697 a.C. a 2597 a.C. <ref>BLOFELD, J. o.c. </ref> |
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É considerado o ancestral de todos os [[China|chineses]] da etnia [[Han]] (a principal etnia da China) e o introdutor do antigo [[calendário chinês]], bem como o criador lendário de importantes elementos da cultura chinesa, como o [[taoismo]], a [[astrologia chinesa]], a [[medicina chinesa]] e o ''[[feng shui]]'' ([[geomancia]] chinesa).<ref>WU, J. ''Iniciação ao taoismo''. Volume 2. Rio de Janeiro. Mauad. 2006. p. 63.</ref> . |
É considerado o ancestral de todos os [[China|chineses]] da etnia [[Han]] (a principal etnia da China) e o introdutor do antigo [[calendário chinês]], bem como o criador lendário de importantes elementos da cultura chinesa, como o [[taoismo]], a [[astrologia chinesa]], a [[medicina chinesa]] e o ''[[feng shui]]'' ([[geomancia]] chinesa).<ref>WU, J. ''Iniciação ao taoismo''. Volume 2. Rio de Janeiro. Mauad. 2006. p. 63.</ref> . |
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Além de uma concepção sobre a [[patologia]] humana, suas causas e tratamentos, contém prescrições sobre a vida e "adaptação" do ser humano de acordo com o sexo e faixas de idade, distinguindo diferentes ciclos: sazonais (5 estações), ciclos circadianos (''[[Yin/Yang na Medicina Tradicional Chinesa|Yin/Yang]]'') e ciclos infra e ultradianos ("a grande circulação da energia" que obedece aos cinco elementos e o ciclo vital) que delimitam a relação dos órgãos internos com as fases do dia ou períodos comuns da vida humana envolvendo o [[nascimento]], [[maturação]] sexual e [[envelhecimento]]. |
Além de uma concepção sobre a [[patologia]] humana, suas causas e tratamentos, contém prescrições sobre a vida e "adaptação" do ser humano de acordo com o sexo e faixas de idade, distinguindo diferentes ciclos: sazonais (5 estações), ciclos circadianos (''[[Yin/Yang na Medicina Tradicional Chinesa|Yin/Yang]]'') e ciclos infra e ultradianos ("a grande circulação da energia" que obedece aos cinco elementos e o ciclo vital) que delimitam a relação dos órgãos internos com as fases do dia ou períodos comuns da vida humana envolvendo o [[nascimento]], [[maturação]] sexual e [[envelhecimento]]. |
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Há muitas versões sobre a origem desses textos ideográficos. Alguns estudiosos da história da China acreditam que o Nei Jing tenha sido realmente escrito por um grupo de médicos do [[Período dos Reinos Combatentes]], da [[dinastia Chou orientais]], 721-256 a.C. |
Há muitas versões sobre a origem desses textos ideográficos. Alguns estudiosos da história da China acreditam que o Nei Jing tenha sido realmente escrito por um grupo de médicos do [[Período dos Reinos Combatentes]], da [[Dinastia Zhou|dinastia Chou orientais]], 721-256 a.C. <ref>HORN, J.S. ''Medicina para Milhões''. Rio de Janeiro. Editora Civilização Brasileira. 1979.</ref> <ref>SUSSMAN, D. J. ''O que é a acupuntura''. São Paulo. Record. 1972 </ref> época associada à conquista do ferro e aos grandes clássicos da cultura chinesa que originaram o [[taoismo]] (a partir do [[Tao Te King]] de [[Lao Tsé]]) e o [[confucionismo]]. Os sábios da corte teriam feito uma síntese da tradição oral médica chinesa daquela época. Naturalmente, face aos recursos da escrita artesanal e à instabilidade política da época, teria sofrido diferentes adaptações e versões. |
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Os primeiros papéis produzidos na [[China]] datam do século II de nossa era, descobertos em antigo sítio arqueológico do período Han (estampados como tabuinhas que resultaram na invenção da xilografia [VIII a.C.] e tipografia entre 1380 e 1430). O primeiro texto de ampla divulgação encontrado é a [[Sutra do Diamante]] (''Jingangjijing''), o que se deve à divulgação do [[budismo]]. A partir dos séculos XII e XIII, ocorreram as primeiras grandes coleções de textos enciclopédicos<ref> |
Os primeiros papéis produzidos na [[China]] datam do século II de nossa era, descobertos em antigo sítio arqueológico do período Han (estampados como tabuinhas que resultaram na invenção da xilografia [VIII a.C.] e tipografia entre 1380 e 1430). O primeiro texto de ampla divulgação encontrado é a [[Sutra do Diamante]] (''Jingangjijing''), o que se deve à divulgação do [[budismo]]. A partir dos séculos XII e XIII, ocorreram as primeiras grandes coleções de textos enciclopédicos<ref>GERNET, Jacques. O mundo chinês, uma civilização e uma história 2V, v 1. Lisboa, Rio de Janeiro, Edições Cosmos, 1974</ref>. |
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A versão da [[dinastia Tang]] (618-906) é uma das mais conhecidas graças ao poder e riqueza dessa época. Contudo, a versão mais antiga (clássica) corresponde à [[dinastia Han]]. O Livro do Imperador Amarelo, na sua forma atual, encontrou respaldo nos achados recuperados em 1973 do túmulo nº3 em Mawangdui Changsha, na |
A versão da [[dinastia Tang]] (618-906) é uma das mais conhecidas graças ao poder e riqueza dessa época. Contudo, a versão mais antiga (clássica) corresponde à [[dinastia Han]]. O Livro do Imperador Amarelo, na sua forma atual, encontrou respaldo nos achados recuperados em 1973 do túmulo nº3 em Mawangdui Changsha, na província de [[Hunan]] <ref>WEIKANG, F. ''Acupuntura y moxibustion - bosquejo histórico''. Ediciones em lenguas extranjeras. Beijing, China. 1983.</ref>. |
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Além do cânone básico, a fabricação do [[aço]] - imprescindível para compreensão e prática da acupuntura moderna - e potencial divulgação do papel são referências suficientes para associar a etnia Han ao desenvolvimento da acupuntura. As primeiras referências à fundição do ferro são anteriores à esta, correspondendo à [[dinastia Chou]] (513 a.C.). Contudo, nada impede ter ocorrido a prática da acupuntura com agulhas de bronze (2000 a.C.) ou mesmo pedra e ossos. |
Além do cânone básico, a fabricação do [[aço]] - imprescindível para compreensão e prática da acupuntura moderna - e potencial divulgação do papel são referências suficientes para associar a etnia Han ao desenvolvimento da acupuntura. As primeiras referências à fundição do ferro são anteriores à esta, correspondendo à [[dinastia Chou]] (513 a.C.). Contudo, nada impede ter ocorrido a prática da acupuntura com agulhas de bronze (2000 a.C.) ou mesmo pedra e ossos. |
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Na perspectiva da [[antropologia estrutural]], o Livro do Imperador Amarelo corresponde segundo [[Claude Levi-Strauss|Lévi-Strauss]] a um "documento bruto", o que equivale a uma [[etnografia]] elaborada por representantes da própria etnia, opinião da qual também partilham [[Émile Durkheim|Durkheim]] e [[Marcel Mauss|Mauss]]. A abordagem etnográfica traz, com ela, a dificuldade de comparar povos sem escrita vivendo organizações naturais de famílias, clãs e tribos ou nações com formações culturais complexas organizadas no tempo e espaço a partir da escrita em interação com a nossa civilização. |
Na perspectiva da [[antropologia estrutural]], o Livro do Imperador Amarelo corresponde segundo [[Claude Levi-Strauss|Lévi-Strauss]] <ref>LÉVI-STRAUSS, Claude. A noção de estrutura em etnologia. in: Levi-Strauss (Os Pensadores). SP, Abril-Cultural, 1980</ref> a um "documento bruto", o que equivale a uma [[etnografia]] elaborada por representantes da própria etnia, opinião da qual também partilham [[Émile Durkheim|Durkheim]] e [[Marcel Mauss|Mauss]]. A abordagem etnográfica traz, com ela, a dificuldade de comparar povos sem escrita vivendo organizações naturais de famílias, clãs e tribos ou nações com formações culturais complexas organizadas no tempo e espaço a partir da escrita em interação com a nossa civilização. |
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No caso da China, com cinco mil anos de história e sociedades pré–econômicas, protoeconômicas, pré-científicas ou pré-industriais, dificilmente se aplicam períodos anteriores a formações imperiais, dado o volume do comércio e tecnologia que se registra desde 2000 a.C., data em torno da qual se assinalam o fim do [[período neolítico]], as técnicas de cerâmica Longshan e Yang Shao e os mitos que fundamentam a organização imperial dos cinco e três imperadores ancestrais. |
No caso da China, com cinco mil anos de história e sociedades pré–econômicas, protoeconômicas, pré-científicas ou pré-industriais, dificilmente se aplicam períodos anteriores a formações imperiais, dado o volume do comércio e tecnologia que se registra desde 2000 a.C., data em torno da qual se assinalam o fim do [[período neolítico]], as técnicas de cerâmica Longshan e Yang Shao e os mitos que fundamentam a organização imperial dos cinco e três imperadores ancestrais. |
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O estudo da dinastia Han, por sua vez, nos remete à difícil distinção conceitual, na perspectiva antropológica entre etnias e dinastias ou à organização destas a partir das lutas internas pelo poder imperial. Identificam-se, hoje, na [[República Popular da China]], 56 [[etnia]]s, 55 destas (60 milhões de pessoas) sob a sombra do poder da principal nacionalidade, segundo [[Rogerio Haesbaert da Costa|Haesbaert]], o grupo Han, que envolve 93% da população. |
O estudo da dinastia Han, por sua vez, nos remete à difícil distinção conceitual, na perspectiva antropológica entre etnias e dinastias ou à organização destas a partir das lutas internas pelo poder imperial. Identificam-se, hoje, na [[República Popular da China]], 56 [[etnia]]s, 55 destas (60 milhões de pessoas) sob a sombra do poder da principal nacionalidade, segundo [[Rogerio Haesbaert da Costa|Haesbaert]] <ref>HAESBAERT, R. ''China entre o ocidente e o oriente''. São Paulo. Ática. 1994.</ref>, o grupo Han, que envolve 93% da população. |
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O estudioso da civilização chinesa [[Joseph Needham]], da [[Universidade de Cambridge]], compartilha da ideia de que a medicina chinesa está embrionicamente integrada ao nosso processo civilizatório. Identifica uma série de "coincidências" de período histórico e estrutura conceitual entre esta e a [[medicina hipocrática]], inclusive entre os textos (66 tratados) que compõem o ''[[Hipócrates|Corpus Hippocraticum]]'' (460 – 379 a.C.), destacando a concepção dual, a dinâmica dos cinco elementos, a relação [[microcosmo]]–[[macrocosmo]] e, em especial, a relação entre saúde e meio ambiente. |
O estudioso da civilização chinesa [[Joseph Needham]], da [[Universidade de Cambridge]], compartilha da ideia de que a medicina chinesa está embrionicamente integrada ao nosso processo civilizatório. Identifica uma série de "coincidências" de período histórico e estrutura conceitual entre esta e a [[Medicina da Grécia Antiga|medicina hipocrática]], inclusive entre os textos (66 tratados) que compõem o ''[[Hipócrates|Corpus Hippocraticum]]'' (460 – 379 a.C.), destacando a concepção dual, a dinâmica dos cinco elementos, a relação [[microcosmo]]–[[macrocosmo]] e, em especial, a relação entre saúde e meio ambiente. |
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== Edições atuais do Livro do Imperador Amarelo == |
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HAESBAERT, R. ''China entre o ocidente e o oriente''. São Paulo. Ática. 1994. |
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HORN, J.S. ''Medicina para Milhões''. Rio de Janeiro. Editora Civilização Brasileira. 1979. |
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LÉVI-STRAUSS, C. ''A Noção de Estrutura em Etnologia''. São Paulo. Abril-Cultura. Os Pensadores volume 50. 1a Edição. 1976. |
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NEEDHAM, J. G. – DJEN, L. ''Science and Civilisation in China''. v. 6 Biology and Biological Technology, Part VI Medicine. UK, Cambridge University Press, 2000. |
NEEDHAM, J. G. – DJEN, L. ''Science and Civilisation in China''. v. 6 Biology and Biological Technology, Part VI Medicine. UK, Cambridge University Press, 2000. |
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PRIETO, H. / BLAISE, P. ''O Imperador Amarelo''. Adaptação infanto-juvenil. 2006. São Paulo. Moderna Editora. 2006. |
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SUSSMAN, D. J. ''O que é a acupuntura''. São Paulo. Record. 1972 |
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WEIKANG, F. ''Acupuntura y moxibustion - bosquejo histórico''. Ediciones em lenguas extranjeras. Beijing, China. 1983. |
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Revisão das 12h24min de 25 de novembro de 2013
História da China | |||||||
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História Antiga | |||||||
Neolítico 8500 AEC – 2070 AEC | |||||||
Dinastia Xia 2070 AEC – 1600 AEC | |||||||
Dinastia Shang 1600 AEC – 1046 AEC | |||||||
Dinastia Zhou 1046 AEC – 256 AEC | |||||||
Zhou Ocidental | |||||||
Zhou Oriental | |||||||
Primaveras e Outonos | |||||||
Estados Combatentes | |||||||
História Imperial | |||||||
Dinastia Qin 221 AEC – 206 AEC | |||||||
Dinastia Han 206 AEC – 220 EC | |||||||
Han Ocidental | |||||||
Dinastia Xin | |||||||
Han Oriental | |||||||
Três Reinos 220–280 | |||||||
Wei, Shu and Wu | |||||||
Dinastia Jin 265–420 | |||||||
Jin Ocidental | |||||||
Jin Oriental | Dezesseis Reinos | ||||||
Dinastias do Norte e do Sul 420–589 | |||||||
Dinastia Sui 581–618 | |||||||
Dinastia Tang 618–907 | |||||||
(Segunda dinastia Zhou 690–705) | |||||||
Cinco Dinastias e Dez Reinos 907–960 |
Dinastia Liao 907–1125 | ||||||
Dinastia Song 960–1279 |
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Song do Norte | Xia Ocidental | ||||||
Song do Sul | Jin | ||||||
Dinastia Yuan 1271–1368 | |||||||
Dinastia Ming 1368–1644 | |||||||
Dinastia Qing 1644–1911 | |||||||
História Moderna | |||||||
República da China 1912–1949 | |||||||
República Popular da China 1949–presente |
República da China (Taiwan) 1949–presente | ||||||
Huang Di ou Huang-Ti [1] (黃帝) (pinyin: huángdì), conhecido como o Imperador Amarelo, é um dos Cinco Imperadores, reis lendários, sábios e moralmente perfeitos que teriam governado a China após o período de milênios regido pelos também lendários Três Augustos ou Três Soberanos. O Imperador Amarelo teria reinado de 2697 a.C. a 2597 a.C. [2] É considerado o ancestral de todos os chineses da etnia Han (a principal etnia da China) e o introdutor do antigo calendário chinês, bem como o criador lendário de importantes elementos da cultura chinesa, como o taoismo, a astrologia chinesa, a medicina chinesa e o feng shui (geomancia chinesa).[3] .
Conta a tradição que, desde criança, Huang Di era muito perspicaz, dotado duma inteligência fora do comum e capaz de estabelecer raciocínios avançados, além do normal para a sua idade, sobre os mais variados temas. Durante o seu reinado, Huang Di interessou-se especialmente pela saúde e pela condição humana, questionando os seus ministros-médicos sobre a tradição médica da época.
O Clássico do Imperador Amarelo
Do registro das conversas entre Huang Di e seus ministros, surgiu a obra conhecida actualmente como Nei Jing (内經) (pinyin: Nèijīng) - "O Clássico do Imperador Amarelo"[1]. Essa obra é considerada um dos livros fundamentais da medicina tradicional chinesa. Divide-se em dois livros, de 81 capítulos cada um:
- O Su Wen - "Tratado de Medicina Interna"
- e o Ling Shu - "O Pivô Maravilhoso".
Além de uma concepção sobre a patologia humana, suas causas e tratamentos, contém prescrições sobre a vida e "adaptação" do ser humano de acordo com o sexo e faixas de idade, distinguindo diferentes ciclos: sazonais (5 estações), ciclos circadianos (Yin/Yang) e ciclos infra e ultradianos ("a grande circulação da energia" que obedece aos cinco elementos e o ciclo vital) que delimitam a relação dos órgãos internos com as fases do dia ou períodos comuns da vida humana envolvendo o nascimento, maturação sexual e envelhecimento.
Há muitas versões sobre a origem desses textos ideográficos. Alguns estudiosos da história da China acreditam que o Nei Jing tenha sido realmente escrito por um grupo de médicos do Período dos Reinos Combatentes, da dinastia Chou orientais, 721-256 a.C. [4] [5] época associada à conquista do ferro e aos grandes clássicos da cultura chinesa que originaram o taoismo (a partir do Tao Te King de Lao Tsé) e o confucionismo. Os sábios da corte teriam feito uma síntese da tradição oral médica chinesa daquela época. Naturalmente, face aos recursos da escrita artesanal e à instabilidade política da época, teria sofrido diferentes adaptações e versões.
Os primeiros papéis produzidos na China datam do século II de nossa era, descobertos em antigo sítio arqueológico do período Han (estampados como tabuinhas que resultaram na invenção da xilografia [VIII a.C.] e tipografia entre 1380 e 1430). O primeiro texto de ampla divulgação encontrado é a Sutra do Diamante (Jingangjijing), o que se deve à divulgação do budismo. A partir dos séculos XII e XIII, ocorreram as primeiras grandes coleções de textos enciclopédicos[6].
A versão da dinastia Tang (618-906) é uma das mais conhecidas graças ao poder e riqueza dessa época. Contudo, a versão mais antiga (clássica) corresponde à dinastia Han. O Livro do Imperador Amarelo, na sua forma atual, encontrou respaldo nos achados recuperados em 1973 do túmulo nº3 em Mawangdui Changsha, na província de Hunan [7].
Além do cânone básico, a fabricação do aço - imprescindível para compreensão e prática da acupuntura moderna - e potencial divulgação do papel são referências suficientes para associar a etnia Han ao desenvolvimento da acupuntura. As primeiras referências à fundição do ferro são anteriores à esta, correspondendo à dinastia Chou (513 a.C.). Contudo, nada impede ter ocorrido a prática da acupuntura com agulhas de bronze (2000 a.C.) ou mesmo pedra e ossos.
Múltiplas possibilidades de interpretação
Na perspectiva da antropologia estrutural, o Livro do Imperador Amarelo corresponde segundo Lévi-Strauss [8] a um "documento bruto", o que equivale a uma etnografia elaborada por representantes da própria etnia, opinião da qual também partilham Durkheim e Mauss. A abordagem etnográfica traz, com ela, a dificuldade de comparar povos sem escrita vivendo organizações naturais de famílias, clãs e tribos ou nações com formações culturais complexas organizadas no tempo e espaço a partir da escrita em interação com a nossa civilização.
No caso da China, com cinco mil anos de história e sociedades pré–econômicas, protoeconômicas, pré-científicas ou pré-industriais, dificilmente se aplicam períodos anteriores a formações imperiais, dado o volume do comércio e tecnologia que se registra desde 2000 a.C., data em torno da qual se assinalam o fim do período neolítico, as técnicas de cerâmica Longshan e Yang Shao e os mitos que fundamentam a organização imperial dos cinco e três imperadores ancestrais.
O estudo da dinastia Han, por sua vez, nos remete à difícil distinção conceitual, na perspectiva antropológica entre etnias e dinastias ou à organização destas a partir das lutas internas pelo poder imperial. Identificam-se, hoje, na República Popular da China, 56 etnias, 55 destas (60 milhões de pessoas) sob a sombra do poder da principal nacionalidade, segundo Haesbaert [9], o grupo Han, que envolve 93% da população.
O estudioso da civilização chinesa Joseph Needham, da Universidade de Cambridge, compartilha da ideia de que a medicina chinesa está embrionicamente integrada ao nosso processo civilizatório. Identifica uma série de "coincidências" de período histórico e estrutura conceitual entre esta e a medicina hipocrática, inclusive entre os textos (66 tratados) que compõem o Corpus Hippocraticum (460 – 379 a.C.), destacando a concepção dual, a dinâmica dos cinco elementos, a relação microcosmo–macrocosmo e, em especial, a relação entre saúde e meio ambiente.
Edições atuais do Livro do Imperador Amarelo
WANG, Bing. Princípios de Medicina Interna do Imperador Amarelo (Dinastia Tang – Edição bilíngue). São Paulo. Editora Ícone. 2001.
Nei Ching: o livro de ouro da medicina chinesa. Rio de Janeiro. Editora Objetiva. reedição da primeira tradução para língua portuguesa publicado por Editora Minerva, PT, 1940.
Ling – Shu. Base da acupuntura da medicina tradicional chinesa. Tradução e comentários de Ming Wong. São Paulo. Andrei. 1995.
CHUNCAI, Z. Clássico de Medicina do Imperador Amarelo: tratado sobre a saúde e vida longa. São Paulo. Editora Roca. 1999. Edição adaptada a charges ilustradas com desenhos de Chuncai, Zhou et al.
Bibliografia auxiliar
NEEDHAM, J. G. – DJEN, L. Science and Civilisation in China. v. 6 Biology and Biological Technology, Part VI Medicine. UK, Cambridge University Press, 2000.
Nan-Ching, o clássico das dificuldades. Tradução e notas de Unschuld, Paul U. São Paulo. Roca. 2003.
PRIETO, H. / BLAISE, P. O Imperador Amarelo. Adaptação infanto-juvenil. 2006. São Paulo. Moderna Editora. 2006.
Referências
- ↑ BLOFELD, J. Taoismo: o caminho para a imortalidade. São Paulo. Editora Pensamento. p. 10.
- ↑ BLOFELD, J. o.c.
- ↑ WU, J. Iniciação ao taoismo. Volume 2. Rio de Janeiro. Mauad. 2006. p. 63.
- ↑ HORN, J.S. Medicina para Milhões. Rio de Janeiro. Editora Civilização Brasileira. 1979.
- ↑ SUSSMAN, D. J. O que é a acupuntura. São Paulo. Record. 1972
- ↑ GERNET, Jacques. O mundo chinês, uma civilização e uma história 2V, v 1. Lisboa, Rio de Janeiro, Edições Cosmos, 1974
- ↑ WEIKANG, F. Acupuntura y moxibustion - bosquejo histórico. Ediciones em lenguas extranjeras. Beijing, China. 1983.
- ↑ LÉVI-STRAUSS, Claude. A noção de estrutura em etnologia. in: Levi-Strauss (Os Pensadores). SP, Abril-Cultural, 1980
- ↑ HAESBAERT, R. China entre o ocidente e o oriente. São Paulo. Ática. 1994.
Ver também
- China
- República Popular da China
- Yin/yang na medicina tradicional chinesa
- Medicina Tradicional Chinesa
- História da acupuntura
- Acupuntura
- Cheng Nong 2953 a.C.
- Três Augustos e os Cinco Imperadores
Ligações externas
- Extratos do Livro Interno de Huangdi
- Online Neijing Suwen text in traditional characters (Big5 encoding). No details about text given, contains no notes or commentary.
- O Livro de Acupuntura do Imperador Amarelo Jan 2011
- Veith Ilza (Translate and comments) The Yellow Emperor's Classic of Internal Medicine. Google Books (1), Google Books (2), Jan 2011
- Nguyen Van Nghi - LINGSHU', Set. 2011
- Su Wen - Huangdi Neijing Facsímile de uma edição original: 黄帝内经素问 Biblioteca Digital, Mundial Maio de 2011