Ana Mendieta

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Ana Mendieta
Nascimento 18 de novembro de 1948
Havana, Cuba Cuba
Morte 8 de setembro de 1985 (36 anos)
Nova York, Estados Unidos Estados Unidos
Área Performance, escultura, videoarte

Ana Mendieta (18 de novembro de 1948, Havana, Cuba – 8 de setembro de 1985, Nova York,  Estados Unidos) foi uma performer, escultora, pintora e vídeo artista cubana, que é mais conhecida por suas obras de arte "corpo-terra" ("earth-body"). Nascida em Havana, Ana Mendieta chegou aos Estados Unidos como refugiada em 1961,[1] dois anos após o revolucionário Fidel Castro depor o ditador Fulgêncio Batista.

Família[editar | editar código-fonte]

Ana Mendienta é a filha do meio de Ignacio e Raquel Oti Mendieta. Sua família era de uma classe média alta com histórico de vida política, o seu tio-avô, Carlos Mendieta, foi presidente provisório de Cuba em 1934.[2] Seu pai, Ignacio, era um advogado que frequentava os mesmos círculos sociais que os líderes políticos e, em um primeiro momento, apoiou a revolução contra o ditador Batista. Há evidências que indicavam que Ignacio tinha sido treinado pelo FBI como informante.[2][3]

Ignacio, por meio da operação Peter Pan organizada pela Igreja Católica para "salvar as crianças do comunismo",[1][2] providenciou a viagem de Ana Mendieta, onze anos, e sua irmã mais velha Raquel, quinze anos, para os Estados Unidos em 11 de Setembro de 1961. Porém, a idade em que ela emigrou apresentou variações (11, 12 ou 13 anos) nos textos consultados.[1][2][4]

Vida e obra[editar | editar código-fonte]

A obra de Mendieta era, geralmente, autobiográfica e focada em temas que incluem feminismo, violência, vida, morte, lugar e pertencimento. Seus trabalhos, geralmente, estão associados aos quatro elementos básicos da natureza. Mendieta frequentemente remetia a uma conexão física e espiritual com a Terra. Mendieta unia seu corpo com a terra para se tornar inteira. "Através das minhas esculturas de terra/corpo, eu me torno uma com a terra... Eu me torno uma extensão da natureza e a natureza se torna uma extensão do meu corpo. Este ato obsessivo de reafirmar meus laços com a terra é realmente uma reativação das minhas crenças primitivas... [em] uma força feminina onipresente, a imagem posterior se engloba dentro do útero, é uma manifestação da minha sede de viver."[5] Durante sua vida, Mendieta produziu mais de 200 obras de arte usando a terra como o meio para escultura.[6] A Silueta Series (1973–1980) envolveu a criação de silhuetas femininas na natureza – em barro, areia e grama – com materiais naturais, de folhas e galhos a sangue, criando marcas de corpos ou pintando sua silhueta ou de outros em paredes.[7]

Ela estudou na Universidade de Iowa e graduou em pintura. Logo após se matriculou no Programa de Arte Multimídia e Vídeo da mesma universidade.[1] Durante seus estudos começou a desenvolver sua prática artisticas tendo como base as violências sofridas e as que ela via a sua volta. E, assim, desenvolveu suas performances em torno da violência exercida sobre os corpos femininos colonizados, inspirada na metáfora do corpo da mulher como a primeira das colônias,[1] já que ela mesma, aos treze anos de idade, foi arrancada de sua terra materna.[1]

In a 1981 artist statement, Mendieta says, "I have been carrying out a dialogue between the landscape and the female body (based on my own silhouette). I believe this has been a direct result of my having been torn from my homeland (Cuba) during my adolescence. I am overwhelmed by the feeling of having been cast from the womb (nature). My art is the way I re-establish the bonds that unite me to the universe. It is a return to the maternal source."[8]

Em 1978, Ana Mendieta passou a integrar o Artists In Residence Inc (A.I.R. Gallery) em Nova York, que foi a primeira galeria para mulheres fundada nos Estados Unidos. A iniciativa possibilitou a Mendieta encontrar com outras artistas mulheres da vanguarda do movimento feminista.[9] Nesta época, Mendieta também se envolveu ativamente na administração e manutenção do A.I.R. Em uma declaração não publicada, Mendieta anotou que: "É crucial para mim ser parte de todas as minhas obras de arte. Como resultado de minha participação, minha visão se torna uma realidade e parte de minhas experiências."[9] Ao mesmo tempo, após dois anos de seu envolvimento na A.I.R., ela concluiu que: "O Feminismo Americano, como está, é basicamente um movimento da classe média branca", e buscou desafiar os limites dessa perspectiva através da sua arte.[10] Ela conheceu seu futuro marido Carl Andre na galeria quando ele participou de um painel chamado "How has women's art practices affected male artist social attitudes?".[11]

Carl Andre era um artista minimalista, movimento artístico que estava na crista da onda, e que se consolidava no cânone. Contrariando a isso, Mendieta era a precursora de uma arte politizada e que se afastava da produção hegemônica. Mas, para a historiadora da arte Andrea Giunta, a obra de Mendieta tem sido despolitizada pela crítica e considerada "arte conceitual".[1]

Em 2009, Mendieta recebeu o prêmio Lifetime Achievement Award pela Cintas Foundation. A obra de Ana Mendieta é atualmente gerenciada pela Galerie Lelong em Nova York.[1][12]

Exibições e coleções[editar | editar código-fonte]

Sala «da arte feminina», com a apresentação de fotografias das artistas Ana Mendieta, Cindy Sherman e Helena Almeida, entre outras. Trabalhos apresentados no Museu Coleção Berardo de Lisboa, 2006.

Em 1979, Mendieta apresentou uma exibição solo de suas fotografias na A.I.R. Gallery em Nova York. Também foi curadora e escreveu o catálogo introdutório de uma exibição na A.I.R. em 1981 intitulada Dialectics of Isolation: An Exhibition of Third World Women Artists of the United States, que destacou a obra de artistas como Judy Baca, Senga Nengudi, Howardena Pindell e Zarina.[13] O New Museum of Contemporary Art, em Nova York, recebeu a primeira exibição de pesquisa de Mendieta em 1987. Desde sua morte, Mendieta tem sido reconhecida com retrospectivas internacionais solo em museus, como "Ana Mendieta" no Art Institute of Chicago (2011) e "Ana Mendieta in Context: Public and Private Work", De La Cruz Collection, Miami (2012).[14] Em 2004, o Hirshhorn Museum and Sculpture Garden em Washington, D.C., organizou o "Earth Body, Sculpture and Performance", uma grande retrospectiva que viajou pelo Whitney Museum of American Art, New York; Des Moines Art Center, Iowa e Miami Art Museum, Flórida (2004).

A obra de Mendieta aparece em muitas coleções públicas importantes, incluindo o Solomon R. Guggenheim Museum, Metropolitan Museum of Art, Whitney Museum of American Art, Museum of Modern Art, New York; Art Institute of Chicago, Centre Pompidou, Paris; Musée d'Art Moderne et Contemporain, Genebra e Tate Collection, em Londres.[14]

Ana Mendieta em suas performances Silueta Series, realizadas no México entre 1976 e 1991, influencaram artistas contemporâneas dos movimentos ecofeminimos que entendem a ligação do feminismo à ecologia é urgente. Algumas artistas desse movimento também relaciona a noção de que as mulheres foram socializadas de forma diferente e que, por isso, possuem uma ligação mais forte com a natureza em comparação aos homens.

Morte e controvérsia[editar | editar código-fonte]

Ana Mendieta morreu em 8 de setembro de 1985, em Nova York, após cair do 34º andar do seu apartamento na 300 Mercer Street, em Greenwich Village,[15] onde ela viveu com seu marido por oito meses, o escultor minimalista, Carl Andre. Ela caiu sobre o teto de uma loja.[16] Logo antes de sua morte, vizinhos escutaram uma briga violenta entre o casal.[17] Não houve nenhuma testemunha ocular dos eventos que levaram à morte de Mendieta[18] Numa gravação de uma chamada de Carl para o 911, ele diz: "Minha esposa é uma artista e eu sou um artista e nós tivemos uma discussão sobre o fato de que eu era mais, é, expus mais ao público do que ela. Ela foi para o quarto e eu fui depois dela e ela se jogou da janela."[19] Em 1988, Carl Andre foi acusado e absolvido de seu assassinato. Durante o processo, que durou três anos,[18] o advogado de Andre descreveu a morte de Mendieta como um possível acidente ou suicídio. O júri considerou Andre inocente por dúvida razoável.[19]

A absolvição causou furor entre as feministas do mundo da Arte e permanece controversa até os dias de hoje. Em 2010, um simpósio chamado Where Is Ana Mendieta aconteceu na New York University por ocasião do 25º aniversário de sua morte.[20] Em maio de 2014, o grupo de protestos feminista No Wave Performance Task Force realizou um protesto em frente à retrospectiva de Carl Andre na Dia Art Foundation.[21] O grupo depositou pilhas de sangue e vísceras de animais em frente ao estabelecimento e a frase "I Wish Ana Mendieta Was Still Alive" escritas neles.[22]

Caso Amazon[editar | editar código-fonte]

Em 2018, a família e detentores dos direitos autorais de Ana Mendieta processaram a Amazon Studios por utilizar indevidamente imagens de obras da artista na divulgação do remake Suspiria (2018), filme dirigido por Luca Guadagnino. Duas imagens baseadas nas obras "Rape Scene" e "Untitled" (Silueta Series, México) apareceram no primeiro trailer do filme. Após o processo, as duas imagens foram retiradas do material, entretanto, após o lançamento de filme, a família Mendieta fez novas acusações apontando mais oito momentos em que o filme reproduz imagens semelhantes às obras da artista. O diretor Luca Guadagnino chegou a revelar em entrevistas que o trabalho de Ana Mendieta, entre outras artistas feministas como Gina Pane, Francesca Woodman e Judy Chicago, haviam sido inspiração para produzir o filme.[23][24]

Referências

  1. a b c d e f g h Bidaseca, Karina,. La revolución será feminista o no será : la piel del arte feminista descolonial. Buenos Aires, Argentina: [s.n.] OCLC 1076547422 
  2. a b c d SILVA, Isabela Tozini. Os deslocamentos de Ana Mendieta: rastros, intervalos e fronteiras = Ana Mendieta's displacement: traces, intermissions and borders. 2018. 1 recurso online (121 p.). Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes, Campinas, SP. Disponível em:http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/332937. Acessado em: 14 de set. de 2020.
  3. Blocker, Jane,. Where is Ana Mendieta? : identity, performativity, and exile. Durham, NC: [s.n.] OCLC 39523289 
  4. «The Ultimate Guide to Ana Mendieta». www.sleek-mag.com (em inglês). Consultado em 15 de setembro de 2020 
  5. Ramos, E. Carmen (2014). our america. [S.l.]: Smithsonian American Art Museum, Washington, DC. ISBN 9781907804441 
  6. Blocker, Jane. Where Is Ana Mendieta?: Identity, Performativity, and Exile. Duke University Press, May, 1999. p. 47-48.
  7. Perry, Gill (2003). «The expanding field: Ana Mendieta's Silueta series». Frameworks for Modern Art. New Haven: Yale University Press. pp. 153–201. ISBN 0-300-10228-3 
  8. Manchester, Elizabeth. «Untitled (Silueta Series, Mexico)». TATE. Consultado em 1 de outubro de 2009 
  9. a b Griefen, Kat (2011). «Ana Mendieta At A.I.R. Gallery, 1977–82». Women & Performance. 21 (2): 171–181. doi:10.1080/0740770X.2011.607595 
  10. Butler Schwartz, Cornelia Alexandra (2010). Modern Women: Women Artists at the Museum of Modern Art. New York: The Museum of Modern Art. 389 páginas 
  11. Sneed, Gillian (12 October 2010). "The Case of Ana Mendieta". Art In America. Retrieved 12 February 2015.
  12. «Estate of Ana Mendieta - Artists - Galerie Lelong & Co.». www.galerielelong.com. Consultado em 15 de setembro de 2020 
  13. Lovelace, Carey. «Aloft in Mid A.I.R.». A.I. R. Gallery. Consultado em 14 de março de 2014. Arquivado do original em 12 de maio de 2013 
  14. a b Ana Mendieta Alison Jacques Gallery, London.
  15. Carl Swanson (April 1, 2012), Maximum Outrage Over Minimalist Sculptor New York Magazine.
  16. Sean O'Hagan (September 21, 2013), Ana Mendieta: death of an artist foretold in blood "The Guardian".
  17. William Wilson (February 18, 1998), Haunting Works From Cuban Exile Mendieta Los Angeles Times.
  18. a b Vincent Patrick (June 10, 1990), A Death In The Art World New York Times.
  19. a b Sullivan, Ron (12 de fevereiro de 1988). «Greenwich Village Sculptor Acquitted of Pushing Wife to Her Death». The New York Times. Consultado em 13 de fevereiro de 2015 
  20. Sneed, Gillian (12 de outubro de 2010). «The Case of Ana Mendieta». Art In America. Consultado em 13 de fevereiro de 2015 
  21. Steinhauer, Jill (20 de maio de 2014). «Artists Protest Carl Andre Retrospective With Blood Outside Dia: Chelsea». Hyperallergic. Consultado em 13 de fevereiro de 2015 
  22. Crawford, Marisa (10 de março de 2015). «Crying for Ana Mendieta at the Carl Andre Retrospective». Hyperallergic.com 
  23. Povo, Correio do. «Amazon é processada por usar obra de arte indevidamente em "Suspiria"». Correio do Povo. Consultado em 15 de setembro de 2020 
  24. «Família da performer Ana Mendieta acusa Amazon de plágio no filme 'Suspiria'». Folha de S.Paulo. 4 de outubro de 2018. Consultado em 15 de setembro de 2020 

Leituras adicionais[editar | editar código-fonte]