Estátua equestre do Corvo

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Ilha do Corvo: é possível ver a caldeira do vulcão, em cuja extremidade Oeste estaria a estátua.

A estátua equestre do Corvo foi uma estátua em pedra, representando uma figura humana a cavalo, com um braço apontando para Oeste, alegadamente descoberta na ilha do Corvo, no arquipélago dos Açores, aquando do reconhecimento da ilha no século XV.

A crónica de Damião de Góis[editar | editar código-fonte]

A informação de que dispomos sobre o monumento, a noroeste do cume do vulcão, é do cronista Damião de Góis (1502-1574):

"...uma estátua de pedra posta sobre uma laje, que era um homem em cima de um cavalo em osso, e o homem vestido de uma capa como bedém, sem barrete, com uma mão na crina do cavalo, e o braço direito estendido, e os dedos da mão encolhidos, salvo o dedo segundo, a que os latinos chamam índex, com que apontava contra o poente.
"Esta imagem, que toda saía maciça da mesma laje, mandou el-rei D. Manuel tirar pelo natural, por um seu criado debuxador, que se chamava Duarte D'Armas; e depois que viu o debuxo, mandou um homem engenhoso, natural da cidade do Porto, que andara muito em França e Itália, que fosse a esta ilha, para, com aparelhos que levou, tirar aquela antigualha; o qual quando dela tornou, disse a el-rei que a achara desfeita de uma tormenta, que fizera o inverno passado. Mas a verdade foi que a quebraram por mau azo; e trouxeram pedaços dela, a saber: a cabeça do homem e o braço direito com a mão, e uma perna, e a cabeça do cavalo, e uma mão que estava dobrada, e levantada, e um pedaço de uma perna; o que tudo esteve na guarda-roupa de el-rei alguns dias, mas o que depois se fez destas coisas, ou onde puseram, eu não o pude saber." (Crónica do Príncipe D. João, Cap. IX, 1567)

O cronista refere ainda que o capitão do donatário, Pêro da Fonseca, presente nas ilhas das Flores e do Corvo em 1529:

"...soube dos moradores que na rocha, abaixo donde estivera a estátua, estavam entalhadas na mesma pedra da rocha umas letras; e por o lugar ser perigoso para se poder ir onde o letreiro está, fez abaixar alguns homens por cordas bem atadas, os quais imprimiram as letras, que ainda a antiguidade de todo não tinha cegas, em cera que para isso levaram; contudo as que trouxeram impressas na cera eram já mui gastas, e quase sem forma, assim que por serem tais, ou porventura por na companhia não haver pessoa que tivesse conhecimento mais que de letras latinas, e este imperfeito, nem um dos que ali se achavam presentes soube dar razão, nem do que as letras diziam, nem ainda puderam conhecer que letras fossem."

Duarte de Armas, que anteriormente havia sido encarregado pelo rei de fazer o levantamento das fortalezas da fronteira com Espanha, fora também encarregado de fazer um debuxo da estátua, que infelizmente se perdeu.

Referências mais tardias[editar | editar código-fonte]

O padre Gaspar Frutuoso (1522-1591), nascido na Ilha de São Miguel, um dos primeiros historiadores nativos dos Açores escreveu, por volta de 1590, no volume VII das "Saudades da Terra":

"...um vulto de um homem de pedra, grande, que estava em pé sobre uma laje ou poio, e na laje estavam esculpidas umas letras, e outros dizem que tinha a mão estendida ao nor-nordeste, ou noroeste, como que apontava para a grande costa da Terra dos Bacalhaus [Terra Nova]; outros dizem que apontava para o sudoeste, como que mostrava as Índias de Castela [Antilhas] e a grande costa da América com dois dedos estendidos e nos mais, que tinha cerrados, estavam uma letras, ou caldeias ou hebreias ou gregas, ou doutras nações, que ninguém sabia ler, que diziam os daquele ilhéu e ilha das Flores dizerem: Jesus avante. Os construtores teriam sido na sua opinião dos cartagineses pela viagem que eles para estas partes fizeram, ... e da vinda, que das Antilhas alguns tornassem, deixariam aquele padrão com as letras por marco e sinal do que atrás deixavam descoberto."

Os construtores teriam sido na sua opinião "dos cartagineses pela viagem que eles para estas partes fizeram, (…) e da vinda, que das Antilhas alguns tornassem, deixariam aquele padrão com as letras por marco e sinal do que atrás deixavam descoberto".

António Cordeiro (1641-1722), outro dos mais antigos historiadores açorianos, refere-se ao mito nas suas histórias como "antigualha mui notável" e Manuel de Faria e Sousa (1590-1649) escreve de Madrid, na Epitome de las Histórias Portuguesas, sobre as letras incompreensiveis e a estátua.

Em 1790, Johann Frans Podolyn, um numismata sueco, escreveu que tinha encontrado moedas cartaginesas na Ilha do Corvo, mas o seu rasto perdeu-se. Contudo permanecem desenhos pormenorizados e descrições que são exactas, mas que poderão ter sido feitas a partir de moedas encontradas nas colónias cartaginesas do Mediterrâneo.

Controvérsia recente[editar | editar código-fonte]

Vários arqueológos[carece de fontes?] têm recentemente manifestado interesse na história. Existem várias outras histórias de grandes viagens pelos Cartagineses e os seus antepassados os Fenicios. Ruínas arqueológicas cartaginesas foram comprovadamente encontradas em Mogador, 500 quilómetros abaixo do Estreito de Gibraltar na costa de África.

Segundo o historiador grego antigo Hérodoto, o fenício Sataspes teria chegado à África tropical; enquanto Hanno, um pouco mais cedo, teria, tendo partido do Mediterrâneo, chegado ao Egipto pelo Mar Vermelho no século V a.C., descrevendo as paisagens tropicais com realismo. As viagens de Hanno e de Himilco provam a capacidade cartaginesa de navegar no Atlântico, abrindo a possibilidade que, por desígnio ou acaso, tivessem visitado os Açores. É por isso que muitos arqueólogos[carece de fontes?] aceitam que os Cartagineses ou Fenícios poderão ter descoberto os Açores antes dos Portugueses. Estes povos frequentemente representavam os seus deuses com estátuas equestres, como é comprovado em inúmeras descobertas arqueológicas no Mediterrâneo[carece de fontes?].

Em Junho de 1983, o arqueólogo B. Isserlin da Universidade de Leeds conduziu escavações na ilha em quatro sítios. Numa delas foram encontrados pedaços de cerâmica num estilo incomum. No entanto a datação pelas técnicas físicas, apesar de permitir uma origem antiga, não foi conclusiva.

Recentemente, o escritor Gavin Menzies escreveu um livro de especulações não provadas mas bem argumentadas no qual especula, sem qualquer prova, de que a estátua equestre do Corvo poderia ter sido erguida pelos Chineses liderados por Zheng He no século XIV. É sabido que os grandes juncos dos Chineses chegaram à costa oriental de África nessa data, mas a sua chegada ao Atlântico é pura especulação.

Significado[editar | editar código-fonte]

Apesar de nunca arqueologicamente confirmada, e de ser considerada provavelmente falsa por historiadores subsequentes, a história da estátua equestre do Corvo, bem como a das moedas púnicas ali encontradas[carece de fontes?], são culturalmente e turisticamente importantes para os Açores e para a história do Atlântico, fazendo parte da mitologia que envolve os arquipélagos da Macaronésia.

Não são de descartar as visitas dos cartagineses à ilha do Corvo, já que é certo que visitaram as Canárias, que aliás eram habitadas no tempo da sua descoberta pelos povos guanches, vivendo em condições similares às dos povos neolíticos, e onde deixaram irrefutáveis vestígios arqueológicos.

Com o esbater dos mitos nacionalistas, que faziam "acto de fé" da primazia portuguesa nas ilhas atlânticas, levando à negação sem análise de qualquer vestígio humano prévio à colonização portuguesa, torna-se necessário estudar melhor a pré-história açoriana.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

Joaquim Fernandes, "O Cavaleiro da Ilha do Corvo", LIsboa, Temas&Debates/Círculo de Leitores, 2008; idem, Editora Bússola, S. Paulo, 2011.

Ver também[editar | editar código-fonte]