Trypanosoma cruzi

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Como ler uma infocaixa de taxonomiaTrypanosoma cruzi
Trypanosoma cruzi, forma flagelada em esfregaço sanguíneo.
Trypanosoma cruzi, forma flagelada em esfregaço sanguíneo.
Classificação científica
Reino: Protista
Filo: Euglenozoa
Clado: Discoba
Clado: Discicristata
Classe: Kinetoplastea
Subclasse: Metakinetoplastina
Ordem: Trypanosomatida
Família: Trypanosomatidae
Género: Trypanosoma
Espécie: T. cruzi
Nome binomial
Trypanosoma cruzi
Chagas, 1909
Sinónimos[1]

Trypanosoma cruzi é um protozoário flagelado da família Trypanosomatidae. É o agente etiológico da doença de Chagas.

Nomenclatura e taxonomia[editar | editar código-fonte]

A espécie foi descrita em 1909 pelo médico brasileiro Carlos Chagas, como Trypanosoma cruzi.[2] O epíteto específico homenageia o médico epidemiologista Oswaldo Cruz.[3] No mesmo ano, Chagas recombinou-a em um novo gênero, o Schizotrypanum, após reconhecer particularidades biológicas no ciclo reprodutivo que a diferenciava das demais espécies do gênero Trypanosoma.[4] Em 1912, Delanoë e Delanoë descrevem o parasita Pneumocystis carinii,[5] demonstrando que as particularidades do ciclo reprodutivo observadas por Chagas eram na verdade de um outro parasita, fazendo com que Chagas retomasse o uso de Trypanosoma cruzi.[6][7]

Dentro do gênero Trypanosoma, a espécie está classificada na seção Stercoraria e no subgênero Schizotrypanum.[1] T. cruzi é politípico, com duas subespécies reconhecidas: Trypanosoma cruzi cruzi, agente da doença de Chagas, e o Trypanosoma cruzi marinkellei, encontrado apenas em morcegos no Continente americano.[8][9]

Distribuição geográfica[editar | editar código-fonte]

O T. cruzi ocorre naturalmente do sul dos Estados Unidos até a Argentina, sendo relativamente incomum na bacia amazônica.[10]

Morfologia[editar | editar código-fonte]

Formas amastigotas em um coração de macaco.

O T. cruzi é um protozoário unicelular e parasita obrigatório.[10] Possui um único flagelo e uma única mitocôndria, alongada e terminada num cinetoplasto, que contêm o DNA mitocondrial. Apresenta alternância de formas celulares durante seu ciclo biológico, sendo as principais: tripomastigota, forma em formato de C e flagelada; epimastigota, forma flagelada encontrada apenas no vetor, com capacidade reprodutiva; e amastigota, forma intracelular, sem flagelo, encontrada no hospedeiro vertebrado com capacidade reprodutiva.[11] É um protozoário pequeno medindo cerca de 16.3 - 21.8 μm de comprimento, incluindo o flagelo, na sua forma tripomastigota.[1]

Biologia[editar | editar código-fonte]

A espécie possui um ciclo evolutivo heteroxênico, com hospedeiros vertebrados e invertebrados.[11] Em função desse ciclo digenético, Trypanosoma cruzi desenvolveu mecanismos adaptativos que permitem que o parasita sobreviva às diversas mudanças físico-químicas na passagem de um hospesdeiro para outro.

Os hospedeiros invertebrados são insetos da subfamília Triatominae, distribuída por todo o continente americano. Mais de 72 espécies foram encontradas com infecção natural por Trypanosoma cruzi, e outras 10 foram infectadas experimentalmente.[12] As espécies dos gêneros Triatoma, Rhodnius e Panstrongylus estão entre os principais vetores envolvidos na transmissão do T. cruzi.[13] Especificamente, cinco espécies são consideradas as mais notórias na transmissão da doença de Chagas, pela capacidade de colonizar e adaptar-se às habitações humanas, são elas: Triatoma infestans, Triatoma brasiliensis, Triatoma dimidiata, Panstrongylus megistus e Rhodnius prolixus.[10]

Ao contrário das outras espécies do subgênero Schizotrypanum, o T. cruzi tem um amplo espectro de hospedeiros, sendo reportada a infecção em mais de 150 espécies de mamíferos. Todos os mamíferos são considerados susceptíveis à infecção, enquanto aves e répteis aparentemente não são susceptíveis.[1] Marsupiais e tatus são os reservatórios silvestres mais importantes, enquanto cães, gatos, ratos e camundongos atuam como reservatórios domésticos.[11] As taxas de prevalência do T. cruzi em outros animais domésticos, como porcos, cavalos, bois e cabras, são geralmente muito baixas.[10]

Ciclo evolutivo: 1 Um inseto vetor triatomíneo infectado ao alimenta-se de sangue, elimina pelas fezes, tripomastigotas próximo do local da picada. Os tripomastigotas entram no hospedeiro através do ferimento da picada ou por mucosas intactas. 2 Dentro do hospedeiro, os tripomastigotas invadem células próximas ao ponto de entrada onde diferenciam-se nas formas intracelulares, os amastigotas. 3 Os amastigotas multiplicam-se por divisão binária. 4 Então diferenciam-se em tripomastigotas e são liberados na circulação sanguínea. Os tripomastigotas infectam células de uma grande variedade de tecidos e transformam-se em amastigotas intracelulares, num ciclo infectante contínuo. 5 O triatomíneo infecta-se ao ingerir sangue de um hospedeiro vertebrado contendo parasitas circulantes. 6 Os tripomastigotas ingeridos transformam-se em epimastigotas no intestino médio do vetor. 7 Multiplicando-se por divisão binária. 8 No intestino posterior o parasita se diferencia na forma infectante, o tripomastigota metacíclico.[14]

Genética[editar | editar código-fonte]

T. cruzi está dividido em dois grandes grupos: T. cruzi I e T. cruzi II. Este último por sua vez se divide em cinco grupos menores: T. cruzi IIa, IIb, IIc, IId e IIe. T. cruzi II está mais associado aos casos crônicos a doença de Chagas, especialmente no cone sul da América do Sul.[15] O consenso mais recente[16] divide intraespecificamente em seis grupos gerais: TcI, TcII, TcIII, TcIV, TcV e TcVI. Cada grupo é predominante em regiões diferentes da América, sendo que a patogenicidade em humanos e a relação com cada grupo depende da região em que determinado isolado foi encontrado.

Referências

  1. a b c d Stevens, J.R.; Brisse, S. (2004). Maudlin, I.; Holmes, P.H.; Miles, M.A., ed. The Trypanosomiasis. Cambridge: CABI Publishing. p. 1-23. ISBN 0-85199-475-X  line feed character character in |seção= at position 43 (ajuda)
  2. Chagas, C (1909). «Neue Trypanosomen». Vorläufige Mitteilung Arch Schiff Tropenhyg. 13: 120–122 
  3. O Globo (23 de março de 2012). «Médico e barbeiro de fama mundial». Revista Pacheco. Consultado em 26 de junho de 2014 
  4. Chagas, C. (1909). «Nova tripanozomiase humana: Estudos sobre a morfolojia e o ciclo evolutivo do Schizotrypanum cruzi n. gen., n. sp., ajente etiolojico de nova entidade morbida do homem». Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. 1 (2): 159–218. ISSN 0074-0276. doi:10.1590/S0074-02761909000200008 
  5. Delanoë, P.; Delanoë, M. (1912). «Sur les rapports des kystes de Carini du poumon des rats avec le Trypanosoma lewisi». Comptes rendus de l'Academie des sciences. 155: 658–661 
  6. Chagas, C. (1913). «Revisão do cyclo evolutivo do "Trypanosoma Cruzi"». Brazil-Médico. 27. 225 páginas 
  7. Redhead, S.A.; Cushion, M.T.; Frenkel, J.K.; Stringer, J.R (2006). «Pneumocystis and Trypanosoma cruzi: nomenclature and typifications». Journal of Eukaryotic Microbiology. 53 (1): 2–11. doi:10.1111/j.1550-7408.2005.00072.x 
  8. Baker, J.R.; Miles, M.A.; Godfrey, D.G.; Barrett, T.V. (1978). «Biochemical characterization of some species of Trypansoma (Schizotrypanum) from bats (Microchiroptera)». The American Journal of Tropical Medicine and Hygiene. 27 (3): 483-491 
  9. Hamilton, P.B.; Teixeira, M.M.G.; Stevens, J.R. (2012). «The evolution of Trypanosoma cruzi: the 'bat seeding' hypothesis». Trends in Parasitology. 28 (4): 136-141 
  10. a b c d Miles, M.A (2009). Cook, G.C.; Zumla, A.I., ed. Mason's Tropical Diseases 22 ed. Filadélfia: W.B. Saunders. p. 1327-1340. ISBN 978-1-4160-4470-3 
  11. a b c Lana, M.; Tafuri, W.L. (2001). Neves, D.P., ed. Parasitologia Humana 11 ed. São Paulo: Atheneu. p. 85-108. ISBN 8573797371 
  12. Marcondes, C.B. (2001). «Hemípteros (Triatomíneos e Cimicídeos)». Entomologia Médica e Veterinária. São Paulo: Atheneu. p. 239-262 
  13. Costa, J.; Peterson, T.A. (2011). «Ecological niche modeling as a tool for understanding distributions and interactions of vectors, hosts, and etiologic agents of Chagas disease». Advances in Experimental Medicine and Biology. 710: 59-70. doi:10.1007/978-1-4419-5638-5_7 
  14. «DPDx – Trypanosomiasis, American. Fact Sheet» (em inglês). Centers for Disease Control (CDC). Consultado em 6 de julho de 2014 
  15. Souto, R.P.; Fernandes, O.; Macedo, A.M.; Campbell, D.A.; Zingales, B. (1996). «DNA markers define two major phylogenetic lineages of Trypanosoma cruzi». Mol. Biochem. Parasitol. 83 (2): 141–152. doi:10.1016/S0166-6851(96)02755-7 
  16. Zingales, B.; Andrade, S. G.; Briones, M. R. S.; Campbell, D. A.; Chiari, E.; Fernandes, O.; Guhl, F.; Lages-Silva, E.; Macedo, A. M. (novembro de 2009). «A new consensus for Trypanosoma cruzi intraspecific nomenclature: second revision meeting recommends TcI to TcVI». Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. 104 (7): 1051–1054. ISSN 0074-0276. doi:10.1590/S0074-02762009000700021 

Ver também[editar | editar código-fonte]

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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