Usuário:Yleite/Restrições adaptativas

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Restrições adaptativas são fatores que impedem que a evolução das adaptações seja perfeita simultaneamente em todos os níveis de organização, apesar da seleção natural levar à existência de organismos bem adaptados ao seu ambiente. Quando a seleção natural não puder operar de forma rápida, com mesma rapidez em que ocorrem as mudanças do ambiente de uma espécie, a adaptação será imperfeita. Segundo Maynard Smith (1978) “se não existissem restrições ao possível, o melhor fenótipo viveria para sempre, seria inatingível pelos predadores, e colocaria um número infinito de ovos e assim por diante”. Restrições são necessárias para se manter versatilidade adaptativa face à interdependências funcionais e complexidade fenotípica ou também que justifica porque a evolução não deve ser vista somente como sinônimo de progresso, já que uma mesma característica que garante o sucesso, em um determinado momento, pode não ser tão favorável em outro momento. Tanto a seleção natural quanto à restrição podem através de hipóteses explicarem a ausência de qualquer forma na natureza como também explica hipoteticamente as formas existentes. As restrições que impedem a evolução de adaptações perfeitas são classificadas como: temporal, genética, ao desenvolvimento e histórica.[1]

Restrição temporal[editar | editar código-fonte]

Preguiças-gigantes foram extintas há cerca de 10.000 anos

A evolução por seleção natural atua de forma lenta e gradual. Com isso, a seleção natural pode não acompanhar a evolução das adaptações, pois o tempo para que ocorram as mudanças necessárias para torná-las bem adaptadas pode não ser suficiente, permitindo que a adaptação seja imperfeita. Devido à evolução ser demorada, as adaptações frequentemente poderão ser imperfeitas. Como o ambiente das espécies muda quase que continuamente devido ao desvio com os quais as espécies competem e cooperam, a evolução das espécies é necessária para que se mantenham esses eventos e quando a sua distância até a adaptação ótima não é suficiente poderá se tornar defasada. Um exemplo ilustrativo seria plantas que produzem frutos que são adaptados de vários modos aos animais que são induzidos a serem agentes de dispersão. Esses frutos são atraentes e adaptados aos hábitos e à fisiologia de determinados animais, permanecendo no intestino por um período suficiente para que haja a dispersão a uma distância apropriada de sua origem. Tais adaptações evoluíram ao longo do tempo, permitindo que as plantas se adaptassem a diversos animais ao seu redor. Devido às grandes mudanças na fauna, ocorrem períodos em que as adaptações dos frutos ficam inadequadas e eles estão adaptados às formas anteriores de dispersão. Isso ocorre devido à seleção natural ser de forma lenta. A fauna das Américas do Norte e Central era composta, há mais ou menos 10 mil anos atrás, de grandes herbívoros, como preguiça-gigante, urso gigante, grupos que possuíam um parentesco com mastodontes chamados gonfotérios, mamutes e cavalos, todos já extintos, mas árvores da qual se alimentavam ainda existem. Uma grande palmeira Sheelea rostrata ainda é encontrada na floresta tropical da Costa Rica que produz grandes frutos, rijos e em grandes quantidades. A fauna presente composta de pecaris e pequenos mamíferos, como cutias, não é capaz de dispersar suas sementes para longe e de consumir seus frutos de forma suficiente. Como consequência, ocasiona um grande acúmulo e apodrecimento dos frutos na base das árvores. Seus frutos parecem estar mal adaptados aos pequenos mamíferos da fauna atual, porém os frutos estariam adaptados aos grandes herbívoros extintos. O tempo, 10 mil anos, parece não ser o suficiente para que a Scheelea rostrata ajustasse seus frutos ao tamanho dos herbívoros da fauna atual.[1]

As cutias são mamíferos roedores de pequeno porte, medindo entre 49 à 64 centímetros.

Restrição genética[editar | editar código-fonte]

Se em um heterozigoto estiverem presentes alelos com maior valor adaptativo em relação ao homozigoto, uma população tende à evolução para um equilíbrio onde os três genótipos estarão presentes e um grupo da população consequentemente será portador do genótipo deletério. Isso ocorre devido à herança mendeliana, onde os homozigotos não são capazes de produzir somente heterozigotos e quando os heterozigotos são mais vantajosos em relação aos homozigotos, caracteriza-se uma restrição genética. Uma manifestação de restrição genética e caracterizada pela anemia falciforme, que corresponde a uma hemoglobinopatia, onde uma cadeia anormal de hemoglobina (Hb S) é produzida.

Células de eritrócios com sua conformação normal

É uma anemia hereditária caracterizada pela presença de eritrócitos em forma de foice e pela hemólise acelerada devida à substituição de um único aminoácido da cadeia beta da hemoglobina. Os indivíduos homozigotos afetados apresentam anemia grave (anemia falciforme), enquanto os heterozigotos (que têm o caráter falciforme) normalmente não apresentam sintomatologia.[2]Esta doença surgiu nos países do centro-oeste africano, da Índia e do leste da Ásia, há cerca de 50 a 100 mil anos, entre os períodos paleolítico e mesolítico.[3] [4] A baixa tensão de oxigênio distorce a forma das hemácias, que sofrem hemólise, responsável pela anemia. As hemácias falciformes (Hb S) também são menos flexíveis que as hemácias normais (Hb A), o que leva a oclusões microvasculares, causando em homozigotos “crises” caracterizadas por episódios de dor intensa, infartos ósseos, úlcera de perna, associada à suscetibilidade aumentada às infecções bacterianas.[5] No entanto essa característica é comum em 40 % de populações negros residentes da África devido ao gene falciforme heterozigoto (Ss) que são mais resistentes a malária em relação ao gene homozigoto (SS).[6]

Células de eritrócitos com expressão do fenótipo para anemia falciforme

A malária e uma doença caracterizada pela infestação de protozoários de três espécies: Plasmodium falciparum, Plasmodium vivax e Plasmodium malariae, sendo transmitidos pela saliva das fêmeas através de picadas do mosquito Anopheles, transfusão de sangue contaminado pelo protozoário ou ainda pela mãe via cordão umbilical ao feto. O protozoário ataca e consequentemente destrói as células do fígado e hemácias durante a fase de reprodução essa degradação das células pelo parasita da malária resulta em aminoácidos que serão utilizados como fonte de nutrientes pelo protozoário. Haldane propôs que a malária pode ser o agente seletivo responsável que balanceia a perda dos genes para a anemia falciforme, por morte prematura dos homozigotos e aumento do valor adaptativo de heterozigotos no ambiente com malária.[7] Portanto, o valor adaptativo reprodutivo dos indivíduos homozigotos para a anemia falciforme (SS) diminuiria pela morte associado com a presença das células falcêmicas. Os indivíduos homozigotos normais (Hb AA) seriam desta forma mais afetados que os indivíduos heterozigotos para traços falcêmicos (Hb AS) pelos efeitos da malária. Evidencia se que há vantagem dos indivíduos Hb AS heterozigotos sobre os Hb AA homozigotos para anemia falciforme na resistência à malária caracterizando uma restrição genética.[1]

Restrição ao desenvolvimento[editar | editar código-fonte]

Uma restrição ao desenvolvimento pode ser definida como sendo uma limitação ou um desvia a variabilidade fenotípica sendo causado pela estrutura, caráter, posição ou dinâmica do sistema em formação. As mutações que possam surgir em alguns de seus caracteres serão influenciadas pelo modo em que ocorre o desenvolvimento do organismo ou pelo modo que diferentes organismos realizam mecanismos diferentes de desenvolvimento que podem promover variação nas taxas dos diferentes tipos de mutações. Um exemplo de restrição ao desenvolvimento é a pleiotropia, que corresponde aos múltiplos efeitos de um gene que controla várias características de um fenótipo. Um par de alelos pode codificar diversas características em um mesmo organismo ou ainda quando um gene pode expressar diversas características simultaneamente. Os genes dividem os caracteres de um organismo de forma diferente da observação humana. Por exemplo, o gene que codifica o comprimento de uma perna direita provavelmente controla o crescimento da perna esquerda possivelmente esse crescimento será controlado devido a um mecanismo de crescimento. Para se caracterizar uma restrição ao desenvolvimento seriam necessárias que as mutações alterassem ambas as pernas e que essa modificação fosse devido a algum mecanismo de desenvolvimento. Considerando que os genes influenciam os processos de desenvolvimento de um organismo e, uma modificação no seu desenvolvimento causará alteração em mais de uma parte de seu fenótipo. O segundo grupo de restrição ao desenvolvimento é causado por novas mutações que perturbam frequentemente o desenvolvimento de um organismo, que em alguns casos pode causar assimetria no desenvolvimento ou na forma de alguns organismos. Um exemplo de assimetria do desenvolvimento está presente nas moscas-varejeiras de ovelha da Austrália, quando os fazendeiros pulverizam inseticidas, as moscas logo evoluem e criam uma resistência. A primeira mutação resistente causa assimetria no desenvolvimento, sendo deletéria, mas não a ponte de sobre seleção contrária consequentemente à mutação aumenta de frequência. A seleção natural atua de forma a minimizar os efeitos causados pelo novo gene deletérios favorecendo nos genes em outros locos que mantém seus efeitos vantajosos e que possam reduzir as desvantagens causadas pelas novas mutações e que se harmonize com o desenvolvimento da mosca-varejeira, esse processo provavelmente seja importante para corrigir a regulação no desenvolvimento com a nova mutação. Os outros genes quem matem a resistência e que restauram a simetria no desenvolvimento são chamados de genes modificadores e o tipo de seleção é canalizadora. As restrições ao desenvolvimento têm sido frequentemente sugeridas com uma explicação alternativas á seleção natural através da persistência de espécies fósseis que em longos períodos de tempo permanecem inalterados em suas formas ou ainda através das variedades de forma existentes na natureza.

Outro tipo de restrição ao desenvolvimento pode ser demonstrado através do crescimento dos artrópodes. A curva de crescimento dos artrópodes demonstra um crescem por salto, quando seu exoesqueleto está rijo não ocorre crescimento, o tamanho corporal influência na termorregulação no poder de competição e na quantidade de comida consumida, porém nenhum desses fatores por explicar o crescimento dos artrópodes por saltos. A explicação mais plausível para a curva de crescimento dos artrópodes está na restrição do desenvolvimento que devido o crescimento por mudas ser perigoso, pois o organismo mais fica vulnerável, além de crescer em uma forma uniforme seria provavelmente muito arriscado.[1]

Seleção natural x restrição adaptativa[editar | editar código-fonte]

Para se definir se uma adaptação existe devido à seleção natural ou por restrição ao desenvolvimento, segundo Maynard Smith et. é necessária listarmos quatro possibilidades: Por previsão adaptativa, por medidas diretas de seleção, pela herdabilidade dos caracteres e por evidência comparada entre espécies.[1]

Previsão adaptativa[editar | editar código-fonte]
Conchas de gastrópodes

Se as hipóteses de adaptação sobre o formato das conchas de Raup demonstrou que de forma aprimorada e bem sucedida comparando a concha e o ambiente, quais as formas estarão presentes ou ausentes na natureza, os estudos de Raup analisou que as conchas poderiam ser caracterizadas pelas seguintes variáveis: a taxa de translação, e a distância da curvatura geradora até o eixo de enrolamento. A maior parte dos espaços de uma concha não está preenchida esses espaços podem ter surgidos pela seleção natural onde o morfoespaço corresponderia uma má adaptação e por restrição ao desenvolvimento seria provável de ocorrer, pois as modificações que alteraram essas conchas nunca ocorreram. Na falta de uma hipótese embriológica exata para explicar adaptação da concha isso tende a favor da seleção natural e contra a restrição ao desenvolvimento.[1]

Medidas diretas de seleção[editar | editar código-fonte]

Consiste em se criar, experimentalmente - podemos utilizar novamente o exemplo do morfoespaço das conchas confeccionando as conchas - que não existem naturalmente e testá-las como a seleção natural agiria sobre elas e observar se a seleção negativa atua sobre as conchas.[1]

Herdabilidade dos caracteres[editar | editar código-fonte]
Concha de um gastrópode

Através da medida da herdabilidade analisa-se a restrição está impedindo a mutação de um caráter que não poderia ser geneticamente variável. A variabilidade genética pode ser medida e a refutação da restrição se deve ao fato de apresentar herdabilidade significativa para qualquer caráter. Com essas evidências indicam que os espaços presentes nas conchas de Raup não seriam devido à restrição, pois foram realizadas medidas nas conchas e a variação genética encontrada foi bem significativa.[1]

Comparação entre espécies[editar | editar código-fonte]

Essa medida é utilizada principalmente quando a restrição ao desenvolvimento é devido à pleiotropia sendo medidos mais de um caráter e os valores encontrados estão em diferentes indivíduos realizando uma comparação um contra o outro como resultado quase sempre se encontra relacionados, esse resultado são encontrado quando comparados na mesma espécie ou em espécies diferentes. É utilizado frequentemente relação de alometria que corresponde comparação das medidas do corpo contra outro caráter qualquer. Frequentemente são encontrados relações alométricas quando se compara, por exemplo, o tamanho cerebral em contraste como o tamanho corporal em espécies de vertebrados os resultados são positivos. Um animal com o tamanho corporal pequenos seria possivelmente mais adaptados com um cérebro maior ou ainda o tamanho de seu cérebro não poderia ter nenhuma influência, pois o as mudanças relacionadas ao tamanho cerebral seriam um resultado correlacionado as modificações corporais (ou vice-versa) com isso as mutações que modifiquem um caráter seria motivada a alterar o outro. Huxley em 1932 com seus estudos propôs a seguinte hipótese para explicar as relações alométricas: " sempre que encontramos , relações alométricas, temos justificativa para concluir que o tamanho relativo do cifre, da mandíbula ou de outro órgão é determinado automaticamente como resultado secundário de um mecanismo comum de crescimento e, por isso, não tem significância adaptativa. Isto proporciona uma grande lista nova de caracteres genéricos e específicos não-adaptativos".[1]

Restrição histórica[editar | editar código-fonte]

A seleção natural não pode atua de forma a favorecer modificações que sejam momentaneamente desvantajosas, pois não há como prever que ao final se tornaria vantajosa, porem ela pode direcionar a um ótimo em um local onde se torna anexada, pois pequenas mudanças não seriam vantajosas ou por adaptação que são seletivamente neutras. As adaptações imperfeitas atuais de algumas espécies provavelmente se devem ao fato de seus ancestrais sofrerem acidentes históricos em uma direção que posteriormente se tornou a errada.

Girafa

Um exemplo que caracteriza esse fato é o nervo laríngeo presente nas girafas que corresponde ao quarto nervo vago craniano que surgiu nos ancestrais de peixes. Nos peixes esse nervo vago passa por trás dos arcos arteriais e segue em direção as brânquias. Já nos mamíferos, ao longo do tempo evolutivo, se transformou no sexto arco branquial evoluindo no ducto arterial próximo ao coração. Nos mamíferos o arco branquial foi modificado com isso o espaço percorrido pelo nervo laríngeo é muito maior descendo do cérebro, passando pelo pescoço, contornando a aorta dorsal e retornando para a laringe em humanos corresponde em 30 cm a 60 cm. Nas girafas o desvia percorre uma distância muito maior abaixo e cima do pescoço provavelmente esse desvia é desnecessário devido a custo para formá-lo e o gasto energético para a transmissão de impulsos e as resposta enviada percorre uma maior distância ao longo do nervo. A imperfeição permanece por não ter ocorrido outra mutação que favorecesse uma reorganização embrionária que promovesse o direcionamento do nervo vago do cérebro para a faringe. Essa imperfeição seguiu através da seleção natural que atuou em um curto prazo de tempo e promoveu modificações onde cada passo ocorre alterando uma forma que pré-existiu.[1]

Referências

  1. a b c d e f g h i j Ridley, Mark. Evolução. 3a. ed. Porto Alegre: ArtMed Editora,2006.
  2. STEDMAN Dicionário médico (Ed) 25a ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1996.
  3. Naoum, P.C. Hemoglobinopatias e talassemias. Sarvier, 1997.
  4. WHO, Working Group – Hereditary anemias: genetics basis, clinical features, diagnosis and treatment. Bull. WHO, 60: 643-60, 1982.
  5. EMBURY SH: Anemia falciforme e hemoglobinopatias associadas. In: Bennett JC, Plum F (Ed). Cecil tratado de medicina interna. 20ª ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1997.
  6. STEBBINS, G.L., Processos de evolução orgânica, São Paulo, Polígono editora, 1970.
  7. Flint J, Serjeantson SW, Bana-Koiri J et al. High frequencies of α-thalassaemia are the result of natural selection by malaria. Nature 1986;321:744-50.