Criado-mudo
Uma mesa de cabeceira, também conhecida no Brasil como criado-mudo, é um pequeno móvel auxiliar usado para aparar objectos,[1] geralmente colocado ao lado da cama, servindo sobretudo para guardar os objectos que podem ser necessários durante a noite.[2]
Etimologia[editar | editar código-fonte]
A palavra criado-mudo tem origem provável na tradução literal da palavra inglesa dumbwaiter.[3] Embora atualmente signifique um pequeno elevador doméstico de carga, já teve o significado de móvel auxiliar para dispor de pratos e talheres. Segundo a Encyclopædia Britannica (edição de 1911), tais móveis tiveram origem em Inglaterra no final do século XVIII.[4] Na língua inglesa, essa palavra é atestada desde 1749.
No Diccionario brazileiro da lingua portugueza, de Antônio Joaquim de Macedo Soares, publicado em 1889, o termo surge como sinônimo de bidé e "velador", descrito como "móvel de quarto de dormir, colocado ao pé da cama, e sobre o qual se bota o castiçal com a vela, a caixa de fósforos, o copo de água, etc.; tem tampo de mármore, gavetinha, e duas prateleiras com porta onde se guardam urinois". Antes disso, o termo usado para o móvel era donzella.[5]
É um termo composto, derivando, por analogia, do substantivo criado, por ser um móvel auxiliar, e silencioso, ou seja, mudo.[1][6]
O desuso do termo "criado-mudo"[editar | editar código-fonte]
No Brasil, em 2019, uma campanha do Dia da Consciência Negra da Etna, rede de decoração e móveis que existiu até 2022, mencionava que o termo "criado-mudo" tinha origem racista. O vídeo da campanha explicava a relação entre a origem do móvel e a existência de servos escravizados que ficariam a noite do lado da cama dos seus senhores para servir objetos como roupas e copos d'água. A campanha teve um grande sucesso viral, a ponto do nome "criado-mudo" ter sido citado em várias listas de termos relacionados ao racismo nos anos seguintes.[7][8]
Entretanto, a veracidade da história da campanha tem sido questionada por especialistas em etimologia, linguística e historiadores. O fato do termo donzella ser usado durante o período escravagista do Brasil, a provável origem da tradução do dumbwaiter anglófono - idiomas como o alemão usam termos equivalentes - e especialmente a inviabilidade de deixar uma pessoa escravizada tão próxima dos senhores de escravos nos seus quartos enquanto dormiam - um momento de vulnerabilidade física destes - geraram discussões sobre o que de fato é verdade na campanha - se é que há - ou se ela foi uma estratégia de marketing. Existem poucos registros ligando o criado-mudo ao racismo na internet antes da campanha da Etna, que acabou sendo acusada posteriormente de desinformação.[9][10][5][11][12]
Há, também, especialistas que defendem que, uma vez que o termo "criado" para se referir a trabalhadores domésticos ganhou força no século XIX - período que o móvel era chamado donzella - o nome criado-mudo pode sim ter relação com servos, podendo ou não serem escravizados[9], apesar da palavra ainda poder carregar uma característica de desumanização dos trabalhadores e relação com o período escravagista.[5]
Como consequência direta da campanha, outras empresas, incluindo concorrentes da Etna, se engajaram e passaram a nomear o móvel com o sinônimo "mesa de cabeceira", levando o termo a, na atualidade, ser o mais usado para o móvel comercialmente.[13]
Ver também[editar | editar código-fonte]
Referências
- ↑ a b Oliveira, Maria Lilia Simões de (2001). «A METÁFORA COMO LEITURA NA OBRA DE BARTOLOMEU CAMPOS QUEIRÓS». Soletras (1)
- ↑ Infopédia. «Definição ou significado de mesa de cabeceira no Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa». Infopédia - Dicionários Porto Editora. Consultado em 25 de novembro de 2019
- ↑ «criado-mudo | Palavras | Origem Da Palavra»
- ↑ Encyclopædia Britannica. [S.l.: s.n.] 1911
- ↑ a b c «Criado-mudo é expressão racista? Entenda a polêmica e o mistério por trás do termo». CNN Brasil. 21 de janeiro de 2023. Consultado em 19 de março de 2024
- ↑ «dumb-waiter | Origin and meaning of dumb-waiter by Online Etymology Dictionary» (em inglês)
- ↑ «Marca de móveis tira a palavra 'criado-mudo' de seu catálogo». CartaCapital. 21 de novembro de 2019. Consultado em 19 de março de 2024
- ↑ «Etna deixa de usar termo racista 'criado-mudo' em catálogo». Catraca Livre. 21 de novembro de 2019. Consultado em 19 de março de 2024
- ↑ a b «Criado-mudo é uma expressão racista? Entenda a polêmica». Aventuras na História. 20 de janeiro de 2023. Consultado em 19 de março de 2024
- ↑ «Criado-mudo é um termo racista?». Casa Vogue. 21 de janeiro de 2023. Consultado em 19 de março de 2023
- ↑ «A polêmica do cancelamento de palavras». Super. 21 de janeiro de 2022. Consultado em 19 de março de 2024
- ↑ «Criado-mudo: racismo histórico ou campanha contemporânea para vender móveis?». Oeste Mais. 22 de maio de 2023. Consultado em 19 de março de 2024
- ↑ «Painel S.A.: Lojas de móveis mudam nome de criado-mudo após considerar termo racista». Folha de S.Paulo. 24 de janeiro de 2019. Consultado em 19 de março de 2024