Prisão preventiva
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A prisão preventiva é uma medida de natureza cautelar decretada pela autoridade judiciária competente, não se confundindo com uma ação penal definida na sentença condenatória. É a sanção máxima que um suspeito de crime pode ter antes do julgamento e não se confunde com o cumprimento provisório da pena visto que, neste caso, já há uma decisão de mérito sobre a acusação formulada.
No Brasil
[editar | editar código-fonte]A prisão preventiva não viola a garantia constitucional de presunção de inocência,[1] se a decisão for devidamente motivada e a prisão for estritamente necessária nos termos dos artigos 311 a 316 do Código de Processo Penal.
É uma prisão cautelar que tem o objetivo de evitar que o acusado cometa novos crimes ou ainda que, em liberdade, prejudique a colheita de provas (destruição de evidências, intimidação de testemunhas, por exemplo) ou perigo de fuga. De acordo com o processualista Paulo Rangel, "se o indiciado ou acusado em liberdade continuar a praticar ilícitos penais, haverá perturbação da ordem pública, e a medida extrema é necessária se estiverem presentes os demais requisitos legais".[2]
Pode ser decretada inclusive na fase investigatória da persecução criminal, ou seja, durante o inquérito policial.
Código de Processo Penal
[editar | editar código-fonte]Segundo o Código de Processo Penal Brasileiro, arts. 311 a 316, pode ser decretada em qualquer fase do inquérito ou instrução criminal.(Vide nova redação dada pela Lei nº 12.403/2011).
A prisão preventiva poderá ser decretada:
- A requerimento do Ministério Público, querelante ou assistente.
- Mediante representação da autoridade policial competente.
O juiz não pode mais decretar a prisão preventiva de ofício, conforme a atualização realizada pela chamada Lei "Anticrime" (Lei n. 13.964/2019), que alterou o artigo 311 do CPP, com a seguinte redação:
"Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial."
Necessário prova da materialidade de crime e indícios suficientes de autoria (Fumus Commissi Delicti).
Motivos (fundamentos) para decretação (Periculum Libertatis):
- Garantia da ordem pública
- Garantia da ordem econômica
- Conveniência da instrução criminal
- Assegurar a aplicação da lei penal
- Assegurar o cumprimento de medida protetiva de urgência (art. 20 da Lei Maria da Penha - nº 11.340/06)
Cabíveis nas seguintes situações:
- Crimes dolosos (ação praticada com a intenção de violar o direito alheio), punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos (Art. 313,I, CPP) (a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado (...) Considera-se regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média, art. 33 caput e parágrafo 1º, "a" do CP);
- Se houver dúvidas sobre sua identidade civil ou não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la (Art. 313, parágrafo único, CPP);
- Crimes cuja punição é a pena privativa de liberdade;
- Se o réu já foi condenado por outro crime doloso com sentença transitada em julgado;
- Se o crime envolver violência doméstica contra a mulher;
- Não é cabível contra contravenção penal.
É vedada nos casos de Estado de Necessidade, Legítima Defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito (causas excludentes de ilicitude - art. 23 e incisos do CPB).
Pode ser revogada e decretada sempre que necessário (decisão rebus sic stantibus - conforme o estado da causa)
- Sua decretação ou negação deve ser fundamentada.
- A apresentação espontânea do acusado não impede sua decretação.
- Cabe recurso em sentido estrito contra despacho que indeferir requerimento de prisão preventiva.
Casos notáveis
[editar | editar código-fonte]Em fevereiro de 2010, José Roberto Arruda tornou-se o primeiro governador de uma unidade da Federação brasileira, o Distrito Federal, a ser preso durante o exercício do cargo, sob forte comoção nacional e internacional. Foi uma prisão preventiva, com a declarada intenção de impedir que o acusado destruísse provas.
Após o encerramento das provas orais no inquérito, o ex-governador foi posto em liberdade, tendo sido revogada a sua prisão preventiva pelo órgão especial do Superior Tribunal de Justiça.[3]
Já no caso Isabella Nardoni, os acusados ficaram presos temporariamente, durante as investigações preliminares. Mais tarde, foram postos em liberdade. Encerrado o inquérito policial e colhidas provas, foi oferecida a ação penal com pedido de prisão preventiva. Os réus foram pronunciados e presos preventivamente. Responderam a todo o processo ainda presos (diversos pedidos de habeas corpus foram rejeitados). Ambos foram condenados pelo Tribunal do Júri e aguardaram, ainda sob prisão preventiva, o julgamento, pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, da apelação interposta.
No contexto da Operação Lava Jato e da Prisão de Luiz Inácio Lula da Silva, ficou conhecido nos meios de comunicação o "princípio Lula", um entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de que uma pessoa não pode ser presa (por condenação ou preventivamente) por qualquer "atraso da justiça".[4] O entendimento jurídico utilizado em favor de Lula tem sido aplicado a outros presos condenados ou presos preventivamente com base no erga omnes, de que o ato jurídico vale para todos.[5] Foi utilizado em 23 de março de 2018 pelo juiz da oitava vara criminal da Brasília Osvaldo Tovani para soltar um acusado de roubo e preso preventivamente.[6][7] O mesmo princípio foi citado pelo promotor Valmir Soares Santos, do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT), ao pedir em 24 de março de 2018 a soltura de uma pessoa presa preventivamente desde janeiro por ter roubado um carro.[8][9] Em 22 de março o STF julgou um habeas corpus preventivo;[10] pelo entendimento da corte, para prisão em segunda instância o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) poderia emitir mandado de prisão contra o ex-presidente após o último recurso julgado no em 26 de março.[11] No entanto, o "princípio Lula" impediu que TRF4 executasse a sentença de prisão.[12][10] A jurista Janaina Paschoal, autora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff afirmou que a "sessão que deu liminar proibindo a prisão de Lula foi um banho de água fria e parecia combinada" e que "foi um dia muito triste para a cidadania".[13] A decisão do Supremo também foi alvo de críticas de procuradores da República e procuradores da Lava Jato. Um dos procuradores, Carlos Fernando de Lima, chegou a fazer um desabafo em sua página numa rede social: “O silêncio dos bons é a causa da audácia dos maus”.[14]
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/Constituicoes_Brasileiras/constituicao1988.html/ConstituicaoTextoAtualizado_EC84.pdf Constituição da República Federativa do Brasil]. Art 5º, inciso LVII - "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"; inciso LXI - "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei."
- ↑ RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 12. ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 613.
- ↑ Por 8 a 5, STJ decide pela liberdade de ex-governador do Distrito Federal. G1, 12 de abril de 2010
- ↑ Noblat, Ricardo. «O "Princípio Lula"». Veja. Abril. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ Costa, Camilla (5 abril 2018). «'Erga omnes' ou 'Stare decisis'? Um manual para entender a língua do STF». BBC Brasil. Consultado em 7 de agosto de 2019
- ↑ «'Princípio Lula' leva Justiça a soltar acusado de roubo em Brasília». Jornal do Brasil. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ «Justiça solta ladrão com base no 'princípio Lula'». Yahoo. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ Mariana Muniz. «Promotor do DF pede soltura de preso com base no 'Princípio Lula'». Jota. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ «"Princípio Lula": juiz do DF solta preso com base em decisão do STF». Metrópoles. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ a b «Mohallem: "STF salva Lula ao conceder habeas corpus, mas reforça a imagem de elitismo no sistema"». El País. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ Junqueira, Diego; Skodowski, Thais. «Tribunal rejeita recurso de Lula e prisão depende do STF». R7. Record. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ «STF evita prisão de Lula até 4 de abril». El País
- ↑ «Dia muito triste para cidadania, diz Janaína Paschoal sobre caso Lula». Radio Jornal. Uol. Consultado em 26 de março de 2018
- ↑ «Decisão do STF sobre habeas corpus contraria força-tarefa de Curitiba». O Globo. Globo. 23 de março de 2018
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- A inconstitucionalidade da prisão preventiva decretada como garantia da ordem pública. Por Renato Perrotta de Souza. Rio de Janeiro: Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, 2013.
- A inconstitucionalidade da prisão preventiva decretada sob o fundamento do clamor público. Por Bianca Moreira Dutra. Jus navigandi, outubro de 2014.
- Crise de identidade da "ordem pública" como fundamento da prisão preventiva. Por Aury Lopes Jr e Alexandre Morais da Rosa. Consultor Jurídico, 6 de fevereiro de 2015.