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Eutanásia é o ato intencional de proporcionar a alguém uma morte indolor para aliviar o sofrimento causado por uma uma doença incurável ou dolorosa.[1][2][3][4] Geralmente a eutanásia é realizada por um profissional de saúde mediante pedido expresso da pessoa doente.[5] A eutanásia é diferente do suicídio assistido, que é o ato de disponibilizar ao paciente meios para que ele próprio cometa suicídio.[6] Entre os motivos mais comuns para que levam os doentes terminais a pedir uma eutanásia estão a dor intensa e insuportável e a diminuição permanente da qualidade de vida por condições físicas como paralisia, incontinência, falta de ar, dificuldade em engolir, náuseas e vómitos.[5] Entre os fatores psicológicos estão a depressão e o medo de perder o controlo do corpo, a dignidade e independência.[5]

A eutanásia pode ser classificada em voluntária e involuntária. Na eutanásia voluntária é a própria pessoa doente que, de forma consciente, expressa o desejo de morrer e pede ajuda para realizar o procedimento. Na eutanásia involuntária a pessoa encontra-se incapaz de dar consentimento para determinado tratamento e essa decisão é tomada por outra pessoa, geralmente cumprindo o desejo anteriormente expresso pelo próprio doente nesse sentido.[6][7] A eutanásia pode também ser classificada em ativa e passiva. A eutanásia ativa é o ato de intervir de forma deliberada para terminar a vida da pessoa (por exemplo, injetando uma dose excessiva de sedativos). A eutanásia passiva consiste em não realizar ou interromper o tratamento necessário à sobrevivência do doente.[6][7]

A eutanásia está no centro de um intenso debate público com diversas considerações de ordem religiosa, ética e prática. Estas considerações têm origem em diferentes perspetivas sobre o significado e valor da vida humana.[5] Entre os argumentos a favor da prática da eutanásia estão a a alegação de que as pessoas têm o direito a tomar decisões sobre o seu corpo e escolher como e quando querem morrer, que o direito à morte está implícito nos restantes Direitos Humanos, que a lei não deve interferir em assuntos da esfera privada que não prejudiquem outras pessoas, que a eutanásia continua a ser praticada mesmo que ilegal e que a morte não é necessariamente má.[8][7] Entre os argumentos contra a prática de eutanásia estão a alegação que a eutanásia é contra a vontade de Deus, que não respeita a inviolabilidade da vida, que desvaloriza o valor da vida, de que a permissão da eutanásia voluntária levaria a casos de eutanásia involuntária e de que cuidados paliativos de qualidade retiram a necessidade de praticar eutanásia.[9][7] Algumas pessoas alegam que, ainda que moralmente justificável, a eutanásia pode ser abusada para encobrir um homicídio.[5]

Na maior parte dos países não existe legislação específica sobre a eutanásia, pelo que a eutanásia realizada pelo próprio doente é geralmente considerada suicídio e a eutanásia realizada por outra pessoa homicídio. No entanto, dentro da lei o médico pode decidir não prolongar a vida em casos de sofrimento extremo e administrar sedativos mesmo que isto diminua a esperança de vida do doente.[1] Tanto a eutanásia voluntária como o suicídio medicamente assistido são legais na Holanda, Bélgica, Luxemburgo e Colômbia. O suicídio assistido é ainda legal na Suíça, Alemanha, Canadá, África do Sul e em cinco estados dos Estados Unidos.[10] No entanto, a eutanásia involuntária é ilegal em todos os países do mundo e geralmente considerada homicídio. Mesmo nos países em que a eutanásia voluntária é legal, continua a ser considerada homicídio se não estiverem cumpridas determinadas condições.[11][12][13][14] A noção de que a eutanásia é moralmente aceitável remonta a Sócrates Platão e ao Estoicismo. O primeiro país a legalizar a eutanásia foi a Holanda em 2001.[1]

Terminologia[editar | editar código-fonte]

O suicídio assistido consiste na disponibilização, por parte do médico, de meios para que o paciente possa cometer suicídio. Enquanto na eutanásia quem pratica o ato que leva à morte é o médico, no suicídio assistido o ato é praticado pelo próprio doente. O suicídio assistido geralmente consiste na prescrição de uma dose letal de sedativos que proporcionem uma morte indolor. Ao contrário da interrupção do tratamento, não existe consenso sobre a legitimidade da prática de suicídio assistido, sendo proibido na maior parte dos países. O debate questiona se estas proibições devem ou não ser levantadas.[15]

Ao contrário do suicídio medicamente assistido, na eutanásia é o médico a praticar o ato que resulta na morte do doente. A eutanásia pode ser classificada em voluntária, involuntária ou não voluntária. A eutanásia voluntária é a que é realizada a pedido do próprio doente. A eutanásia involuntária é a que é realizada apesar das objeções do doente. A eutanásia não voluntária é a que ocorre quando não foi procurado consentimento do doente ou o doente não tem capacidade de decidir.[15]

Sedação paliativa ou profunda é a sedação de um paciente até um estado de inconsciência mantendo nutrição artificial. Quando a sedação profunda é necessária para aliviar a dor ou os sintomas e o doente concorda com ela, a prática é considerada aceitável e não é considerada eutanásia. No entanto, a prática implica a perda de capacidade em comunicar, outro dos principais objetivos dos cuidados paliativos.[15]




Debate[editar | editar código-fonte]

O debate público e académico sobre a morte medicamente assistida surge apenas no fim do século XX e início do século XXI. Isto é o reflexo de uma alteração significativa na epidemiologia da mortalidade humana. Enquanto ao longo da História as principais causas de morte estavam associadas a doenças infeciosas e parasitárias e a esperança de vida era de cerca de 20–40 anos, atualmente dois terços das mortes nos países desenvolvidos são causadas por doenças degenerativas, particularmente doenças cardiovasculares e cancro, e a esperança de vida é de mais de 80 anos. A maior parte da população nos países desenvolvidos atualmente morre em estádios avançados de doenças degenerativas, cuja evolução é previsível e são marcadas por uma fase terminal.[16]

No debate sobre a legitimidade da prática de eutanásia e suicídio medicamente assistido, os principais argumentos a favor são a autonomia da pessoa em tomar decisões sobre o próprio corpo e o alívio da dor e do sofrimento. Os principais argumentos contra são que matar é intrinsecamente errado, a integridade da profissão médica e o potencial de abuso (slippery slope).[16]


Argumento da autonomia[editar | editar código-fonte]

O argumento da autonomia defende que, da mesma forma que a pessoa tem o direito de auto-determinação ao longo de toda a vida, também deve poder determinar tanto quanto possível o curso da sua própria morte. Os proponentes alegam que, se um doente terminal pedir a assistência de um médico de forma voluntária e consciente, deve ser permitido ao médico poder realizar o ato.[17]

Uma das objeções a este argumento alega que numa fase terminal da vida é impossível haver verdadeira autonomia de decisão, uma vez que as decisões podem ser influenciadas por pressões sociais, depressão e perturbações psiquiátricas. Em resposta, os proponentes do argumento da autonomia alegam que todas as decisões são influenciadas por fatores sociais mas que, ainda assim, devem ser respeitadas e que mesmo no fim da vida é possível tomar decisões informadas. Outra objeção alega que o suicídio é moralmente errado, pelo que não é possível obrigar um médico a praticar um ato moralmente errado, mesmo que o pedido seja feito de forma voluntária e racional. Em resposta a esta objeção, os proponentes sustentam que o argumento não obriga o médico a praticar o ato, mas apenas lhe dá liberdade para o fazer de acordo com as suas convicções.[17]

Argumento de que matar é intrinsecamente errado[editar | editar código-fonte]

Matar é proibido e considerado moralmente errado em praticamente todas as religiões, culturas e sistemas sociais. Uma vez que o suicídio é um ato de matar, os proponentes deste argumento sustentam que também o suicídio medicamente assistido é intrinsecamente errado do ponto de vista moral, pecado, tabu ou castigado por Deus.[18]

Embora todas as religiões se oponham ao suicídio, na Europa e América do Norte é a religião Católica que tem sido mais ativa no debate contra a eutanásia. O catolicismo considera que a vida é uma dádiva de deus e não permite o suicídio, nem mesmo nos casos de doença terminal.

Posição da igreja anglicana

en:Kevin Wildes John Finnis

Uma das objeções a este argumento alega que existem situações onde o ato de matar pode ser moralmente aceitável, como em auto-defesa, guerra ou pena de morte. Se pode ser moralmente aceite nesses casos, também pode ser aceite em casos em que é a própria pessoa que toma a decisão informada e voluntária de morrer para terminar com o seu sofrimento. Em resposta a esta objeção, os proponentes do argumento alegam que nos casos de auto-defesa, guerra ou pena capital a pessoa morta é culpada de agressão ou ação imoral, enquanto na morte medicamente assistida a pessoa é inocente.[19]

Argumento da integridade da profissão[editar | editar código-fonte]

Os proponentes deste argumento alegam que o Juramento de Hipócrates proíbe os médicos de matar doentes e que a função dos médicos é salvar vidas, e não terminá-las.[20]

Uma das objeções a este argumento considera que o juramento original também proibia os médicos de realizar cirurgias, de administrar medicamentos indutores de aborto e de cobrar dinheiro por exercer medicina. Se o juramento foi modificado para contemplar estes casos, também o pode ser para os casos em que o paciente tem uma doença terminal e pede ajuda ao médico. Os proponentes contrapõem a esta objeção a alegação de que permitir ao médico matar o doente subverteria a relação de confiança entre ambos. Os que se posicionam contra este argumento alegam o contrário, de que a relação de confiança aumenta se o paciente souber que terá ajuda do médico nas decisões que tomar em relação à morte.[21]

Argumento do potencial de abuso (slippery slope)[editar | editar código-fonte]

Os proponentes deste argumento alegam que permitir aos médicos assistir o suicídio, mesmo que em casos justificáveis, pode no futuro levar a situações em que os pacientes são mortos contra a sua vontade.[22]

Uma das objeções a este argumento sustenta que a suposição deve ser demonstrada com factos antes de se suprimir escolhas pessoais e direitos individuais. Os proponentes rejeitam esta objeção alegando que a previsão se baseia na pressão económica, ganância, preguiça, insensibilidade e outros fatores que influenciam médicos, instituições de saúde e a sociedade. Os objetores deste argumento alegam que com uma lei bem elaborada e medidas de controlo eficazes é possível proteger os doentes de eventuais abusos. Os proponentes alegam ainda que os doentes vulneráveis, como os doentes crónicos, doentes mentais e idosos, serão manipulados pela sociedade para que se considerem inúteis e forçados a terminar a vida. Os objetores deste argumento alegam que a opção de morte assistida será disponibilizada apenas aos doentes terminais e que nos países onde a morte assistida é legal não existem evidências de impacto significativo em grupos vulneráveis.[23]

Argumento do alívio da dor e sofrimento[editar | editar código-fonte]

Este argumento alega que nenhuma pessoa deve ser obrigada a submeter-se a um sofrimento injustificável durante uma doença terminal, e que deve ser dada a possibilidade de morte assistida nos casos em que o médico é incapaz de aliviar esse sofrimento de forma aceitável para o paciente e a única forma de evitar o sofrimento é através da morte.[24]

Uma das objeções a este argumento sustenta que com os cuidados paliativos modernos é possível evitar praticamente toda a dor e sofrimento. Os proponentes contrapõem que "praticamente toda" não é toda e que a eutanásia é reservada para os casos em que não existe outra possibilidade de aliviar a dor e sofrimento. Os objetores contrapõem que nesses casos é possível sedar completamente o doente. Os proponentes alegam que isso coloca o doente num estado de embotamento equivalente à morte. Outra objeção ao argumento do alívio do sofrimento alega que, mesmo com dor e sofrimento, o fim da vida pode ser um processo de intimidade e crescimento espiritual. Os proponentes contrapõem que não existe garantia de qualquer experiência transformadora ou positiva.[24]


Referências

  1. a b c «Euthanasia». Enciclopédia Britannica. Consultado em 25 de maio de 2018 
  2. «Eutanásia». Dicionário de Termos Médicos da Porto Editora. Consultado em 25 de maio de 2018 
  3. «Euthanasia». Dicionário Merriam-Webster. Consultado em 25 de maio de 2018 
  4. «Euthanasia». National Cancer Institute. Consultado em 25 de maio de 2018 
  5. a b c d e «Ethics of Euthanasia: Introduction». BBC. Consultado em 25 de maio de 2018 
  6. a b c «Euthanasia and Assisted Suicide». National Health Service. 29 de junho de 2017. Consultado em 25 de maio de 2018 
  7. a b c d Judith Phillips, Kristine Ajrouch, Sarah Hillcoat-Nallétamby (2010). Key Concepts in Social Gerontology. [S.l.]: Sage. pp. 91–96. doi:10.4135/9781446251058 
  8. «Euthanasia: Overview of pro-euthanasia arguments». BBC. Consultado em 25 de maio de 2018 
  9. «Overview of anti-euthanasia arguments». BBC. Consultado em 25 de maio de 2018 
  10. «Euthanasia Map». Kennedy Institute of Ethics, Georgetown University. Consultado em 29 de maio de 2018 
  11. Oluyemisi Bamgbose (2004). «Euthanasia: Another Face of Murder». International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology. 48 (1): 111–21. PMID 14969121. doi:10.1177/0306624X03256662 
  12. Concluding observations of the Human Rights Committee : Netherlands. 27 August 2001
  13. Carmen Tomás Y Valiente, La regulación de la eutanasia en Holanda, Anuario de Derecho Penal y Ciencias Penales – Núm. L, Enero 1997
  14. R Cohen-Almagor (2009). «Belgian euthanasia law: a critical analysis». J. Med. Ethics. 35 (7): 436–39. PMID 19567694. doi:10.1136/jme.2008.026799 
  15. a b c Kenny 2007, pp. 284-299.
  16. a b Battin 2005, p. 18.
  17. a b Battin 2005, p. 20.
  18. Battin 2005, pp. 21-22.
  19. Battin 2005, p. 21.
  20. Battin 2005, pp. 24–25.
  21. Battin 2005, p. 24.
  22. Battin 2005, p. 25.
  23. Battin 2005, pp. 25–26.
  24. a b Battin 2005, p. 29.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]