Vera Lagoa

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Vera Lagoa
Nome completo Maria Armanda Pires Falcão
Pseudônimo(s) Vera Lagoa
Nascimento 25 de dezembro de 1917
Ilha de Moçambique
Morte 19 de agosto de 1996 (78 anos)
Lisboa
Nacionalidade Portugal Portuguesa
Cônjuge Francisco António de Gusmão Fiúza (1 filho)

José Manuel Tengarrinha
José Rebordão Esteves Pinto

Ocupação Jornalista, cronista e empresária
Magnum opus Revolucionários que Eu Conheci

Vera Lagoa (pseudónimo de Maria Armanda Pires Falcão), (Ilha de Moçambique, 25 de Dezembro de 1917Lisboa, 19 de Agosto de 1996), foi uma jornalista, cronista e empresária portuguesa. Foi a primeira locutora da televisão em Portugal. Foi a primeira jornalista a ser processada por um presidente da república.[1][2][3]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Primeiros anos[editar | editar código-fonte]

Maria Armanda Falcão nasceu em Moçambique quando esta ainda era colónia de Portugal, filha de Armando Augusto Pires Falcão (Lisboa, São Sebastião da Pedreira, 21 de Novembro de 1880), oficial do exército, e de sua segunda mulher Beatriz Lúcia (Lisboa, São José), e irmã de Armando Pires Falcão (Ilha de Moçambique, 18 de Agosto de 1916). Do primeiro casamento de seu pai, com Palmira Leopoldina de Pinho (Lisboa), tinha uma meia-irmã mais velha, Maria Isabel Pires Falcão (Lisboa, São José, 1905), casada na Ilha de Moçambique a 21 de Maio de 1921 com Fortunato Abrantes de Andrade Pissarra.[4][5]

Devido às prisões e deportações do seu pai durante a 1.ª República, Maria Armanda não teve oportunidade de prosseguir os estudos para além da 4.ª classe da instrução primária, sendo que a cultura e conhecimentos que depois adquiriu se ficaram a dever ao auxílio de amigos do seu pai e ao facto de ser autodidacta. Devido às dificuldades financeiras da sua família (o pai fora expulso do exército, no posto de major, tendo sido reintegrado postumamente, depois do 25 de Abril, no posto de coronel), Maria Armanda começou a trabalhar muito jovem, como secretária.

Primeira locutora da RTP[editar | editar código-fonte]

Apareceu ao lado de Raul Feio na primeira transmissão experimental da RTP do dia 4 de Setembro de 1956, já com quase 40 anos, na Feira Popular de Lisboa, então na Palhavã, onde hoje é a estação do metropolitano Praça de Espanha. Nesta noite, apresentou um documentário sobre ourivesaria. [6][7][8]

Tudo começou quando ela era secretária e estavam à procura de uma locutora. Foi falar com o responsável da emissora e disse-lhe que estava interessada nesse lugar. Passou nos testes, mas com uma condição: não podia aparecer de cabelo preto. Afirmou que a transmissão tinha corrido bem e os cenários eram tão simples que eram de plástico. Era tudo improvisado, com 20 televisores espalhados pela Feira. Como não havia o VT, a transmissão foi gravada em filme. Maria Armanda Falcão tinha todos os predicados para ser uma boa locutora, contudo, foi dispensada dessa função, por "excesso de personalidade": recusava-se a dizer, no final da emissão, «Até amanhã, se Deus quiser», por ser agnóstica. [1][9]

Maria Armanda Falcão opôs-se ao Estado Novo, ajudando os presos políticos e apoiando a candidatura de Humberto Delgado em 1958.[10][1]

Cronista social[editar | editar código-fonte]

Frustrada a sua carreira de locutora televisiva, tornou-se jornalista no Diário Popular, com a sua crónica social Bisbilhotices (título que ela detestava e que lhe foi imposto sem o seu conhecimento). Foi então que surgiu o seu pseudónimo Vera Lagoa, sugerido pelo seu amigo Luís de Sttau Monteiro, durante um jantar: 'Vera', por significar autêntica ou verdadeira, e 'Lagoa' por ser o nome do vinho que estava na mesa. Os seus artigos eram marcadamente irreverentes, e acabou por sair do Diário Popular, de relações cortadas com Francisco Pinto Balsemão, devido às constantes interferências censórias do administrador.[4][10][1][11][12]

Directora de O Diabo[editar | editar código-fonte]

Depois do 25 de Abril, durante algum tempo foi militante do Partido Socialista, mas depressa se desiludiu com o novo regime democrático. Mulher vertical, independente e insubmissa, conhecedora dos bastidores da sociedade portuguesa e de muitas das suas figuras destacadas da cultura da política, ficou revoltada com a quantidade de oportunistas e de hipócritas que dantes eram apoiantes, cumpridores e agradecidos do Estado Novo e que de um momento para o outro se tornaram vociferantes radicais da extrema-esquerda, perseguidores de quem não lhes seguisse o exemplo. Denunciou alguns deles no livro Revolucionários que Eu Conheci.[13]

Escreveu no semanário Tempo dirigido por Nuno Rocha, inflamados artigos contra o PREC e contra as figuras do regime, como Vasco Gonçalves ou Costa Gomes. Mais tarde, sentindo-se cerceada, saiu e em 10 de Fevereiro de 1976 fundou o seu próprio jornal, de que foi directora vitalícia, O Diabo, homónimo de um jornal dos anos 30, anti-salazarista. [14][15] [4]

«Não gosto de si. O senhor é muito feio!», assim terminava o editorial O senhor Gomes de Chaves, publicado n’O Diabo, em Fevereiro de 1976, sobre o então Presidente da República, Costa Gomes. Passadas poucas semanas, o Conselho da Revolução suspendia o jornal. [1][3]

Vera Lagoa cria então novo semanário, O Sol, com a mesma linha editorial, que sofreu um atentado à bomba logo depois dos primeiros números, tendo ficado com sequelas cardíacas. Mudou então a redacção e a impressão do jornal para o Porto, onde esteve durante algum tempo. A suspensão d'O Diabo terminara, entretanto, voltando a ser publicado a partir de 16 de Fevereiro de 1977.[10][1]

Mulher de causas, Vera Lagoa, defendeu as vítimas da descolonização e os injustiçados do PREC, como Antónia Ramalho, mãe de António Ramalho Fialho, o homem que foi, bárbara e arbitrariamente, assassinado a tiros de G3, juntamente com Conceição Santos, sua companheira de viagem, gravemente ferida, por militares às portas do RALIS, a 12 de Março de 1975[16], depois de terem ido ao local apreciar os danos causados pelo ataque da véspera. Foi a promotora das manifestações anuais patrióticas do feriado 1.º de Dezembro. Manifestou-se empenhadamente contra a reeleição de Ramalho Eanes em 1980, pelas suas atitudes políticas ambíguas, por ser apoiado pelos comunistas e por querer perpetuar o poder do Conselho da Revolução. Pugnou por uma investigação apurada à queda do avião que matou Sá Carneiro e seus acompanhantes, que, juntamente com Augusto Cid, ela considerava ter sido um atentado bombista.[17][3]

Vida pessoal[editar | editar código-fonte]

Foi casada com Francisco António de Gusmão Fiúza, José Manuel Tengarrinha e José Rebordão Esteves Pinto. Teve um filho do primeiro casamento, Armando Falcão de Gusmão Fiúza, e quatro netos: José Manuel Fiúza, Rita Fiúza (Al-Merei, pelo casamento), Pedro Fiúza e Clara Fiúza.[10]

Morreu de ataque cardíaco, em 1996, aos 78 anos.[4][1]

Obras[editar | editar código-fonte]

  • 1968 - Bisbilhotices [18]
  • 1975 - Crónicas do Tempo : 5-6-75 - 2-10-75 [19]
  • 1977 - Revolucionários que eu conheci [13][3]
  • 1978 - A cambada: crónicas da liberdade adaptadas e baseadas nos artigos da autora publicados em "O Diabo" - "O Sol", "O Pais" e "O Diabo" [20]
  • 1980 - Eanes nunca mais! [21]

Reconhecimento[editar | editar código-fonte]

Em 1977, o cartoonista José Vilhena publicou o livro Vera Lagoa meteu a pata na poça! que compilava uma série de fictícias respostas satíricas das personalidades visadas por Vera no seu livro Revolucionários que Eu Conheci.[1][22]

Foi capa da revista Nova Gente que substitui a revista Gente depois do 25 de Abril.[23]

É uma das personalidades referidas no livro Lisboa, Anos 70, de Joana Stichini Vilela, publicado em 2014.[24][25]

É também mencionada em livros como O Botequim da Liberdade, Faça-se Justiça!, Memórias da vida e da rádio de afectos, entre outros.[26][27][28]

Foi retratada na série 3 Mulheres do realizador português Fernando Vendrell pela actriz Maria João Bastos, que estreou na RTP em 2018. Snu Abecassis e Natália Correia foram as outras duas mulheres homenageadas pela série.[29][30][9]

Em 2021, foi lançada pela Oficina do Livro, a sua biografia escrita pela historiadora Maria João da Câmara.[31]

Uma das ruas da freguesia de São Domingos de Benfica (Lisboa), tem o seu nome.[32]

Referências

  1. a b c d e f g h «Vera Lagoa». NewsMuseum. 7 de abril de 2016. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  2. Vera Lagoa, a provocadora da esquerda e da direita, por Nuno Gonçalo Poças, Observador, 16 ago 2020
  3. a b c d «Livros que foram de notícia | Revolucionários que eu conheci». hemerotecadigital.cm-lisboa.pt. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  4. a b c d «Vera Lagoa». IMDb. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  5. Ferreira, Alexandre A. (2007). Moçambique, 1489-1975. [S.l.]: Prefácio 
  6. «RTP 50 anos». museu.rtp.pt. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  7. admin (21 de novembro de 2018). «Dia Mundial da Televisão». Multidados.com. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  8. «David Duarte». 16 de outubro de 2017. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  9. a b José Pinto Vieira, Rúben (2018). Séries Portuguesas: Diferenciação no Mercado Audiovisual (PDF). Lisboa: Faculdade de Ciências Sociais e Humanas 
  10. a b c d «Maria Armanda Falcão/Vera Lagoa (Maria João Bastos)». 3 Mulheres - RTP. 23 de outubro de 2018. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  11. «| Cc | PesqArquivo». casacomum.org. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  12. Dacosta, Fernando (17 de fevereiro de 2017). Amália. [S.l.]: Leya 
  13. a b «Revolucionários que eu conheci». catalogo.bn.pt. Biblioteca Nacional de Portugal. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  14. «Crónicas do Tempo». catalogo.bn.pt. Biblioteca Nacional de Portugal. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  15. «O DIABO». catalogo.bn.pt. Biblioteca Nacional de Portugal. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  16. Pedro Dordio (12 de setembro de 2015). «Foi há 40 anos: O dia-a-dia de Lisboa no caldeirão do PREC». https://observador.pt. Consultado em 7 de março de 2021 
  17. «Influência de Ramalho Eanes e a maior crise no PS - DN». www.dn.pt. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  18. «Bisbilhotices». catalogo.bn.pt. Biblioteca Nacional de Portugal. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  19. «Biblioteca Nacional de Portugal». catalogo.bn.pt. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  20. «A cambada: crónicas da liberdade». catalogo.bn.pt. Biblioteca Nacional de Portugal. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  21. Eanes, nunca mais!. [S.l.: s.n.] 
  22. Vera lagoa meteu a pata na poça: Respondem à acusações de "Vera lagoa" (em inglês). [S.l.]: Branco e Negro. 1977 
  23. Anastácio, Marina (2012). A IMPRENSA COR-DE-ROSA EM PORTUGAL – UMA ANÁLISE AO DISCURSO JORNALÍSTICO (PDF). Portalegre: Instituto Politécnico de Portalegre. p. 20 
  24. Vilela, Joana Stichini (9 de abril de 2014). Lisboa, anos 70. [S.l.]: Leya 
  25. «Lisboa, Anos 70 - eBook - WOOK». www.wook.pt. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  26. Dacosta, Fernando (7 de outubro de 2013). O Botequim da Liberdade. [S.l.]: Leya 
  27. Mota, Francisco Teixeira da (28 de fevereiro de 2012). Faça-se Justiça!. [S.l.]: Leya 
  28. Sala, António (27 de fevereiro de 2012). Memórias da Vida e da Rádio dos Afectos. [S.l.]: Leya 
  29. «"A persona que ela [Maria Armanda Falcão] criou de Vera Lagoa era construída muito sabiamente"». Máxima. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  30. Cardoso, Joana Amaral. «"Três Mulheres", a série em que Natália, Snu e Vera Lagoa devolvem os anos 1960 a Portugal». PÚBLICO. Consultado em 26 de agosto de 2020 
  31. «Vera Lagoa - Livro - WOOK». www.wook.pt. Consultado em 20 de julho de 2021 
  32. «Código Postal - Rua Vera Lagoa». Código Postal. Consultado em 26 de agosto de 2020 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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