A Vênus das Peles
Venus im Pelz | |
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A Vênus das Peles | |
Autor(es) | Leopold von Sacher-Masoch |
País | Áustria-Hungria |
Gênero | Novela erótica |
Série | O Legado de Caim |
Lançamento | 1870 |
A Vênus das Peles (título original: Venus im Pelz) é uma novela literária de 1870 e a obra mais famosa do escritor austríaco Leopold von Sacher-Masoch. A novela faz parte da coleção de livros de Sacher-Masoch chamada O Legado de Caim, na qual A Vênus das Peles faz parte do primeiro volume.
Antecedentes e desenvolvimento
[editar | editar código-fonte]Os temas centrais da obra, como dominação feminina e sadomasoquismo, foram fortemente inspirados na própria vida do autor. Wanda von Dunajew, a personagem feminina central, foi inspirada em Fanny Pistor, uma escritora literária emergente. Os dois se conheceram quando Pistor contatou Sacher-Masoch, sob o nome falso e título fictício de Baronesa Bogdanoff, para sugestões sobre como melhorar sua escrita para torná-la adequada para publicação.[1]
Durante seis meses, os dois acabaram se envolvendo num relacionamento de dominação e submissão e estabeleceram um contrato que dizia que Sacher-Masoch seria o servo de Pistor e que ela poderia puní-lo da maneira que achasse mais adequada, mas que usaria roupas de pele animal enquanto o dominava. O contrato, datado de 8 de dezembro de 1869, também previa que Sacher-Masoch pudesse separar uma pequena parte de seu dia para se dedicar à um trabalho que ele viria a escrever. Esse trabalho que ele escreveu durante os seis meses de relacionamento foi lançado em 1870 com o nome de Venus im Pelz.[2]
Apesar do relacionamento de Pistor e Sacher-Masoch ter servido de inspiração para o livro, há diferenças significativas entre o contrato que foi assinado na vida real e o contrato fictício dos personagens Severin e Wanda von Dunajew. A primeira diferença é a condição que diz que “Sra. Pistor não pode exigir nada que seja desonroso a ele”, sendo que na obra não existe nenhuma condição que impeça isso. A segunda diferença é que “ela deve deixá-lo durante seis horas diárias para que ele realize seu trabalho e ela nunca olhará suas cartas ou escritas”. Por fim, o contrato com Pistor indica uma duração de seis meses enquanto o contrato da obra fica sob decisão da dominadora quando deve acabar.[2]
Sinopse
[editar | editar código-fonte]A história central da novela é introduzida através de uma narrativa moldura. Tudo começa com um sonho de um narrador sem nome, onde ele tem um dialógo com Vênus, a deusa romana do amor. Eles discutem como a natureza cruel das mulheres afeta o desejo dos homens. O narrador desperta de seu sonho e vai a um encontro marcado com seu amigo Severin von Kusiemski.
Na casa de Severin, o narrador se depara com uma pintura à óleo de Vênus que o faz lembrar de seu sonho. Após ouvir o narrador contar sobre seu sonho, Severin diz que se uma mulher não é subserviente a um homem, ele deve ser subserviente a ela, e mostra ao narrador um manuscrito escrito por ele chamado "Confissões de um homem suprassensual".
No manuscrito, vemos que o personagem central, também chamado Severin, apaixona-se por Wanda von Dunajew num resort nos Cárpatos. Ela o ama também, mas o avisa que se cansará dele e ficará despótica. Ele abraça essa ideia e propõe que ele seja seu escravo. Após muita insistência de Severin, Wanda concorda, redigindo um contrato dando a ela controle absoluto sobre ele. A única condição de Severin é que ela às vezes vista roupas de pele animal e finja ser a deusa do amor.
No início, Wanda exerce seu poder com hesitação, mas aos poucos ela começa a gostar da posição dominante e se torna cada vez mais sádica. Ela dá a ele um novo nome, Gregor, e os dois partem de trem para a cidade de Florença, na Itália.
Em Florença, Wanda se apaixona por outro homem. Ela expressa suas intenções de que Severin também torne-se escravo de seu amante, mas ele recusa. Após isso, o relacionamento de Wanda e Severin encerra-se e ela o liberta de seu contrato.
A história é trazida de volta para o mundo real, onde Severin e o narrador sem nome conversam sobre o manuscrito. A moral da história, de acordo com Severin, é que no estado atual, a mulher só pode ser escrava ou déspota do homem, nunca sua companheira. Isso pode mudar apenas quando a mulher tem os mesmos direitos que o homem e é igual a ele na educação e no trabalho.
Impacto cultural
[editar | editar código-fonte]Em 1886, o psiquiatra alemão Richard von Krafft-Ebing publicou o estudo forense Psychopathia Sexualis. Neste estudo, os prazeres em sentir dor e humilhação relatados por Sacher-Masoch em A Vênus das Peles fizeram com que Krafft-Ebing criasse a palavra "masoquismo" para descrever tais desejos.[3] Porém, o escritor não gostou de ver seu nome sendo utilizado para criar esse termo.[4]
A influência de A Vênus das Peles no mundo do sadomasoquismo fez com que o filósofo francês Gilles Deleuze publicasse o livro Présentation de Sacher-Masoch, em 1967, com a finalidade de examinar o trabalho de Sacher-Masoch. No estudo, Deleuze reconhece Sacher-Masoch como grande escritor e exalta a importância de sua obra, além de entrar no campo psicanalítico a fim de discutir a natureza do masoquismo. O livro de Deleuze foi traduzido e lançado no Brasil em 2009 com o nome de Sacher-Masoch: o Frio e o Cruel.[5]
No álbum de estreia de The Velvet Underground, The Velvet Underground & Nico de 1967, a banda lançou uma música sobre sadomasoquismo e bondage chamada "Venus in Furs", inspirada na obra de Sacher-Masoch.[6] Steven Severin, co-fundador da banda Siouxsie and the Banshees, utiliza o sobrenome artístico "Severin" por causa do personagem de A Vênus das Peles que é citado na música de The Velvet Underground.[7]
Os protocolos adotados por Severin na história são geralmente tidos como um elemento precursor do masoquismo que influenciou a imaginação popular ao longo da história da comunidade BDSM. Um exemplo disso é a utilização de um contrato de dominação e submissão no relacionamento de Wanda e Severin, algo que viria a ser um elemento importante em relacionamentos BDSM em geral.[8]
Adaptações
[editar | editar código-fonte]A obra já foi adaptada para o cinema diversas vezes. Sua primeira adaptação cinematográfica ocorreu em 1967 com Venus in Furs, um filme sexploitation americano dirigido por Joe Marzano.[9]
Dois anos depois, foi lançado Venere in pelliccia, drama erótico italiano dirigido por Massimo Dallamano e estrelado por Laura Antonelli e Régis Vallée. O filme foi originalmente lançado apenas na Alemanha Ocidental e foi censurado na Itália por conter cenas de sexo consideradas muito pesadas. O filme só foi ser lançado nos cinemas italianos em 1975 com o título Le malizie di Venere, numa versão com muitas cenas cortadas e com a introdução de novas cenas gravadas pelo diretor Paolo Heusch, que tranformaram o enredo do filme num giallo.[10]
No ano de 1984, Guido Crepax adaptou o livro para histórias em quadrinhos em Venere in pelliccia, que foi publicada pela Olympia Press em Milão.[11]
Em 1985, Monika Treut fez sua estreia como diretora de cinema com o lançamento do filme alemão Verführung: Die grausame Frau. O filme, baseado em A Vênus das Peles, foi lançado um ano após Treut escrever sua tese de doutorado A imagem da mulher nas obras de Marquis de Sade e Leopold von Sacher-Masoch.[12]
Na década seguinte, o filme independente holandês Venus in Furs foi lançado e exibido em 1994 em diversos festivais, entre eles o Festival Internacional de Cinema de Roterdão[13] e a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.[14]
Nos teatros, a obra de Sacher-Masoch foi adaptada em Im Pelz, uma peça alemã de Katharina Schmitt que estreou no Schauspiel Leipzig em 2009.[15]
A obra também serviu de inspiração para a peça de David Ives chamada Venus in Fur, que teve sua estreia off-Broadway em 2010 e na Broadway em 2011. A peça foi encenada por Nina Arianda e Wes Bentley e venceu diversos prêmios, incluindo o Tony Award de Melhor Atriz para Nina Arianda e a indicação ao Tony Award de Melhor Peça.[16]
Em 2013, Roman Polanski dirigiu o filme francês La Vénus à la fourrure (lançado no Brasil como A Pele de Vênus e em Portugal como Vénus de Vison), baseado na peça de David Ives. O filme foi um sucesso de crítica, sendo indicado à Palma de Ouro no Festival de Cannes 2013 e vencendo na categoria Melhor Diretor no César de 2014.[17][18]
Referências
- ↑ Tuman, Myrom (19 de junho de 2019). The Sensitive Son and the Feminine Ideal in Literature: Writers from Rousseau to Roth (em inglês). [S.l.]: Palgrave Macmillan. p. 110-111. ISBN 978-3030157005
- ↑ a b Schreiber-Byers, Elizabeth Anne (Maio de 2008). «Castrating the Female Dominant: An Analysis of Female Agency in Leopold von Sacher-Masoch's Venus im Pelz» (em inglês): 51-53. doi:10.17615/v4zs-yk16
- ↑ Mennel, Barbara (15 de junho de 2007). The Representation of Masochism and Queer Desire in Film and Literature (em inglês). [S.l.]: AIAA. p. 15-17. ISBN 978-1403979971
- ↑ Moore, Alison M. (19 de novembro de 2015). Sexual Myths of Modernity: Sadism, Masochism and Historical Teleology (em inglês). [S.l.]: Lexington Books. ISBN 978-0739130773
- ↑ Safatle, Vladimir (23 de agosto de 2009). «Gozar das leis». Folha de S.Paulo
- ↑ Als, Hilton (1 de fevereiro de 2010). «The Whip Comes Down». The New Yorker (em inglês)
- ↑ «Steven Severin – interview». Total Music (em inglês). 2006
- ↑ Vinokour, Maya (2016). «Power, Sexuality, and the Masochistic Aesthetic From Sacher-Masoch to Kharms». University of Pennsylvania (em inglês): 50-51
- ↑ Pereira, Cláudia Raquel Castro (2015). «A obra Venus in Furs e a sua influência em outras formas de arte: um estudo comparatista»: 44-50
- ↑ Giusti, Marco (1 de janeiro de 1999). Dizionario dei film italiani stracult (em italiano). [S.l.]: Sperling & Kupfer. ISBN 978-8820029197
- ↑ «Fantagraphics pubblicherà in USA l'integrale di Crepax». Fumettologica (em italiano). 9 de março de 2015
- ↑ «Biografie - Monika Treut». filmportal.de (em alemão)
- ↑ «1994 films: Venus in furs». IFFR (em inglês)
- ↑ «Venus in Furs». Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
- ↑ Gambihler, Ralph (9 de dezembro de 2009). «Im Pelz – Katharina Schmitts Stück über Macht und Sprache uraufgeführt». Nachtkritik.de (em alemão)
- ↑ Lang, Brent (10 de junho de 2012). «Tony Awards: Nina Arianda Wins Best Actress in a Play for 'Venus in Fur'». TheWrap (em inglês)
- ↑ «Filme de Polanski estreia em Cannes e atriz usa traje ousado». G1. 25 de maio de 2013
- ↑ «Polanski ganha César de melhor diretor por 'La Vénus à la fourrure'». G1. 28 de fevereiro de 2014