Plan Rubber: diferenças entre revisões

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{{Info/Genérico/Wikidata|imagem=Brazil Rio Grande do Norte Natal location map.svg|legenda=[[Natal (Rio Grande do Norte)|Natal, capital do Rio Grande do Norte]], <br />um dos alvos do Plano Borracha.<ref>Garfield, Seth. ''In Search of the Amazon Brazil, the United States, and the Nature of a Region.'' [[Duke University Press]], 2013, pág. 71, {{en}}. ISBN 9780822377177 Consultado em 19 de maio de 2022</ref>}}
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'''Plan Rubber (Plano Borracha)''' foi o codinome dado aos planos militares dos Estados Unidos de invasão e ocupação da costa do nordeste do Brasil durante a Segunda Guerra Mundial. O plano foi elaborado por causa da preocupação norte-americana de que o Brasil entraria na guerra ao lado do Eixo, ou pelo menos agiria de forma simpática à causa do Eixo.
'''Plan Rubber (Plano Borracha)''' foi o [[codinome]] dado pelos militares dos Estados Unidos aos planos de invasão e ocupação da costa do [[nordeste do Brasil]] durante a [[Segunda Guerra Mundial]]. O plano foi elaborado por causa da preocupação norte-americana de que o [[Brasil]] entraria na guerra ao lado das [[Potências do Eixo]], ou pelo menos agiria de forma simpática à causa do Eixo.


== Plan Rubber - A invasão do Brasil em fevereiro de 1942 ==
== Plan Rubber - A invasão do Brasil em fevereiro de 1942 ==
A localização estratégica do Brasil no que diz respeito à travessia do Atlântico foi a motivação principal pelo desenvolvimento do plano Rubber. A ponta nordeste do Brasil permite o ponto de passagem mais curto entre o Continente Americano e África Ocidental Francesa e [[Serra Leoa]] . Em 1939, os Estados Unidos elaboraram o Plano de Guerra ''Arco-íris'', e um de seus pontos principais era de que a região nordeste do Brasil estaria disponível e seguro como um ponto de passagem de viagens transatlânticas para a África, para a Europa, Oriente Médio, e até mesmo para o Extremo Oriente e China. Em 1939, os Estados Unidos estavam profundamente preocupados com o envolvimento japonês na China Continental e uma segunda rota independente da rota do Pacífico era essencial para esse teatro de guerra. Quando os EUA entraram na guerra, Washington acreditava que a segurança do nordeste do Brasil não estava garantida e que a região, possivelmente todo o país, poderiam estar do lado dos nazistas. O raciocínio por trás disso era complexo, mas havia dois elementos essenciais. Primeiro, o Brasil não era uma democracia, mas sim uma ditadura governada por [[Getúlio Vargas]]. Tendo encenado uma revolução no início da década de 1930, Vargas proclamou um "Estado Novo" com elementos fascistóides que criava paralelos óbvios com a Itália de Mussolini, a Espanha e, em até certo ponto, a Alemanha nazista. Isso ainda era reiterado pelo persistente comércio do Brasil com as nações do Eixo e grande quantidade de imigrantes dessas nações estabelecidos em território brasileiro. Em segundo lugar, Getúlio Vargas também se orgulhava da independência de seu país. No final de 1941, os EUA solicitaram o uso de bases brasileiras para operações aéreas e o envio de tropas para proteger essas bases brasileiras contra sabotagem. Vargas inicialmente viu esse pedido como uma afronta à soberania brasileira e recusou. Em Washington, a recusa pode ter sido interpretada como uma resistência aos EUA, em vez de orgulho nacional. Daí, portanto havia uma a dúvida quanto à lealdade de Vargas (e, portanto, do Brasil). <ref>US Naval Institute Proceedings, October 1999</ref>


A localização estratégica do Brasil no que diz respeito à travessia do [[Atlântico]] foi a motivação principal pelo desenvolvimento do plano Rubber. A ponta nordeste do Brasil permite o ponto de passagem mais curto entre o [[Continente Americano]] e [[África Ocidental Francesa]] e [[Serra Leoa]]. Em 1939, os [[Estados Unidos]] elaboraram o Plano de Guerra ''Arco-íris'', e um de seus pontos principais era de que a região nordeste do Brasil estaria disponível e seguro como um ponto de passagem de viagens transatlânticas para a [[África]], para a [[Europa]], [[Oriente Médio]], e até mesmo para o [[Extremo Oriente]] e [[China]]. Em 1939, os Estados Unidos estavam profundamente preocupados com o envolvimento japonês na China Continental e uma segunda rota independente da rota do [[Pacífico]] era essencial para esse [[teatro de operações]]. Quando os EUA entraram na guerra, [[Washington, D.C.|Washington]] acreditava que a segurança do nordeste do Brasil não estava garantida e que a região, possivelmente todo o país, poderiam estar do lado dos [[nazista]]s. O raciocínio por trás disso era complexo, mas havia dois elementos essenciais. Primeiro, o Brasil não era uma [[democracia]], mas sim uma [[ditadura]] governada por [[Getúlio Vargas]]. Tendo encenado uma [[Revolução de 1930|revolução no início da década de 1930]], Vargas proclamou um "[[Estado Novo (Brasil)|Estado Novo]]" com elementos fascistóides que criava paralelos óbvios com a [[Itália fascista|Itália de Mussolini]], a [[Espanha Franquista]] e, em até certo ponto, a [[Alemanha nazista]]. Isso ainda era reiterado pelo persistente comércio do Brasil com as [[Potências do Eixo|nações do Eixo]] e grande quantidade de [[Imigração no Brasil|imigrantes dessas nações estabelecidos em território brasileiro]]. Em segundo lugar, Getúlio Vargas também se orgulhava da independência de seu país. No final de 1941, os EUA solicitaram o uso de bases brasileiras para operações aéreas e o envio de tropas para proteger essas bases brasileiras contra [[sabotagem]]. Vargas inicialmente viu esse pedido como uma afronta à soberania brasileira e recusou. Em Washington, a recusa pode ter sido interpretada como uma resistência aos EUA, em vez de orgulho nacional. Daí, portanto havia uma a dúvida quanto à lealdade de Vargas (e, portanto, do Brasil).<ref>US Naval Institute Proceedings, October 1999</ref>
O medo de que o Brasil, ou pelo menos os militares, ficassem do lado do Eixo não era uma teoria totalmente infundada. Na época, a maior parte das forças armadas do Brasil estavam localizadas na parte sul do país, com a parte norte sendo relativamente segura e portanto, mal defendida. Embora a marinha e a força aérea fossem geralmente consideradas pró-Aliadas (nada surpreendente, considerando os laços estreitos que cada uma havia se formado com a [[Marinha Real Britânica]] e a [[Forças Aéreas do Exército dos Estados Unidos|USAAF,]] respectivamente), havia um grau considerável de apoio ao exemplo militar da [[Alemanha Nazista]] entre o corpo de oficiais do exército brasileiro, principalmente na região sul do Brasil. Um relatório do Escritório de Serviços Estratégicos dos EUA estimou que cerca de 70% dos oficiais do exército eram pró-nazistas, e também se acreditava que ministros do governo Vargas tinham a mesma opinião. Outro fator de preocupação era a grande população de expatriados alemães, cerca de 1,5 milhão de pessoas, a maioria dos quais residia na parte sul do Brasil. <ref>Records of the Office of the Chief of Naval Operations, Plans, Orders & Related Documents, CINCLANT Oct 1941 to Dec 1942, Box 16. Rubber Plan</ref>


O medo de que o Brasil, ou pelo menos os militares, ficassem do lado do Eixo não era uma teoria totalmente infundada. Na época, a maior parte das [[forças armadas do Brasil]] estavam localizadas na parte sul do país, com a parte norte sendo relativamente segura e portanto, mal defendida. Embora a marinha e a força aérea fossem geralmente consideradas pró-Aliadas (nada surpreendente, considerando os laços estreitos que cada uma havia se formado com a [[Marinha Real Britânica]] e a [[Forças Aéreas do Exército dos Estados Unidos|USAAF]], respectivamente), havia um grau considerável de apoio ao exemplo militar da [[Alemanha Nazista]] entre o corpo de oficiais do [[exército brasileiro]], principalmente na [[região sul do Brasil]]. Um relatório do [[Escritório de Serviços Estratégicos]] dos EUA estimou que cerca de 70% dos oficiais do exército eram pró-nazistas, e também se acreditava que ministros do governo Vargas tinham a mesma opinião. Outro fator de preocupação era a grande população de expatriados alemães, cerca de 1,5 milhão de pessoas, a maioria dos quais residia na parte sul do Brasil.<ref>Records of the Office of the Chief of Naval Operations, Plans, Orders & Related Documents, CINCLANT Oct 1941 to Dec 1942, Box 16. Rubber Plan</ref>
A queda da França e o espectro de uma tomada alemã dos territórios de Vichy e as colônicas na África Ocidental completaram o quadro. Estrategistas norte-americanos acreditavam que o fracasso alemão em capturar Moscou em 1941 poderia levar a expedições no flanco oposto, com uma investida alemã à Espanha e Portugal, juntamente com a tomada do território francês na África, colocando o nordeste do Brasil ao alcance das aeronaves alemãs, pondo em risco a rota do Atlântico. Postulou-se até mesmo um cenário envolvendo tropas alemãs (ou pelo menos "colunistas" desembarcados por via aérea de Dacar), combinado com a mobilização de integrantes pró-nazistas das Forças Armadas brasileiras. Assim sendo, nos dias que se seguiram o ataque a Pearl Harbor, os Estados Unidos traçaram planos para impedir qualquer tentativa do Eixo de assegurar para si o Nordeste do Brasil, tomando-o à forças eles próprios se necessário. Nasceu então, o "Plano Borracha".

A [[queda da França]] e o espectro de uma tomada alemã dos territórios da [[França de Vichy]] e as [[colônia]]s na África Ocidental completaram o quadro. Estrategistas norte-americanos acreditavam que o fracasso alemão em [[Batalha de Moscou|capturar Moscou]] em 1941 poderia levar a expedições no flanco oposto, com uma investida alemã à [[Espanha]] ([[Operação Félix]]) e [[Portugal]] ([[Operação Isabella]]),<ref>Chant, Christopher. [https://books.google.com.br/books?id=eTaMAQAAQBAJ&pg=PA93&redir_esc=y#v=onepage&q&f=false ''The Encyclopedia of Codenames of World War II (Routledge Revivals)].'' [[Routledge]], 2013, pág. 93, {{en}}. ISBN 9781134647873 Consultado em 19 de maio de 2022</ref> juntamente com a tomada do território francês na África, colocando o nordeste do Brasil ao alcance das aeronaves alemãs, pondo em risco a rota do Atlântico. Postulou-se até mesmo um cenário envolvendo tropas alemãs (ou pelo menos "[[Quinta-coluna|Quinta-colunistas]]" desembarcados por via aérea de [[Dacar]]), combinado com a mobilização de integrantes pró-nazistas das Forças Armadas brasileiras. Assim sendo, nos dias que se seguiram o [[ataque a Pearl Harbor]], os Estados Unidos traçaram planos para impedir qualquer tentativa do Eixo de assegurar para si o Nordeste do Brasil, tomando-o à forças eles próprios se necessário. Nasceu então, o "Plano Borracha".


== "Plano Borracha" ==
== "Plano Borracha" ==
O título completo do plano era "Plano Básico Conjunto para a Ocupação do Nordeste do Brasil [Conjunto], Série 737 de 21 de dezembro de 1941". A parte inicial do plano, descrevendo uma operação anfíbia que tomaria vários portos e aeroportos importantes, tinha um título mais curto '''Plan Rubber''' (Plano Borracha). O objetivo do Plano Borracha era desembarcar fuzileiros navais dos EUA no nordeste do Brasil para proteger os campos de aviação vitais. O alvo principal era o aeroporto de Natal, o principal campo de aviação na ligação transatlântica. Outros alvos no continente citados no plano eram a cidade Salvador no sul e Belém no norte, e também a Ilha de Fernando de Noronha. Todos os três locais no continente tinham aeródromos ou aeroportos capazes de receber bombardeiros B17 e grandes aeronaves de transporte. A Ilha de Fernando de Noronha tinha um campo de aviação menor, mas este havia sido construído e era operado pela companhia aérea italiana ''Ala Littoria''. A localização estratégica desta ilha a tornava um alvo vital, pois havia a possibilidade do Eixo usá-la como ponto de parada, e operações originadas de lá facilitavam flanquear rotas marítimas Recife e Salvador. Dois outros alvos foram considerados prioritários, os aeródromos de Fortaleza e Recife.


O título completo do plano era "Plano Básico Conjunto para a Ocupação do Nordeste do Brasil [Conjunto], Série 737 de 21 de dezembro de 1941". A parte inicial do plano, descrevendo uma operação anfíbia que tomaria vários portos e aeroportos importantes, tinha um título mais curto '''Plan Rubber''' (Plano Borracha). O objetivo do Plano Borracha era desembarcar [[Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos|fuzileiros navais dos EUA]] no nordeste do Brasil para proteger os campos de aviação vitais. O alvo principal era o [[aeroporto de Natal]], o principal campo de aviação na ligação transatlântica. Outros alvos no continente citados no plano eram a [[cidade de Salvador]] no sul e [[Belém (Pará)|Belém]] no norte, e também a ilhas de [[Fernando de Noronha]]. Todos os três locais no continente tinham aeródromos ou aeroportos capazes de receber [[Boeing B-17 Flying Fortress|bombardeiros B-17]] e grandes aeronaves de transporte. A Ilha de Fernando de Noronha tinha um campo de aviação menor, mas este havia sido construído e era operado pela companhia aérea italiana ''[[Ala Littoria]]''. A localização estratégica desta ilha a tornava um alvo vital, pois havia a possibilidade do [[Potências do Eixo|Eixo]] usá-la como ponto de parada, e operações originadas de lá facilitavam flanquear rotas marítimas [[Recife]] e Salvador. Dois outros alvos foram considerados prioritários, os aeródromos de [[Fortaleza]] e [[Recife]].
A geografia foi contra o planejamento desde o início. Com exceção de Salvador (que apresentava extensas praias de areia), os litorais ao redor de Natal, Belém e [[Fernando de Noronha]] são quase totalmente inadequados para operações anfíbias. Em Natal, as praias são arenosas e rasas (ideais para embarcações de desembarque), mas eram protegidas por um recife traiçoeiro que era aberto apenas em seis pontos. A embarcações teriam que ser lançadas a cerca de 14 quilômetros da costa por causa do recife e encontrar as seis lacunas seria bastante difícil. Em Belém a situação era pior; as melhores praias ficavam a vários quilômetros da cidade e eram separadas dela por quilômetros de pântano intransponível. Além das docas em Belém, os únicos pontos de desembarque adequados eram algumas praias adequadas mais próximas da cidade, mas só podiam ser alcançadas por meio de embarcações de desembarque, e isso somente após uma viagem de 13 quilômetros rio acima, e as embarcações eram facilmente avistadas dos morros ao redor a cidade. Se essas morros fossem defendidos com alguma força, o desembarque seria extremamente perigoso. Finalmente, a Ilha de Fernando de Noronha tem apenas uma praia que poderia ser usada, com 182 metros de largura mas correntes muito fortes. Mesmo um desembarque sem a presença do inimigo seria traiçoeiro; e se bem defendida, a praia pode se tornar um campo de matança. A geografia também foi a razão pela qual as cidades de Fortaleza e Recife não poderiam ser tomadas por um ataque anfíbio; Fortaleza era cercada por terreno intransitável, enquanto o mar Recife era totalmente cercado por arrecifes. Ataques em ambas cidades teriam que ter apoio de ofensivas terrestres montadas a partir de Natal após desembarques iniciais.


A geografia foi contra o planejamento desde o início. Com exceção de Salvador (que apresentava extensas praias de areia), os litorais ao redor de Natal, Belém e Fernando de Noronha são quase totalmente inadequados para [[Guerra anfíbia|operações anfíbias]]. Em Natal, as praias são arenosas e rasas (ideais para embarcações de desembarque), mas eram protegidas por um [[recife de coral]] traiçoeiro que era aberto apenas em seis pontos. A embarcações teriam que ser lançadas a cerca de 14 quilômetros da costa por causa do recife e encontrar as seis lacunas seria bastante difícil. Em Belém a situação era pior; as melhores praias ficavam a vários quilômetros da cidade e eram separadas dela por quilômetros de [[pântano]] intransponível. Além das [[doca]]s em Belém, os únicos pontos de desembarque adequados eram algumas praias adequadas mais próximas da cidade, mas só podiam ser alcançadas por meio de embarcações de desembarque, e isso somente após uma viagem de 13 quilômetros rio acima, e as embarcações eram facilmente avistadas dos morros ao redor a cidade. Se essas morros fossem defendidos com alguma força, o desembarque seria extremamente perigoso. Finalmente, a Ilha de Fernando de Noronha tem apenas uma praia que poderia ser usada, com 182 metros de largura mas [[Corrente oceânica|correntes]] muito fortes. Mesmo um desembarque sem a presença do inimigo seria traiçoeiro; e se bem defendida, a praia pode se tornar um campo de matança. A geografia também foi a razão pela qual as cidades de Fortaleza e Recife não poderiam ser tomadas por um ataque anfíbio; Fortaleza era cercada por terreno intransitável, enquanto o mar Recife era totalmente cercado por arrecifes. Ataques em ambas cidades teriam que ter apoio de ofensivas terrestres montadas a partir de Natal após desembarques iniciais.
Apesar dos desafios significativos que a geografia apresentava, o planejamento foi adiante. A Frota do Atlântico dos EUA forneceria cobertura para a força de assalto, também era esperado um bombardeio costeiro a partir do navio de guerra {{USS|Texas|BB-35|6}} e suporte aéreo oriundo do porta-aviões {{USS|Ranger|CV-4|6}} (que poderia ser embarcado com esquadrões do [[Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos|USMC]] encarregados de ataques ao solo). A 5ª Divisão de Fuzileiros Navais e a 9ª Divisão do Exército dos EUA foram designadas para o plano e começaram o treinamento de assalto anfíbio. Em janeiro de 1942, tropas da 1ª Divisão de Infantaria dos EUA e da 1ª Divisão de Fuzileiros Navais realizaram um exercício em Cape Henry, na Virgínia, em condições mais benignas do que se esperava em Recife. O resultado do treinamento foi um desastre. A navegação do navio até a costa foi problemática; as tropas se espalharam por várias praias, a organização falhou e o controle foi perdido. Aos olhos da equipe de árbitros, o ataque foi um fracasso total, apesar de uma vantagem de 4:1 sobre a força de defesa. Na perspectiva do Plano Borracha, as tripulações dos barcos envolvidos nesse desastre eram as mesmas destinadas aos desembarques no Brasil, o que tornava esse fracasso do treinamento ainda pior. Entretanto, os exercícios mostraram fraquezas significativas na capacidade de desembarcar tropas a partir de navios. É possível que, se fossem identificadas, algumas desses problemas poderiam ter sido superados no momento em que o Plano Borracha seria posto em prática.

Apesar dos desafios significativos que a geografia apresentava, o planejamento foi adiante. A [[Quarta Frota dos Estados Unidos|Frota do Atlântico dos EUA]] forneceria cobertura para a força de assalto, também era esperado um bombardeio costeiro a partir do navio de guerra {{USS|Texas|BB-35|6}} e suporte aéreo oriundo do [[porta-aviões]] {{USS|Ranger|CV-4|6}} (que poderia ser embarcado com esquadrões do [[Fuzileiro naval|fuzileiros navais]] dos Estados Unidos encarregados de ataques ao solo). A 5ª Divisão de Fuzileiros Navais e a 9ª Divisão do Exército dos EUA foram designadas para o plano e começaram o treinamento de assalto anfíbio. Em janeiro de 1942, tropas da 1ª Divisão de Infantaria dos EUA e da 1ª Divisão de Fuzileiros Navais realizaram um exercício em Cape Henry, na [[Virgínia]], em condições mais benignas do que se esperava em Recife. O resultado do treinamento foi um desastre. A navegação do navio até a costa foi problemática; as tropas se espalharam por várias praias, a organização falhou e o controle foi perdido. Aos olhos da equipe de árbitros, o ataque foi um fracasso total, apesar de uma vantagem de 4:1 sobre a força de defesa. Na perspectiva do Plano Borracha, as tripulações dos barcos envolvidos nesse desastre eram as mesmas destinadas aos desembarques no Brasil, o que tornava esse fracasso do treinamento ainda pior. Entretanto, os exercícios mostraram fraquezas significativas na capacidade de desembarcar tropas a partir de navios. É possível que, se fossem identificadas, algumas desses problemas poderiam ter sido superados no momento em que o Plano Borracha seria posto em prática.


== Forças brasileiras ==
== Forças brasileiras ==
Apesar das forças da natureza postas contra os americanos, os idealizadores do Plano Borracha dos EUA acreditavam que o exército brasileiro era fraco o suficiente para permitir que o plano tivesse sucesso. No mar, o Brasil poderia reunir dois encouraçados de construção britânica, dois cruzadores leves, nove contratorpedeiros, três submarinos e outras pequenas embarcações. No ar, o Brasil tinha cerca de 330 aeronaves, porém muitas delas eram caças e bombardeiros obsoletos. O número de aeronaves que foram relatadas como em serviço no momento do Plano Borracha era o seguinte:


Apesar das forças da natureza postas contra os americanos, os idealizadores do Plano Borracha dos EUA acreditavam que o exército brasileiro era fraco o suficiente para permitir que o plano tivesse sucesso. No mar, o Brasil poderia reunir dois [[encouraçado]]s de construção britânica, dois [[cruzador]]es leves, nove [[contratorpedeiro]]s, três [[submarino]]s e outras pequenas embarcações. No ar, o Brasil tinha cerca de 330 aeronaves, porém muitas delas eram [[caça (avião)|caça]]s e [[bombardeiro]]s obsoletos. O número de aeronaves que foram relatadas como em serviço no momento do Plano Borracha era o seguinte:
'''Caças'''


;Caças:
[[Boeing P-12|Boeing 256]] (versão de exportação do [[Boeing P-12|Boeing F4B]] ) - 14


Boeing 69 (versão de exportação do Boeing F2B ) - 46
* [[Boeing P-12|Boeing 256]] (versão de exportação do [[Boeing P-12|Boeing F4B]] ) - 14
* Boeing 69 (versão de exportação do Boeing F2B ) - 46


'''Bombardeiros de ataque'''
;Bombardeiros de ataque:


Bombardeiro Vultee V-11 - 18
* Bombardeiro [[Vultee V-11]] - 18


Bombardeiro de torpedo Vultee V-11 - 12
* [[Torpedeiro (avião)|Bombardeiro de torpedo]] Vultee V-11 - 12


NA-44 - 6 norte-americano
* NA-44 - 6 norte-americano


Fairey Gordon - 10
* Fairey Gordon - 10


Assim como o Exército, a [[Força Aérea Brasileira]] (FAB) concentrava-se principalmente no sul e sudeste do país, mas podia ser rapidamente mobilizada e enviada para o norte. Nas regiões a serem atacadas, os brasileiros poderiam reunir cerca de 3.500 militares em Natal, 2.900 em Fortaleza, 5.500 em Recife, 3.500 em Salvador e 1.300 em Belém. Na época, Fernando de Noronha era uma colônia penal com apenas 65 guardas, 600 presidiários e 900 outros habitantes, mas seu campo de aviação permitia que pudesse ser reforçado rapidamente por via aérea. Havia também várias instalações de defesa em terra, mas o status delas era amplamente desconhecido para os idealizadores do plano nos Estados Unidos. Sabe-se que os brasileiros traçaram planos de defesas montando canhões de 12" e 6", apoiados em baterias móveis de com canhões de 75mm e metralhadoras. Se isso estava em vigor na época em que o Plano Borracha estava para começar é uma questão para debate. No entanto, os brasileiros estavam tão cientes quanto qualquer um das limitações às operações litorâneas impostas por sua geografia e, como tal, é provável que, caso a notícia do Plano Borracha tivesse vazado, pelo menos alguma forma de defesa aguardasse os atacantes americanos.
Assim como o Exército, a [[Força Aérea Brasileira]] (FAB) concentrava-se principalmente no sul e sudeste do país, mas podia ser rapidamente mobilizada e enviada para o norte. Nas regiões a serem atacadas, os brasileiros poderiam reunir cerca de 3.500 militares em Natal, 2.900 em Fortaleza, 5.500 em Recife, 3.500 em Salvador e 1.300 em Belém. Na época, Fernando de Noronha era uma [[colônia penal]] com apenas 65 guardas, 600 presidiários e 900 outros habitantes, mas seu campo de aviação permitia que pudesse ser reforçado rapidamente por via aérea. Havia também várias instalações de defesa em terra, mas o status delas era amplamente desconhecido para os idealizadores do plano nos Estados Unidos. Sabe-se que os [[brasileiros]] traçaram planos de defesas montando canhões de 12" e 6", apoiados em [[bateria (unidade)|bateria]]s móveis de com canhões de 75mm e [[metralhadora]]s. Se isso estava em vigor na época em que o Plano Borracha estava para começar é uma questão para debate. No entanto, os brasileiros estavam tão cientes quanto qualquer um das limitações às operações litorâneas impostas por sua geografia e, como tal, é provável que, caso a notícia do Plano Borracha tivesse vazado, pelo menos alguma forma de defesa aguardasse os atacantes americanos.


== Plano Borracha Arquivado ==
== Plano Borracha Arquivado ==
Nenhum desembarque americano ocorreu no Brasil em 1942. Houve uma grande mobilização na frente diplomática que acabou persuadindo o presidente Getúlio Vargas a permitir a entrada de tropas americanas em Recife, tornando o Plano Borracha desnecessário. Em dezembro de 1941, o subsecretário Welles persuadiu Vargas a permitir que 150 fuzileiros navais dos EUA entrassem nos aeródromos de Recife, Natal e Belém, disfarçados de mecânico de aeronaves. Eles receberam ordens de garantir a segurança dos aeródromos e das aeronaves em trânsito nos Estados Unidos, mas foram lembrados de que ali estavam a convite das autoridades brasileiras. Esse sucesso despertou o temor de que elementos pró-nazistas no Brasil pudessem provocar uma reação, mas o presidente Roosevelt resistiu aos apelos dos militares para executar imediatamente o Plano Borracha e, em vez disso, procurou uma solução diplomática. Roosevelt percebeu rapidamente que Vargas precisava manter o respeito de sua população, Vargas precisava salvar a face, então os movimentos de Roosevelt foram cuidadosamente planejados para permitir que isso acontecesse.


{{AP|vt=s|Brasil na Segunda Guerra Mundial}}
No exato momento em que o exército dos EUA planejava desembarcar tropas no Brasil, Roosevelt autorizou a exportação de armas e munições para o Brasil, o que aumentou o nível de apoio dos aliados do governo e os militares brasileiros. Isso abriu caminho para uma reunião de chanceleres das nações sul-americanas em janeiro de 1942, na qual os Estados Unidos instaram seus vizinhos a romper relações diplomáticas com a Alemanha. O aumento do apoio à causa aliada levou o Brasil a fazer exatamente isso no final da reunião. O ponto culminante dessa política cuidadosa foi a assinatura em maio de 1942 do Acordo de Defesa Brasileiro-Americano, que permitiu total apoio dos Estados Unidos à defesa do Brasil e, finalmente (após o naufrágio de cinco embarcações brasileiras por barcos U alemães) a entrada do Brasil na guerra do lado aliado em 22 de agosto de 1942.

[[Ficheiro:Jornal O Globo 1942.jpg|thumb|Jornal ''[[O Globo]]'', de Fevereiro de 1942, noticiando o afundamento do [[navio mercante]] brasileiro [[Navio Mercante Buarque|Buarque]], torpedeado por um submarino alemão no dia 16 daquele mesmo mês.<ref>{{citar web|url=https://www.al.sp.gov.br/noticia/?id=329879|título=Brasileiros esquecidos - 70 anos da entrada do Brasil na 2ª Guerra Mundial (segunda parte)|autor=Ribeiro, Antonio Sérgio |data=22 de agosto de 2012|publicado=[[Assembleia Legislativa de São Paulo]]|acessodata=19 de maio de 2022|arquivourl=|arquivodata=|urlmorta=}}</ref>]]

Nenhum desembarque americano ocorreu no Brasil em 1942. Houve uma grande mobilização na frente diplomática que acabou persuadindo o presidente Getúlio Vargas a permitir a entrada de tropas americanas em Recife, tornando o Plano Borracha desnecessário. Em dezembro de 1941, o subsecretário Welles persuadiu Vargas a permitir que 150 fuzileiros navais dos EUA entrassem nos aeródromos de Recife, Natal e Belém, disfarçados de mecânicos de aeronaves. Eles receberam ordens de garantir a segurança dos aeródromos e das aeronaves em trânsito nos Estados Unidos, mas foram lembrados de que ali estavam a convite das autoridades brasileiras. Esse sucesso despertou o temor de que elementos pró-nazistas no Brasil pudessem provocar uma reação, mas o presidente [[Franklin D. Roosevelt]] resistiu aos apelos dos militares para executar imediatamente o Plano Borracha e, em vez disso, procurou uma solução diplomática. Roosevelt percebeu rapidamente que Vargas precisava manter o respeito de sua população e precisava salvar a face, então os movimentos de Roosevelt foram cuidadosamente planejados para permitir que isso acontecesse.

No exato momento em que o exército dos EUA planejava desembarcar tropas no Brasil, Roosevelt autorizou a exportação de armas e munições para o Brasil, o que aumentou o nível de apoio dos aliados do governo e os militares brasileiros. Isso abriu caminho para uma reunião de [[chanceler]]es das nações sul-americanas em janeiro de 1942, na qual os Estados Unidos instaram seus vizinhos a romper relações diplomáticas com a Alemanha. O aumento do apoio à causa aliada levou o Brasil a fazer exatamente isso no final da reunião. O ponto culminante dessa política cuidadosa foi a assinatura em maio de 1942 do Acordo de Defesa Brasileiro-Americano ([[Acordos de Washington]]), que permitiu total apoio dos Estados Unidos à defesa do Brasil e, finalmente (após o [[Lista de navios brasileiros atacados na Segunda Guerra Mundial|naufrágio de cinco embarcações brasileiras]] por [[U-Boot#Segunda_Guerra_Mundial|submarinos U-Boot alemães]]) a entrada do Brasil na guerra do lado aliado em 22 de agosto de 1942.{{clr}}


== Veja também ==
== Veja também ==


* [[Força Expedicionária Brasileira]] (FEB)
* [[Força Expedicionária Brasileira]] (FEB)
* [[Frank McCann]]
* [[História militar do Brasil]]


{{Referências}}
{{Referências}}

{{Portal3|Segunda Guerra Mundial|Brasil|Estados Unidos}}

[[Categoria:Brasil na Segunda Guerra Mundial]]
[[Categoria:Brasil na Segunda Guerra Mundial]]

Revisão das 17h10min de 19 de maio de 2022

Plan Rubber

Natal, capital do Rio Grande do Norte,
um dos alvos do Plano Borracha.[1]
Características
Classificação invasão
operação militar
Parte de Segunda Guerra Mundial Edit this on Wikidata
Localização
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Plan Rubber (Plano Borracha) foi o codinome dado pelos militares dos Estados Unidos aos planos de invasão e ocupação da costa do nordeste do Brasil durante a Segunda Guerra Mundial. O plano foi elaborado por causa da preocupação norte-americana de que o Brasil entraria na guerra ao lado das Potências do Eixo, ou pelo menos agiria de forma simpática à causa do Eixo.

Plan Rubber - A invasão do Brasil em fevereiro de 1942

A localização estratégica do Brasil no que diz respeito à travessia do Atlântico foi a motivação principal pelo desenvolvimento do plano Rubber. A ponta nordeste do Brasil permite o ponto de passagem mais curto entre o Continente Americano e África Ocidental Francesa e Serra Leoa. Em 1939, os Estados Unidos elaboraram o Plano de Guerra Arco-íris, e um de seus pontos principais era de que a região nordeste do Brasil estaria disponível e seguro como um ponto de passagem de viagens transatlânticas para a África, para a Europa, Oriente Médio, e até mesmo para o Extremo Oriente e China. Em 1939, os Estados Unidos estavam profundamente preocupados com o envolvimento japonês na China Continental e uma segunda rota independente da rota do Pacífico era essencial para esse teatro de operações. Quando os EUA entraram na guerra, Washington acreditava que a segurança do nordeste do Brasil não estava garantida e que a região, possivelmente todo o país, poderiam estar do lado dos nazistas. O raciocínio por trás disso era complexo, mas havia dois elementos essenciais. Primeiro, o Brasil não era uma democracia, mas sim uma ditadura governada por Getúlio Vargas. Tendo encenado uma revolução no início da década de 1930, Vargas proclamou um "Estado Novo" com elementos fascistóides que criava paralelos óbvios com a Itália de Mussolini, a Espanha Franquista e, em até certo ponto, a Alemanha nazista. Isso ainda era reiterado pelo persistente comércio do Brasil com as nações do Eixo e grande quantidade de imigrantes dessas nações estabelecidos em território brasileiro. Em segundo lugar, Getúlio Vargas também se orgulhava da independência de seu país. No final de 1941, os EUA solicitaram o uso de bases brasileiras para operações aéreas e o envio de tropas para proteger essas bases brasileiras contra sabotagem. Vargas inicialmente viu esse pedido como uma afronta à soberania brasileira e recusou. Em Washington, a recusa pode ter sido interpretada como uma resistência aos EUA, em vez de orgulho nacional. Daí, portanto havia uma a dúvida quanto à lealdade de Vargas (e, portanto, do Brasil).[2]

O medo de que o Brasil, ou pelo menos os militares, ficassem do lado do Eixo não era uma teoria totalmente infundada. Na época, a maior parte das forças armadas do Brasil estavam localizadas na parte sul do país, com a parte norte sendo relativamente segura e portanto, mal defendida. Embora a marinha e a força aérea fossem geralmente consideradas pró-Aliadas (nada surpreendente, considerando os laços estreitos que cada uma havia se formado com a Marinha Real Britânica e a USAAF, respectivamente), havia um grau considerável de apoio ao exemplo militar da Alemanha Nazista entre o corpo de oficiais do exército brasileiro, principalmente na região sul do Brasil. Um relatório do Escritório de Serviços Estratégicos dos EUA estimou que cerca de 70% dos oficiais do exército eram pró-nazistas, e também se acreditava que ministros do governo Vargas tinham a mesma opinião. Outro fator de preocupação era a grande população de expatriados alemães, cerca de 1,5 milhão de pessoas, a maioria dos quais residia na parte sul do Brasil.[3]

A queda da França e o espectro de uma tomada alemã dos territórios da França de Vichy e as colônias na África Ocidental completaram o quadro. Estrategistas norte-americanos acreditavam que o fracasso alemão em capturar Moscou em 1941 poderia levar a expedições no flanco oposto, com uma investida alemã à Espanha (Operação Félix) e Portugal (Operação Isabella),[4] juntamente com a tomada do território francês na África, colocando o nordeste do Brasil ao alcance das aeronaves alemãs, pondo em risco a rota do Atlântico. Postulou-se até mesmo um cenário envolvendo tropas alemãs (ou pelo menos "Quinta-colunistas" desembarcados por via aérea de Dacar), combinado com a mobilização de integrantes pró-nazistas das Forças Armadas brasileiras. Assim sendo, nos dias que se seguiram o ataque a Pearl Harbor, os Estados Unidos traçaram planos para impedir qualquer tentativa do Eixo de assegurar para si o Nordeste do Brasil, tomando-o à forças eles próprios se necessário. Nasceu então, o "Plano Borracha".

"Plano Borracha"

O título completo do plano era "Plano Básico Conjunto para a Ocupação do Nordeste do Brasil [Conjunto], Série 737 de 21 de dezembro de 1941". A parte inicial do plano, descrevendo uma operação anfíbia que tomaria vários portos e aeroportos importantes, tinha um título mais curto Plan Rubber (Plano Borracha). O objetivo do Plano Borracha era desembarcar fuzileiros navais dos EUA no nordeste do Brasil para proteger os campos de aviação vitais. O alvo principal era o aeroporto de Natal, o principal campo de aviação na ligação transatlântica. Outros alvos no continente citados no plano eram a cidade de Salvador no sul e Belém no norte, e também a ilhas de Fernando de Noronha. Todos os três locais no continente tinham aeródromos ou aeroportos capazes de receber bombardeiros B-17 e grandes aeronaves de transporte. A Ilha de Fernando de Noronha tinha um campo de aviação menor, mas este havia sido construído e era operado pela companhia aérea italiana Ala Littoria. A localização estratégica desta ilha a tornava um alvo vital, pois havia a possibilidade do Eixo usá-la como ponto de parada, e operações originadas de lá facilitavam flanquear rotas marítimas Recife e Salvador. Dois outros alvos foram considerados prioritários, os aeródromos de Fortaleza e Recife.

A geografia foi contra o planejamento desde o início. Com exceção de Salvador (que apresentava extensas praias de areia), os litorais ao redor de Natal, Belém e Fernando de Noronha são quase totalmente inadequados para operações anfíbias. Em Natal, as praias são arenosas e rasas (ideais para embarcações de desembarque), mas eram protegidas por um recife de coral traiçoeiro que era aberto apenas em seis pontos. A embarcações teriam que ser lançadas a cerca de 14 quilômetros da costa por causa do recife e encontrar as seis lacunas seria bastante difícil. Em Belém a situação era pior; as melhores praias ficavam a vários quilômetros da cidade e eram separadas dela por quilômetros de pântano intransponível. Além das docas em Belém, os únicos pontos de desembarque adequados eram algumas praias adequadas mais próximas da cidade, mas só podiam ser alcançadas por meio de embarcações de desembarque, e isso somente após uma viagem de 13 quilômetros rio acima, e as embarcações eram facilmente avistadas dos morros ao redor a cidade. Se essas morros fossem defendidos com alguma força, o desembarque seria extremamente perigoso. Finalmente, a Ilha de Fernando de Noronha tem apenas uma praia que poderia ser usada, com 182 metros de largura mas correntes muito fortes. Mesmo um desembarque sem a presença do inimigo seria traiçoeiro; e se bem defendida, a praia pode se tornar um campo de matança. A geografia também foi a razão pela qual as cidades de Fortaleza e Recife não poderiam ser tomadas por um ataque anfíbio; Fortaleza era cercada por terreno intransitável, enquanto o mar Recife era totalmente cercado por arrecifes. Ataques em ambas cidades teriam que ter apoio de ofensivas terrestres montadas a partir de Natal após desembarques iniciais.

Apesar dos desafios significativos que a geografia apresentava, o planejamento foi adiante. A Frota do Atlântico dos EUA forneceria cobertura para a força de assalto, também era esperado um bombardeio costeiro a partir do navio de guerra USS Texas e suporte aéreo oriundo do porta-aviões USS Ranger (que poderia ser embarcado com esquadrões do fuzileiros navais dos Estados Unidos encarregados de ataques ao solo). A 5ª Divisão de Fuzileiros Navais e a 9ª Divisão do Exército dos EUA foram designadas para o plano e começaram o treinamento de assalto anfíbio. Em janeiro de 1942, tropas da 1ª Divisão de Infantaria dos EUA e da 1ª Divisão de Fuzileiros Navais realizaram um exercício em Cape Henry, na Virgínia, em condições mais benignas do que se esperava em Recife. O resultado do treinamento foi um desastre. A navegação do navio até a costa foi problemática; as tropas se espalharam por várias praias, a organização falhou e o controle foi perdido. Aos olhos da equipe de árbitros, o ataque foi um fracasso total, apesar de uma vantagem de 4:1 sobre a força de defesa. Na perspectiva do Plano Borracha, as tripulações dos barcos envolvidos nesse desastre eram as mesmas destinadas aos desembarques no Brasil, o que tornava esse fracasso do treinamento ainda pior. Entretanto, os exercícios mostraram fraquezas significativas na capacidade de desembarcar tropas a partir de navios. É possível que, se fossem identificadas, algumas desses problemas poderiam ter sido superados no momento em que o Plano Borracha seria posto em prática.

Forças brasileiras

Apesar das forças da natureza postas contra os americanos, os idealizadores do Plano Borracha dos EUA acreditavam que o exército brasileiro era fraco o suficiente para permitir que o plano tivesse sucesso. No mar, o Brasil poderia reunir dois encouraçados de construção britânica, dois cruzadores leves, nove contratorpedeiros, três submarinos e outras pequenas embarcações. No ar, o Brasil tinha cerca de 330 aeronaves, porém muitas delas eram caças e bombardeiros obsoletos. O número de aeronaves que foram relatadas como em serviço no momento do Plano Borracha era o seguinte:

Caças
  • Boeing 256 (versão de exportação do Boeing F4B ) - 14
  • Boeing 69 (versão de exportação do Boeing F2B ) - 46
Bombardeiros de ataque
  • NA-44 - 6 norte-americano
  • Fairey Gordon - 10

Assim como o Exército, a Força Aérea Brasileira (FAB) concentrava-se principalmente no sul e sudeste do país, mas podia ser rapidamente mobilizada e enviada para o norte. Nas regiões a serem atacadas, os brasileiros poderiam reunir cerca de 3.500 militares em Natal, 2.900 em Fortaleza, 5.500 em Recife, 3.500 em Salvador e 1.300 em Belém. Na época, Fernando de Noronha era uma colônia penal com apenas 65 guardas, 600 presidiários e 900 outros habitantes, mas seu campo de aviação permitia que pudesse ser reforçado rapidamente por via aérea. Havia também várias instalações de defesa em terra, mas o status delas era amplamente desconhecido para os idealizadores do plano nos Estados Unidos. Sabe-se que os brasileiros traçaram planos de defesas montando canhões de 12" e 6", apoiados em baterias móveis de com canhões de 75mm e metralhadoras. Se isso estava em vigor na época em que o Plano Borracha estava para começar é uma questão para debate. No entanto, os brasileiros estavam tão cientes quanto qualquer um das limitações às operações litorâneas impostas por sua geografia e, como tal, é provável que, caso a notícia do Plano Borracha tivesse vazado, pelo menos alguma forma de defesa aguardasse os atacantes americanos.

Plano Borracha Arquivado

Jornal O Globo, de Fevereiro de 1942, noticiando o afundamento do navio mercante brasileiro Buarque, torpedeado por um submarino alemão no dia 16 daquele mesmo mês.[5]

Nenhum desembarque americano ocorreu no Brasil em 1942. Houve uma grande mobilização na frente diplomática que acabou persuadindo o presidente Getúlio Vargas a permitir a entrada de tropas americanas em Recife, tornando o Plano Borracha desnecessário. Em dezembro de 1941, o subsecretário Welles persuadiu Vargas a permitir que 150 fuzileiros navais dos EUA entrassem nos aeródromos de Recife, Natal e Belém, disfarçados de mecânicos de aeronaves. Eles receberam ordens de garantir a segurança dos aeródromos e das aeronaves em trânsito nos Estados Unidos, mas foram lembrados de que ali estavam a convite das autoridades brasileiras. Esse sucesso despertou o temor de que elementos pró-nazistas no Brasil pudessem provocar uma reação, mas o presidente Franklin D. Roosevelt resistiu aos apelos dos militares para executar imediatamente o Plano Borracha e, em vez disso, procurou uma solução diplomática. Roosevelt percebeu rapidamente que Vargas precisava manter o respeito de sua população e precisava salvar a face, então os movimentos de Roosevelt foram cuidadosamente planejados para permitir que isso acontecesse.

No exato momento em que o exército dos EUA planejava desembarcar tropas no Brasil, Roosevelt autorizou a exportação de armas e munições para o Brasil, o que aumentou o nível de apoio dos aliados do governo e os militares brasileiros. Isso abriu caminho para uma reunião de chanceleres das nações sul-americanas em janeiro de 1942, na qual os Estados Unidos instaram seus vizinhos a romper relações diplomáticas com a Alemanha. O aumento do apoio à causa aliada levou o Brasil a fazer exatamente isso no final da reunião. O ponto culminante dessa política cuidadosa foi a assinatura em maio de 1942 do Acordo de Defesa Brasileiro-Americano (Acordos de Washington), que permitiu total apoio dos Estados Unidos à defesa do Brasil e, finalmente (após o naufrágio de cinco embarcações brasileiras por submarinos U-Boot alemães) a entrada do Brasil na guerra do lado aliado em 22 de agosto de 1942.

Veja também

Referências

  1. Garfield, Seth. In Search of the Amazon Brazil, the United States, and the Nature of a Region. Duke University Press, 2013, pág. 71, (em inglês). ISBN 9780822377177 Consultado em 19 de maio de 2022
  2. US Naval Institute Proceedings, October 1999
  3. Records of the Office of the Chief of Naval Operations, Plans, Orders & Related Documents, CINCLANT Oct 1941 to Dec 1942, Box 16. Rubber Plan
  4. Chant, Christopher. The Encyclopedia of Codenames of World War II (Routledge Revivals). Routledge, 2013, pág. 93, (em inglês). ISBN 9781134647873 Consultado em 19 de maio de 2022
  5. Ribeiro, Antonio Sérgio (22 de agosto de 2012). «Brasileiros esquecidos - 70 anos da entrada do Brasil na 2ª Guerra Mundial (segunda parte)». Assembleia Legislativa de São Paulo. Consultado em 19 de maio de 2022