Svetlana Alexijevich

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Svetlana Aleksiévitch
Svetlana Alexijevich
Svetlana Aleksiévitch em Colónia, 14 de outubro de 2013
Nascimento 31 de maio de 1948 (75 anos)
Stanislav, RSS Ucrânia
Cidadania bielorrussa
Ocupação Escritora e jornalista
Prémios National Book Critics Circle Award (2005)

Prémio Médicis ensaio (2013)
Nobel de Literatura (2015)

Género literário Recolha de testemunhos
Magnum opus Vozes de Tchernóbil, O Fim do Homem Soviético
Assinatura
Página oficial
www.alexievich.info

Svetlana Aleksandrovna Aleksiévitch, também grafado como Svetlana Alexandrovna Alexievitch (em bielorrusso: Святлана Аляксандраўна Алексіевіч; Stanislav, RSS Ucrânia, 31 de maio de 1948) é uma escritora e jornalista bielorrussa. Foi galardoada com o Nobel de Literatura de 2015 "pela sua escrita polifónica, monumento ao sofrimento e à coragem na nossa época".[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Filha de dois professores, sendo o pai bielorrusso e a mãe ucraniana, Svetlana Aleksievitch nasceu em Stanislav, hoje Ivano-Frankivsk, na Ucrânia, em 1948, mas cresceu na Bielorrússia. Estudou jornalismo na Universidade de Minsk a partir de 1967 e depois de completar o curso mudou-se para Beresa, na província de Brest, para trabalhar no jornal e escola locais. Durante esse tempo debateu-se entre a tradição familiar de trabalhar no ensino e no jornalismo. Trabalhou depois como repórter na imprensa local de Narowla, no voblast de Homiel.

Desde os seus dias de escola já tinha escrito poesia e artigos para a imprensa escolar. Também foi jornalista da revista literária Neman de Minsk, para a que escreveu ensaios, contos e reportagens. O escritor bielorrusso Ales Adamovich inclinou-a definitivamente para a literatura apoiando um novo género de escrita que denominou "novela coletiva", "novela-oratório", "novela-evidência", "gente dançando com lobos" ou "coro épico", entre outras fórmulas[2]. De fato, nos seus textos a meio caminho entre a literatura e o jornalismo usa a técnica de collage justapondo testemunhos individuais, com o que consegue aproximar-se mais à substância humana dos acontecimentos. Usou este estilo pela primeira vez no seu livro A Guerra Não Tem Rosto de Mulher (1983), em que a partir de uma série de entrevistas aborda o tema das mulheres russas que participaram na Segunda Guerra Mundial[2][3].

A autora utiliza do caráter polifônico de sua obra para clarificar e evidenciar os traumas da sociedade soviética e pós-soviética. A autora publicou seus primeiros livros durante a Perestroika e a Glasnost de Gorbatchóv, num momento de grande clamor e crítica ao Partido Comunista da União Soviética.

Aleksiévitch utiliza de uma literatura oralizada, de modo a tentar captar tanto os silêncios quanto as pausas de rememoração do trauma. O enorme silêncio, característico da própria dificuldade de narrar o trauma, evidencia-se em sua obra por exemplo na grande ocorrência de reticências - na edição brasileira de "As últimas testemunhas", há uma média de 6 reticências por página. Conforme nota Portal,[4] "As reticências possuem os mais diversos usos, mas sua recorrência maior em Svetlana é para indicação de pausas como se para prolongar certa incompletude existencial do relato, como se permanecesse no ar até a próxima oração. É como se brotasse uma espécie de temporalidade em suspenso que nos faz refletir, de modo a imaginarmos a entonação utilizada pela testemunha e o ato da entrevista. As reticências produzem uma temporalidade ética sem hipertrofiá-la em seu sentido."

Nesse sentido, Aleksiévitch ocupa certa posição semelhante àquela de Soljenítsin, como condenadora do mal causado pela União Soviética. O discurso da autora, existencialmente carregado de sofrimento, tende a construir uma imagem de interrogação diante das perseguições, do gulag, da repressão, do autoritarismo e do medo. Logo, a autora procura as maiores catástrofes soviéticas para pintar a imagem de um regime totalitário desde seu início. A autora, assim, escreve um texto que se assemelha a uma oração para a humanidade. É nesse sentido que afirma Portal: "Esse ato, que é ao mesmo tempo composição artística e gesto político, produz um texto transpassado sempre por um significado em suspenso, em espera, como uma janela aberta diante de uma obliquidade violenta comum. Não é sem razão que experimentemos um mutismo linguístico a partir dessa violência, feito a busca por um ser humano originário que perdeu-se em seu próprio projeto enquanto humanidade." [4]

Relevância da obra[editar | editar código-fonte]

A sua obra é uma crônica pessoal da história de mulheres e homens soviéticos e pós-soviéticos, a quem entrevistou para as suas narrativas durante os momentos mais dramáticos da história do seu país, como por exemplo a Segunda Guerra Mundial, a Guerra do Afeganistão, a queda da União Soviética e o desastre de Chernobyl[2]. Abandonou a Bielorrússia em 2000 e viveu em Paris, Gotemburgo e Berlim. Em 2011 Aleksievitch voltou a Minsk[1][3].

Vários livros seus têm sido publicados na Europa, Estados Unidos, China, Vietname e Índia. É interessante lembrar, porém, que, ainda no final dos anos 1990, a tradutora e escritora Galia Ackerman fez uma via-crúcis para publicar o primeiro título de Aleksiévitch em francês, "Vozes de Chernobil" (título lançado em 1997), que foi rejeitado quatro editoras francesas.[5]

Desde 1996 tem recebido numerosos prêmios internacionais, como o polaco Ryszard-Kapuściński em 1996, o Prêmio Herder em 1999 e o Prêmio da Paz dos Editores Alemães (2013), entre outros. Está traduzida em 22 línguas e algumas das suas obras foram adaptadas a peças de teatro e documentários. Svetlana recebeu, entre outras distinções, o Erich Maria Remarque Peace Prize, em 2001, e o National Book Critics Circle Award, em 2006[1].

Svetlana assim descreve seu trabalho:

Se inserindo no campo da literatura traumática, Aleksiévitch escreve um retrato da catástrofe do século XX. Ela pede que as testemunhas tomem a palavra e lhe falem de suas memórias de sofrimento. Exercício sensível de escuta, ela age numa perspectiva clínica e terapêutica, propondo uma relação entre autora e testemunha baseada na exposição prolongada do trauma e da memória machucada. Ao mesmo passo em que ela escuta relatos individuais, ela insere as biografias no tecido coletivo da história soviética. Assim nota Portal[7] a respeito da representação da violência soviética levada a cabo por Aleksiévitch:

A construção dessa potência testemunhal, levada a cabo por uma representação sígnica de dor e medo, é a dimensão cênica de uma memória perturbada. Ao mesmo tempo exercício de compreensão e pedido de demora, as reticências, enquanto elemento sígnico e textual, dotam o texto enquanto uma plataforma de significado em aberto. Ao ver-nos diante desse cenário, certamente latente, nos deparamos com a manifestação de um sintoma escondido da humanidade, que a constitui e a forma de maneira violenta. [...] Essas palavras de Svetlana nos situam à margem, mas, ao mesmo tempo, perante o enorme drama de uma condição humana baseada na destruição. O texto passa a contaminar-nos em sua perversidade, como a expressão de uma desmontagem que nos ultrapassa.

Obras[editar | editar código-fonte]

  • У войны не женское лицо (U voyny ne zhenskoe litso, War Does Not Have a Woman's Face), Minsk: Mastatskaya litaratura, 1985. Edição portuguesa: A Guerra não Tem Rosto de Mulher. Elsinore, 2016. ISBN 9789898843579. Edição brasileira: Companhia das Letras, 2016, ISBN 9788535927436.
  • Цинковые мальчики (Tsinkovye malchiki, Boys in Zinc), Moscow: Molodaya Gvardiya, 1991. Edição portuguesa: Rapazes de Zinco: A geração soviética caída na guerra do Afeganistão. Elsinore, 2017. ISBN 9789898864000
  • Чернобыльская молитва (Chernobylskaya molitva, Chernobyl Prayer), Moscow: Ostozhye, 1997. ISBN 5-86095-088-8. Edição portuguesa: Vozes de Chernobyl: Histórias de um desastre nuclear, Elsinore, 2016. ISBN 9789898831828. Edição brasileira: Vozes de Tchernóbil: crônica do futuro, Companhia das Letras, 2016, ISBN 9788535927085.
  • Последние свидетели: сто недетских колыбельных (Poslednie svideteli: sto nedetskikh kolybelnykh, The Last Witnesses: A Hundred of Unchildlike Lullabys), Moscow, Palmira, 2004, ISBN 5-94957-040-5 (primeira edição: Moscovo: Molodaya Gvardiya, 1985). Edição portuguesa: As Últimas Testemunhas: Cem histórias sem infância. Elsinore, 2017. ISBN 9789898864178
  • Зачарованные смертью (Zacharovannye Smertyu, Enchanted with Death) (Bielarrusso: 1993, Russo: 1994)

Referências

  1. a b c Queirós, Luís Miguel (8 de outubro de 2015). «Svetlana Alexievich é o Prémio Nobel da Literatura 2015». Público PT. Consultado em 8 de outubro de 2015 
  2. a b c El País (ed.). «Por que você precisa ler Svetlana Alexievich, a nova Nobel de literatura?». El País. Consultado em 2 de maio de 2017 
  3. a b CORINNE SEGAL (ed.). «Svetlana Alexievich, investigative journalist from Belarus, wins Nobel Prize in Literature». PBS. Consultado em 2 de maio de 2017 
  4. a b Portal, João Camilo Grazziotin (2021). «Uma curadora de memórias soviéticas traumáticas : testemunho, violência e autoria em Svetlana Aleksiévitch». Consultado em 13 de julho de 2022 
  5. «Nos 1990, quatro editoras francesas rejeitaram livro de Svetlana - 24/10/2015 - Ilustrada». Folha de S.Paulo. Consultado em 30 de março de 2023 
  6. Svetlana Alexievich Website (ed.). «THE CHRONICLER OF THE UTOPIAN LAND». Svetlana Alexievich Website. Consultado em 2 de maio de 2017 
  7. Portal, João Camilo (jul. 2021). «Uma escritora da hospitalidade: as imagens da escuta de Svetlana Aleksiévitch». História & Cultura (UNESP) (vol. 10, n. 1): 72-93. Consultado em 12 de julho de 2022 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]


Precedido por
Patrick Modiano
Nobel de Literatura
2015
Sucedido por
Bob Dylan