Volta Seca

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Volta Seca
Volta Seca
Arthur Ramos, médico-legista, fazendo exames de craniometria em Volta Seca, em 1944]]
Conhecido(a) por Volta Seca
Nascimento 13 de março de 1918
Saco Torto, Itabaiana, SE
Morte 2 de fevereiro de 1997 (78 anos)
Estrela Dalva, MG
Nacionalidade brasileiro

Antônio dos Santos (Saco Torto, 13 de março de 1918Estrela Dalva, 2 de fevereiro de 1997), conhecido como Volta Seca, foi um cangaceiro sergipano do bando de Lampião. Entrou para o cangaço aos onze anos de idade, após cometer, com apenas dez anos, seu primeiro homicídio. Assim como Lampião, também foi comparado ao fora da lei Jesse James.[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Entrada no cangaço[editar | editar código-fonte]

O cangaceiro mais jovem do bando de Lampião, Antônio dos Santos, mais conhecido como Volta Seca, ingressou no bando com apenas 11 anos, por causa de brigas frequentes com sua madrasta e, também, segundo ele, por fugir da política por ter assassinado o homem que estuprou sua irmã, aos dez anos de idade, indo para o grupo.[1] Suas funções diárias se limitavam a banhar os cavalos, lavar louças, roupas sujas e espionar cidades que havia muitos policias em ronda, passando desde logo a ser o famoso Volta Seca. Tanto apanhou que se passou a ser um dos cangaceiros mais violentos de todo o bando. Apesar de semialfabetizado, escrevia com muita facilidade versos e também compunha músicas que o bando inteiro conhecia e entoava com entusiasmo quando estava acampado em alguma fazenda sob proteção do próprio dono.

Em 1929, Volta Seca participou da chacina de Queimadas.[2][3]

Prisão, fugas e indulto[editar | editar código-fonte]

Volta Seca foi preso três vezes, tendo fugido nas duas primeiras.[4] Na primeira vez, aos quinze anos, em março de 1932, após ser capturado na Bahia, foi transferido para um presídio em Salvador.[5] Nessa ocasião, duas mil pessoas recepcionaram sua chegada à cidade, antes de ser levado à cadeia.[2] Em 1939, enquanto se encontrava preso, foi visitado por Irmã Dulce, canonizada em 2019, que tocava sanfona para os prisioneiros.[2] Em 1944, conseguiu escapar do presídio, em companhia de Manoel Pompilio,[6] e foi caminhando da Bahia até Sergipe, percurso que demorou vinte dias.[2] Empreendeu a segunda fuga em 1946.[6]

Volta Seca em frente ao Elevador Lacerda, após ser libertado

À revelia do Código de Menores de 1927, em vigor na época, que estabelecia a maioridade penal aos dezoito anos de idade,[7] Volta Seca foi julgado, aos quinze, e sentenciado a 145 anos de prisão.[8][3] Ulteriormente a pena foi reduzida para trinta, e, finalmente, para vinte anos.[5] O cangaceiro relatou, aliás, ter solicitado intervenção de Irmã Dulce para conseguir diminuir a pena.[2] Além disso, foi objeto de estudos de antropologia criminal por Estácio de Lima, médico-legista, e Arthur Ramos, diretor do Instituto Nina Rodrigues, que constataram a ausência de "estigmas lombrosianos" em Volta Seca e advogaram pela sua libertação, visto que o direito à ampla defesa também não foi respeitado.[5] Inclusive, Estácio de Lima o convidou a trabalhar no Instituto.[3] Em 24 de março de 1952,[3] após vinte anos preso, foi liberado do cárcere em decorrência do indulto presidencial concedido Getúlio Vargas e solicitado, pessoalmente, pelo médico quatro vezes.[3] O dinheiro que acumulou no presídio, cerca de oito contos de réis, doou aos pobres após deixar a cadeia.[2]

Vida após o cangaço[editar | editar código-fonte]

Após deixar o cangaço, Volta Seca teve treze filhos e trabalhou na Estação Barão de Mauá.[4][1][2] Gravou, em 1957, o LP de 10 polegadas "As cantigas de Lampeão", com direção do maestro Guio de Morais e narração do locutor da Rádio Nacional, Paulo Roberto.[9] Lançado pela gravadora Todamérica, o disco continha as músicas do Cangaço, entre elas "Mulher Rendeira" e "Acorda Maria Bonita".[2][4]

Em 1952, colaborou no célebre filme O Cangaceiro (1953), de Lima Barreto, oferecendo seu testemunho sobre a vida no cangaço.[10] Em 1963, procurou a redação do jornal A Tarde, descontente com boatos de que ele se dedicou, no cárcere, ao ofício do crochê e com a sugestão de que ele fosse homossexual, publicada em uma reportagem de 27 de março de 1957 do jornal soteropolitano: "na Penitenciária dedicou-se a tarefas mais próprias às mulheres, executando trabalhos em ‘tricot’ de fino gosto! Quando parecia que deixava a prisão marcado por uma anomalia sexual, casa-se cá fora ‘Volta-Seca’, hoje já sendo pai por duas vezes".[4]

Volta Seca faleceu aos 78 anos vítima de um enfisema pulmonar.

Representações culturais[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c «O Pasquim encosta na parede o Jesse James do Nordeste: Volta Seca, o cangaceiro» 🔗. O Pasquim. 1973. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  2. a b c d e f g h «Sanfoneira, Irmã Dulce visitava presídios e atendeu até cangaceiro de Lampião». Folha de S.Paulo. 10 de outubro de 2019. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  3. a b c d e Cadena, Nelson. «Com sanfona, Irmã Dulce visitou cangaceiro e intercedeu por ele». www.correio24horas.com.br. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  4. a b c d e TARDE, A. (29 de maio de 2021). «A trajetória de Volta Seca, o menino do bando de Lampião». A TARDE. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  5. a b c Domingues, Petrônio (3 de agosto de 2017). «O "Corisco Preto": cangaço, raça e banditismo no Nordeste brasileiro». Revista de História (176): 01–39. ISSN 2316-9141. doi:10.11606/issn.2316-9141.rh.2017.119973. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  6. a b «Fuga sensacional de Volta Seca». Gazeta de Notícias (16): p. 8. 19 de janeiro de 1946. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  7. «Crianças iam para a cadeia no Brasil até a década de 1920». Senado Federal. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  8. Fernandes, Millôr (1973). «E isso é isso - carta editorial n.º 14». O Pasquim. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  9. «Volta Seca». Dicionário Cravo Albin. Consultado em 22 de outubro de 2023 
  10. Neves, Anderson (28 de fevereiro de 2013). «Entre o western e o nordestern : os possíveis diálogos de Lima Barreto e Glauber Rocha no cinema cangaço (O cangaceiro 1953, Deus e o diabo na terra do sol 1964 e O dragão da maldade contra o santo guerreiro 1969)». doi:10.14393/ufu.di.2013.140. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  11. Bakuzis, Alida (1984). «Reformismo e roupagem revolucionária: uma comparação das forças sociais de mudança em Esteiros e Capitães da Areia». Mester (2). ISSN 0160-2764. doi:10.5070/M3132013729. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  12. «Portal UFS - UFS concede título de Doutor Honoris Causa ao jornalista, pesquisador e professor Gilfrancisco». www.ufs.br. Consultado em 21 de outubro de 2023 
  13. SILVA, Gonçalo Ferreira da. Volta seca um menino no cangaço. [S.n.t.].

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Fontes, Oleone Coelho (1999). Lampião na Bahia 3. ed ed. Petrópolis: Vozes. ISBN 8532617085