Bumba meu boi

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Boi de reis no Paço Alfândega, no Recife

Bumba meu boi ou boi-bumbá[1] é uma festa do folclore popular brasileiro, com personagens humanos e animais fantásticos, que gira em torno de uma lenda sobre a morte e ressurreição de um boi.[1][2]

Em diversas cidades do Brasil, especialmente no Norte e no Nordeste mas também em algumas do Sudeste, existem agremiações chamadas de "bois" que realizam cortejos ou outros tipos de apresentações utilizando a figura do animal, tendo muitas vezes caráter competitivo.

A festa tem ligações com diversas tradições, africanas, indígenas e europeias, inclusive com festas religiosas católicas, sendo associada fortemente ao período de festas juninas.[3]

Embora com gênese no Piauí[4], e tido um de seus primeiros registros em Pernambuco, é mais popular no Maranhão. O bumba meu boi maranhense recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) o título de Patrimônio Cultural do Brasil, e o de Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO.[5][6]

Ao espalhar-se pelo país, a manifestação adquire nomes, ritmos, formas de apresentação, indumentárias, personagens, instrumentos, adereços e temas diferentes. Em Pernambuco é chamado boi-calemba ou bumbá; no Maranhão, Rio Grande do Norte, Alagoas e Piauí é chamado bumba meu boi; no Ceará, é boi de reis, boi-surubim e boi-zumbi; na Bahia é boi-janeiro, boi-estrela-do-mar e mulinha-de-ouro; em Minas Gerais e no Rio de Janeiro é bumba ou folguedo-do-boi; no Espírito Santo é boi de reis; em São Paulo é boi de jacá e dança-do-boi; no Pará, Rondônia e Amazonas é boi-bumbá;[2] no Paraná e em Santa Catarina é boi-de-mourão ou boi-de-mamão;[2] e no Rio Grande do Sul é bumba, boizinho ou boi-mamão.[2]

História[editar | editar código-fonte]

Detalhe da apresentação do bumba-meu-boi de Axixá, em São Luís

Manifestações culturais e religiosas em torno da figura do boi existiram em diversas culturas antigas pelo mundo.[7] A festa do bumba meu boi surgiu no norte do país.

A história econômica e social, a memória oral, as narrativas, as lendas e mitos de fundação de origem negra e indígena relacionados à cultura do boi apontam para esse fato de que o bumba meu boi tem sua gênese no Piauí palco de onde o auto pastoril teria migrado para o Maranhão, Pará e outras regiões do Brasil.[4] Outro fato conhecidamente certo sobre a história do surgimento dessa festa é o de um episódio ocorrido no período da dominação holandesa no estado de Pernambuco, mais precisamente no Recife. Esse acontecimento é denominado de episódio do Boi Voador, e que, a partir daí, teria evoluído para uma lenda com uma história mais elaborada tal como é hoje.

Seu primeiro registro ocorre num jornal do Recife, no ano de 1840.[8]

Mas é no Estado do Maranhão que o bumba meu boi tem sido mais valorizado em todo o Nordeste e, dali, foi exportado para o Estado do Amazonas com o nome de boi-bumbá, visitado anualmente por milhares de turistas que vão conhecer o famoso Festival Folclórico de Parintins, realizado desde 1965.[1]

Enredo[editar | editar código-fonte]

Existem algumas variações a respeito da lenda do boi. A história mais comum aborda a escrava Catirina (ou Catarina), grávida, que pede ao marido Chico (ou Pai Francisco) para comer língua de boi. O escravo atende ao desejo da esposa, matando o boi, e sendo preso a mando do dono da fazenda. Com a ajuda de curandeiros, o boi é então ressuscitado.[3]

Dependendo da versão, outros personagens podem ser incorporados, tais como: Battião, Arlequim, Pastorinha, Turtuqué, o engenheiro, o padre, o médico, o diabo, entre outros. Quase todos quase sempre interpretados por homens, que se travestem para compor os personagens femininos.[3]

Em algumas versões, Pai Chico chama-se Mateus[9] e o boi não é morto por ele, mas apenas se perde e acaba morto no decorrer da história, sendo também ressuscitado no fim.[9]

Concepção[editar | editar código-fonte]

A essência da lenda enlaça a sátira, a comédia, a tragédia e o drama, e demonstra sempre o contraste entre a fragilidade do homem e a força bruta de um boi. Esta essência se originou da lenda de Catirina e Pai Francisco, de origem nordestina. Ao ser levada para a região Norte, sofreu adaptação à realidade amazônica, e faz reverência ao boi como se esse fosse nativo da floresta Amazônica (o que é historicamente incorreto, pois o gado bovino não é nativo das Américas), também exaltando a alegria, sinergia e força das festas coletivas indígenas.

Personagens[editar | editar código-fonte]

Bumba-Meu-Boi Mimoso, de São Bento, no Maranhão, em apresentação

O Capitão é o comandante do espetáculo. Há também Francisco e Catirina, personagens bastante conhecidos que apresentam os bichos, cantam e dançam de forma cômica.[9] Existem vários personagens e variam bastante entre os diferentes grupos, mas os principais são os seguintes:

  • Amo: representa o papel do dono da fazenda, comanda o grupo com auxílio de um apito e um maracá (maracá do amo) canta as toadas principais;
  • Pai: Chico ou Mateus
  • Mãe: Catirina ou Catarina
  • Boi: é a principal figura, consiste numa armação de madeira em forma de touro, coberta de veludo bordado. Prende-se, à armação, uma saia de tecido colorido. A pessoa que fica dentro e conduz o boi é chamado miolo do boi;
  • Vaqueiros: são também conhecidos por rajados. Nos bois de zabumba, são chamados caboclos de fita. Em alguns bois, existe o primeiro vaqueiro, a quem o fazendeiro delega a responsabilidade de encontrar pai Chico e o boi sumido, e seus ajudantes, que também são chamados vaqueiros;
  • Índios, índias e caboclos: têm a missão de localizar e prender Pai Chico. Na apresentação do boi, proporcionam um belo efeito visual, devido à beleza de suas roupas e da coreografia que realizam. Alguns bois, principalmente os grupos de sotaque da ilha, possuem o caboclo real, ou caboclo de pena, que é a mais rica indumentária do boi;
  • Burrinha: aparece em alguns grupos de bumba meu boi. Trata-se de um cavalinho ou burrinho pequeno, com um furo no centro por onde entra o brincante. A burrinha fica pendurada nos ombros do brincante por tiras similares a um suspensório';
  • Cazumbá: Personagem divertido, às vezes assustador, que usa batas coloridas e máscaras de formatos e temática muito variada. Não são todos os grupos de bumba meu boi que possuem cazumbás.

Instrumentos[editar | editar código-fonte]

Os bois de influência predominantemente indígena, bois de matraca, utilizam principalmente os seguintes instrumentos:

  • maracá: instrumento feito de lata, cheio de chumbinhos ou contas de Santa Maria. É um instrumento de origem tanto africana como indígena;
  • matraca: feita de madeira, principalmente pau d'arco, é tocada batendo-se uma contra a outra;
  • pandeirão: pandeiro grande, coberto geralmente de couro de cabra. Alguns têm mais de 1 metro de diâmetro e cerca de 10 cm de altura. São afinados a fogo.
  • tambor onça: É uma espécie de cuíca, toca-se puxando uma vareta que fica presa ao couro e dentro do instrumento. Imita o urro do boi, ou da onça.

Os bois de zabumba utilizam principalmente:

  • tamborinho: pequeno tambor coberto de couro de bicho. O mais comum é usar couro de cutia. É tocado com a ponta dos dedos.
  • zabumba: é um grande tambor, conhecido também como bumbo, é um instrumento tipicamente africano;
  • tambor de fogo: feito de uma tora de madeira ocada à fogo e coberto por um couro cru de boi preso à tora por cravelhas. É um instrumento tipicamente africano;

Os bois de orquestra têm instrumentação muito variada: utilizam instrumentos de sopro como saxofones, trombones, clarinetas e pistões; banjos, bumbos e taróis, também mara.

Festival Folclórico de Parintins[editar | editar código-fonte]

Ver artigo principal: Festival Folclórico de Parintins

O Festival Folclórico de Parintins é um festival de boi-bumbá que acontece todos os anos na cidade de Parintins, no interior do Amazonas. É considerado Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).[10]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti (agosto de 1999). «O Boi-Bumbá de Parintins, Amazonas: breve história e etnografia da festa». Consultado em 15 de junho de 2013 
  2. a b c d Silvio Essinger. «Bumba-Meu-Boi, Uma tradição que corre o Brasil de Norte a Sul». Consultado em 15 de agosto de 2013. Cópia arquivada em 22 de junho de 2009 
  3. a b c Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular. «Bumba-Meu-Boi». Consultado em 15 de agosto de 2013. Cópia arquivada em 19 de dezembro de 2012 
  4. a b FERREIRA, Elio (2016). O Bumba-Meu-Boi do Piauí: poesia afro-brasileira, cantigas, gênese, memórias e narrativas de fundação do Boi de Né Preto de Floriano Piauí. Teresina: Revista Vozes. p. 1. 15 páginas 
  5. Ministério da Cultura: "Iphan entrega títulos de patrimônio cultural a grupos de Bumba-meu-boi no Maranhão"
  6. «Bumba Meu Boi do Maranhão agora é Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade». UNESCO. 11 de dezembro de 2019. Consultado em 16 de dezembro de 2019 
  7. Enciclopédia Nordeste. «Bois do Carnaval». Onordeste.com. Consultado em 5 de janeiro de 2012. Arquivado do original em 5 de janeiro de 2012 
  8. Cíntia Cristina. «Bois do Carnaval». Mundo Estranho. Consultado em 15 de agosto de 2013 
  9. a b c Fonte: GASPAR, Lúcia. Bumba-meu-boi. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar>. Acesso em: 15/08/2013.
  10. «Complexo Cultural do Boi-Bumbá do Médio Amazonas e Parintins». portal.iphan.gov.br. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN. Consultado em 29 de setembro de 2019 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • BARROS, Antonio Evaldo Almeida. 2007. O Pantheon Encantado: Culturas e Heranças Étnicas na Formação de Identidade Maranhense (1937-65). Dissertação de Mestrado em Estudos Étnicos e Africanos. Salvador: PÓS-AFRO/CEAO/UFBA.
  • CARVALHO, Maria Michol Pinho de. 1995. Matracas que desafiam o tempo: é o bumba-boi do Maranhão. São Luís: s/e.
  • PRADO, Regina de Paula Santos. 1977. Todo ano tem: as festas na estrutura social camponesa. Dissertação de Mestrado em Antropologia. Rio de Janeiro: PPGAS-MN/UFRJ.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]