Grande revolta irmandinha

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Castelo da Rocha Forte demolido pelos irmandinhos em 1467.

A Grande Revolta Irmandinha, foi possivelmente a maior revolta europeia de todo o século XV.[1][2] Começou na primavera de 1467, na Galiza, numa conjuntura de crise social (fome, epidemias, bem como os abusos da nobreza galega) e política (guerra civil em Castela).

Assim como as demais Revoltas Irmandinhas, foi protagonizada por integrantes das "irmandades" (tipo de corpo policial formado nas cidades da Península Ibérica na Baixa Idade Média).

Precedentes[editar | editar código-fonte]

A grande revolta irmandinha de 1467 foi precedida por diversas revoltas em certas zonas e localidades da Península Ibérica (ver: Revoltas Irmandinhas).

Segundo alguns historiadores,[3] a primeira revolta protagonizada por uma Irmandade, ocorreu entre 1418 e 1422 (Baixa Idade Média), na Galícia, em Santiago de Compostela.

Em 1431, Roi Xordo liderou a Irmandade Fusquenlla, nas terras dos Andrade.

Em 1451, foi constituída uma irmandade nas rias de Pontevedra e Arousa. Depois surgiu a Irmandade da Corunha e Betanzos, seguindo-se as de Santiago de Compostela, Muros e Noia de 1458.

Desencadeantes[editar | editar código-fonte]

Conjuntura de crise social[editar | editar código-fonte]

Agressividade dos senhores. Os refúgios de mal-feitores[editar | editar código-fonte]

Armadura e armas dos cavaleiros, geralmente aportadas pelo senhor na Investidura.

A nobreza galega vivia um século XV de conflitos e confrontos internos. À intranquilidade gerada por tal série de conflitos, somavam-se os efeitos negativos da epidemia de 1466, além disso, antes da peste, ocorreram más colheitas, que provocaram uma queda de rendas da nobreza, a qual optou por uma atitude arrecadadora agressiva para contra-restar esta queda.

Entre as vítimas desta rapacidade da nobreza, encontrava-se também o clero, mesmo mosteiros e catedrais, cujo patrimônio e senhorios tinham sido ocupados ou encomendados nessas datas.[4]

Existia, portanto, um sentimento acumulado de agravo, pelos males e danos que vilas e gente recebiam das fortalezas (fortificações), percebidas como refúgios de mal-feitores, tanto de senhores e cavaleiros quanto de prelados, como indicam as testemunhas do Pleito Tabera - Fonseca:

Tudo isso indica uma certa convicção de que a anarquia provinha dos senhores.

Por isso, as irmandades concentraram esforços para demolir os refúgios dos malfeitores,: as "fortalezas" (fortificações), construídas entre os séculos X e XV.

A estes determinantes componentes emotivos, acresciam as intenções de se emanciparem da vassalagem e do pago de rendas ao senhor.

Conjuntura de crise política[editar | editar código-fonte]

Outro fator era a debilidade do Estado medieval, que fazia com que os reis, em toda a Europa, se apoiassem nas cidades e vilas para reduzir o poder da nobreza feudal. No Reino de Castela, era especialmente relevante a disputa, na década de 1460, entre o infante D. Afonso e o Rei Henrique IV de Castela, com o correspondente vazio de poder.

Posição da nobreza galega no conflito entre D. Henrique e D. Afonso[editar | editar código-fonte]

Enrique IV de Castela, quem autorizou a Santa Irmandade.

A atitude de toda a nobreza galega frente do conflito entre Henrique IV e Afonso ainda não está totalmente esclarecida. Mas, pode-se afirmar que entre os fiéis a Henrique IV situar-se-iam: D. Alvar Pérez Osorio (conde de Trastâmara),[5] e talvez[6] e alguns dos seus parentes próximos, como Lope Sánchez de Moscoso ou Gómez Pérez das Mariñas.

Segundo Morais Muñiz, os partidários de Afonso seriam os condes de Ribadeo e de Santa Marta, o de Benavente,[7] D. Alvar Páez de Soutomaior,[8] o visconde de Monterrei, D. Juan de Zúñiga[9] e provavelmente também Fernán Pérez de Andrade,[10] bem como o arcebispo D. Alonso II de Fonseca[11] e também o próprio conde de Lemos, apesar das evidências serem escassas e contraditórias.[12][13]

Posição do clero e terceiro estamento no conflito entre Henrique e Afonso[editar | editar código-fonte]

Pelo contrário da nobreza galega, o rei contou com o apoio da maioria do clero galego, incluindo o episcopado, à exceção do arcebispo Fonseca.[14] Henrique IV contou também com uma ampla base popular, maiormente em vilas e cidades, conhecedores de ser D. Henrique o apoio legal do movimento Irmandinho.

As "Hermandades" noutros territórios da coroa de Castela. Surgimento e influência na Irmandade[editar | editar código-fonte]

Esta aguda crise social e política favoreceu o desenvolvimento das Hermandades. Assim, já entre 1456 e 1460 várias vilas de Guipúscoa utilizaram a "hermandad" contra a nobreza local, demolindo um grande número das suas casas-fortes "porque façian e consentían muchos robos e malificios en la tierra e en los caminos e en todos los logares".[15] Em 1464 uma nova Hermandad General castelhana celebrou a sua primeira junta em Segóvia. Esta irmandade permaneceu inicialmente sob controlo de Henrique IV, quem a utilizaria contra os partidários do seu irmão D. Afonso.[16]

O surgimento da "Hermandad General de Castela e Leão" deu pé a que as cidades galegas leais a Henrique demandassem dele a extensão das Hermandades ao Reino da Galiza. Henrique IV permitiu afinal o surgimento da "Santa Irmandade", seguramente com o propósito de debilitar a rebelião da nobreza. Outro propósito de Henrique poderia ser o de conseguir a contribuição da Galiza à Fazenda real, restituindo ademais o direito a voto nas Cortes da Galiza (cuja perda ocorrera nas cortes de Madrid de 1419).[17]

Alonso de Palencia, cronista oficial do reino de Castela, comenta em 1477 a formação e atividade da Irmandade galega, apresentando-a como a máxima realização da Hermandad General de Castela e Leão, e amostra o seu entusiasmo pela eficácia do seu trabalho justiceiro e anti-senhorial, tomando fortificações tidas por inexpugnáveis.[18]

Começo da Irmandade[editar | editar código-fonte]

Precedentes[editar | editar código-fonte]

Entre 1454 e 1458, existiu outra irmandade na Galiza "quel dicho moy virtuoso rey don Enrrique mandó faser e se fiso por su mandato en la çibdad de la Cruña e villa de Betanços", à qual se uniriam os concelhos de Santiago, Noia e Muros ,[19] bem como importantes senhores galegos (Bernal Yáñez de Moscoso, Pedro Bermúdez de Montaos ou Suero Gómez de Soutomaior).

O começo da Irmandade foi anterior à grande revolta da primavera de 1467, como provam documentos e referências de começos de 1465. Assim, em Fevereiro de 1465 registra-se que D. Pedro Álvarez Osorio, conde de Lemos, cedia para o seu filho a fortificação de Monforte, por lhe serem contrárias as irmandades da Galiza e, segundo declara o conde, "poderia ser quisessem tomar suas terras e não era justo que seu filho, sendo sem culpa e inocente, as perdesse".[20]

Aprovação da Irmandade[editar | editar código-fonte]

Aparentemente, algumas das vilas galegas mais significativas, como a Corunha, Ferrol, Santiago, Lugo, Pontevedra ou Betanzos, enviaram os seus representantes a fim de sancionar o nascimento da instituição na Galiza. Lope García de Salazar afirma que foi Alonso de Lanzós quem canalizou a demanda, obtendo de Henrique IV os capítulos da Irmandade.[21]

Consta a presença nas cortes de Salamanca, em Maio de 1465, do escrivão Juan Blanco, procurador de Betanzos, quem parece que obteve a demandada aprovação real.

Alfonso Mosqueira, testemunha do pleito Tavera-Fonseca, conta a presença de um enviado do rei D. Henrique, que se chamava Joan de Betresca

Consolidação e implantação[editar | editar código-fonte]

Em princípios de 1467, a Irmandade estava já organizada e implantada, enquanto no rol de ordenamento e justiça. Um testemunho da implantação e integração na Irmandade de vários assinalados nobres galega é a demanda que, em Fevereiro de 1467, apresenta D. Teresa de Zúñiga, condessa de Santa Marta, ante dois representantes da Hermandad General,[23] quem se comprometeram a proceder contra os querelados Sancho López de Ulloa, Pedro Pardo de Cela e Diego de Andrade

Além disso, na demanda também é indicada que esta integração se estendera não somente aos nobres das suas fortificações, mas também aos seus vassalos.

O comprometimento com a Irmandade de cabidos e cidades[editar | editar código-fonte]

Nos princípios de 1467, os comprometimentos de cabidos e cidades foram já expressados publicamente. A 14 de Março, por exemplo, o cabido e o concelho de Tui juraram os capítulos da Santa Yrmandade e uma semana mais tarde designaram o cônego Gonzalo Vázquez para assistir no seu nome à junta da Hermandad que ia celebrar-se em Medina del Campo. Por sua vez, a 16 de Março registra-se um acordo do cabido compostelano de contribuir com "quatro mill maravedies de pares de brancas para aa arca da Yrmandade",[24] e o concelho de Ourense, em Abril, antecipou " viinte e çinco mill pares de brancas" para que a fortificação de Castelo Ramiro fosse entregue "aa Santa Yrmandade". A isto se acrescentam outras reuniões ou assembléias: em Santiago, depois em Lugo, depois em Melide, e mais tarde em Betanzos. Os pormenores da revolta ultimaram-se em tais reuniões; na última há registro da assistência dos senhores Fernán Pérez de Andrade, Sancho Sánchez de Ulloa e Gómez Pérez das Mariñas[25] aos quais foram requeridos a cederem as suas fortificações, "cada uno las suias, e qe las pedían para derribárselas porque dezían que de las dichas fazían muchos males, porque robaban y tomaban a los hombres y los prendían ". Esta exigência representa a confirmação última das intenções já presentes anteriormente, como indicam as precauções tomadas pelo conde de Lemos que se mencionam previamente.

Evolução da revolta[editar | editar código-fonte]

Estalido[editar | editar código-fonte]

Torre de San Sadurniño, em Cambados, destruída entre 1466 a 1470 durante as revoltas irmandinhas.

Nos princípios da primavera estourou a revolta geral, quando as Juntas das Irmandades, organizadas em todas as comarcas galegas, lançaram a consigna contra as fortalezas (fortificações), símbolo do acosso senhorial.[26] As colunas irmandinhas, por volta de "oitenta mil omes",[27] começaram a percorrer as comarcas, e com a força do seu número e o auxílio de trabucos, bombardas e outras armas, acabaram rendendo a grande maioria dos castelos e fortificações.[28][29][30] Como data simbólica, em 25 de Abril de 1467 foi arrasada a primeira fortificação, o Castelo Ramiro, perto de Ourense.

Torreão dos Andrade. Alonso de Lanzós, no comando dos Irmandinhos, apoderou-se do castelo e da vila de Pontedeume, conservando-se na sua posse durante algum tempo.

A revolta era encabeçada por personagens relevantes, incluindo cavaleiros e fidalgos, mesmo parte da aristocracia urbana.[21] Entre eles destacaram-se desde um princípio: Alonso de Lanzós, que agiria na zona de Betanzos e no bispado de Mondoñedo, Pedro Osorio na área de Compostela, e Diego de Lemos, a Sul de Lugo e em Ourense, Lopo Mariño de Lobeira, etc.

A surpresa do ataque foi decisiva no triunfo irmandinho, bem como o total abandono dos vassalos aos senhores e, portanto, a falta de apoio destes, tornando vãs as tentativas da nobreza por resistir.

A maioria dos nobres tentou fugir da Galiza: Sancho de Ulloa e Diego de Andrade partiram para Castela.[32] O arcebispo Fonseca, que se encontrava desterrado de Redondela, fugiu também, primeiro para Castela, e depois para Portugal. Fugiram também outros mais para Portugal, como Juan de Zúñiga, Pedro Álvarez de Soutomaior ou Juan de Pimentel.[33] Alguns tentaram resistir, como Álvar Páez de Soutomaior, que se fez forte em Tui até que, pouco antes da sua morte repentina, rendeu a cidade aos cinco mil irmandinhos que a sitiavam,[34][35] como o conde de Lemos, que saíra vitorioso no princípio, mas teve finalmente que fugir para o seu castelo de Ponferrada; ali se juntou ademais o seu genro, Pardo de Cela. Outros permaneceram escondidos por terras galegas, como Suero Gómez de Soutomaior, parente de Álvar Páez.[36] Gómez Pérez das Marinhas e Alonso Osorio, herdeiro da casa de Lemos encontraram refúgio no mosteiro de Samos[37]

A fuga do conde de Lemos, o senhor mais poderoso da Galiza, simboliza a derrota dos senhores[38] e é salientada pelos cronistas da época:

Vitória e reconhecimento[editar | editar código-fonte]

Cena de batalha medieval.

A vitória irmandinha foi rápida e completa. Os autores mais próximos a estes acontecimentos relatam a lista de castelos, fortificações, simples torres ou casas fortes, que foram total ou parcialmente demolidas e cujo número, segundo calcula Lojo Piñeiro, pôde chegar a 169.[40] Desconhecem-se quantas fortificações foram entregues pacificamente à Irmandade e quantas deveram ser tomadas pela força. Nas declarações do pleito Tavera-Fonseca indica-se que os irmandinhos demoliram mesmo fortificações de cavaleiros participantes ou simpatizantes da Irmandade, e não somente fortificações dos senhores, mas também casas-fortes de fidalgos. É de destacar a aparente resolução irmandinha de não se vingar nos senhores derrotados e fugidos, alguns de eles escondidos em mosteiros e casas de antigos vassalos, proporcionando à insurreição uma orientação em positivo, social e politicamente.

Castelo da Rocha Forte: projéteis de catapulta.

A resposta de Henrique IV foi de claro apoio, emitindo uma carta a 6 de Julho daquele ano, onde dá por boas as demolições feitas:

Henrique IV pedia neste mesmo documento, aos alcaides das fortificações galegas que estiveram assediadas, devido aos males que desde elas faziam, que " .. las den e entreguen a los alcaldes e diputados de la Santa Hermandad del dicho regno". É importante acrescentar que, alguns meses antes deste reconhecimento e referendo dado às Irmandades, Henrique IV tivera de requerer a recondução de algumas atuações das Irmandades contrárias aos interesses da coroa. Assim, a 25 de Abril demandara a devolução a D. Teresa de Zúñiga, condessa de Santa Marta, ao seu filho o conde D. Bernaldino Sarmiento e a D. Juan de Zúñiga, visconde de Monterrei, de "qualesquier tierras e vasallos e fortalesas que les tengades tomadas…". Do mesmo jeito, em 19 de Junho exigia que devolvessem a vila e castelo de Monterrei a D. Pedro de Estúñiga, que primeiramente lhe fora arrebatada por seu irmão D. Juan de Estúñiga, e a este mais tarde pela Irmandade. Por isso ordena à Irmandade que

Evolução durante o triunfo da revolta[editar | editar código-fonte]

O interclassismo do seio da Irmandade (nobreza alta e baixa, clero, burgueses e camponeses) não permitiu possivelmente manter sua unidade após o triunfo. Em 1469, as diferenças entre os membros das diferentes juntas, entre algumas delas e entre os diversos grupos sociais integrados nelas, traduziram-se em claros confrontos.[42] De qualquer forma, o insucesso final da revolta irmandinha foi devido primariamente a circunstâncias externas a Galiza, basicamente influíram dois fatos acontecidos na segunda metade de 1468: o primeiro sendo o falecimento do infante D. Afonso, e o segundo, a reconciliação de Henrique IV com a nobreza opositora, com o pacto dos Touros de Guisando, pelo qual Henrique reconhece como herdeira do trono a sua irmã D. Isabel de Castela.

O contra-ataque dos senhores[editar | editar código-fonte]

Os soldados de Pedro Álvarez usavam modernos arcabuzes na segunda guerra irmandinha. O da imagem é de 1425.
Afonso V de Portugal ajudou Pedro Madruga.

Esta situação fez com que os senhores galegos preparassem seu retorno, reorganizando-se e procurando apoios. Assim, segundo Vasco de Aponte, na primavera de 1469, Pedro Álvarez de Soutomaior reuniu-se em Monção com o arcebispo Fonseca e com Juan Pimentel, acordando reunir as suas tropas nas proximidades de Santiago.

O acordo levou-se a cabo e, após chegar estes, fê-lo o de Soutomaior, que entrara por Portugal á frente de 100 lanças e cerca de 2000 peões (no seu caminho, junto ao castro da Framela, tivera de fazer frente de quatro ou cinco mil vilões e, após vencê-los, sorteou a cidade de Pontevedra, onde se encontravam os irmandinhos no comando de Lope Pérez Mariño, filho de Payo Mariño de Lobera) [43] O exército de Fonseca, Pimentel e Soutomaior, com um total de trezentas lanças, entre castelhanos, portugueses e galegos, venceu no monte Almáciga a dez mil irmandinhos comandos por Pedro Osorio.[44] Esta vitória resultou decisiva, de fato, dois meses mais tarde (Julho de 1469) a cidade de Santiago viu-se obrigada a abrir as portas ao Arcebispo

Juntaram-se a este exército as tropas de Fernán Pérez de Andrade, Sancho Sánchez de Ulloa, Lope Pérez de Moscoso e Gómez Pérez das Mariñas. Então, desde Santiago, encaminharam-se para os domínios de Andrade. Em Castro Gundián, encontrando-se com um exército irmandinho, chefiado por Alonso de Lanzós, quem aguardava os reforços de Diego de Lemos. Mas a batalha começou sem ainda os reforços terem chegado, e Alonso, após um breve parlamento com Pedro Álvarez de Soutomaior, optou pela retirada.;[46] a chegada posterior dos reforços, no comando de Diego de Lemos já não teve consequências. Após esta nova derrota, os senhores liquidaram a resistência irmandinha naquela zona, embora Pontedeume não fosse entregue ao de Andrade, senão ao Arcebispo, por decisão de Alonso de Lanzós, mortal inimigo do primeiro.[47] O conde de Lemos tornava também à Galiza pelo Bierzo, resistindo aos irmandinhos, capitaneados pelo fidalgo berciense Álvaro Sánchez (a quem depois mandou matar com seta) e às gentes de Álvaro Pérez Osorio, conde de Trastâmara e agora marquês de Astorga, que apoiara a sublevação. Com o conde de Lemos parece que retornaram também Pedro Pardo de Cela, com Pedro Miranda, Pedro Bolaño e outros como Alonso López de Lemos, pai de Diego de Lemos. Os primeiros, pelo que parece, atacaram os núcleos irmandinhos de Lugo e sua comarca; o último, pela sua parte, fê-lo contra os que ocupavam as terras de Lemos, aos quais parece que venceu na paróquia de Vilamelle, junto Ferreira de Pantón, apoderando-se da vila de Monforte.[48]

Porem, os sucessos em campo aberto da cavalaria feudal não ocorreram no caso das cidades muradas, o que obrigou os senhores mais importantes a pactuar, ajudados depois por alguns irmandinhos, sem solução de continuidade, a combater os novos inimigos compartilhados. Primeiro pactua o arcebispo Fonseca com Santiago, Pontevedra e demais vilas da Terra de Santiago, e depois o conde de Lemos com Ourense e Allariz (contra o conde de Benavente).

O pacto de Fonseca com as cidades irmandinhas da Terra de Santiago foi feito sobre a base de Fonseca respeitar os usos e costumes urbanos e o acordo de não reedificar as fortificações que lhe foram antes derrubadas, o que se refletiria mais de meio século depois no pleito Tabera - Fonseca.

Ainda durante 1470 e 1471, as cidades da Corunha, Pontedeume, Viveiro, Ribadavia, Lugo e Mondoñedo resistiam. Em qualquer caso, em pouco tempo o grosso da Irmandade foi derrotado, recuperando os grandes senhores galegos o controlo dos seus antigos domínios.

Estruturação e Armamento[editar | editar código-fonte]

Espadas do período final da Idade Média.

Os irmandinhos formaram exércitos nas comarcas, que se ajuntavam para acometer grandes assédios ou batalhas, implicando ou visando implicar em alguma ocasião o conjunto da Galiza. Existem provas de que a mobilização foi bastante geral nas cidades e no campo (perderam-se colheitas), ao menos entre as pessoas comuns.

É errônea a imagem dos irmandinhos enfrentando-se com aparelhos agrícolas: A infantaria e a escassa cavalaria das milícias usariam as mesmas armas do que os exércitos senhoriais, nos quais participaram no passado, tendo portanto experiência militar e armas nas suas moradias. Alem disso, as vilas contavam com armeiros que fabricavam nelas.

Consequências[editar | editar código-fonte]

Castelo de Sandiás, arrasado em 1467 na grande revolta Irmandinha, reconstruído uma vez sufocada a revolta.

Não ficaram registrados "castigos exemplares" dos vencedores sobre os vassalos que se rebelaram. Talvez não fosse "possível" pelo caráter massivo do movimento anti-fortificações e anti-senhorial. Os porta-vozes posteriores dos vencedores, como Vasco Aponte e Felipe de la Gándara,[49] também não deram novas de represálias. Talvez contribuísse para a falta de repressão o fato de previamente os irmandinhos não se ter vingado dos cavaleiros derrotados quando atingiram a vitória em 1467.

Talvez o sentido prático, que transluz na célebre resposta do conde de Lemos a Pardo de Cela, quando este o instava a "encher os carvalhos de vassalos" (enforcados): "não se ia manter de carvalhos".

Fim da Revolta camponesa de 1381 na Inglaterra. No caso inglês, o final foi mais grave para os camponeses: a maioria dos líderes foi capturada e executada. As concessões iniciais foram revogadas e o imposto origem da revolta foi novamente introduzido.

Couselo Bouzas indica que a maior parte dos testemunhos ao respeito do pleito Tavera-Fonseca concentram-se na ânsia reconstrutora do conde de Lemos, que obrigava a serventias de dois ou três dias por semana, para o qual deviam levar carro e bois e satisfazer dois reais para pagar os encarregados da direção das obras.[50]

A retaliação principal foi em serventias, prestações pessoais que quase todos os senhores impuseram aos vassalos para a reconstrução das suas fortificações. Setenta e três fortificações, menos da metade das que foram demolidas, foram reconstruídas.[51]

Influências posteriores[editar | editar código-fonte]

Sem dúvida influenciou a decisão dos Reis Católicos mais tarde de pacificar o reino da Galiza (decretando a Doma y castración de Galicia), forçando a demolição das fortificações dos nobres rebeldes. A ação dos Reis Católicos na Galiza foi (obviando a problemática cultural causada por certas ações) em palavras de Fernando Lojo, "vista na mentalidade coletiva como uma autêntica libertação e o início da pacificação do reino, objetivo que buscara também, com menos sucesso, a irmandade de 1467".[52] Até certo ponto, a revolução Irmandinha influenciou ainda a mesma criação em Castela, pelos Reis Católicos dum Estado Moderno. Em efeito, como nos indica Carlos Barros,[53] um Estado Moderno, sujeito a uma monarquia absoluta, somente pôde impor-se uma vez que os grupos populares derrubaram, irreversivelmente, as fortalezas, não só as físicas (fortificações), mas também éticas (consentimento) do poder senhorial.

Fontes.- Pleito Tabera-Fonseca.[editar | editar código-fonte]

A grande revolta irmandinha tornou-se num tema atrativo e recorrente na historiografia galega, maiormente após a localização e estudo do pleito Tabera - Fonseca (1526-1527), o qual fez possível conhecer tanto uma parte da história da revolta, quanto a mentalidade dos irmandinhos e seus contrários[54]

Outras revoltas do século XV[editar | editar código-fonte]

No mesmo século teve lugar também a revolta catalã dos "payeses de remensa" contra os maus usos feudais. No caso catalão terminou de maneira favorável para os camponeses, graças à sentença de Guadalupe, auspiciada em 1486 por Fernando II de Aragão.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências e Notas

  1. p. 95 de BLICKLE, Peter (2003) [1997]. Resistance, Representation, and Community: Representation and Community. European ScienceFoundation. [S.l.: s.n.] ISBN 0198205481 
  2. As primeiras revoltas medievais já tiveram ocorrido na Europa durante a segunda metade do século XIV, depois da peste negra de 1348: a Jacquerie na França em 1358, a revolta camponesa de 1381 em Inglaterra, etc.
  3. E.g. Carlos Barros Guimeráns
  4. De fato, a Irmandade devolveu à Igreja muitos dos bens usurpados pela nobreza laica
  5. DE PALENCIA, Alfonso. Crónica de Enrique IV. [S.l.: s.n.] p. L. VIII, Cap. II, p.181, e L. VII, Cap. X. 172 páginas 
  6. PORTELA PAZOS, Salustiano. Galicia en tiempo de los Fonsecas. [S.l.: s.n.] 69 páginas 
  7. que era seu Chanceler maior MORALES MUÑIZ, Dolores C. (1988). El príncipe don Alfonso de Ávila , rey de Castilla. [S.l.: s.n.] pp. 308–309 e 338 
  8. MORALES MUÑIZ, Dolores C. (1988). El príncipe don Alfonso de Ávila , rey de Castilla. [S.l.: s.n.] pp. 307–308  Texto " Ávila" ignorado (ajuda)
  9. MORALES MUÑIZ, Dolores C. (1988). El príncipe don Alfonso de Ávila , rey de Castilla. [S.l.: s.n.] pp. 315–316 e 338  Texto " Ávila" ignorado (ajuda)
  10. PARDO DE GUEVARA, Eduardo. «vol. I». Los señores de Galicia. [S.l.: s.n.] 364 páginas 
  11. MORALES MUÑIZ, Dolores C. (1988). El príncipe don Alfonso de Ávila , rey de Castilla. [S.l.: s.n.] pp. 322 e 331 
  12. a sua lealdade à causa de D Afonso é sustida por [[Antonio López Ferreiro|]] em LÓPEZ FERREIRO, Antonio (1896). Galicia en el último tercio del siglo XV. A Coruña: [s.n.] , enquanto outros sustêm que a lealdade a tinha para D. Henrique: FRANCO SILVA, Alfonso (1982). «vol. I». El señorío de Villafranca del Bierzo. Boletín de la Real Academia de la Historia. [S.l.: s.n.] 38 páginas 
  13. PORTELA PAZOS, Salustiano. Galicia en tiempo de los Fonseca. [S.l.: s.n.] 57 páginas 
  14. DE PALENCIA, Alfonso. Crónica de Enrique IV. [S.l.: s.n.] p. L. VII, Cap. X. 172 páginas 
  15. GARCÍA DE SALAZAR, Lope (1971). «vol. IV, Libro XXII». Bienandanzas e fortunas. A. Rodríguez Herrero, Bilbao. [S.l.: s.n.] pp. 174–175 
  16. GUTIÉRREZ NIETO, Juan Ignacio (1975). «vol. II: «Historia Medieval»». «Puntos de aproximación en torno al movimiento hirmandino (relaciones entre la Santa Hermandad y la Santa Irmandade)», Actas de las I Jornadas de metodología aplicada de Ciencias Históricas,. Santiago de Compostela: [s.n.] 317 páginas 
  17. OLIVERA SERRANO, C. (1990). La ausencia de Galicia en las cortes del siglo XV", Galicia en la Edad Media. Madrid: [s.n.] pp. 320–321 
  18. Crónica de Enrique IV. BAE núm. 257. Madrid: [s.n.] 1973. pp. 191–192 
  19. TBD (1901). «vol. I». Galicia Histórica. [S.l.: s.n.] pp. 19–27 
  20. PARDO DE GUEVARA, Eduardo (2000). «vol. I». Los Señores de Galicia. Tenentes y condes de Lemos en la Edad Media. colección "Galicia Histórica". A Coruña: [s.n.] 370 páginas 
  21. a b GARCÍA DE SALAZAR, Lope. «vol. IV, Libro XXV». Bienandanzas e fortunas. [S.l.: s.n.] 417 páginas 
  22. RODRÍGUEZ GONZÁLEZ, Ángel. «vol. II». Las fortalezas de la mitra compostelana y los irmandiños. [S.l.: s.n.] 426 páginas. ISBN 84-85728-39-X Verifique |isbn= (ajuda) 
  23. Pedro Maldonado, vizinho de Zamora e diputado de la Santa Hermandad della , e Alfonso Fernández da Madalena, vizinho também de Zamora e cuadrillero de la dicha Santa Hermandad de la dicha çibdad
  24. LÓPEZ CARREIRA, Anselmo. Os irmandiños. Textos, documentos e bibliografía. [S.l.: s.n.] pp. 85–87 
  25. COUSELO BOUZAS, José. La guerra hermandina. [S.l.: s.n.] 23 páginas 
  26. BECEIRO PITA, Isabel. La rebelión irmandiña. [S.l.: s.n.] pp. 136–137 
  27. cifra dada por uma testemunha do pleito Tavera-Fonseca
  28. RODRÍGUEZ GONZÁLEZ, Ángel. «vol. II». Las fortalezas de la mitra compostelana y los irmandiños. [S.l.: s.n.] 345 páginas. ISBN 84-85728-39-X Verifique |isbn= (ajuda) 
  29. BECEIRO PITA, Isabel. La rebelión irmandiña. [S.l.: s.n.] 122 páginas 
  30. COUSELO, José. La guerra hermandina. [S.l.: s.n.] 15 páginas 
  31. (cf.RODRÍGUEZ GONZÁLEZ, Ángel. «vol. II». Las fortalezas de la mitra compostelana y los irmandiños. [S.l.: s.n.] pp. 428–429. ISBN 84-85728-39-X Verifique |isbn= (ajuda) )
  32. embora fossem interceptados pelas gentes da condessa de Ribadavia, que os encarcerou durante dois anos (COUSELO BOUZAS, José. La guerra hermandina. [S.l.: s.n.] 28 páginas )
  33. PORTELA PAZOS, Salustiano. Galicia en tiempos de los Fonseca. [S.l.: s.n.] pp. 57–58 
  34. COUSELO BOUZAS, José. La guerra hermandina l38. [S.l.: s.n.] 
  35. VÁZQUEZ, Rui (1467–1468). Crónica de Santa María de Iria. [S.l.: s.n.] 
  36. SALVADO MARTÍNEZ, Vicente (1943). El mariscal don Suero Gómez de Sotomayor. Museo de Pontevedra, 2. [S.l.: s.n.] pp. 121–135 
  37. VAAMONDE LORES, César. Gómez Pérez das Mariñas y sus descendientes. [S.l.: s.n.] pp. 18–21 
  38. «Carlos Barros: Os irmandiños da Terra de Lemos». Consultado em 31 de maio de 2008. Arquivado do original em 8 de junho de 2008 
  39. DE PALENCIA, Alonso. Crónica de Enrique IV, I, BAE nº 257. [S.l.: s.n.] 192 páginas 
  40. LOJO PIÑEIRO, Fernando (1991). A violencia na Galicia do século XV. Universidade de Santiago de Compostela. [S.l.: s.n.] pp. 109–114 
  41. PARDO DE GUEVARA, Eduardo. "Notas para una relectura del fenómeno hermandino", doc. IV. [S.l.: s.n.] pp. 105–106 
  42. BECEIRO PITA, Isabel. La rebelión irmandiña. [S.l.: s.n.] pp. 154–156 
  43. APONTE , Vasco de (1943). Relación de algunas casas y linajes del reino de Galicia. Editorial Nova, Buenos Aires. [S.l.: s.n.] 120 páginas 
  44. APONTE , Vasco de (1945). Relación de algunas casas y linajes del reino de Galicia. Editorial Nova, Buenos Aires. [S.l.: s.n.] 121 páginas 
  45. RODRÍGUEZ GONZÁLEZ, Ángel. «vol. II». Las fortalezas de la mitra compostelana y los irmandiños. [S.l.: s.n.] 304 páginas. ISBN 84-85728-39-X Verifique |isbn= (ajuda) 
  46. APONTE, Vasco de (1945). Relación de algunas casas y linajes del reino de Galicia. Editorial Nova, Buenos Aires. [S.l.: s.n.] 123 páginas 
  47. Contudo, Lanzós foi perseguido e apresado por Fernán Pérez Parragués, quem o entregou a Fernán Pérez de Andrade
  48. DE LA GÁNDARA, Felipe (1662). Armas y Triunfos. Hechos heróicos de los hijos de Galicia. [S.l.: s.n.] pp. Cap. XL, p. 573–547 
  49. nomeado cronista oficial de Galicia, pela Junta de Galicia em 1654
  50. RODRÍGUEZ GONZÁLEZ, Ángel. «vol. I». Las fortalezas de la mitra compostelana y los irmandiños. [S.l.: s.n.] 162 páginas. ISBN 84-85728-39-X Verifique |isbn= (ajuda) 
  51. LOJO PIÑEIRO, Fernando (1991). A violencia na Galicia do século XV. Universidade de Santiago de Compostela. [S.l.: s.n.] pp. 109–114 
  52. LOJO PIÑEIRO, Fernando (1991). A violencia na Galicia do século XV. Universidade de Santiago de Compostela. [S.l.: s.n.] 72 páginas 
  53. ver capítulo "Os señores que foron" de BARROS GUIMERÁNS, Carlos (1996). ¡Viva El-Rei! Ensaios Medievais. Edicións Xerais. [S.l.: s.n.] ISBN 84-7507-961-X 
  54. Este documento foi dado a conhecer por José Couselo Bouzas por volta de 1925, sendo finalmente publicada a sua transcrição completa em 1984 por Ángel Rodríguez González. Inclui 204 declarações de testemunhas, incluindo as respostas a perguntas tais como o porquê da demolição das fortificações em 1467

Bibliografía[editar | editar código-fonte]

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